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LUZES DA CIVILIZAÇÃO CRISTÃ<br />
vogado ou engenheiro, como aqueles que andam sempre<br />
devendo à quitanda. Não. Basta-lhe o seu status, eminentemente<br />
abdominal e saudável a ponto de as bochechas<br />
serem pontudas, a bigodeira abundante, a voz estentórica,<br />
mãos nas quais se nota o proletariado, mas em cujo<br />
dedo anular refulge um anel de brilhante usado por ele<br />
no dia do casamento da filha. É tudo o que deseja para<br />
si e seu sucessor.<br />
A um canto da loja se vê a imagem da devoção dele,<br />
iluminada constantemente por uma pequena luz dourada.<br />
Será do seu Santo padroeiro ou de Nossa Senhora,<br />
sob alguma invocação venerada na sua aldeia natal.<br />
A imagem está lá, intocável como uma preciosa tradição,<br />
recebendo de quando em vez um olhar piedoso da velha<br />
freguesa, uma súplica dele próprio, quando as preocupações<br />
o atormentam.<br />
Em suma, a figura do vendeiro se torna simpática para<br />
quem a sabe compreender e admirar no seu peculiar<br />
contexto. Foi, aliás, o meu caso. Comecei a freqüentar a<br />
venda do “seu Manuel” com certa reticência. Em determinado<br />
momento, percebi o papel que desempenhavam<br />
numa sociedade organicamente estabelecida. E pensei:<br />
“Não, mas essa gente é interessante, tem vitalidade, disposições,<br />
pitorescos, funcionalidades que desempenham<br />
sua missão benéfica e enriquecedora no ambiente social<br />
onde se insere.”<br />
E aí passei a compreender melhor o “meu” Portugal...<br />
<br />
“Essa gente é interessante, tem<br />
disposições e funcionalidades<br />
que desempenham seu papel<br />
benéfico e enriquecedor no<br />
ambiente social em que vivem...”<br />
À esquerda, venda na Rua do Arsenal;<br />
no centro, vendeiro na Lisboa antiga; na<br />
pág. seguinte, a Rua da Alfama, tradicional<br />
centro de vendas na capital portuguesa<br />
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