Revista Agosto 2018
Revista Nossos Passos edição Agosto 2018. Matérias pertinentes a Paróquia e assuntos de interesse.
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12 AGOSTO / 18<br />
NÃO MATARÁS!<br />
Envolvido em bastante polêmica, o tema suicídio é de<br />
alta complexidade e leva pesquisadores para ampla reflexão<br />
sobre diversas perspectivas que expliquem a prática<br />
suicida. Quando o ato de viver torna-se mais sacrificante<br />
que o de morrer? Como identificar um comportamento<br />
iminentemente suicida em alguém próximo a mim? Como<br />
ajudar uma pessoa com potencial de autodestruição? Eu<br />
posso ter coragem de acabar com minha própria vida? As<br />
frequentes perguntas que permeiam a questão do suicídio<br />
podem ficar desacompanhadas de respostas, em função da<br />
força que o tabu possui em silenciá-las.<br />
Por não haver um único fator responsável pelo<br />
suicídio, troca-se o termo causa por culminância, ou seja, a<br />
soma dos fatores biológicos, familiares, sociais e psicológicos<br />
pode gerar o resultado de eliminação da vida. Entre os<br />
aspectos citados, destaca-se a influência da pressão social<br />
sobre o indivíduo, a necessidade de inclusão em diversos<br />
grupos em que vive e suas possíveis frustrações. Diante<br />
de tanta diversidade de comportamentos, as regras sociais<br />
passam a exercer papel fundamental na constituição<br />
pessoal, de forma que a permanência desse indivíduo em<br />
seu ambiente comunitário passa a ser confundida com a<br />
conservação de sua própria vida. O suicídio também é um<br />
ato de linguagem que se destina a comunicar algo sobre<br />
a própria morte àqueles com quem convivemos nas redes<br />
sociais de relacionamento.<br />
De acordo com números oficiais fornecidos pela<br />
Organização Mundial de Saúde, são 32 brasileiros que<br />
vão a óbito, diariamente, vitimas do suicídio. A estatística<br />
mostra taxas superiores aos falecimentos por AIDS e<br />
diversos tipos de câncer. Segundo a OMS, 9 entre 10 casos<br />
de morte suicida poderiam ser evitados, o que faz abrir<br />
uma janela por onde a solidariedade pode entrar de forma<br />
eficaz nesse cenário.<br />
Entre tantas outras formas de esforço de prevenção<br />
do suicídio, o Centro de Valorização da vida, em parceria<br />
com o Conselho Federal de Medicina e a Associação<br />
Brasileira de Psiquiatria, iniciou, em 2015, as primeiras<br />
atividades da campanha Setembro Amarelo no Brasil. O<br />
objetivo da ação, que utiliza o site setembroamarelo.org.<br />
br, é levar à população a conscientização da importância<br />
da prevenção do suicídio e suas formas de atuação, frente<br />
à realidade dos altos índices de ocorrência no Brasil e no<br />
mundo.<br />
Imaginar que alguém próximo a você possa ser<br />
candidato ao suicídio é uma vivência extremamente<br />
difícil, acompanhada de intensa dor psíquica. Perceber que<br />
algo diferente está se processando dentro de seu próprio<br />
círculo de convivência exige a cautela e a disponibilidade<br />
que poucas vezes temos. A aceleração do ritmo e a grande<br />
quantidade de tarefas que a atualidade impõe, muitas<br />
vezes roubam a atenção das pessoas para o ocorrência dos<br />
sintomas que as avizinham.<br />
Multifacetado, o mundo opaco do suicida está na<br />
fome do desempregado; no abandono do desamparado;<br />
na vulnerabilidade do morador de rua; na ideologia do<br />
homem-bomba; na crueldade do bullying; na solidão<br />
acompanhada da adolescência e seus sites de recrutamento<br />
à morte, na anestesia dos entorpecentes, na essência do ser<br />
humano. O pensamento suicida não pertence ao suicida,<br />
pertence a todos nós, seres humanos. Uma das formas de<br />
engajamento na luta contra o suicídio é identificar-se no<br />
outro, para haver capacidade de colaboração no momento<br />
da desesperança, quando o repertório de tentativas foi<br />
limitado pela mente em conflito.<br />
A ideação suicida é revestida de grande ambivalência,<br />
pois a pessoa recorre à morte como rota de fuga do<br />
sofrimento e, ao mesmo tempo, sinaliza seu clamor por<br />
socorro. Um dos traços marcantes da contemporaneidade<br />
é a velocidade herdada da eficiência tecnológica que produz<br />
o fenômeno do imediatismo e facilita atitudes precipitadas.<br />
A sociedade deve ser promover ações como o Setembro<br />
Amarelo no sentido de aproveitar este momento decisivo.<br />
As famílias e os amigos devem buscar o caminho inverso<br />
do afrouxamento das relações para reinventar o espaço do<br />
diálogo, do olhar cuidadoso pelo próximo. Diante de tanta<br />
tensão interna, a informação e o acolhimento são capazes<br />
de resgatar o indivíduo para o centro de sua trajetória,<br />
para que as forças internas de destruição sejam vencidas<br />
pela escolha da manutenção da vida.<br />
>>Renata Quiroga<br />
Psicanalista<br />
Pós graduada em Filosofia