27.07.2019 Views

349840591-Sombras-de-Reis-Barbudos

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Empurrando, espremendo, metendo cunha com os ombros e com os cotovelos consegui um lugar na frente.<br />

O aperto era para ver o Gran<strong>de</strong> Uzk jogar bilhar.<br />

Jogar, não; ele fazia mágicas com as bolas. Quando cheguei ele já <strong>de</strong>via ter feito algumas porque todo<br />

mundo já estava com cara <strong>de</strong> hipnotizado. O Gran<strong>de</strong> Uzk arrumava uma porção <strong>de</strong> bolas em linha no<br />

comprimento da mesa. Abaixou-se e mirou para ver se estavam no alinhamento. Acertou os <strong>de</strong>svios<br />

usando o taco como régua. Levantou o taco, passou giz; apontou, ensaiou, <strong>de</strong>u a tacada. A bola empurrada<br />

pelo taco bateu na segunda, sumiu; a segunda bateu na terceira, sumiu; a terceira bateu na quarta, sumiu.<br />

Cada bola batia na seguinte e sumia, até que só ficou a última; essa foi rodando já sem força e parou antes<br />

<strong>de</strong> encostar na tabela. Ninguém dizia nada, e parece que nem respirava.<br />

— On<strong>de</strong> estão as bolas? — ele perguntou.<br />

Como é que íamos saber? Algumas pessoas ainda procuraram olhar no chão, <strong>de</strong>baixo da mesa, mas<br />

<strong>de</strong>sistiram por causa do aperto. Também ninguém tinha visto nenhuma bola saltar da mesa.<br />

— No meu bolso? — perguntou o mágico, e bateu nos bolsos para mostrar que estavam vazios.<br />

— No meu boca? — Abriu a boca <strong>de</strong>snecessariamente, ninguém esperava que estivessem lá.<br />

— Na barriga do menino? — Bateu <strong>de</strong> leve com o taco na minha barriga. Eu gelei. Imagine se aquelas<br />

bolas todas estivessem pesando <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> mim.<br />

— Quem adivinha eu ensina.<br />

O único que teve coragem <strong>de</strong> ensaiar uma investigação foi o dono do bilhar. Ele se <strong>de</strong>bruçou sobre a<br />

mesa, pegou a bola restante, não conseguiu levantá-la da primeira vez porque estava com o corpo<br />

inclinado e sem firmeza.<br />

— Acertou. Vou ensinar.<br />

O Gran<strong>de</strong> Uzk pegou a bola e <strong>de</strong>u a outras, pessoas para avaliarem o peso. Quem pegava precisava<br />

agarrar com as duas mãos para não <strong>de</strong>ixar cair.<br />

A mágica para separar as bolas <strong>de</strong>via ser tão sensacional como a <strong>de</strong> juntá-las. Pela cara que fazia, o<br />

dono do bilhar parecia não acreditar na separação, pensava que elas iam ficar para sempre englobadas.<br />

— Quer os bolas? Muito fácil — disse o Gran<strong>de</strong> Uzk.<br />

Pegou a bola pesada, pôs bem no centro da mesa. Segurou-a entre os <strong>de</strong>dos da mão direita, girou a<br />

mão.<br />

Foi bonito. A bola saiu girando, e enquanto girava as outras iam saindo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>la e se<br />

espalhando em espiral pela mesa.<br />

— Faz <strong>de</strong> novo! — pediram várias vozes quando nos refizemos do espanto.<br />

— Ele faz — disse o Gran<strong>de</strong> Uzk apontando para o dono do bilhar.<br />

— Eu?<br />

— Senhor — disse o Gran<strong>de</strong> Uzk, e ofereceu-lhe o taco.<br />

O dono do bilhar hesitava, mas víamos que estava doido para experimentar.<br />

— É só bater?<br />

— Só bater. Mas espera eu mandar.<br />

O homem preparou o taco, apontou. O Gran<strong>de</strong> Uzk fechou os olhos, com a mão direita estendida na<br />

direção da bola. Deu a or<strong>de</strong>m.<br />

O homem <strong>de</strong>u a tacada. Mas bateu com medo, ou fora <strong>de</strong> hora, ou errou a pontaria. A primeira bola<br />

bateu na segunda, só entrou a meta<strong>de</strong>, e as duas ficaram formando uma espécie <strong>de</strong> oito. A cabeça do oito<br />

bateu sem força na terceira bola porque as duas primeiras já tinham seguido arrastadas, e bateu meio <strong>de</strong><br />

lado, e as três formaram uma figura que lembrava uma batata aleijada. Ficou engraçado, e todo mundo<br />

riu. O dono do bilhar tentou separar as bolas puxando com a mão, não conseguiu. Outras pessoas<br />

experimentaram puxando, torcendo, quebrando, também não conseguiram.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!