Benedito Bacurau - O pássaro que não nasceu de um ovo
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O coreto encantado
centro de muitas cidades nem sempre é exatamente no centro. Às
vezes, o centro pode estar em um dos lados da cidade. É que se costuma
chamar de centro o ponto que deu origem à vida urbana de um lugar, onde
se dá também a maior concentração de pessoas indo e vindo, vindo e indo
sem parar. Pois bem, no centro de Fortaleza, que não é no meio da cidade, fica
a Praça do Ferreira. E no centro da Praça do Ferreira, bem no centro mesmo,
fica a Coluna da Hora.
Há quem diga que do alto do relógio é possível contemplar toda a história
de Fortaleza. Não explico a razão dessa afirmativa simplesmente porque não sei,
mas tenho lá meus motivos para pensar que por cima da Coluna da Hora o
tempo e o vento se perpetuam como se não tivessem o que fazer.
O coração da cidade
É cheio de nove horas
Vento passa a toda hora
Não tem hora pra parar
Era uma agradável noite morna de domingo. Sentado em um banco da
praça percebi a presença do Benedito na parte mais elevada da torre, logo
acima do relógio. Não sei se as outras pessoas também observavam aquela
inquietação do bacurau. Ele queria demonstrar alguma coisa, mas acho que só
queria fazer a suposta revelação para quem estivesse disposto a fazer daquele
momento um momento especial. Entendi assim e assim me pus a olhar, olhar,
olhar, até ir-me distraindo, distraindo, distraindo...
No começo daquela experiência fantasiosa, pelo brilho dos seus olhos,
que, com certeza, brilhava nos meus, fui formando vagas idéias da memória
da praça perdida no tempo.Tinha burburinho de pessoas tomando banho no
velho cacimbão, na época em que tudo por ali era um grande areal, com pés
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