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imensa dor, extrairia os prazeres da absolvição. Gritando para as parceiras, enciumadas: «Eu nunca te menti sobre a
minha condição!» Pois não. Só que estava diferente, devassada que foi um dia em sua ambiguidade carnal.
Depois, Joel tornou-se proxeneta de almas, escavando nelas, estilizado, um suplício irritante, como
funcionário catártico do Poder vigente. Às tantas, canino, deleitava-se mesmo a infligir tormentos vãos aos pobres
diabos, idealistas, num desbarato quanto à integridade militante.
Algum instante, quer Ofélia quer Joel procuravam-se, com as marcas tribais da própria emanação, equívoca.
A dela, precedia-o. A dele, perseguia-a.
- És tu ou eu? – questionava a já maligna, fixando-se ao espelho. Mas logo lhe voltava as costas, como se
vira a esquina para nada.
– És tu ou eu! – deduzia o torcionário ao açaimar, furtando-se à sua imagem. Então, apático, ficava com o
medo reflectido no olhar.
Melancolia mansa, fúria selvagem. Nunca mais.
Por natureza, nunca mais seriam. Profanados, destilavam o paradoxo de tal
perplexidade, numa existência alternativa.
E se tivessem nascido outros? Como assim, únicos – a divergência que entretanto assumiriam.
E se pudessem morrer autênticos? Quem então, impessoais – anteriores ao
sobressalto da sua coincidência.
Homogéneo. Um tempo em harmonia, na vertigem das origens. Hegemónico. Um mundo às avessas, nos
pilares do apocalipse. Joel Crespo e Ofélia Toledo – enfim anónimos, e recriando a fractura essencial...
Contos de loucura, cantos de lucidez. Era uma altura em que ainda havia uma relação mais próxima, entre
humanos e animais. Os homens alteravam-se em bestas míticas. Os bichos convertiam-se em fabulosos heróis.
Os SobreNaturais
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