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Tribuna Pacense 27 de Dezembro de 2019 | Edição nº 1198

Destaques desta edição: - Nova Igreja de Freamunde já está aberta ao público - Reportagem: "Sem-abrigo, também os há na nossa terra" - Vento e chuva fazem estragos no concelho - F.C Paços de Ferreira em maré alta - Artigos de opinião: "2020, mais um ano de mixórdia política" e "Greta Thunberg".

Destaques desta edição:
- Nova Igreja de Freamunde já está aberta ao público
- Reportagem: "Sem-abrigo, também os há na nossa terra"
- Vento e chuva fazem estragos no concelho
- F.C Paços de Ferreira em maré alta
- Artigos de opinião: "2020, mais um ano de mixórdia política" e "Greta Thunberg".

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CYANMAGENTAYELLOWBLACK

OPINIÃO

TRIBUNA PACENSE 27 de Dezembro de 2019

Do meu galho em árvore podre

A SARA TRANSGREDIU - E A SOCIEDADE

QUE A PARIU E ATIROU AO LIXO, NÃO?

A Sara, aquela que

deitou o filho no contentor

do lixo, nasceu

selvagem como eu,

como você, como toda

a gente que nasceu e

anda por aí como o

Santana Lopes, como

todos nós. Esta é a mais

comezinha das verdades

e de tão comezinha

que é todos a rejeitam,

menos eu, que a última

coisa que farei será a

de me enganar a mim

próprio, que isto de curtir

a vaidade tola de me

considerar de origem

divina e de me considerar

superior às outras

espécies não entra na

minha cabeça. Tamanha

intrujice excede largamente

a capacidade

de alojamento do meu

crânio, não só pela sua

dimensão, mas também

pela baixa qualidade

dos pressupostos.

Ao parto natural

sucede o parto social.

Este é que vai definir

o que cada um representa

na vida. Somos o

que a sociedade faz de

nós, umas vezes amordaçando-nos

o instinto,

outras vezes exacerbando-lhe

a animalidade.

Vítimas de um cérebro

que evoluiu demasiado

rápido; vítimas de

uma prodigiosa imaginação,

capaz de ficções

que se transformam em

segundas realidades;

vítimas da inaptidão

para distinguir a realidade

da fantasia e da

mentira, a raça humana

transformou-se num

conjunto de animais

exóticos com um percurso

terrestre divergente

da restante natureza,

cujos resultados se

conjecturam complexos

e perigosos.

O caminho divergente

que tomamos iniciou-se

com a invenção

da multiplicação do alimento

há alguns milhares

de anos atrás.

A sociedade actual

começa com a agricultura.

Aí se inicia a propriedade

privada dos

meios de produção e

da terra e a divisão dos

homens em classes.

Patrões e trabalhadores,

na época esclavagistas e

escravos. Assim começou

a civilização, assim

continuou e assim continua.

Todo o desenvolvimento

moderno assenta

na expansão da base alimentar

primitiva.

Se limparmos o lixo

que o sistema que rege a

sociedade nos atira para

os olhos, observamos

com grande nitidez que

o actual sistema capitalista

é uma cópia a cores

do sistema esclavagista

a preto e branco de

antigamente. A base é

exactamente a mesma:

a propriedade privada

dos meios de produção

e a inerente sociedade

de classes, tal e qual

como há milhares de

anos lá para os lados

da selva. Onde está o

progresso no relacionamento

humano, este

sim, o mais importante

de todos?

Não existe, continuamos

os mesmos

animais, os mesmos

esclavagistas, as mesmas

bestas insensíveis,

os mesmos ditadores,

os mesmos ignorantes,

os mesmos escravos

obedientes ao poder da

riqueza. Houve, é facto,

uma mudança enorme

na multiplicação da

riqueza, na capacidade

de escravização da

natureza por meio da

tecnologia e da ciência,

mas não houve mudanças

fundamentais no

relacionamento entre os

homens. Pelo contrário,

a bestialidade acentuou-

-se, actualmente com

esmeros de sadismo

extraído do conhecimento

cada vez maior

do funcionamento da

natureza e da sociedade.

Na primeira escravatura,

o impulso era

dado pela necessidade

cega de aumentar os

bens necessários, agora,

o impulso é dado pelo

mais estulto egoísmo.

Nunca houve sociedade

mais burra que a actual.

O modo como se usa a

ciência e a tecnologia,

meios já capazes de instalar

na Terra o Paraíso

da fábula para muito

melhor, informa-nos

tragicamente sobre o

progresso zero na convivência

humana. É de

tragédia o facto incontroverso

de os seres

humanos não se reconhecerem

entre si como

iguais. O racismo, a

xenofobia, o classismo

e todo rol de discriminações

entre culturas e

países diferentes, também

entre os nacionais

de um país ao separarem-se

por uma quantidade

absurda de preconceitos

adquiridos

passivamente e transformados

em valores

de conduta ao serem

interiorizados como

verdades plenas, retira

toda a esperança numa

sociedade inteligente e

harmoniosa.

Aceitar a nossa natureza

animal é o primeiro

passo para olharmos o

mundo na sua realidade

material e o limparmos

das sujidades místicas

que lhe ocultam a verdade

e a beleza. Jamais

poderemos usufruir o

mundo real se continuarmos

a vê-lo pelos

olhos das ficções teológicas,

das perplexidades

dos nossos longínquos

antepassados e das

ideologias da desigualdade.

Impõe-se uma

revolução cultural planetária

que dê a volta ao

miolo da infeliz espécie

humana, se for possível

e houver tempo para

ela.

A Sara exerce clandestinamente

a profissão

de prostituta (puta

em português vernáculo)

em Lisboa, cidade

dirigida pelo autarquíssimo

Fernando Medina,

cuja elevação administrativa

fá-lo andar de

cabeça inclinada às alturas

por dever do cargo e

predisposição pessoal,

não lhe sobrando minutos

suficientes para dar

uma olhada ao chão da

cidade. Por tão ponderoso

motivo não viu as

condições de vida da

Sara e de milhares de

miseráveis desestruturados

que se arrastam

pelo piso mais à mão,

de corpo mal cheiroso e

subnutrido, asilo revestido

a farrapos de vidas

rejeitadas pela sociedade,

atiradas para as

bermas e valetas como

latas de cerveja. Por seu

turno, as excelências

ministeriais estão concentradas

na obediência

subserviente às ordens

de Bruxelas, não lhes

sobrando tempo para

minudências sem efeito

no PIB.

Nesta sociedade,

como acima se mostrou,

antiquada no relacionamento

humano, baseada

na propriedade privada

dos meios de produção

e nas subsequentes classes

sociais, que tem o

lucro económico acima

de todas as coisas, que

engendra desigualdades

abismais entre as

pessoas, que legitima

a existência de riquezas

incomensuráveis e

pobrezas calamitosas,

que fomenta o ódio e

desencadeia a violência,

que não respeita

nem dignifica o ser

humano, que continua

a praticar a escravatura,

agora paga em dinheiro

e não em espécie, forçosamente

produz distúrbios

psicológicos e

de carácter em muitos

seres. Esta sociedade,

nos moldes em que está

constituída, comete permanentemente

crimes

contra a maioria dos

seus membros. É uma

sociedade injusta, violenta,

criminosa.

A Sara errou. O seu

crime vai ser julgado

pela legislação de uma

sociedade criminosa

que a excluiu e atirou

para o lixo. Quem julga

a sociedade que a maltratou?

ORM

TRIBUNA

JORNAL

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