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severamente restritiva, cruelmente proibidora. É disso, em verdade, que surge a concepção de um
ser superior que distribui castigos inexoravelmente.
Não posso ir à frente em minha consideração dessas questões sem introduzir uma nova
hipótese. O superego surge, como sabemos, de uma identificação com o pai tomado como
modelo. Toda identificação desse tipo tem a natureza de uma dessexualização ou mesmo de uma
sublimação. Parece então que, quando uma transformação desse tipo se efetua, ocorre ao mesmo
tempo uma desfusão instintual [[1]]. Após a sublimação, o componente erótico não mais tem o
poder de unir a totalidade da agressividade que com ele se achava combinada, e esta é liberada
sob a forma de uma inclinação à agressão e à destruição. Essa desfusão seria a fonte do caráter
geral de severidade e crueldade apresentado pelo ideal - o seu ditatorial ‘farás’.
Consideremos novamente, por um momento, a neurose obsessiva. Aqui, o estado de
coisas é diferente. A desfusão de amor em agressividade não foi efetuada por ação do ego, mas é
o resultado de uma regressão que ocorreu no id. Esse processo, porém, estendeu-se além do id,
até o superego, que agora aumenta a sua severidade para com o inocente ego. Pareceria,
contudo, que nesse caso, não menos que no da melancolia, o ego, tendo ganho controle sobre a
libido por meio da identificação, é punido pelo superego por assim proceder, mediante a
instrumentalidade da agressividade que estava mesclada com a libido.
As nossas idéias sobre o ego estão começando a clarear e os seus diversos
relacionamentos ganham nitidez. Vemos agora o ego em sua força e em suas fraquezas. Está
encarregado de importantes funções. Em virtude de sua relação com o sistema perceptivo, ele dá
aos processos mentais uma ordem temporal e submete-os ao ‘teste da realidade’. Interpondo os
processos de pensamento, assegura um adiamento das descargas motoras e controla o acesso à
motilidade. Este último poder, com efeito, é mais uma questão de forma do que de fato; no assunto
da ação, a posição do ego é semelhante à de um monarca constitucional, sem cuja sanção
nenhuma lei pode ser aprovada, mas que hesita longo tempo antes de impor seu veto a qualquer
medida apresentada pelo parlamento. Todas as experiências da vida que se originam do exterior
enriquecem o ego; o id, contudo, é o seu segundo mundo externo, que ele se esforça por colocar
em sujeição a si. Ele retira libido do id e transforma as catexias objetais deste em estruturas do
ego. Com a ajuda do superego, de uma maneira que ainda nos é obscura, ele se vale das
experiências de época passadas armazenadas no id [ [1]e[2]]
Há dois caminhos pelos quais os conteúdos do id podem penetrar no ego. Um é direto, o
outro por intermédio do ideal do ego; seja qual for destes dois o caminho tomado, pode ser de
importância decisiva para certas atividades mentais. O ego evolui da percepção para o controle
dos instintos, da obediência a eles para a inibição deles. Nesta realização, grande parte é tomada
pelo ideal do ego, que, em verdade, constitui parcialmente uma formação reativa contra os
processos instintuais do id. A psicanálise é um instrumento que capacita o ego a conseguir uma
progressiva conquista do id.
De outro ponto de vista, contudo, vemos este mesmo ego como uma pobre criatura que