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agrupou; é esse temor que persiste como medo da consciência.
A frase altissonante ‘todo medo é, em última análise, o medo da morte’ dificilmente tem
qualquer significado, e, de qualquer maneira, não pode ser justificada. Parece-me, pelo contrário,
perfeitamente correto distinguir o medo da morte do temor de um objeto (ansiedade realística) e da
ansiedade libidinal neurótica. Apresenta-se um problema difícil para a psicanálise, pois a morte é
um conceito abstrato com conteúdo negativo para o qual nenhum correlativo inconsciente pode ser
encontrado. Pareceria que o mecanismo do medo da morte só pode ser o fato de o ego abandonar
em grande parte sua catexia libidinal narcísica - isto é, de ele se abandonar, tal como abandona
algum objeto externo nos outros casos em que sente ansiedade. Creio que o medo da morte é algo
que ocorre entre o ego e o superego.
Sabemos que o medo da morte faz seu aparecimento sob duas condições (as quais, além
disso, são inteiramente análogas a situações em que outros tipos de ansiedade se desenvolvem),
a saber, como reação a um perigo externo e como um processo interno (como, por exemplo, na
melancolia). Mais uma vez uma manifestação neurótica pode ajudar-nos a compreender uma
normal.
O medo da morte na melancolia só admite uma explicação: que o próprio ego se abandona
porque se sente odiado e perseguido pelo superego, ao invés de amado. Para o ego, portanto,
viver significa o mesmo que ser amado - ser amado pelo superego, que aqui, mais uma vez,
aparece como representante do id. O superego preenche a mesma função de proteger e salvar
que, em épocas anteriores, foi preenchida pelo pai e, posteriormente, pela Providência ou Destino.
Entretanto, quando o ego se encontra num perigo real excessivo, que se acredita incapaz de
superar por suas próprias forças, vê-se obrigado a tirar a mesma conclusão. Ele se vê desertado
por todas as forças protetoras e se deixa morrer. Aqui está novamente a mesma situação que
fundamenta o primeiro grande estadode ansiedade do nascimento e a ansiedade infantil do desejo
- a ansiedade devida à separação da mãe protetora.
Estas considerações tornam possível encarar o medo da morte, tal qual o medo da
consciência, como um desenvolvimento do medo da castração. A grande significação que o
sentimento de culpa tem nas neuroses torna concebível que a ansiedade neurótica comum seja
reforçada nos casos graves pela formação de ansiedade entre o ego e o superego (medo da
castração, da consciência, da morte).
O id, ao qual finalmente retornamos, não possui meios de demonstrar ao ego amor ou
ódio. Ele não pode dizer o que quer; não alcançou uma vontade unificada. Eros e o instinto de
morte lutam dentro dele; vimos com que armas um grupo de instintos defende-se contra o outro.
Seria possível representar o id como se achando sob o domínio dos silenciosos mas poderosos
instintos de morte, que desejam ficar em paz e (incitados pelo princípio de prazer) fazer repousar
Eros, o promotor de desordens; mas talvez isso seja desvalorizar o papel desempenhado por Eros.