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entrevista
Texto por Pedro Queirós e
Leonor Costa
“Eu gostava de ser
o primeiro comediante
português a
ter um especial de
comédia em inglês
na Netflix”
André de Freitas optou por construir a sua
carreira ao contrário: procurou o sucesso internacional
antes de se destacar em Portugal.
E o sucesso acompanhou o humorista. Foi o
primeiro português a atuar em inglês no Edinburgh
Festival Fringe e na Comedy Store, em
Los Angeles. Um caminho “difícil”, mas com
muita história para contar.
Pontos de Vista: Quando surgiu o interesse
pelo stand up?
André de Freitas: Surgiu quando eu tinha 15
anos. Andava na Escola Profissional de Teatro
de Cascais e descobri que existia uma coisa
chamada “stand up”. Isto é, descobri que existia
em Portugal porque já tinha visto uma
coisa na televisão do Chris Rock com o meu
pai e achei altamente. Descobri que havia em
Portugal porque um colega de turma disse-me
que o primo dele fazia stand up e que eu era
capaz de curtir, para irmos ver. Fomos ver, era
na Guilherme Cossoul [Sociedade de Instrução
Guilherme Cossoul, em Lisboa]. Na altura, eram
os Alcómicos Anónimos: Salvador Martinha, Rui
Sinel de Cordes, Luís Franco Bastos e Ricardo
Vilão. Estávamos umas vinte pessoas na sala.
Foi aí que nasceu o interesse.
Fizeste um curso com Rui Sinel de Cordes.
Como foi a experiência?
Foi fixe. Eu já tinha pesquisado sobre stand up
e tinha ficado um pouco obcecado pelo stand
up americano. Na altura, mesmo com amigos,
já falava mais inglês do que português. Então,
já tinha algumas ideias. Mas depois, ter a oportunidade
de estar ali, frente a frente, com outros
colegas, com outras pessoas e fazer o curso foi
excelente. Aprendemos todos e muita gente
desse curso acabou por ter grandes carreiras
no stand up, ou seja, alguma coisa se fez bem
nesse curso.
Quem é que também estava nesse curso e conseguiu
chegar longe?
O [Carlos Coutinho] Vilhena, o Guilherme Geirinhas.
O [Pedro] Teixeira da Mota fez o curso
depois. No meu [curso], estavam outras pessoas
que andam por aí, mas que ainda não tiveram
o sucesso que o Vilhena e o Geirinhas tiveram.
Foto: Paustorch
De qualquer das formas, o curso tinha umas
nove pessoas, ou seja, se pensarmos na taxa de
sucesso de um curso com nove ou dez pessoas,
é bastante alta. Acho que todos os cursos que
o Sinel [Rui Sinel de Cordes] fez tiveram muitas
pessoas que conseguiram ter sucesso.
O Rui Sinel de Cordes está muito ligado ao
humor negro. Sentiste-te influenciado a seguir
esse caminho?
Sem dúvida. Acho que todos ali sentíamos, de
certa forma. Porque ele fazia humor negro e
nós, a querer impressionar, desviamos para isso.
Ele dizia sempre que o humor negro era o que
ele fazia, não tinha que ser o que nós fazíamos.
Eu acho que quando se começa na comédia,
está-se à procura de criar uma reação nas pessoas.
Quere-se uma reação, mesmo que essa
reação, às vezes, não seja riso. Por isso é que
muitos comediantes, quando começam, fazem
humor negro, porque aquilo é uma reação. Mesmo
que as pessoas façam “uh”, na nossa cabeça
é quase equivalente ao riso porque é qualquer
coisa. Então havia muito disso. Obviamente, ao
longo dos anos, nós todos fomos descobrindo
as nossas vozes, ainda estamos a descobrir.
Inclusive, eu diria que o Sinel de Cordes também
está a descobrir a voz dele porque ele esteve
tanto tempo a fazer cenas negras, que hoje em
dia já está numa fase diferente da vida dele.
Acho que ele também está a redescobrir uma
nova voz. Mas sim, havia uma certa pressão que
nós colocávamos em nós próprios.
Disseste, numa entrevista, que fizeste o curso
do Rui Sinel de Cordes com 18 anos, mas que
ele só reparou em ti quando tinhas 21. Como
explicas isso?
Porque, na altura, eu sabia que tinha qualquer
coisa, mas ainda não tinha encontrado o que
era. Então enveredei muito pelo humor negro.
Comecei a usar camisas, sapatos, … Muita influência
do Sinel, mas que não era eu. Qualquer
pessoa que olhe para mim percebe que eu não
sou essa pessoa. Então, estava a fazer uma coisa
que não era propriamente eu e sentia que,
mesmo para evoluir, para chegar aos objetivos
que queria, tinha que sair do país. Porque em
Portugal não havia maneira de chegar ao nível
que queria chegar. Ou pelo menos de descobrir-me
a mim próprio como artista. Então fui
para Inglaterra. Depois ele [Rui Sinel de Cordes]
veio para Inglaterra e foi aí que nós começamos
a passar mais tempo juntos. Nessa altura, eu já
estava com alguns anos de Londres e já era um
comediante diferente. Se calhar quando comecei
a descobrir mais a minha voz, foi quando ele
começou a notar mais. E também porque estávamos
a passar mais tempo juntos. Em Londres,
passávamos muito tempo juntos, se calhar foi
mais por aí.
Tiveste o apoio da tua família próxima quando
decidiste ser humorista?
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