Florestan Fernandes
Florestan Fernandes, 20 anos depois
Florestan Fernandes, 20 anos depois
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<strong>Florestan</strong> <strong>Fernandes</strong> • 20 anos depois 35<br />
obstáculos ao desenvolvimento e à mudança, por outro lado. Ou você estuda<br />
uma coisa ou estuda outra. Em <strong>Florestan</strong> as duas coisas vêm juntas. Sugiro que<br />
uma das peculiaridades do modo de pensar em <strong>Florestan</strong> é esta, de juntar, de<br />
trabalhar simultaneamente num bloco aquilo que em outros aparece separado.<br />
Então para ele, desde logo, a questão é como localizar, como identificar o que é<br />
problemático. Ele não recua diante do termo comprometedor que é “ordem”.<br />
Quer saber o que é problemático na ordem social e o que deve ser pensado como<br />
a ordem social que se constitui neste país.<br />
Em primeiro lugar, ordem para <strong>Florestan</strong> significa algo em construção,<br />
significa algo que se propõe como desafio. Ordem não é simplesmente a configuração<br />
dada das coisas, mas é aquilo que responde à tendências possíveis,<br />
aquilo que pode vir a ser construído pelos próprios agentes sociais na sociedade.<br />
Mas isto é uma referência primeira, pois não há como se tentar identificar<br />
problemas se não se tiver uma ideia de qual é o tipo de ordem ou o tipo de<br />
constituição da sociedade em que eles possam emergir. A questão que ele se<br />
propõe, então, é a seguinte. Nós temos uma determinada configuração dessa<br />
sociedade, que precisamos conhecer, mas não para se contentar com isso.<br />
Mais do que isso, importa pesquisar, não só a figura presente da ordem social,<br />
do arranjo que está aí dado, mas as tendências internas que se vão gestando<br />
nesta ordem. Para onde ela pode se dirigir, para que tipo de sociedade ela<br />
tende? Esta é uma pergunta durkheimiana. Para o que tende a sociedade que<br />
aí está dada? Para onde ela tende a se dirigir?<br />
Mas a visão de <strong>Florestan</strong> é mais crispada do que em Durkheim. Aliás, tudo<br />
em <strong>Florestan</strong> é mais crispado do que nos outros. Porque ele simultaneamente<br />
se pergunta “para onde tende, historicamente e no presente, o tipo de sociedade<br />
que aqui se constitui?” e “o que é intrinsecamente problemático nessa tendência?”.<br />
O que ao mesmo tempo impulsiona para a constituição deste determinado<br />
tipo de sociedade e também a freia, porque as duas coisas estão juntas<br />
o tempo todo no pensamento de <strong>Florestan</strong>. Ele junta dimensões das grandes<br />
questões que em outros poderiam ser separadas. Se penso “ordem” posso ter<br />
uma referência substantiva, uma referência observável, no limite uma referência<br />
empírica, é o arranjo das partes num conjunto maior. Mas posso ter uma<br />
referência conceitual, analítica, e neste caso “ordem” tem a ver com fenômenos<br />
que ocorrem de uma maneira não casual, não aleatória. Em <strong>Florestan</strong> é difícil<br />
distinguir quando ele está pensando em um nível e quando ele está pensando<br />
no outro, porque ele joga de um para outro constantemente. E em parte isto