Florestan Fernandes
Florestan Fernandes, 20 anos depois
Florestan Fernandes, 20 anos depois
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<strong>Florestan</strong> <strong>Fernandes</strong> • 20 anos depois 37<br />
em andamento. Por isso a preocupação com os ex-escravos, por isso a preocupação<br />
com os negros e por isso a preocupação com a integração na sociedade de<br />
classes. A integração do negro na sociedade de classes é um título “enganador”,<br />
porque na realidade o que no fundo ele está analisando é a difícil integração, a<br />
difícil constituição da sociedade de classes. Nós sabemos que ele, na prática, vai<br />
demonstrar que o processo no qual estas duas coisas se juntariam não ocorre,<br />
não ocorria até o momento em que ele escrevia, e é de se suspeitar que ainda não<br />
tenha ocorrido de modo pleno até o momento presente.<br />
O que está em jogo, então, é localizar o fulcro mesmo da dinâmica do processo<br />
histórico pela localização do seu ponto mais sensível, digamos assim,<br />
daquilo que é mais difícil de ser superado, daquilo que está no cerne mesmo<br />
da dificuldade da constituição de uma figura vaga, no início, que seria o povo,<br />
para uma figura bem definida, em termos de realização da sociedade, que é a<br />
classe. O problema, nós sabemos, desta obra que estou tomando aqui como<br />
referência é, simultaneamente, da dificuldade da transição da raça para a<br />
classe e, agravado isso pela dificuldade da identidade de raça, porque um dos<br />
pontos apontados por <strong>Florestan</strong> em sua análise é de que temos um caminho<br />
em duas etapas para fazer frente a um processo histórico visto da perspectiva<br />
que estão no pior ponto de partida.<br />
O primeiro passo é que os negros organizem a sua identidade como “raça”.<br />
Feito isto eles terão condições de dar o segundo passo. O primeiro passo tem<br />
caráter mais defensivo, de constituição de uma identidade que se contraponha<br />
ao resto e que permita a constituição de um agente social e de um agende<br />
político. O segundo passo é decisivo, porque joga a coisa para a sociedade<br />
como um todo. A identidade de raça é, digamos, fechada, não é aberta, é fechada<br />
para se organizar. Já a classe é exatamente uma forma de organização<br />
aberta e competitiva, para utilizar a linguagem de <strong>Florestan</strong>. Então, para poder<br />
ser competitivo no interior da sociedade de classes que promete se organizar,<br />
mas que dificilmente realiza isto, é preciso primeiro refluir, para em<br />
seguida avançar.<br />
Isso de alguma maneira permite a <strong>Florestan</strong> colocar na sua análise alguns<br />
temas que são perenes na sua reflexão. Porque quando se trata de refletir<br />
sobre aquilo que, para ele, em várias dimensões, é a questão da mudança no<br />
interior da sociedade, aparece algo que tem muito a ver com o pensamento<br />
que se desenvolvia naquele período no Brasil, na América Latina e até por<br />
influência europeia. E nisto a referência é ao autor que teve enorme peso