IX. A viagem das palavras
IX. A viagem das palavras
IX. A viagem das palavras
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>IX</strong> A VIAGEM DAS PALAVRAS<br />
442<br />
5. Todos assim dizem<br />
Chapado nariz<br />
Cabeça pequena<br />
Tem cafarinho de Sena.<br />
Embora os cafres fossem, na Índia, utilizados principalmente como criados<br />
e carregadores de palanquim, em breve, o exército os utilizaria como mercenários.<br />
Com um território demasiado vasto, sujeitos a ataques constantes<br />
pelos principados locais e pelos outros poderes coloniais europeus, os militares<br />
começaram a usar escravos cafres para reforçar as guarnições. Esta tradição<br />
sobreviveu em Macau até ao início do século passado; muitos anos<br />
depois da escravatura ter sido abolida, a guarnição local incluía um regimento<br />
de negros de Moçambique.<br />
A mesma utilização lhes iria ser dada pelos poderes coloniais que substituem<br />
os Portugueses no Índico. Admirados pelos Holandeses, pela sua bravura e<br />
lealdade aos amos durante o cerco de Macau de 1622, os cafres deixados em<br />
Ceilão, aquando da retirada portuguesa, foram utilizados pelos seus novos<br />
senhores na construção do forte de Colombo. E a importação de escravos<br />
da zona de Moçambique 25 irá continuar com ingleses e holandeses. Os In -<br />
gle ses utilizaram-nos no exército, pelo menos desde 1807, altura em que um<br />
regimento Kaffir em Colombo tinha cerca de 700 Kaffirs (Cordiner, 1807).<br />
Este regimento transformou-se, mais tarde, no 3rd Ceylon Riffle Regiment<br />
(Brohier, 1973, 22), estacionado em Puttalam. Os seus descendentes tornaram-se<br />
conhecidos como os Kaffirs de Puttalam, uma comunidade que manteve,<br />
até hoje, «a distinct way of leisury life, blending old time national traits with<br />
new occupations and scenes» 26 . As suas músicas e danças, de clara in fluência<br />
africana, tornaram-se parte do folclore do Sri Lanka contemporâneo: Baila,<br />
Chikoti e Kaferinhoe 27 .<br />
Foram estes Kaffirs, falantes do «Português corrupto» ou de crioulos de<br />
base portuguesa, que participaram como actores na difusão lexical que<br />
estamos a analisar. Por um lado, contribuindo com <strong>palavras</strong> de origem<br />
africana (oriental) para a língua franca e para os crioulos, e influenciando,<br />
por outro, se gundo alguns estudiosos 28 – através da exportação pelos Ho -<br />
landeses de escravos da Indonésia para a cidade do Cabo –, a formação do<br />
Africânder.