16.04.2013 Views

A ESTRATÉGIA EPISTOLAR EM NOVAS CARTAS PORTUGUESAS

A ESTRATÉGIA EPISTOLAR EM NOVAS CARTAS PORTUGUESAS

A ESTRATÉGIA EPISTOLAR EM NOVAS CARTAS PORTUGUESAS

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura<br />

São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, V. 4, 3 e 4 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128<br />

6<br />

espremer de um furúnculo. Talvez mais nada do que o dizermos em alta voz<br />

- coragem? necessidade? – os mal-estares, os ataques, as recusas e os medos.<br />

Quem escreve omite e elabora, segundo as regras do tempo e do lugar,<br />

alinda o auto-retrato. Aqui e agora, por exemplo, podem aparecer certas<br />

liberdades de linguagem, mas outras não, os maneirismos aceites são uns<br />

quantos, e ser reaccionários é a desclassificação sem recurso; somos todos<br />

escritores puros e limpos, ai, e de tão bons sentimentos. Por isso não<br />

emendei, não omiti, etc. Que saia a nossa dialéctica de mulheres-nascidas-ecriadas-na-burguesia-citadina-desta-sociedade-cujos-valores-bem-sabemose-simpatizantes-com-todas-as-classes-e-grupos-explorados-com-agudosentimento-de-pertença-ao-grupo-explorado-”mulheres”,<br />

que esta nossa<br />

dialéctica retorcida se desenrole entre nós e os outros, e não só intra-eus ou<br />

intra-nós. (Barreno, [1972] 2010: 288-289)<br />

Quer dizer, as autoras, nesta “assembléia de três” que compõem, como que se<br />

propuseram desclausurar a própria escrita e desclausurarem-se também enquanto<br />

escritoras, mostrarem-se como mulheres, como cidadãs, pois o nome do autor não<br />

assinala o indivíduo mas o escritor: “Considerai a cláusula proposta, a desclausura, a<br />

exposição de meninas na roda, paridas a esconsas de matriz de três.” (Barreno, [1972]<br />

2010, p. 6) Esse procedimento que a arte tem para se pensar nos seus processos,<br />

meios e fins, chamado de metalinguagem aponta para o exercício da escrita e como<br />

que denuncia o autor, sua mitologia. Como assinala Philippe Lejeune, em Pacto<br />

autobiográfico: de Rousseau à internet:<br />

Um autor não é uma pessoa. É uma pessoa que escreve e publica. Inscrita, a<br />

um só tempo, no texto e no extratexto, ele é a linha de contato entre eles. O<br />

autor se define como sendo simultaneamente uma pessoa real socialmente<br />

responsável e o produtor de um discurso. Para o leitor, que não conhece a<br />

pessoa real, embora creia em sua existência, o autor se define como a pessoa<br />

capaz de produzir aquele discurso e vai imaginá-lo, então, a partir do que<br />

ele produz.” (Lejeune, 2008, p. 23)<br />

Novas cartas portuguesas, ao fazer irromper no discurso a voz das autoras,<br />

frequentemente na primeira pessoa do plural – “nós” -, resgata o autor e o leitor,<br />

instância que é, constantemente, chamada a tomar parte no jogo. Prevendo as<br />

consequências de não assinarem os textos, põem o pé na realidade, pois têm<br />

consciência de quebrarem o pacto de ficcionalidade que a assinatura do autor implica

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!