Fernando Pessoa - Antologia - Rotary Club Coimbra
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toda a literatura, na estranheza da obra dum poeta que,<br />
aparentemente, parece ter sido escrita por vários poetas.<br />
É o tão debatido problema da heteronomia, nome este<br />
dado pelo próprio <strong>Fernando</strong> <strong>Pessoa</strong> ao aparecimento<br />
duma poesia múltipla escrita por varios poetas, sendo<br />
afinal poesia e poetas criação literária dum só autor.<br />
Diversas interpretações têm sido dadas a este fenómeno<br />
pelos numerosos críticos da obra pessoana. E cada um<br />
tem uma opinião porque cada um acaba por ver não o<br />
verdadeiro <strong>Fernando</strong> <strong>Pessoa</strong>, mas sim o que acerca dele<br />
imaginou. Penso ser preferível, em vez de os citar, ouvir<br />
o que o próprio poeta nos diz acerca da heteronimia:<br />
Não sei quem sou, que alma tenho.<br />
Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade<br />
falo. Sou variamente outro do que um eu que não sei se<br />
existe (se é esses outros). ....<br />
Sinto-me múltiplo. Sou como urn quarto com inúmeros<br />
espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma<br />
única anterior realidade que não está em nenhuma e está<br />
em todas.<br />
Como o panteísta se sente árvore e até a flor, eu sinto-me<br />
vários seres. Sinto-me viver vidas alheias, em mim,<br />
incompletamente, como se o meu ser participasse de<br />
todos os homens, incompletamente de cada, por uma<br />
suma de não-eus sintetizados num eu postiço.<br />
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