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Diário do Legislativo de 16/10/1999 - A Assembleia

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As conquistas da ciência e da técnica são patrimônio <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os homens, e não privilégio absoluto <strong>do</strong> capital. Sen<strong>do</strong> assim, to<strong>do</strong> o tempo poupa<strong>do</strong> nos processos <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>ve<br />

ser distribuí<strong>do</strong> entre os trabalha<strong>do</strong>res, para que possam utilizá-lo no livre usufruto <strong>do</strong>s bens da vida.<br />

Há pouco mais <strong>de</strong> cem anos, na Inglaterra, os tecelões e mineiros, muitos <strong>de</strong>les ainda crianças, trabalhavam <strong>16</strong> horas por dia, 7 dias por semana. As conquistas sociais <strong>do</strong> século XX<br />

fizeram com que essa carga se reduzisse a menos da meta<strong>de</strong>, com a garantia <strong>do</strong> repouso semanal. O neoliberalismo, que usa a máscara suja da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, é o retrocesso <strong>de</strong> mais <strong>de</strong><br />

um século.<br />

Na Inglaterra legada por Mme. Tatcher, crianças voltam a trabalhar, o <strong>de</strong>semprego continua a crescer, e os bairros pobres são vigia<strong>do</strong>s pela polícia com a ajuda <strong>de</strong> circuitos <strong>de</strong><br />

televisão, tornan<strong>do</strong> realida<strong>de</strong> a sinistra previsão <strong>de</strong> George Orwell em "1984".<br />

Senhoras e senhores, o problema <strong>do</strong> <strong>de</strong>semprego, como <strong>de</strong> resto to<strong>do</strong>s os problemas ti<strong>do</strong>s como econômicos, só encontram solução nos atos políticos. A política é a construção das<br />

regras <strong>de</strong> convívio entre as pessoas. O gran<strong>de</strong> erro <strong>de</strong> nosso tempo é supor que as relações humanas, entre elas as que envolvem o capital e o trabalho, po<strong>de</strong>m ser resolvidas com<br />

esquemas técnicos. A técnica po<strong>de</strong> ajudar na organização administrativa e econômica que a vonta<strong>de</strong> política estabeleça, mas não po<strong>de</strong> substituir essa vonta<strong>de</strong>, que as instituições<br />

<strong>de</strong>mocráticas enten<strong>de</strong>m, pelo equivoca<strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> eficiência econômica.<br />

A iniciativa <strong>de</strong>ste seminário soma-se, em boa hora, à abertura <strong>de</strong> mais uma etapa <strong>do</strong> Fórum Políticas Macroeconômicas Alternativas para o Brasil, que acontecerá nesta quarta-feira,<br />

às 19h30min, aqui neste Plenário, com as palestras <strong>do</strong> Diretor <strong>do</strong> "Le Mon<strong>de</strong> Diplomatique", Bernard Cassen, e <strong>do</strong> Professor da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, Henrique <strong>de</strong>l Nero, para<br />

a qual convi<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os presentes.<br />

Ao saudá-los nesta noite, em nome da Assembléia Legislativa, manifesto-lhes a minha certeza <strong>de</strong> que a discussão que começa aqui, neste seminário, e prossegue no fórum, até o dia 5<br />

<strong>de</strong> outubro, contribuirá para os esforços nacionais no reencontro <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvolvimento econômico. E em conseqüência, ofereço a colaboração e o empenho <strong>de</strong>sta Casa em discutir e<br />

buscar mo<strong>de</strong>los alternativos que gerem trabalho e emprego para to<strong>do</strong>s os brasileiros. Muito obriga<strong>do</strong>.<br />

A Presidência passa a palavra ao Deputa<strong>do</strong> Ivo José, Presi<strong>de</strong>nte da Comissão <strong>do</strong> Trabalho, da Previdência e da Ação Social da Assembléia Legislativa <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> Minas Gerais e<br />

coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ste seminário, para, a partir <strong>de</strong> agora, conduzir os trabalhos <strong>de</strong>sta noite.<br />

Palavras <strong>do</strong> Deputa<strong>do</strong> Ivo José<br />

Deputa<strong>do</strong> An<strong>de</strong>rson Adauto, Presi<strong>de</strong>nte da Assembléia Legislativa <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> Minas Gerais; Deputa<strong>do</strong> Durval Ângelo, 2º-Vice-Presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>sta Casa; Prof. Márcio Pochmann,<br />

que nos honra com sua presença; senhores representantes <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s, senhoras e <strong>de</strong>mais participantes <strong>de</strong>ste encontro, o Deputa<strong>do</strong> Durval Ângelo fez consi<strong>de</strong>rações acerca <strong>de</strong> como<br />

surgiu a idéia <strong>de</strong> se realizar este seminário legislativo, e, como um <strong>do</strong>s autores <strong>do</strong> requerimento, vejo-me também no <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> tecer alguns comentários a respeito <strong>de</strong>ssa iniciativa,<br />

antes <strong>de</strong> passar a palavra ao palestrante da noite.<br />

Durante os <strong>de</strong>bates sobre a reformulação <strong>do</strong> Regimento Interno, no ano passa<strong>do</strong>, estávamos convictos ao propor a criação <strong>de</strong> mais uma comissão permanente: a Comissão <strong>do</strong><br />

Trabalho, da Previdência e da Ação Social. O nosso argumento era simples e incontestável. Atualmente e nas próximas décadas, a discussão em torno <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho tomaria<br />

conta das aca<strong>de</strong>mias, <strong>do</strong>s sindicatos, <strong>do</strong>s governos e <strong>de</strong> toda a socieda<strong>de</strong>.<br />

Não há <strong>de</strong>safio maior para a humanida<strong>de</strong> <strong>do</strong> que procurar alternativas <strong>de</strong> trabalho e <strong>de</strong> renda para bilhões <strong>de</strong> pessoas, pais e mães <strong>de</strong> famílias, jovens e i<strong>do</strong>sos, que per<strong>de</strong>ram as<br />

esperanças <strong>de</strong> se tornarem produtivos num mun<strong>do</strong> criva<strong>do</strong> pelas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais.<br />

E não há nada mais humilhante <strong>do</strong> que um pai <strong>de</strong> família não conseguir recursos suficientes para a sua sobrevivência, com um mínimo <strong>de</strong> dignida<strong>de</strong>. Humilhante e injusto, pois esses<br />

trabalha<strong>do</strong>res, em sua maioria, têm perfeitas condições para o trabalho, mas não lhes restam oportunida<strong>de</strong>s, e são con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s ao <strong>de</strong>sespero.<br />

A situação torna-se mais preocupante quan<strong>do</strong> analisamos as causas <strong>do</strong>s índices alarmantes <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego no Brasil e chegamos à conclusão <strong>de</strong> que elas têm pouco a ver com a<br />

inversão <strong>do</strong>s rumos econômicos no mun<strong>do</strong> e muito a ver com as políticas econômicas a<strong>do</strong>tadas pelos governos neoliberais, particularmente o <strong>de</strong> Fernan<strong>do</strong> Henrique Car<strong>do</strong>so.<br />

Após a a<strong>do</strong>ção <strong>do</strong> Plano Real, os índices <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego apresentam ligeira recuperação, mas se agravaram no <strong>de</strong>correr <strong>do</strong>s anos seguintes, principalmente quan<strong>do</strong> o Governo <strong>de</strong>sistiu<br />

<strong>de</strong> regular a parida<strong>de</strong> real-dólar através das reservas cambiais, optan<strong>do</strong> por uma nova fórmula <strong>de</strong> controle da inflação.<br />

Essa nova fórmula, que <strong>de</strong>ixa claros os verda<strong>de</strong>iros compromissos <strong>de</strong>sse Governo, resume-se em estimular medidas recessivas, aumentar as taxas <strong>de</strong> juros e impedir o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento econômico. Portanto, infelizmente, po<strong>de</strong>mos afirmar categoricamente que o Governo contém a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alta inflacionária utilizan<strong>do</strong> como âncora cambial a<br />

promoção <strong>do</strong> <strong>de</strong>semprego.<br />

O Governo não quer fomentar o <strong>de</strong>senvolvimento econômico. Não quer inverter as regras <strong>do</strong> jogo, impon<strong>do</strong> rígi<strong>do</strong> controle ao merca<strong>do</strong> financeiro interno e estabelecen<strong>do</strong> regras para<br />

o ingresso <strong>de</strong> capital estrangeiro. Ao contrário, quer <strong>de</strong>ixar o País ao livre sabor <strong>do</strong>s ventos, e isso, na prática, significa expor a economia nacional à especulação <strong>do</strong> capital<br />

internacional, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> o seu povo sofrer as conseqüências insanas daqueles que só se preocupam com o lucro.<br />

O Brasil não suporta mais a omissão <strong>de</strong>sse Governo. Não suporta mais a subordinação às regras <strong>do</strong> FMI, que, para garantir o pagamento da dívida externa, impõe sacrifícios<br />

extremos ao povo brasileiro.<br />

E, se é verda<strong>de</strong> que fatores estruturais em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> causam o mesmo problema <strong>do</strong> <strong>de</strong>semprego em diversos países, é também verda<strong>de</strong> que chegou a hora <strong>de</strong> os países mais<br />

pobres protestarem, em conjunto, contra o braço <strong>de</strong> ferro <strong>do</strong>s países <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>s, que instituem reservas legais, tarifárias e econômicas para as suas indústrias em seus territórios e<br />

exigem a liberação <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s no território <strong>do</strong>s outros.<br />

O Brasil não é um país pobre e não precisaria hoje amargar as cifras <strong>de</strong>sumanas <strong>do</strong> <strong>de</strong>semprego. Segun<strong>do</strong> informações prestadas à Comissão <strong>do</strong> Trabalho, no dia 14/9/99, o<br />

Presi<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Instituto <strong>de</strong> Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA - dizia, em alto e bom som, que, pela renda "per capita" <strong>do</strong> Brasil, US$6.480,00 em 1997, o número <strong>de</strong> pobres<br />

<strong>de</strong>veria ser três vezes menor.<br />

Segun<strong>do</strong> os levantamentos <strong>do</strong> IPEA, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> 1977 a 1997, portanto 20 anos, a renda <strong>do</strong>s <strong>10</strong>% mais ricos é 28 vezes maior <strong>do</strong> que a <strong>do</strong>s 40% mais pobres no Brasil,<br />

enquanto em outros países, como os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, a renda média <strong>do</strong>s <strong>10</strong>% mais ricos é <strong>10</strong> vezes maior <strong>do</strong> que a <strong>do</strong>s 40% mais pobres e, na Holanda, cinco vezes.<br />

E o mesmo Instituto constata que se o Brasil conseguisse a mesma distribuição <strong>de</strong> renda da Colômbia - que é injusta - o efeito <strong>de</strong> redução da pobreza equivaleria a <strong>10</strong> anos <strong>de</strong><br />

crescimento, a 5,8% ao ano.<br />

E, além disso, to<strong>do</strong>s os gastos públicos <strong>do</strong> Brasil com políticas sociais, cerca <strong>de</strong> R$130.000.000.000,00 ao ano, não alteraram em um milímetro os níveis <strong>de</strong> pobreza.<br />

Os alarmantes índices <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego nas regiões metropolitanas vêm comprovar a serieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> problema e o <strong>de</strong>scompromisso <strong>do</strong> Governo Fe<strong>de</strong>ral em resolvê-lo.<br />

Na Região Metropolitana <strong>de</strong> Belo Horizonte, 19% da população economicamente ativa - PEA - está <strong>de</strong>sempregada, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os índices da Fundação João Pinheiro, <strong>do</strong><br />

Departamento Intersindical <strong>de</strong> Estatísticas e Estu<strong>do</strong>s Socioeconômicos - DIEESE - e da Secretaria <strong>do</strong> Trabalho. Isso significa que 370 mil pessoas estão à procura <strong>de</strong> emprego, sem

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