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— Companheiros, é agora! — disse Ulisses, erguendo-se e tomando suas armas.<br />
Epeus, <strong>de</strong> posse das chaves que abriam o alçapão do ventre do animal, rumou para o local indicado.<br />
Num instante uma gran<strong>de</strong> porta se abriu, e diversas cordas foram lançadas para baixo, como uma<br />
chuva <strong>de</strong> cascavéis que se espichavam até alcançar o solo. Agarrados nelas, iam <strong>de</strong>scendo um a um os<br />
soldados, com os escudos presos aos ombros e as espadas <strong>de</strong>sembainhadas.<br />
Enquanto isto, lá fora, as tropas comandadas pelo audaz Agamenon já estavam a postos, em absoluto<br />
silêncio, aguardando apenas a hora do massacre começar. Pela primeira vez o punho da espada do<br />
chefe da expedição grega estava molhado, verda<strong>de</strong>iramente encharcado <strong>de</strong> suor, e <strong>de</strong> tempos em<br />
tempos ele tinha <strong>de</strong> secá-lo com as vestes. Dez anos <strong>de</strong> longa espera para serem jogados num única<br />
cartada!, pensava ele. Dentro em breve estaria, se Júpiter po<strong>de</strong>roso lhes fosse favorável, <strong>de</strong> volta à sua<br />
casa, para os braços <strong>de</strong> sua amada Clitemnestra. Este pensamento animava-o e fazia com que seus<br />
<strong>de</strong>dos se agarrassem com mais força e <strong>de</strong>nodo ao punho da espada.<br />
Agamenon estava entregue a estas divagações, quando percebeu um ruído — um assobio trinado. Era<br />
o sinal combinado.<br />
— Soldados, chegou a hora da vingança! — bradou ele.<br />
Um rumor espantoso <strong>de</strong> armas e <strong>de</strong> gritos ergueu-se. Todos os homens arremessaram-se às portas<br />
escancaradas — que os homens <strong>de</strong> Ulisses já haviam aberto <strong>de</strong> par em par -, enquanto outra coluna<br />
gigantesca ia em direção à brecha da muralha, como uma onda negra e invencível que absolutamente<br />
nada po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>ter.<br />
Os soldados gregos entraram na cida<strong>de</strong> sem a menor cerimônia. Pequenos grupos <strong>de</strong> cem homens<br />
enveredaram em todas as direções, portando tochas, lanças e achas <strong>de</strong> dois gumes, prontos para<br />
abaterem qualquer coisa que quisesse lhes fazer frente.<br />
Os primeiros soldados troianos, pobres sentinelas abatidas pelo vinho, acordaram, ainda tontos, apenas<br />
para receberem em seus ventres o bronze afiado das espadas e das lanças inimigas.<br />
Outros, mais felizes, nem tinham tempo <strong>de</strong> acordar, sendo abatidos ainda <strong>de</strong>itados com o peso das<br />
achas que <strong>de</strong>sabavam sobre seus corpos.<br />
As primeiras labaredas começaram a iluminar a noite, ofuscando a luz da lua. Pequenas casas e<br />
residências senhoris ardiam já incontrolavelmente. Homens <strong>de</strong>ixavam as casas, sem saber direito o que<br />
estava ocorrendo, para serem abatidos impiedosamente, diante das esposas e dos filhos. A or<strong>de</strong>m que<br />
havia sido dada pelo cruel Agamenon era <strong>de</strong> que se poupassem somente as crianças do sexo feminino.<br />
Os meninos <strong>de</strong>veriam também ser mortos, tal como os pais.<br />
Muito em breve toda a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong>spertara, finalmente, para a terrível verda<strong>de</strong>: <strong>Tróia</strong> estava perdida —<br />
irremediavelmente perdida!<br />
Os grupos <strong>de</strong> guerreiros invasores seguiam pelas ruas espalhando a morte e a <strong>de</strong>struição.<br />
As mulheres, únicas inocentes poupadas, ainda assim eram obrigadas a passar pelo flagelo da mais<br />
cruel violação. Muitas, vendo os esposos e filhos mortos, e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> terem passado pela abjeta<br />
humilhação, não tinham outro pedido a fazer senão que as matassem também. Algumas lançavam-se<br />
<strong>de</strong> peito <strong>de</strong>snudo às pontas das espadas, lançando terríveis gritos <strong>de</strong> dor que varavam o céu.<br />
A <strong>de</strong>fesa troiana, pega <strong>de</strong> surpresa, não po<strong>de</strong> obrar muita coisa e se limitou a algumas poucas<br />
escaramuças, nas quais pereceram apenas alguns dos invasores. Dentre os <strong>de</strong>fensores, havia um que<br />
não media esforços para levar adiante a vingança: era Enéias, filho <strong>de</strong> Anquises, um dos mais<br />
valorosos heróis das hostes <strong>de</strong> Príamo.<br />
— Adiante, troianos, vendamos nossas vidas a um preço caro! — gritava ele, brandindo a sua acha <strong>de</strong><br />
dois gumes sobre a cabeça dos invasores.<br />
Enéias e os seus já haviam feito muitos mortos entre os gregos, quando se escutou um tremendo ruído<br />
partir do palácio <strong>de</strong> Príamo.<br />
— Os assassinos vão em busca <strong>de</strong> nosso rei! — disse ele, arremessando-se com seus homens na<br />
direção do castelo.<br />
Quando lá chegaram, assistiram a uma das cenas mais impressionantes que olhos humanos um dia já<br />
contemplaram. Postado à entrada do palácio, um grupo cerrado <strong>de</strong> <strong>de</strong>fensores tentava barrar a entrada