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O Bobo - Unama

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O <strong>Bobo</strong><br />

de Alexandre Herculano<br />

CAPÍTULO I<br />

INTRODUÇÃO<br />

www.nead.unama.br<br />

A morte de Afonso VI, Rei de Leão e Castela, quase no fim da primeira década<br />

do século XII, que deu origem a acontecimentos ainda mais graves do que os por ele<br />

previstos no momento em que ia trocar o brial de cavaleiro e o cetro de rei, pela<br />

mortalha com que o desceram ao sepulcro no Mosteiro de Sahagun. A índole inquieta<br />

dos barões leoneses, galegos e castelhanos facilmente achou pretextos para dar<br />

largas às suas ambições e mútuas malquerenças na violenta situação política em que<br />

o falecido Rei deixara o país. Costumado a considerar a audácia, o valor militar e a<br />

paixão da guerra como o principal dote de um príncipe, e privado do único filho varão<br />

que tivera, o Infante D. Sancho, morto em tenros anos na batalha de Ucles, Afonso VI<br />

alongara os olhos pelas províncias do império, buscando um homem temido nos<br />

combates e assaz enérgico para que a fronte lhe não vergasse sob o peso da férrea<br />

coroa da Espanha cristã. Era mister escolher marido para D. Urraca, sua filha mais<br />

velha, viúva de Raimundo Conde de Galiza; porque a ela pertencia o trono por um<br />

costume gradualmente introduzido, a despeito das leis góticas, que atribuíam aos<br />

grandes e até certo ponto ao alto clero a eleição dos reis. Entre os ricos homens mais<br />

ilustres dos seus vastos estados, nenhum o velho Rei achou digno de tão elevado<br />

consórcio. Afonso I de Aragão tinha, porém, todos os predicados que o altivo monarca<br />

reputava necessários no que devia ser o principal defensor da Cruz. Por isso, sentindo<br />

avizinhar-se a morte, ordenou que D. Urraca apenas herdasse a coroa desse a este a<br />

mão de esposa. Esperava por um lado que a energia e severidade do novo Príncipe<br />

contivessem as perturbações intestinas, e por outro que, ilustre já nas armas, não<br />

deixaria folgar os ismaelitas com a notícia da morte daquele que por tantos anos lhes<br />

fora flagelo e destruição. Os acontecimentos posteriores provaram, todavia, mais uma<br />

vez, quanto podem falhar as previsões humanas.<br />

A história do governo de D. Urraca, se tal nome se pode aplicar ao período do<br />

seu predomínio, nada mais foi do que um tecido de traições, de vinganças, de<br />

revoluções e lutas civis, de roubos e violências. A dissolução da Rainha, a sombria<br />

ferocidade do marido, a cobiça e orgulho dos próceres do reino convertiam tudo num<br />

caos, e a guerra civil, deixando respirar os muçulmanos, rompia a cadeia de triunfos<br />

da sociedade cristã, à qual tanto trabalhara por dar unidade o hábil Afonso VI.<br />

As províncias já então libertadas do jugo ismaelita não tinham ainda, digamos<br />

assim, senão os rudimentos de uma nacionalidade. Faltavam-lhes, ou eram débeis<br />

grande parte dos vínculos morais e jurídicos que constituem uma nação, uma<br />

sociedade. A associação do rei aragonês no trono de Leão não repugnava aos<br />

barões leoneses por ele ser um estranho, mas porque a antigos súbditos do novo rei<br />

se entregavam de preferência as tenências e alcaidarias da monarquia. As<br />

resistências, porém, eram individuais, desconexas, e por isso sem resultados<br />

definitivos, efeito natural de instituições públicas viciosas ou incompletas. O conde<br />

ou rico-homem de Oviedo ou de Leão, da Estremadura ou de Galiza, de Castela ou<br />

de Portugal, referia sempre a si, às suas ambições, esperanças ou temores os<br />

resultados prováveis de qualquer sucesso político, e aferindo tudo por esse padrão,<br />

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