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O Bobo - Unama

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— “Garcia, tu és infeliz pelo amor!”<br />

O cavaleiro corou levemente e, com a voz afogada, respondeu:<br />

— “É verdade!”<br />

www.nead.unama.br<br />

O Conde sabia que ele amava Dulce: toda a corte o sabia. Fernando Peres<br />

folgava com a idéia de prender por laços mais fortes que os da amizade aquele<br />

esforçado homem de guerra à fortuna de D. Teresa e à sua. Dulce seria disso um<br />

penhor, e a afeição particular que ela mostrava ao cavaleiro persuadira o Conde e a<br />

Infante de que os seus intentos e desejos seriam brevemente cumpridos. A tristeza<br />

de Garcia, a que não achava outra razão possível depois de um sarau a que tinham<br />

assistido tantos cavaleiros mancebos e gentis-homens, lhe fez crer que entre os<br />

dous amantes se levantara alguma destas procelas, com que o suão mirrador do<br />

ciúme costuma entenebrecer às vezes o céu risonho desta quadra da vida tão bela e<br />

tão passageira. A resposta de Garcia o confirmou nesta idéia.<br />

— “Dulce traiu-te, pois?” — prosseguiu o Conde sem tirar dele os olhos.<br />

— “Não: — replicou o cavaleiro — porque nunca fui amado por ela!”<br />

Estas palavras eram uma fria e morta expressão, como para representar<br />

paixões violentas o é sempre a linguagem dos homens: e todavia no acento com<br />

que haviam sido proferidas revelava-se bem o martírio atroz do orgulho ofendido e<br />

do amor desprezado, que ralava o coração de Garcia.<br />

— “Nunca!?” — interrompeu Fernando Peres. — Cria eu o contrário: tinha<br />

talvez razão para o crer. Se, porém, não é Dulce a dama dos teus afetos, ousarei eu<br />

perguntar a Garcia Bermudes o nome da sua amada e a causa do seu padecer?”<br />

No tom destas palavras havia o que quer que era de ironia e motejo.<br />

— “Conde de Trava, — replicou o cavaleiro — só disse que jamais fui amado<br />

por Dulce: não que eu não a amava. Nunca o encobri a ninguém, e vós sabeis que<br />

muitos segredos meus, que todos ignoram, nunca de vós os escondi.”<br />

O modo sentido e de amarga repreensão com que Garcia respondera fizeram<br />

conhecer a Fernando Peres que a ferida aberta naquele coração era dolorosa e<br />

profunda. Então, estendendo de novo para ele o braço, disse-lhe sorrindo:<br />

— “Vamos: falemos serio e perdoa o meu gracejar. Se amas Dulce, ela será<br />

tua. Cólera de amantes passam como a nuvem varrida do norte: — e que não fosse<br />

assim, seria eu o tufão que a afugentasse.<br />

— Sabes que Dulce é a filha adotiva da Rainha. Será tua esposa a um aceno<br />

do Conde de Trava; e não é o Conde de Trava o teu mais verdadeiro amigo?Oh,<br />

abre-me o teu coração!”<br />

E apertava entre as suas a mão do cavaleiro.<br />

Garcia Bermudes alevantou para ele os olhos úmidos e tristes. Por algum<br />

tempo ficou em silêncio, e por fim exclamou:<br />

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