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O Bobo - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— “Por minha alma que respondeste avisado!” — replicou o Conde. — Não<br />

quisera eu anos da tua vida para ajuntar aos meus, que doravante me vêm aborridos<br />

e trabalhados. Brevemente eu te armarei cavaleiro; talvez em poucos dias ao som<br />

do tinir de golpes em fera arrancada. Basta que a paga de minha mercê seja<br />

cumprires o feito de que vou encarregar-te.”<br />

— “E fá-lo-ei de bom grado — tornou Tructesindo. — Mandai, meu tio, que eu<br />

vos obedecerei.”<br />

— “Um peão, vindo de longes terras, buscava há um momento Gonçalo<br />

Mendes da Maia e o Abade de D. Muma. O cavaleiro e o monge devem ora estar<br />

com esse mensageiro lá em baixo. Acerca-te deles por meio do tropel que flutua<br />

apinhado por toda a parte, e procura saber quem é, o que quer, donde veio.<br />

— Escuta também, se puderes, suas palavras.”<br />

— “E depois?” — perguntou o gentil pajem.<br />

— “Vem prestes dizer-me o que lá se há passado.”<br />

Ligeiro como um gamo, Tructesindo desapareceu. O Conde, chegando daí a<br />

pouco a um dos balcões da imensa sala d’armas, viu ainda o Lidador e o Abade que<br />

encaminhando-se para uma viela, que corria entre os paços e o laço ocidental da<br />

muralha, pareciam atentos às palavras de um homem, cujo rosto ele não pôde bem<br />

divisar, porque o levava meio escondido no capuz de um amplo zorame de lã parda<br />

e grosseira, que quase até os pés o cobria. Perto porém dos três viu Tructesindo,<br />

que fingia retouçar com os outros pajens, ora travando-se a braços com eles, ora<br />

fugindo com grandes apupos e risadas, mas girando sempre, como a borboleta ao<br />

redor da fogueira, em volta de Gonçalo Mendes, do desconhecido e do Abade.<br />

Satisfeito da habilidade com que o seu pajem parecia desempenhar a<br />

comissão que lhe dera, Fernando Peres voltou-se para dentro sorrindo de<br />

contentamento. Achou-se então face a face com Garcia Bermudes, tão triste no<br />

aspecto como nessa manhã o encontrara. Além disso, porém, no carrancudo do<br />

gesto dava mostras de que idéias mui graves o preocupavam. No seu ar o Conde<br />

percebeu que ocorrera algum acontecimento extraordinário.<br />

— “Preciso de falar-vos à puridade” — disse Garcia Bermudes procurando<br />

não ser ouvido dos cortesãos que perpassavam.”<br />

— “Vinde comigo” — respondeu o Conde de Trava no mesmo tom e travandolhe<br />

do braço.<br />

À esquerda da sala d’armas uma pequena porta dava passagem para extenso<br />

e escuro corredor, em cujo topo havia outra porta fechada: o Conde tirou uma chave,<br />

abriu-a e, cerrando-a após si, os dous cavaleiros se acharam em uma espécie de<br />

jardinzinho pênsil, assentado sobre uma alta arcaria, que ligava uma das torres do<br />

castelo com os paços da bela Infanta. As câmaras desta, e os aposentos habitados<br />

pelas suas damas e donzelas, cercavam por dous lados este pequeno terrado coberto<br />

de flores e arbustos viçosos. Um desses engenhos árabes, que ainda hoje cobrem o<br />

solo da Península e fertilizam as nossas veigas e pomares, ministrava<br />

constantemente àquele ameno horto, de um poço profundíssimo talhado no rochedo<br />

em que repousavam os fundamentos do castelo, água cristalina, que ao cair num<br />

tanque de mármore sussurrava brandamente. Junto dele um salgueiro copado<br />

formava uma espécie de caramanchão sobre um banco de pedra. Foi para aquele<br />

sítio que o Conde conduziu Garcia Bermudes, dizendo-lhe: “Aqui podes seguro falar”.<br />

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