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O Bobo - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— “A paz — insistiu o Lidador com firmeza — como eu a pedi mil vezes na<br />

cúria de vossa mãe. Que o Conde vos ceda a herança de meu Senhor D. Henrique;<br />

que D. Teresa ceda a seu nobre filho o senhorio desta terra de cavaleiros!... Que um<br />

mensageiro vá em nome do Infante e dos filhos-d’algo de Portugal propor estas<br />

condições, antes de as oferecermos nas pontas das lanças. Ainda uma vez o<br />

requeiro, em que pese aos que ousarem acusar-me de desleal, porque guardo o<br />

esforço para o momento das obras, e desprezo o que se revela em feros e ameaças<br />

antes de combater.”<br />

O rico-homem olhou em roda com ar altivo. Alguns dos barões do conselho<br />

cravaram a vista no chão.<br />

— “Mas lembrai-vos — atalhou Afonso Henriques — de que a memória de<br />

muitos anos de opróbrio só pode derriscá-la o sangue correndo abundante em<br />

campo de lide.”<br />

— “E vós, Senhor, não vos esqueçais de que também nessa primeira batalha<br />

o sangue que há de correr será dos vassalos e dos peões, cujo Príncipe sois: o<br />

sangue de cristãos e não de agarenos e ismaelitas.”<br />

O Infante ficou por algum tempo mudo: depois fitou os olhos no seu velho aio,<br />

que lhe fez um leve sinal de assenso.<br />

— “Seja, pois, como pretendeis, — disse ele por fim — ainda que tenho por<br />

certo será uma bem inútil mensagem. Ao menos meu primo el-Rei de Leão, que tão<br />

contrário se nos mostra, saberá que procurei evitar a guerra.”<br />

— “E quem há de ser o mensageiro?” — perguntou o Arcebispo de Braga D.<br />

Paio, que no gesto carrancudo dava sinais de estar mais longe do espírito do<br />

Evangelho que o duro e impetuoso Gonçalo Mendes.<br />

A narração que fizera o Lidador convertera em certeza as desconfianças que<br />

o trovador concebera de alguém o haver conhecido na corte, apesar do seu disfarce.<br />

O coração palpitava-lhe ao lembrar-se da promessa que fizera a Dulce, e de que,<br />

ainda quando lhe restasse esperança de poder voltar a Guimarães sem cair nas<br />

mãos do feroz Conde de Trava, nenhuma podia ter de salvar a sua amante: a<br />

proposição do Lidador lhe reanimou, porém, as quase mortas esperanças.<br />

Adiantando-se, pois, disse:<br />

— “Se ao ilustre Infante aprouver, serei eu que vá a Guimarães com essa<br />

mensagem. Pouparei ao Conde de Trava o trabalho de por mais tempo me procurar<br />

debalde.”<br />

— “Bem dito, meu colaço! — bradou o Infante. — É d’esforçado cavaleiro ir<br />

afrontar o inimigo entre os homens d’armas; mas não consinto que vos arrisqueis de<br />

novo à cólera dos estrangeiros. Outrem irá agora em vosso lugar.<br />

O trovador aproximou-se então de Afonso Henriques e, voltando-se para os<br />

prelados e barões:<br />

— “Depois de três anos de ausência — disse com visível agitação — voltei a<br />

Portugal para servir na paz ou defender na guerra o filho de meu Senhor. Como o<br />

ceifeiro que abandonasse a seara quando as espigas se lhe ofereciam mais bastas<br />

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