entre o bordado eo papel: a poesia portuguesa de autoria ... - TEL
entre o bordado eo papel: a poesia portuguesa de autoria ... - TEL
entre o bordado eo papel: a poesia portuguesa de autoria ... - TEL
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Anais do XIV Seminário Nacional Mulher e Literatura / V Seminário Internacional Mulher e Literatura<br />
raro gosto <strong>de</strong> matar”: “E do meu corpo os leves arabescos / Vão-te envolvendo<br />
em círculos dantescos / Felinamente em voluptuosas danças...”.<br />
Contemporânea <strong>de</strong> Florbela e, muito provavemente sua conhecida, 12<br />
Judith Teixeira, cujas obras foram escritas <strong>entre</strong> os anos <strong>de</strong> 1923 e 1927,<br />
também não teve um début literário muito feliz: seu primeiro livro <strong>de</strong> poemas,<br />
Decadência, foi apreendido pelo governo civil e indicado à cremação,<br />
juntamente com Sodoma Divinizada – <strong>de</strong> Raul Leal – e Canções – <strong>de</strong> Antonio<br />
Botto – sob a alegação <strong>de</strong> que estes eram “livros <strong>de</strong> uma literatura consi<strong>de</strong>rada<br />
imoral, – afrontosa das virtu<strong>de</strong>s públicas”. 13 Toda essa enervação<br />
social ren<strong>de</strong>u a ela o epíteto <strong>de</strong> “<strong>de</strong>savergonhada” e ao seu livro <strong>de</strong> “imoral”,<br />
isso sem mencionar a ridicularização feita através da publicação <strong>de</strong> uma<br />
caricatura <strong>de</strong> mulher nua e muito gorda vestida apenas <strong>de</strong> chapéu, acompanhada<br />
<strong>de</strong> uma paródia 14 nada cortês <strong>de</strong> seu poema “A Bailarina vermelha”,<br />
(p.134) do qual cito um trecho: Ela passa, / a papoula rubra, / esvoaçando<br />
graça, / A sorrir... / Original tentação / <strong>de</strong> estranho sabor: / a sua<br />
boca – romã reluzente, / a refulgir!... [...].<br />
Ainda em junho <strong>de</strong> 1923, Judith Teixeira publica Castelo <strong>de</strong> Sombras,<br />
um livro <strong>de</strong> 22 poemas que ela faz questão <strong>de</strong> dizer que foi “intencionalmente<br />
cauteloso” <strong>de</strong>vido aos episódios pouco calorosos <strong>de</strong> que fora vítima em<br />
virtu<strong>de</strong> do primeiro. De fato, agora ela ameniza bastante o erotismo “tão ousado”<br />
da obra prece<strong>de</strong>nte, optando por manter uma atmosfera mais <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte<br />
e conforme o contexto literário instigava, como bem sugere Nostalgia<br />
(p. 103): “- Mas a luz da minha alma não voltou... / Perdi-a, e nunca mais eu<br />
soube <strong>de</strong>la / <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o dia em que a tua m’a levou!”<br />
12 Florbela publica o soneto “Charneca em Flor” – que abre o livro homônimo – na revista<br />
Europa, na edição <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1925, época em que Judith Teixeira dirigia a revista.<br />
13 MONSANTO. Antonio. Livros Proibidos. A propósito duma or<strong>de</strong>m do Sr. Governador Civil.<br />
A Capital. 22/03/1923. p. 1. Todas as citações dos poemas <strong>de</strong> Judith Teixeira foram retiradas<br />
da edição aqui referida, por isso cito apenas a página on<strong>de</strong> se encontram: TEIXEIRA, Judith.<br />
Poemas. Lisboa: & Etc, 1996.<br />
14 A caricatura e a paródia encontram-se na seguinte obra FRANÇA, José Augusto. Os Anos<br />
Vinte em Portugal. Estudo <strong>de</strong> Factos Sócio-Culturais (extra-textos). Lisboa: Editorial Presença,<br />
1992. Segue-se a paródia: Ela pena / Entornando suor, / A <strong>de</strong>sfazer-se em banha. / Um sonho<br />
<strong>de</strong> volúpia / Logo ali se <strong>de</strong>sfaz / Em franca gargalhada / Ao vê-la <strong>de</strong>sgrenhada. / E ela passa /<br />
Fulva, anafada, in<strong>de</strong>cente, / Flor do vício / Espapaçando graxa / Na água gordurosa / Que ela<br />
sua, / Como chouriça ar<strong>de</strong>nte, / Infernal e langorosa / ... Toda nua... / Toda nua!...