as três formas de negação à castração - Psicanálise & Barroco
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Francisco Ramos <strong>de</strong> Fari<strong>as</strong><br />
algo próprio da natureza. Essa diferenciação somente po<strong>de</strong> ser formulada pelo recurso <strong>à</strong><br />
noção <strong>de</strong> estrutura como uma virtualida<strong>de</strong> própria da engrenagem mítica do sujeito e<br />
também como <strong>as</strong>pecto fundamental na constituição dos arranjos subjetivos.<br />
Eis o que <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>mos na conferência XXXI, A dissecação da<br />
personalida<strong>de</strong> psíquica, on<strong>de</strong> há uma comparação entre o processo psíquico mórbido e a<br />
estrutura <strong>de</strong> um cristal que ao romper-se o faz seguindo linh<strong>as</strong> <strong>de</strong> fratura que são invisíveis,<br />
m<strong>as</strong> que preexistem e que são própri<strong>as</strong> da constituição da referida estrutura. A possibilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> quebra da estrutura é somente algo da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> uma inferência. Sendo <strong>as</strong>sim, o que há<br />
<strong>de</strong> mais original no sujeito é o fato <strong>de</strong> sua constituição fazer alusão a um momento pré-<br />
histórico no qual po<strong>de</strong>mos pensar na articulação do Real com o Simbólico. Este momento<br />
em que esses registros se cruzam é aquele no qual se estabelece um tipo <strong>de</strong> esperança,<br />
antecipadora daquilo que está ainda por vir. Eis o sentido dado por Lacan (1998a) ao<br />
argumentar que a cria humana realiza um percurso que vai da “insuficiência <strong>à</strong> antecipação”.<br />
Ainda como um <strong>de</strong>vir o sujeito é antecipado como perfeição. Trata-se <strong>de</strong> um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong>sfeito<br />
pela ação do trauma: primeiro momento <strong>de</strong> ruptura. O trauma é então o momento em que se<br />
evidência o fim da ilusão <strong>de</strong> completu<strong>de</strong>, uma vez que coloca o sujeito no universo da falta,<br />
o que se consolida pelo recalque originário. Estamos admitindo que o ser humano é<br />
antecipado e recebe um corpo habitado por uma imagem, m<strong>as</strong> também esse corpo será o<br />
lugar on<strong>de</strong> circula a palavra e, por isso, representa a morada <strong>de</strong> um sujeito.<br />
O corpo, entendido como estrutura material, é a certeza da finitu<strong>de</strong> daquilo<br />
cujo <strong>de</strong>stino é o estado <strong>de</strong> <strong>de</strong>sintegração: finalida<strong>de</strong> do corpo cadáver. Já a substância<br />
pensante, a alma, <strong>de</strong> natureza imaterial, tem como característica o estado <strong>de</strong> dispersão<br />
originária: a ativida<strong>de</strong> anímica <strong>de</strong>salojada do corpo somente po<strong>de</strong> ser concebida como pura<br />
dispersão. Com isso, queremos <strong>as</strong>sinalar que o corpo, em sua materialida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sintegra-se<br />
pela morte, m<strong>as</strong> o que há <strong>de</strong> imaterial nele <strong>as</strong>sentado como o pensamento, o <strong>de</strong>sejo e o<br />
entendimento, atravessa os ritmos do tempo. Enquanto ponto <strong>de</strong> ancoragem, o corpo é o<br />
único suporte para o vazio estrutural, expondo-se, <strong>de</strong>sse modo, <strong>à</strong>s ações do trauma com a<br />
implantação irremediável da falta.<br />
Temos nisso uma operação da qual resulta um certo aniquilamento do sujeito<br />
em termos da quebra do i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> perfeição, especialmente quando o corpo do infans entra<br />
<strong>Psicanálise</strong> & <strong>Barroco</strong> em revista v.8, n.2: 74-94, <strong>de</strong>z.2010<br />
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