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A<br />
fila se estirava longe como<br />
uma gigantesca cobra<br />
e havia uma grande<br />
ansiedade nos rostos afogueados<br />
dos que dela faziam parte.<br />
Em cada mão uma bolsa de palha,sacolas,sacos<br />
de estopa,caixas,<br />
qualquer recipiente onde<br />
coubesse o máximo do que todos<br />
gostariam de receber. No<br />
ar o barulho decorrente dos<br />
murmúrios, das angústias expressas,<br />
dos medos definidos,<br />
dos diálogos inesperados, das<br />
palavras escapadas, dos sorrisos<br />
desbotados. O sol inclemente<br />
dardejava sobre todos e<br />
queimava-lhes as faces sofridas,<br />
os olhos mortiços,os lábios ressecados,os<br />
cabelos desgrenhados,<br />
e até mesmo o riso se tornava<br />
esgar no franzir dos músculos<br />
das testas cobertas de<br />
suor. Lá na frente, a quase perder<br />
de vista, a carreta onde algumas<br />
pessoas faziam a entrega<br />
das cestas básicas. O temor<br />
dos que estavam ainda tão longe<br />
dela era acabar tudo antes<br />
de lá chegarem. Será que daria<br />
para atender a tanta gente se<br />
aglomerando naquela linha fina<br />
e longa em que se transfor-<br />
gilbamarbezerra@ig.com.br<br />
GILBAMAR DE OLIVEIRA<br />
A FILA <strong>DA</strong> FOME<br />
mara a fila dos interessados?<br />
Lentamente a fila andava,como<br />
a rastejar de lesma. Eu segurava<br />
duas bolsas de palha,Carlos,<br />
meu irmão, um pouco à minha<br />
frente, levava igualmente duas.<br />
Tínhamos chegado bem cedinho<br />
ao local, desde as quatro horas<br />
da manhã,como no dia anterior,<br />
quando literalmente "morre-<br />
VARIE<strong>DA</strong>DES<br />
DICAS GRAMATICAIS<br />
BENJAMIMLINHARES2@HOTMAIL.COM<br />
A Rota da Seda<br />
No século XIX, um arqueólogo alemão chamado Ferdinand Von<br />
Richthofen estabeleceu o nome de uma das mais famosas rotas comerciais<br />
e religiosas de todos os tempos, a chamada Rota da Seda. Antes que tal<br />
nome fosse escolhido, esse trajeto, com mais de sete mil quilômetros, já<br />
era há mais de dez mil anos utilizado por aventureiros, peregrinos comerciantes,<br />
clérigos, monarcas e soldados que cortavam esse extenso conjunto<br />
de estrada a pé ou no lombo de animais,partindo da porção síria do mar<br />
Mediterrâneo,até os territórios chineses de Xiang.A mais antiga importância<br />
desse caminho se encontra no processo de espalhamento, ainda na Pré-<br />
História, das comunidades humanas do continente africano para diversas<br />
regiões da Ásia e da Oceania em busca de melhores condições de vida.<br />
continuação de A Rota da Seda...<br />
Na verdade, as caravanas não percorriam toda a extensão da Rota da<br />
Seda. Com o passar do tempo, percebemos que certas cidades ficaram<br />
responsáveis por agregar comerciantes que se concentravam em apenas<br />
um trecho do percurso.Deste modo,vemos que o comércio se transformou<br />
em uma atividade que organizou o cenário social, econômico<br />
e político de diferentes pontos desse grande território. Entre os séculos<br />
III e IV, a invasão dos hunos marcou o período menos seguro para<br />
que as comitivas de comerciantes se movimentassem. No século VIII,<br />
a parte oeste da rota começou a ser dominada pelos árabes que realizaram<br />
a conquistas das terras da Pérsia. Séculos mais tarde, exatamente no<br />
século XII, os cavaleiros e soldados de Gengis Khan tomaram a Ásia<br />
Central, o Norte da China e os territórios tibetanos.<br />
CURIOSI<strong>DA</strong>DES<br />
CURIOSI<strong>DA</strong>DES II<br />
Séculos mais tarde, seria essa mesma via de acesso que determinaria<br />
a penetração dos povos indo-europeus no Oriente Médio.<br />
Tal ocupação daria origem aos povos semitas que, por sua<br />
vez, estabeleceriam a gênese dos árabes e judeus. Por volta do<br />
século VI a.C.,a unificação territorial empreendida pelo Império<br />
Persa foi o primeiro passo para que atividades comerciais diversas<br />
fossem organizadas pelos povos englobados por essas<br />
civilizações. Os comerciantes que saíam do Oeste levavam<br />
marfim africano,ouro,peles de animais,vinho e animais de montaria.<br />
Em contrapartida, os distantes territórios chineses ofereciam<br />
ervas aromáticas, perfumes e os tão falados tecidos de<br />
seda que nomeavam o caminho.<br />
Ao contrário do que possa parecer, o domínio militar mongol<br />
foi de grande ajuda para que a economia comercial da Rota da<br />
Seda se mantivesse viva ao longo das décadas. Com o simples<br />
pagamento de taxas, os mercadores tinham direito de tráfego<br />
e comércio. Ainda no período medieval, percebemos que o Renascimento<br />
Comercial fomentou a cisão daquela visão de mundo<br />
limitada dos tempos feudais. Nessa época, as famosas viagens<br />
de Marco Polo davam conta de paisagens, costumes e<br />
cidades que ampliavam as perspectivas da época. Ao longo do<br />
tempo, o fechamento dessa via de comércio incentivou bastante<br />
a realização das Grandes Navegações. De tal modo, o homem<br />
europeu começou a constituir novas rotas de comércio pelos<br />
mares e continentes.<br />
mos" na praia sem receber os<br />
alimentos pretendidos. Naquela<br />
fila da seca braba torrando o<br />
Nordeste,há dias vínhamos tentando<br />
conseguir voltar para casa<br />
conduzindo ao menos alguns víveres<br />
necessários e básicos no intuito<br />
de preparar uma refeição<br />
decente.Não logramos,tudo em<br />
vão até aquele momento. Car-<br />
Domingo, 26 de fevereiro de 2012 - 7<br />
RAPIDINHAS<br />
* Eu já falei bastante disso, mas torno a repetir. É<br />
comum ver palavras oxítonas terminadas em i com a<br />
letrinha acentuada. Num cartaz, o feirante escreveu:<br />
Vendo caquí. Este acento, porém, é totalmente dispensável.<br />
Nem guri, nem aqui, nem ali, nem Cambuci,nem<br />
tupi,nem guarani,nem saci,nem abacaxi,nem<br />
xixi precisam dele. Bem diferente é o caso das oxítonas<br />
que terminam com i integrando um ditongo, como:<br />
açaí, daí ou Jacareí.<br />
* Por vezes uma letrinha pode ser decisiva na hora de<br />
grafar uma palavra. E um descuido pode causar problemas<br />
sérios. Por exemplo: na maternidade, quem é lactante<br />
e quem é lactente? Lactante é a mãe ou uma mulher que<br />
amamenta a criança de peito. Já o lactente é o bebê que está<br />
em idade de mamar.<br />
* Às vezes falamos o contrário do que pensamos.<br />
É comum ouvir pessoas usarem a expressão de encontro<br />
ao no lugar da ao encontro de. Quando afirmo<br />
que sua ideia vem de encontro à minha, quero<br />
dizer que nossas ideias se opõem.Quando afirmo que<br />
sua ideia vem ao encontro da minha, quero dizer que<br />
nossas ideias coincidem. Nada de confusões. Ir ao<br />
encontro de é unir-se.Ir de encontro a é entrar em conflito.<br />
* Hoje, há quem diga que precisamos falar politicamente<br />
correto, evitando expressões racistas como: ele judiou<br />
de mim,a coisa tá preta ou você está denegrindo minha imagem.<br />
Até os brancos começam a se revoltar quando ouvem<br />
o vestibulando reclamar: Xi... me deu um branco!<br />
* No dia-a-dia, certas palavras tendem a mudar<br />
de rosto. Já se veem pessoas falarem (e escreverem)<br />
desfarce em lugar de disfarce.Talvez a confusão se deva<br />
à semelhança com o verbo desfazer, por meio de<br />
contaminação fonética. Também muita gente fala<br />
defamar, quando deveriam dizer difamar.<br />
los se enfurecera quando nos avisaram<br />
o fim das cestas e que a ajuda<br />
do governo do Estado voltaria<br />
no dia seguinte. Fomos para<br />
casa quase às lágrimas, ele reclamando<br />
baixinho, expelindo sua<br />
ira, realçando sua decepção,<br />
amargando as palavras como se<br />
elas tivessem enxofre.<br />
Depois de horas de paciente<br />
espera sob a inclemência solar,<br />
o suor empapando nossas<br />
puídas roupas,vi Carlos aproximar-se<br />
da carreta e entregar<br />
as duas bolsas de palha, que<br />
foram se enchendo de feijão,<br />
arroz,sal,farinha,açúcar,óleo,<br />
farinha de milho, bolachas, sabão<br />
e outros itens da composição<br />
da cesta básica oferecida<br />
aos flagelados da destruidora<br />
seca daquele ano. Carlos, segurando<br />
as duas bolsas cheias,<br />
olhou-me sorridente fazendo<br />
um gesto para eu aguardar minha<br />
vez, e eu, todo feliz, levantei<br />
o polegar de satisfação enquanto<br />
caminhava para também<br />
receber a mesma quantidade<br />
de alimentos e, assim, garantir<br />
por alguns dias o pão em<br />
nossa casa. Foram dias difíceis<br />
aqueles para todo mundo.