O Lobo da Estepe - Christian Rocha
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Carece ain<strong>da</strong> de eluci<strong>da</strong>ção o fenômeno individual do <strong>Lobo</strong> <strong>da</strong> <strong>Estepe</strong>, e principalmente suas<br />
relações singulares com a burguesia, de modo que tais sintomas devem ser perscrutados em<br />
sua fonte de origem. Tomemos como ponto de parti<strong>da</strong>, já que se nos apresenta por si mesma,<br />
precisamente aquela sua relação com o "burguês"!<br />
O <strong>Lobo</strong> <strong>da</strong> <strong>Estepe</strong> vivia, segundo seu próprio entendimento, inteiramente à margem do mundo<br />
convencional, pois não conhecera nem a vi<strong>da</strong> de família nem as ambições sociais. Sentia-se<br />
isolado ora como um esquisitão e doentio eremita, ora como um indivíduo superiormente<br />
dotado, que por seu gênio se sobressaía do comum dos mortais. Desprezava conscientemente<br />
a burguesia e vivia orgulhoso de não pertencer a ela. Contudo, sob muitos aspectos, vivia<br />
inteiramente como burguês, tinha dinheiro no banco, aju<strong>da</strong>va alguns parentes pobres, vestiase<br />
sem cui<strong>da</strong>dos particulares mas de maneira decente e sem chamar a atenção; procurava<br />
viver em paz com a polícia, os coletores de impostos e outros poderes semelhantes. Mas além<br />
disso sentia forte e secreta atração pela vi<strong>da</strong> burguesa, pelas tranqüilas e decentes residências<br />
familiares com seus bem cui<strong>da</strong>dos jardins, suas esca<strong>da</strong>s reluzentes e sua modesta atmosfera de<br />
ordem e decoro. Agra<strong>da</strong>va-lhe ter pequenos vícios e extravagâncias, sentir-se antiburguês,<br />
esquisitão ou gênio, mas nunca fixava residência onde não existisse nenhuma classe de<br />
burguesia. Não se encontrava à vontade em meio de pessoas violentas e atrabiliárias, nem<br />
entre delinqüentes e criminosos, mas antes procurava sempre viver em meio à classe média,<br />
com cujos hábitos, normas e atmosfera estava bem familiarizado, embora pudesse ter contra<br />
elas revolta e oposição. Além disso, fora educado em meio à pequena burguesia e dela<br />
conservara um grande número de idéias e noções. Teoricamente na<strong>da</strong> tinha em contrário i<br />
prostituição, mas na prática não seria capaz de levar urna prostituta a sério ou considerá-la<br />
realmente sua igual. Aos criminosos políticos, aos revolucionários ou aos sedutores<br />
espirituais, podia amá-los como se fossem seus irmãos, ou respeitar<br />
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