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frágil e miserável já luta pela vida e é acarinhada pela população ribeirinha que, como os Reis Magos,<br />

lhe presenteia 13 .Oferecem o que se pode colher na natureza. São abacaxis, roletes de cana, jacas,<br />

mangas, ostras, siris, peixes para uma vida franzina, "severina" para a qual duas ciganas prevêem um<br />

triste destino: uma delas vê a criança como um futuro pescador, enlameado no mangue; a outra o<br />

vislumbra, como operário, tomado pela graxa das fábricas.<br />

" Vejo-o, uns anos mais tarde,<br />

na ilha do Maruim<br />

vestido negro de lama<br />

voltar de pescar siris"<br />

"Não o vejo dentro de mangues,<br />

vejo-o dentro de uma fábrica:<br />

se está negro não é lama,<br />

é graxa de sua máquina"<br />

O nascimento da criança é interpretado por mestre José como resposta negativa ao<br />

desejo de Severino suicidar-se; por isso, o mestre enaltece o valor da vida, tomando como exemplo a<br />

luta precoce que aquela criança frágil empreende. O clima de comemoração contagia a todos e<br />

curiosamente o poema se encerra sem a resposta do protagonista, que parece assistir a tudo<br />

atentamente, no entanto, não mais se manifesta.<br />

A vida presidida pela morte<br />

Em sua viagem, Severino e o espectador vão descobrindo que não há saída para o<br />

nordestino miserável. No sertão, é castigado pelo clima árido, pela violência que rege as relações entre<br />

latifundiários e lavradores, pela impossibilidade de cultivar a terra; na zona da mata, percebe que a<br />

terra produtiva está em poder de poucos. Na cidade, a riqueza de uma elite que vive e se enterra com<br />

luxo, a indiferença dos habitantes da capital, as miseráveis condições dos trabalhadores do mangue e<br />

das fábricas perpetuam a mesma sina de privações.<br />

Ainda que nas cenas finais se cantem louvores para o recém-nascido e se reafirme a<br />

crença na novidade que a vida sempre carrega, não se firmam grandes esperanças para o mundo dos<br />

Severinos. A criança franzina, prematura, raquítica traz a fibra de todos aqueles que só conhecem a<br />

vida presidida pela ameaça da morte; o recém-nascido, teimosamente, insiste em viver e por isso é<br />

mais uma "vida severina". 14<br />

13. Os presentes são ofertados por moradores de diversos bairros miseráveis de Recife. Como avisou Manuel Bandeira, sem a<br />

informação de que “Jaqueira“, “Cajueiro“, “Passarinho“, “Peixinhos“ são localidades ribeirinhas do Capiberibe, os versos<br />

de João Cabral seriam surrealistas.<br />

14. Leia o que diz João Cabral sobre o final de Morte e vida severina: “Algumas pessoas encontram em Morte e vida severina<br />

uma mensagem de vida, de esperança, outras não. Eu, propositalmente, deixei o final ambíguo. Apesar de ser<br />

confessadamente pessimista, neste caso não quis tirar qualquer tipo de conclusão”.

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