Kléos, Revista de Filosofia Antiga - Programa de Estudos em ...
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experiências fornece a base epistêmica para uma tese perpectivista irrefutável<br />
(a)na/lwtoi 8 ). Dizer que aísthesis é infalível correspon<strong>de</strong>, teoricamente, à aceitação<br />
da multiplicação e da mutabilida<strong>de</strong> da verda<strong>de</strong>, ou seja, da submissão <strong>de</strong>sta<br />
à errância.<br />
Daí a recusa da sensação ser, na profundida<strong>de</strong> e na sua orig<strong>em</strong>, tanto<br />
ética quanto epist<strong>em</strong>ológica. A recusa ética baseia-se na crença que toma o<br />
apetite como a marca <strong>de</strong> uma falha inscrita na própria natureza humana. Do<br />
reconhecimento <strong>de</strong>ssa falha até a idéia da contaminação psíquica, é só mais<br />
um passo. A recusa epist<strong>em</strong>ológica supõe, na sua exigência <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> e<br />
imutabilida<strong>de</strong> do verda<strong>de</strong>iro, a produção do fantasma singular associado<br />
diretamente aos apetites e a infecção psíquica que provocam.<br />
5. É nesse ponto que a questão do enca<strong>de</strong>amento da alma ao corpo – e<br />
a idéia conseqüente <strong>de</strong> infecção psíquica – precisa ser compreendida na sua<br />
profundida<strong>de</strong>. Sócrates é explícito quando a etiologia da infecção psíquica, diz<br />
ele no Fédon: “o supr<strong>em</strong>o mal, o maior e o mais extr<strong>em</strong>o <strong>de</strong> todos os males é<br />
ser afetado excessivamente pelo prazer”. É preciso que não nos engan<strong>em</strong>os<br />
sobre o significado <strong>de</strong>sse malefício, mesmo porque Sócrates não o permite.<br />
Pois é ele mesmo qu<strong>em</strong> nos adverte na mesma passag<strong>em</strong>:<br />
o mal que advém dos prazeres e dores intensos não é o que po<strong>de</strong>ríamos imaginar – por<br />
ex<strong>em</strong>plo a doença física e a ruína financeira. O maior <strong>de</strong>ntre todos os males, o supr<strong>em</strong>o mal<br />
é experimentado s<strong>em</strong> que nós nos <strong>de</strong>mos conta <strong>de</strong>le 9<br />
.<br />
É preciso fazer justiça ao caráter enfático da linguag<strong>em</strong> <strong>em</strong>pregada por<br />
Sócrates e evitar o engano <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> uma forma externa o perigo que os<br />
prazeres representam.<br />
O real malefício não é o que po<strong>de</strong>ríamos inocent<strong>em</strong>ente supor. Não é<br />
evi<strong>de</strong>nte, n<strong>em</strong> observável, coloca-se para além do que po<strong>de</strong>mos imaginar. Eis por<br />
que não se <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>ixar-se iludir pela noção <strong>de</strong> obstáculo – obstáculo que faz do<br />
corpo, <strong>de</strong> suas distrações, <strong>de</strong> suas ocupações apenas um <strong>de</strong>sperdício <strong>de</strong> t<strong>em</strong>po. A<br />
recusa do prazer t<strong>em</strong> um sentido profundo, um sentido ontológico que, este sim,<br />
permite a compreensão do seu real papel na trama dos Diálogos.<br />
Sócrates explica esse sentido ontológico da seguinte forma:<br />
8 PLATÃO. Teeteto, 179c.<br />
9 PLATÃO. Fédon, 82c-83c.<br />
PRAZER, SENSAÇÃO E ERRÂNCIA EM PLATÃO<br />
K LÉOS N.5/6: 23-34, 2001/2<br />
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