327 ANEXO A ENTREVISTA COM O PROFESSOR ADIR BOTELHO
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sentimentos que nos transporta freneticamente de um ponto a outro, através das sombras<br />
e da luz, pelo seio, pela alma, pelo extraordinário sentimento místico do povo de<br />
Canudos sempre guiado pelo seu inigualável e irresistível profeta. Mas leiamos algumas<br />
palavras dos comentaristas da obra sobre estes impressionantes desenhos a carvão:<br />
346<br />
Mas a força da expressão poética e plástica que transpira de Canudos – Agonia e Morte<br />
de Antonio Conselheiro – certamente constituirá novo marco na bibliografia sobre a<br />
figura de Antonio Conselheiro, ao reunir matéria histórica e arte em um nível de<br />
qualidade difícil de ser superado. 330<br />
A estética expressionista, marcada pelo individualismo subjetivo de seus artistas, se<br />
alimenta do sentimento da crise, de agonia, de ação e de heroísmo. O homem se re-<br />
humaniza na procura de um elemento fundamental: o próprio homem. Por tal razão o<br />
artista expressionista é um reformador que sonha provocar a humanidade para acordá-la<br />
de seu sonho letárgico. Como salvador do mundo, ele escolhe seus temas e constrói o<br />
homem, procurando torná-lo melhor, pela dor, pela solidão e pela generosa doação da<br />
vida, como na saga de Antônio Conselheiro, salvador e vítima, lendário e real, morto,<br />
mas vivente, em sua eterna agonia. [...] Como se fôssemos atingidos pela descarga de<br />
um fio de alta tensão, somos exauridos, catarticamente, de nossas próprias emoções e<br />
nos defrontamos com o trágico. A evidência do herói então se manifesta para autenticar<br />
toda a dramaturgia do artista. Ali está o Antônio Conselheiro criado por Adir, que<br />
confere ao herói traços próprios, a ponto de nos permitir identificá-lo ao longo da série<br />
de desenhos a carvão. [...] À medida que nossos olhos se habituam, conseguimos ver no<br />
carvão, a multiplicidade de elementos que compõem a morte do herói. Animais<br />
simbólicos se misturam a homens; figuras cheias se contrapõem a desenhos mais<br />
lineares, abertos, como se fossem deixados sem preenchimento para a evidência do<br />
traço e o inacabado da agonia. As soluções não se repetem. Em algumas obras, as<br />
fantasmagorias nos fazem pensar em Ensor; em outras, a tensão romântica e as<br />
distorções da forma nos colocam frente a frente com um novo Goya, tão forte, tão<br />
macabro e tão seguro na técnica como o primeiro. As figuras de terror se mesclam a<br />
outras mais simbólicas. De repente, percebemos elefantes, girafas, cavalos, junto a<br />
homens, numa estanha romaria onde todos procuram universalizar o mesmo<br />
sentimento. 330<br />
Noutra série relacionada a Canudos, Adir Botelho trabalha o conflito através do<br />
desenho. As técnicas proliferam ou se contaminam. Riscos, traços, linhas, manchas – os<br />
signos reunidos através de procedimentos e cargas matéricas diversificadas, se<br />
acumulam como carga pulsional. Não se trata aqui de levantar o eu expressionista de<br />
Adir Botelho, mas de compreender a necessidade de expressividade nas figuras desta