Suplemento%20Especia%20-%20Maio
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10<br />
DESCONECTANDO...<br />
elisa aNdrade buzzo<br />
Éramos duas crianças<br />
aprendendo a ver imagens<br />
e a ouvir sons.<br />
Escandíamos as mais simples sílabas<br />
em malabarismo de linguagem.<br />
Recebíamos com espanto a luz dos raios catódicos do<br />
[fundo da tela de cristal:<br />
puxa o fio da boca com os dedos,<br />
sua risada ressoa redonda, grande de dentes.<br />
Aí, veio o bicho-papão<br />
e tirou nosso ar.<br />
:-(<br />
Este poema da Elisa Andrade Buzzo foi publicado no Suplemento Literário n. 1287, que circulou em<br />
fevereiro de 2006. Eu já conhecia um livro da autora, o Se lá no sol, pela 7Letras, de 2005. Elisa é paulistana<br />
e nossos caminhos já vinham se cruzando e ela se tornou, depois, colunista do mesmo site que eu,<br />
o Digestivo Cultural. Acho a poesia dela muito sensível e musical, mas esse poema aí me deixou “de cara”,<br />
como se diz aqui em Minas. Como estudo, academicamente, as tecnologias digitais, achei sensacional<br />
a maneira como Elisa lança as questões da web num poema que beira o humor, o amor e a ironia, num<br />
tempo em que não rolava muita banda larga. Ah, meus tempos de chat no UOL, minha tela de tubo, a linguagem<br />
na velocidade da conexão (que caía!), os emoticons old school, feitos com pontuação (um porre<br />
esses que já vêm prontos!). Elisa é fera em contar boa história num poema breve. E o timbre dessa Elisa<br />
em “Desconectando...” não é assim tão comum nela mesma. Há outro, preponderante, que é mais lírico.<br />
Talvez por isso ela me tenha impressionado nessa paquera poemática via chat. E o título? Muito oportuno,<br />
muito bem-dado, inteligente, aponta sem revelar. Poesia em círculo, assim: você entende o título<br />
depois que termina de ler (ou termina de ler para entender o título). Gosto muito dos escritos que fazem<br />
esse movimento. Então escolhi a Elisa e esse poema porque acho que essa paulistana nascida em 1981 é<br />
um talento que não ficou no primeiro livro (como muitos). Ela publicou outros, participou de antologias,<br />
inclusive no exterior, foi coeditora da revista Mininas, que acho fantástica (só editava mulheres) e, ah, é<br />
uma cronista produtiva, de um lirismo emocionante.<br />
Ana Elisa Ribeiro