As Religiões no Rio - João do Rio - Igreja Metodista de Vila Isabel
As Religiões no Rio - João do Rio - Igreja Metodista de Vila Isabel
As Religiões no Rio - João do Rio - Igreja Metodista de Vila Isabel
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Kant, <strong>de</strong> outros filósofos. Passa por erudito e é respeita<strong>do</strong>. Basta, porém, falar <strong>de</strong> Comte para<br />
que o tomem por um esquisitão e perguntem injuriosamente se essa é a religião <strong>de</strong> Clotil<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Vaux.<br />
- É natural. É a gentinha que não conhece o culto, adultera<strong>do</strong> por espíritos anárquicos. Mas<br />
você vê que os honestos já começam a compreen<strong>de</strong>r a <strong>do</strong>ce religião que submeteu a<br />
inteligência ao sentimento.<br />
- Tem-lhes custa<strong>do</strong>.<br />
- O positivismo tem quarenta a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> propaganda <strong>no</strong> Brasil. Em 1864, o Dr. Barreto <strong>de</strong><br />
Aragão publicava urna aritmética dan<strong>do</strong> a hierarquia científica <strong>de</strong> Comte e o Dr. Brandão<br />
escrevia a Escravidão <strong>no</strong> Brasil. Foram esses os primeiros livros positivistas, hoje quase<br />
<strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong>s. Depois é que o positivismo começou a ser fala<strong>do</strong> entre matemáticos e que os<br />
professores da Central e da Escola Militar <strong>de</strong>ram em citar a <strong>As</strong>tro<strong>no</strong>mia e o primeiro volume da<br />
Filosofia.<br />
- Era o tempo em que se consi<strong>de</strong>rava a Política um livro ímpio...<br />
- Ainda não se fizera sentir a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dispensar os serviços provisórios <strong>de</strong> Deus. O<br />
caráter religioso <strong>do</strong> positivismo não era conheci<strong>do</strong>. Isso não impediu que Benjamim Constant,<br />
fazen<strong>do</strong> concurso na Escola Militar, <strong>de</strong>clarasse ser positivista orto<strong>do</strong>xo e republica<strong>no</strong>, e que o<br />
próprio Benjamim, com os Drs. Oliveira Guimarães e Abreu Lima, constituísse o núcleo <strong>do</strong>s<br />
orto<strong>do</strong>xos em 1872.<br />
- A influência foi nula... - interrompi eu, olhan<strong>do</strong> uma senhora loura que entrava com o<br />
catecismo enca<strong>de</strong>rna<strong>do</strong> em velu<strong>do</strong> ver<strong>de</strong>.<br />
- Nada se per<strong>de</strong>. Oliveira Guimarães <strong>de</strong>ixou um discípulo, Oscar <strong>de</strong> Araújo; Benjamim levou<br />
às escolas a palavra religiosa <strong>do</strong> mestre, regenerou o ensi<strong>no</strong> da matemática e foi o primeiro<br />
brasileiro que teve <strong>no</strong> seu quarto o retrato <strong>de</strong> Clotil<strong>de</strong> <strong>de</strong> Vaux. Os trabalhos a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong>s na Escola<br />
Militar são quase to<strong>do</strong>s <strong>de</strong> discípulos seus. No meio inteligente <strong>de</strong>sses últimos surgiram<br />
Raimun<strong>do</strong> e Miguel Lemos; era um momento <strong>de</strong> agitação. Pereira Barreto publicava o 1.º<br />
volume da obra <strong>As</strong> três filosofias, e tanto Miguel como Teixeira Men<strong>de</strong>s eram litréistas,<br />
consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> a parte religiosa <strong>de</strong> Comte como obra <strong>de</strong> louco.<br />
Foi com eles que Oliveira Guimarães fez aliança para fundar a biblioteca positivista e abrir<br />
cursos científicos.<br />
- Era a filosofia da Aca<strong>de</strong>mia...<br />
- Sem jardins. O começo <strong>do</strong> positivismo <strong>no</strong> Brasil é absolutamente acadêmico. Em 1876 a<br />
Escola <strong>de</strong> Medicina manifestou-se com a tese Da Nutrição, <strong>de</strong> Ribeiro <strong>de</strong> Men<strong>do</strong>nça, e a<br />
primeira socieda<strong>de</strong> positivista foi feita <strong>de</strong> professores orto<strong>do</strong>xos e <strong>de</strong> estudantes litréistas.<br />
- Seria curioso saber como estes mudaram.<br />
- <strong>As</strong> pequenas causas têm às vezes gran<strong>de</strong>s efeitos. Uma censura ao diretor da escola<br />
motivou serem suspensos, por <strong>do</strong>is a<strong>no</strong>s, Teixeira Men<strong>de</strong>s e Miguel Lemos, que foram para a<br />
Europa; e enquanto só, Benjamim propagava aqui, os <strong>do</strong>is em Paris litréizavam. Men<strong>de</strong>s veio o<br />
mesmo, achan<strong>do</strong> o Comte da Política maluco. Miguel ficou, e lá, sponte sua, aban<strong>do</strong><strong>no</strong>u Littré e<br />
relacio<strong>no</strong>u-se com Laffite.<br />
- E converteu-se?<br />
- A 4 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1879.<br />
Solenemente, o meu amigo positivista apanhava sol. Levei-o com carinho para o jardim,<br />
on<strong>de</strong> <strong>de</strong>via florir o bosque sagra<strong>do</strong> com as sepulturas <strong>do</strong>s homens dig<strong>no</strong>s. Não havia bosques,<br />
nem sepulturas. Apenas algumas árvores. O positivista acen<strong>de</strong>u o cigarro, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> o fazer<br />
com um forte fumo <strong>Rio</strong> Novo. Eu perguntei pasma<strong>do</strong>:<br />
- Toma café?<br />
Ele riu.<br />
- Como toda a gente! Essa história <strong>de</strong> não tomar café e não fumar é apenas uma léria.<br />
Então você pensa que Augusto Comte imaginasse, <strong>de</strong> mau, fazer o mun<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixar o café e o<br />
fumo, só para arruinar o Brasil? O fato é outro. O gran<strong>de</strong> filósofo não fumava nem bebia<br />
excitantes, porque lhe faziam mal; Miguel Lemos, <strong>do</strong>ente como é, não se atira a esses<br />
excessos; Teixeira Men<strong>de</strong>s, um homem que reflete <strong>de</strong>zesseis horas a fio, não se po<strong>de</strong> dar aos<br />
<strong>de</strong>vaneios da fumaça... Não há proibições formais para o horren<strong>do</strong> vício; há apenas me<strong>do</strong>...<br />
Puxei com vigor uma baforada.<br />
- A propaganda <strong>de</strong>sapareceu com a estada <strong>de</strong> Miguel Lemos em Paris?