Desafios da crítica imanente do lazer e do consumo a ... - ArtCultura
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25 SMITH apud PAULANI,<br />
idem, ibidem, p. 81.<br />
26 PAULANI, op. cit., p. 86.<br />
27 “[...] para o indivíduo econômico<br />
a socie<strong>da</strong>de fica invisível,<br />
e quan<strong>do</strong> aparece em<br />
sua concretude, sob a forma<br />
<strong>do</strong> dinheiro, por exemplo, ela<br />
não surge para ele como locus<br />
de relações sociais, mas como<br />
um ‘mun<strong>do</strong> natural’, e continua,<br />
portanto, invisível.”<br />
PAULANI, idem, ibidem, p. 89.<br />
28 FREITAS, Ricar<strong>do</strong> F. Nas<br />
alame<strong>da</strong>s <strong>do</strong> <strong>consumo</strong>: os<br />
shopping centers como solução<br />
contemporânea de <strong>lazer</strong><br />
nas ci<strong>da</strong>des globaliza<strong>da</strong>s.<br />
Contato: Revista Brasileira de<br />
Comunicação, Arte e Educação,<br />
Brasília, ano 1, n. 2, jan.mar.1999,<br />
p.135.<br />
29 PADILHA, Valéria, op. cit.,<br />
p. 182.<br />
110<br />
<strong>consumo</strong> de merca<strong>do</strong>rias ou economia mercantil), pois ca<strong>da</strong> um defende<br />
o seu próprio interesse de sobrevivência. Ele afirma: “Não é <strong>da</strong> benevolência<br />
<strong>do</strong> açougueiro, <strong>do</strong> cervejeiro ou <strong>do</strong> padeiro que esperamos nosso<br />
jantar, mas a consideração que eles têm pelo seu próprio interesse.<br />
Dirigimo-nos não à sua humani<strong>da</strong>de, mas à sua auto-estima [...].” 25<br />
No entanto, conforme afirmação de Paulani, a constituição <strong>do</strong> indivíduo<br />
como “elemento autônomo, livre, independente e <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de<br />
vontade própria só se realiza de fato se lhe for garanti<strong>do</strong> o reconhecimento<br />
(de outros indivíduos, evidentemente). Já deixa aí, portanto, de<br />
ser ver<strong>da</strong>deiramente autônoma sua natureza [...].” 26 Ou seja, curiosamente,<br />
o indivíduo só é livre na condição de membro efetivo de uma<br />
socie<strong>da</strong>de, ele só pode ser livre se os outros indivíduos permitirem e reconhecerem<br />
sua liber<strong>da</strong>de, isso porque a idéia de liber<strong>da</strong>de contém uma<br />
negativi<strong>da</strong>de: é livre quem não sofre coerção.<br />
Trata-se de uma contradição interna posta de la<strong>do</strong> pela economia<br />
liberal, visto que ela pretende entender o indivíduo sem considerar o<br />
universo social. O social, para os teóricos <strong>do</strong> liberalismo, é reduzi<strong>do</strong> à<br />
sua versão institucional <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> ou <strong>do</strong> governo vistos como coercitivos<br />
e impeditivos <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>des individuais. Para Smith, os indivíduos é que<br />
fazem a riqueza <strong>da</strong> nação quan<strong>do</strong>, agin<strong>do</strong> de acor<strong>do</strong> com seus próprios<br />
interesses, geram o progresso. Agir de acor<strong>do</strong> com seus próprios interesses,<br />
nessa teoria, significa alimentar uma economia mercantil pela circulação<br />
<strong>do</strong>s bens produzi<strong>do</strong>s, ou seja, em última instância, é o merca<strong>do</strong><br />
quem, “naturalmente”, concretiza a riqueza.<br />
A contradição, como bem aponta Paulani, está justamente no fato<br />
de que a famosa “mão invisível” regula<strong>do</strong>ra e impulsiona<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> desenvolvimento<br />
econômico é o merca<strong>do</strong>, uma força pretensamente anônima<br />
e autônoma à qual os indivíduos se vêem amarra<strong>do</strong>s. Então, como pode<br />
o indivíduo ser livre se sua prosperi<strong>da</strong>de depende de uma “regulação<br />
invisível” exterior a ele? Como pode o homem ser livre quan<strong>do</strong> a socie<strong>da</strong>de<br />
e as relações sociais são apaga<strong>da</strong>s diante de um merca<strong>do</strong> mandão<br />
que ganha uma aparência concreta por meio <strong>do</strong> dinheiro? 27<br />
A visão restrita de liber<strong>da</strong>de, critica<strong>da</strong> nesse artigo, encontra-se<br />
relaciona<strong>da</strong> ao <strong>lazer</strong> e ao shopping center, por exemplo, na afirmação de<br />
que “hoje, para encontrar liber<strong>da</strong>de, é preciso procurar espaços onde o<br />
<strong>lazer</strong> esteja protegi<strong>do</strong>, fora de perigo, como propõem os shopping<br />
centers.” 28 A que tipo de liber<strong>da</strong>de está-se referin<strong>do</strong>? Que perigo seria<br />
este <strong>do</strong> qual as pessoas se vêem protegi<strong>da</strong>s ao desfrutar <strong>do</strong>s <strong>lazer</strong>es ofereci<strong>do</strong>s<br />
pelos shopping centers? “Provavelmente, o perigo que brota <strong>da</strong>s<br />
desigual<strong>da</strong>des sociais estampa<strong>da</strong>s na dinâmica <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> real, <strong>do</strong> ‘mun<strong>do</strong><br />
de fora’ ao qual o shopping center não pode pertencer sob pena de perder<br />
seus maiores atrativos.” 29<br />
Shopping center: estranhamento <strong>do</strong> ser social<br />
e semiformação cultural<br />
Estes centros comerciais, ao distrair as pessoas de forma estranha<strong>da</strong>,<br />
comercializam seus desejos, seus prazeres e, também, seu tempo livre.<br />
Nos shopping centers, a experiência de diversão e descanso passa<br />
pelo <strong>consumo</strong> real ou visual de bens materiais, de bens <strong>da</strong> indústria cultural<br />
ou ain<strong>da</strong> <strong>do</strong> cinema hollywoodiano que propaga o american way of<br />
<strong>ArtCultura</strong>, Uberlândia, v. 10, n. 17, p. 103-119, jul.-dez. 2008