LITERATURA E MODA – UMA ABORDAGEM ... - Artigo Científico

More documents

Recommendations

Info

ando em os encontrados nos romances balzaquianos, que propõe a vestimen- ta como sendo, sobretudo, importante símbolo de insígnia social. O Velho Bru- xo do Cosme 7 vale-se dos elementos da indumentária como importantes para- digmas indiciários, capazes, por si, de revelarem a globalidade à qual perten- cem. Assim, frisa-se, a observação dos elementos do adorno na obra machadiana revela contundentes características psicanalíticas das personagens, não obstante esclarecer questões proeminentes à compreensão da própria narrativa. Não faz muito tempo, a mais misteriosa e eterna personagem feminina da Literatura Brasileira, Capitu 8 , do mestre Machado de Assis, tornou-se tema de mestrado nas mãos talentosas da Professora Geanneti Tavares Salomon 9 , que concluiu o tema com o instigante e sedutor título “Registros Realistas da Moda como Parte do Jogo Romântico em Dom Casmurro, de Machado de As- sis 10 ”. Na afluência entre Moda e Literatura, Geanneti analisou a indumentária na naquela obra machadiana e percebeu que ela não era empregada como acessório ou apelo visual; mas que se fazia parte da estratégia da criação lite- rária e basilar à construção das personagens. Vislumbrou-se, pois, que a Moda era levada a sério pelo Bruxo do Cosme, até porque, Machado de Assis, des- crevia minuciosamente o que se usava à época, com incrível precisão historio- 7 Epíteto respeitoso consagrado a Machado de Assis. O termo ganhou força no meio literário quando Carlos Drummond de Andrade publicou o poema: A um Bruxo, com Amor, no qual fez referência à casa de nº 18 da Rua Cosme Velho, situada no bairro de mesmo nome, no Rio de Janeiro, onde morou Machado de Assis. 8 Capitolina (Capitu, como é conhecida) é personagem do livro Dom Casmurro de Machado de Assis, publicado em 1899. Penetrou no imaginário coletivo como tipo feminino, justificando múltiplos estudos psicológicos e literários, dada sua essência enigmática de – como lhe descreve o autor – “criatura de quatorze anos, alta, forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. (...) Calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos”. 9 Graduada em Letras, Mestre em Literatura, Professora da PUC/MG, estilista, produtora de Moda e figurinista; trabalha para diversas campanhas publicitárias de TV e mídia impressa. Leciona nos cursos de Moda do Centro Universitário UNA e da Faculdade Estácio de Sá/BH. 10 Machado de Assis é o melhor romancista brasileiro e, sem o menor resquício de exagero, incluído na lista dos maiores narradores do século XIX, sendo considerado por diversos especialistas, nacionais e estrangeiros, como um dos cem maiores escritores de toda a história da Literatura Universal. Sua íntima relação com a sociedade do seu tempo o fez criar a emblemática obra-prima: Dom Casmurro, publicado em 1899. É o fundador da Academia Brasileira de Letras – ABL.
gráfica. Exemplo disso é o diálogo entre Capitu e Bentinho, quanto à ida deste ao seminário; ela – ainda menina – assistira à missa de saia balão. No desenrolar da pesquisa, desvendou-se parte do mistério: o romancista cria magistralmente a ideia de personagens segundo a qual se despontam adulteradas conforme seu descritivo agregado na narrativa. A moda, nesse contexto, possui a dimensão sociocultural. O preciosismo do discurso machadiano reside na descrição peculiar da indumentária de José Dias e que remete a implicações no jogo irônico presente no romance. Assim, o romancista o delineia: “(...) Cosi-me muito à parede, e vi- o passar com as suas calças brancas engomadas, presilhas, rodaque e gravata de mola. Foi dos últimos que usaram presilhas no Rio de Janeiro, e talvez nes- te mundo. Trazia as calças curtas para que lhe ficassem bem esticadas. A gravata de cetim prêto, com um arco de aço por dentro, imobilizava-lhe o pescoço; era então moda (...)”. Mostra-se, pois, ao leitor o caráter contraditório e calculista da personagem, porquanto sabia muito bem usar os artifícios da moda, seu poder, para projetar-se como almejava. Vinculada, pois, à Moda, a questão da etiqueta encontra-se presente na obra e faz parte do universo da ambiguidade que permeia o romance, em cuja estrutura se enfatiza a moda feminina, não só como elemento de elegân- cia na tentativa utópica de aproximação do proletariado à burguesia, mas enquanto componente essencial do ser e do parecer, do mostrar-se e do escon- der-se. Nesse lúdico da literatura engajada (e nisso discordaria a maioria dos estudiosos) Machado de Assis se valia da moda feminina do século XIX, visan- do ao jogo irônico presente na obra. Todas as imagens do romance machadiano se mostram fluidas, razão do sentido de duplicidade. A estratégia da narrativa se funda no não fechamen- to da obra, e se emprega da indumentária para manter-se a atmosfera ambígua (sem deixar de ser irônica); nesse contexto, entra-se a Moda e se vale da rou- pa para erigir espaço dos personagens, que, enquanto usuários de Moda, se revelam susceptíveis aos poderes dela emanados. Nesse ínterim, insofismável eu a indumentária constitui-se suporte à construção de identidades ficcionais.
Page 1 and 2: Resumo LITERATURA E MODA - UMA ABOR
Page 3: O Velho Bruxo do Cosme e a Metafís
Page 7 and 8: Todas as marcas registradas, Todos
Page 9 and 10: Eu, Etiqueta, mostra-se enunciado c
Page 11 and 12: Etiqueta relata abstração e inver
Page 13 and 14: Dona, me disse baixinho, não te do
Page 15 and 16: de imposição, ainda que, em algun
Page 17 and 18: Aos 6 de novembro 2008, realizou-se
Page 19 and 20: eber do casto néctar dos deuses. E

LITERATURA E MODA – UMA ABORDAGEM ... - Artigo Científico

Create successful ePaper yourself

Delete template?

Save as template?