Edição 124 - 1º Semestre de 2010 - Tribunal de Contas do Estado ...
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É preciso lembrar que a Or<strong>de</strong>m Econômica não<br />
constitui, ou não <strong>de</strong>veria constituir, um entrave às garantias<br />
fundamentais da pessoa humana; muito ao contrário,<br />
os direitos econômicos constituem pressupostos<br />
<strong>de</strong> existência <strong>do</strong>s direitos sociais, já que orienta<strong>do</strong>s pelas<br />
mesmas diretrizes constitucionais <strong>de</strong>stinadas a assegurar<br />
a to<strong>do</strong>s existência digna e redução das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s<br />
sociais (art. 170, caput e VII).<br />
Desse mo<strong>do</strong>, é inquestionável que a Constituição<br />
<strong>de</strong> 1988 a<strong>do</strong>tou a técnica <strong>de</strong> positivação jurídico-constitucional<br />
<strong>do</strong>s direitos sociais sob a forma <strong>de</strong> normas<br />
programáticas <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> tarefas e fins <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e<br />
<strong>de</strong> conteú<strong>do</strong> eminentemente social, obrigan<strong>do</strong>, assim, o<br />
legisla<strong>do</strong>r, o juiz e o administra<strong>do</strong>r a proteger o núcleo<br />
essencial e vital da pessoa humana.<br />
Não <strong>de</strong>sconhecemos, contu<strong>do</strong>, as dificulda<strong>de</strong>s<br />
apontadas pelos mais varia<strong>do</strong>s setores da socieda<strong>de</strong><br />
em matéria <strong>de</strong> implementação <strong>de</strong> direitos sociais. O<br />
Professor Canotilho 17 <strong>de</strong>staca, em especial, os seguintes<br />
problemas:<br />
(1) a otimização das prestações jurídicas pressupõe<br />
sempre uma reserva econômica <strong>do</strong> possível, condicionan<strong>do</strong><br />
a implementação <strong>de</strong> uma política social aos programas<br />
<strong>de</strong> governo;<br />
(2) assiste-se a uma inversão <strong>do</strong> objeto <strong>do</strong> direito<br />
subjetivo: classicamente, os direitos subjetivos estão<br />
volta<strong>do</strong>s ao direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa e a uma pretensão <strong>de</strong> omissão<br />
<strong>do</strong>s po<strong>de</strong>res públicos perante a esfera jurídica privada;<br />
os direitos a prestações postulam uma proibição <strong>de</strong><br />
omissão, impon<strong>do</strong>-se ao Esta<strong>do</strong> uma intervenção ativa<br />
<strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> prestações;<br />
(3) enquanto a <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>, nas normas consagra<strong>do</strong>ras<br />
<strong>de</strong> direitos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa permite, a justificalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes<br />
direitos-jurídico-individualmente aciona<strong>do</strong>s, os preceitos<br />
consagra<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s direitos a prestações estabelecem<br />
imposições constitucionais vagas e in<strong>de</strong>terminadas, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes<br />
da interposição <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r e <strong>de</strong>mais órgãos<br />
concretiza<strong>do</strong>res;<br />
(4) a idéia <strong>de</strong> correlativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixa em aberto alguns<br />
problemas. Uma coisa é afirmar que o cidadão tem direito<br />
a uma prestação, outra coisa é <strong>de</strong>terminar quais os<br />
mo<strong>do</strong>s ou formas <strong>de</strong> proteção <strong>de</strong>sse direito. Diferentemente<br />
<strong>do</strong> que acontece na dimensão negativa <strong>de</strong> imposição<br />
ao Esta<strong>do</strong>; na segunda dimensão, positiva, existe<br />
um relativo espaço <strong>de</strong> discricionarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r público<br />
quanto à escolha <strong>do</strong>s meios para tornar efetivo o<br />
direito na sua dimensão mínima. Ressalta, porém, que<br />
essa discricionarieda<strong>de</strong> não é absoluta, porquanto o<br />
constituinte a<strong>do</strong>tou a técnica da positivação <strong>do</strong>s chama<strong>do</strong>s<br />
direitos a prestações.<br />
A dignida<strong>de</strong> da pessoa humana expressa um conjunto<br />
<strong>de</strong> valores civilizatórios incorpora<strong>do</strong>s ao patrimônio<br />
da humanida<strong>de</strong>. O conteú<strong>do</strong> jurídico <strong>do</strong> postula<strong>do</strong> vem<br />
associa<strong>do</strong> aos direitos fundamentais e tem como núcleo<br />
material elementar o mínimo existencial, locução que<br />
i<strong>de</strong>ntifica o conjunto <strong>de</strong> bens e utilida<strong>de</strong>s básicas para a<br />
subsistência física e indispensável ao <strong>de</strong>sfrute da própria<br />
liberda<strong>de</strong>. Aquém daquele patamar, ainda quan<strong>do</strong> haja<br />
sobrevivência, não há dignida<strong>de</strong> 18 .<br />
De fato, a dignida<strong>de</strong> da pessoa é um valor espiritual<br />
e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente<br />
na auto<strong>de</strong>terminação consciente e responsável<br />
da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito<br />
por parte das <strong>de</strong>mais pessoas, constituin<strong>do</strong>-se um<br />
mínimo invulnerável que to<strong>do</strong> estatuto jurídico <strong>de</strong>ve<br />
assegurar, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que, somente excepcionalmente,<br />
possam ser feitas limitações ao exercício <strong>do</strong>s direitos<br />
fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária<br />
estima que merecem todas as pessoas enquanto<br />
seres humanos 19 .<br />
Para promover o atendimento das necessida<strong>de</strong>s <strong>do</strong><br />
cidadão, proporcionan<strong>do</strong>-lhe condições <strong>de</strong> viver em<br />
harmonia, ter prosperida<strong>de</strong> e, enfim, atingir o bemestar<br />
social, o Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>ve promover políticas públicas<br />
<strong>de</strong> inclusão social.<br />
Política pública é <strong>de</strong>finida pelo Professor Celso Antônio<br />
Ban<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Mello 20 “como um conjunto <strong>de</strong> atos<br />
unifica<strong>do</strong>s por um fio condutor que os une ao objetivo<br />
comum <strong>de</strong> empreen<strong>de</strong>r ou prosseguir um da<strong>do</strong> projeto<br />
governamental para o País”. O Professor Celso Antônio,<br />
portanto, reconhece o tema das políticas públicas sobre<br />
o enfoque da ativida<strong>de</strong> administrativa.<br />
Do mesmo mo<strong>do</strong>, Maria Paula Dallari Bucci 21 formula<br />
um conceito sobre política pública, dispon<strong>do</strong> que<br />
“são normas <strong>de</strong> ação governamental visan<strong>do</strong> coor<strong>de</strong>nar<br />
os meios à disposição <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e as ativida<strong>de</strong>s privadas,<br />
para a realização <strong>de</strong> objetivos socialmente relevantes e<br />
politicamente <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s”.<br />
O controle judicial das políticas públicas ainda é objeto<br />
<strong>de</strong> controvérsia na jurisprudência.<br />
Recentes <strong>de</strong>cisões ainda são reticentes em admitir o<br />
controle judicial <strong>do</strong>s atos <strong>de</strong> governo, sob pena <strong>de</strong> vio-<br />
17<br />
José Joaquim Gomes Canotilho, op. cit., p. 52.<br />
18<br />
Luís Roberto Barroso, Interpretação e Aplicação da Constituição, p. 334-336.<br />
19<br />
Alexandre <strong>de</strong> Moraes, Direitos Humanos Fundamentais- Teoria Geral, p. 46.<br />
20<br />
Celso Antônio Ban<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Mello, Curso <strong>de</strong> Direito Administrativo, p. 802.<br />
21<br />
Maria Paula Dallari Bucci, Direito Administrativo e Políticas Públicas, p. 239.<br />
DOUTRINA — Revista <strong>do</strong> TCESP nº <strong>124</strong> — 1º semestre <strong>de</strong> <strong>2010</strong> 49