A QUESTÃO DO DUPLO EM DUAS NARRATIVAS BRASILEIRAS
A QUESTÃO DO DUPLO EM DUAS NARRATIVAS BRASILEIRAS
A QUESTÃO DO DUPLO EM DUAS NARRATIVAS BRASILEIRAS
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Ângelo se mata, atirando-se em um abismo, mas antes mata também a frei<br />
Ozéas, arrancando uma cruz do chão e cravando-lhe no pescoço – numa cena (que não<br />
deixa nada a dever aos melhores romances góticos) permeada de escuridão e angústia,<br />
únicos elementos capazes de transmitir o estágio último de desespero e morte que irão<br />
se desenrolar na vida dos desafortunados personagens.<br />
3. O <strong>DUPLO</strong> <strong>EM</strong> ESFINGE<br />
Coelho Neto, talvez, seja um desses escritores sobre o qual se tenha, ainda, que<br />
lançar mão de estudos de caráter mais efetivo e aprofundado. O seu isolamento<br />
paulatino nas Letras nacionais começou a se dar, primeiramente, por meio dos ataques a<br />
ele desferidos por alguns modernistas em ascensão. Posteriormente, o fato de não mais<br />
se publicar a maioria das obras do escritor, acabou por isolá-lo, quase que por completo,<br />
do público leitor das últimas décadas do século XX.<br />
A historiografia e a crítica fazem menção ao autor, destacando, inclusive,<br />
alguns de seus textos. Em meio às rajadas de críticas disparadas contra ou a favor de<br />
Coelho Neto, descobre-se que ele transitou por entre os mais variados gêneros o que<br />
conferiu a sua obra momentos “altos” e “baixos” na visão de alguns críticos, como é o<br />
caso de Lúcia Miguel Pereira.<br />
Nesse transitar por gêneros diversos, Coelho Neto produz uma parcela de<br />
textos que tratam de temas ligados ao fantasmagórico, ao terror/horror ou ao<br />
sobrenatural que não é percebida com mérito pela historiografia ou pela crítica.<br />
Esses temas são oriundos das influências distintas que o escritor sofreu. Dentre<br />
essas influências, reconhecidas pelo próprio Coelho Neto, está a vivência no sertão,<br />
povoada por lendas, contos e histórias de negros cheios de pavores e lendas de caboclos<br />
palpitando encantamentos.<br />
Dentre as outras influências, percebidas pelos historiadores e pela crítica, estão<br />
a Bíblia, Shakespeare, Eça de Queirós, Camilo Castelo Branco, Maupassant e Flaubert,<br />
sem contar os clássicos gregos e As mil e uma noites.<br />
Pereira (1973) vê o ecletismo do autor com temor e desfere, acidamente,<br />
lampejos sobre a produção dele de cunho mais fantasista ou sobrenatural “(...) resvalou<br />
pelo romance de aventuras no Rajá de Pendjab, atolou-se, levado pela sedução de um<br />
orientalismo de bazar, nos mistérios do ocultismo, abordados em Saldunes e Esfinge”<br />
(p.266).<br />
Já Bosi (1999) ao tratar do mesmo assunto, procura manter-se um pouco mais<br />
neutro em suas aferições:<br />
Depois de Miragem, o escritor lançou-se a uma criação ficcional<br />
febril, datando de 1895 seu primeiro romance-lenda (O Rei<br />
Fantasma), experiência que se mostrou fecunda ao longo de sua<br />
carreira literária e que se mesclaria a vagas tendências para o<br />
espiritismo, desde O Rajá de Pendjab (1898) até Imortalidade (1923),<br />
passando por Esfinge (1908), além de várias coleções de novelas e de<br />
contos que não cabe aqui analisar. (p.201)<br />
Algo interessante dito nessa citação faz referência às vagas tendências para o<br />
espiritismo. Tais tendências são fruto de uma “conversão do escritor” às doutrinas<br />
espíritas, decorrente de uma experiência bastante particular. Vale lembrar que as<br />
736