EXTENSÃO - PROEC - Universidade Federal do Paraná
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EXTENSÃOFOCO<br />
EM
Reitor<br />
Zaki Akel Sobrinho<br />
Vice-reitor<br />
Rogério Mulinari<br />
Pró-Reitora de Extensão<br />
Elenice Mara Matos Novak<br />
Diretor da Editora UFPR<br />
Gilberto de Castro<br />
Extensão em Foco<br />
Publicação semestral da Pró-Reitoria de Extensão em Cultura da UFPR<br />
extensaoemfoco@ufpr.br<br />
http://www.proec.ufpr.br/extensaoemfoco/index.htm<br />
Editora: Luciana Panke<br />
Conselho Editorial: Ana Maria Petraitis Liblik (UFPR); Ana Maria Costa e Silva<br />
(University of Minho); Geysa Abreu (UDESC); José Sariol Bonilla (Universidad de<br />
Granma); Julio Pérez López (<strong>Universidade</strong> de Murcia – Espanha);<br />
Suely Scherer (UNERJ); Fernan<strong>do</strong> Oliveira Paulino (UNB).<br />
Conselho Consultivo: Alexander Welker Bion<strong>do</strong>, Aloísio Leoni Schmid,<br />
Araci Asinelli da Luz; Hugo Melo, Luis Allan Künzle, Mariluci Alves Maftum,<br />
Sandra Regina Kirchner Guimarães, Vera Karam de Chueiri.<br />
Sistema Eletrônico de Revistas - SER<br />
Programa de Apoio à Publicação de Periódicos da UFPR<br />
Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação<br />
www.prppg.ufpr.br<br />
O Sistema Eletrônico de Revistas (SER) é um software livre e permite a<br />
submissão de artigos e acesso às revistas de qualquer parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Pode ser acessa<strong>do</strong><br />
por autores, consultores, editores, usuários, interessa<strong>do</strong>s em acessar e obter cópias de artigos<br />
publica<strong>do</strong>s nas revistas. O sistema avisa automaticamente, por e-mail, <strong>do</strong> lançamento de um<br />
novo número da revista aos cadastra<strong>do</strong>s.
EXTENSÃOFOCO<br />
EM<br />
N.º 6 - JUL./DEZ. 2010
Editora UFPR<br />
Rua João Negrão, 280 - Centro<br />
Caixa Postal: 17.309<br />
Tel.: (41) 3360-7489 - fax: (41) 3360-7486<br />
80010-200 - Curitiba - Paraná - Brasil<br />
www.editora.ufpr.br<br />
editora@ufpr.br<br />
Coordenação editorial: Daniele Soares Carneiro<br />
Revisão <strong>do</strong>s textos em português: Fabricio Alberto de Oliveira<br />
Projeto gráfico: Glauco Pessoa Salamunes<br />
Editoração eletrônica: Pedro Henrique de Sousa Ferreira<br />
Projeto gráfico de Capa: Eliane Ribeiro Campos<br />
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ<br />
SISTEMA DE BIBLIOTECAS<br />
BIBLIOTECA CENTRAL. COORD. PROCESSOS TÉCNICOS<br />
Ficha catalográfica<br />
EXTENSÃO EM FOCO / <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná. Pró-Reitoria de<br />
Extensão e Cultura, Coordena<strong>do</strong>ria de Extensão; editora Luciana Panke, n. 1, 2008-<br />
[Curitiba] : Editora UFPR, 2008. (Revista da UFPR, n. 232)<br />
n. 6, jul./dez. 2010<br />
Semestral<br />
Textos em Português, Inglês e Espanhol<br />
Inclui bibliografia e notas<br />
ISSN: 19824432<br />
1. Meio ambiente - Educação ambiental. 2. Extensão rural. 3. Formação de professores. 4.<br />
Educação em direitos humanos.<br />
I. <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná. Pró-Reitoria de Extensão e Cultura.<br />
Coordena<strong>do</strong>ria de Extensão. II. Panke, Luciana. Série.<br />
Samira Elias Simões CRB-9 /755<br />
CDD 22.ed. 341.48<br />
Série Revista da UFPR, n. 254<br />
ISSN 1982-4432<br />
Ref. 631<br />
PRINTED IN BRAZIL<br />
Curitiba, 2011<br />
PEDE-SE PERMUTA<br />
WE ASK FOR EXCHANGE
Editorial<br />
Uma das principais questões públicas <strong>do</strong> século XXI é o meio-ambiente. Tema de imensurável<br />
relevância, cabe também à <strong>Universidade</strong> fomentar a discussão e possibilitar o acompanhamento<br />
da sociedade em projetos e ações continuadas.<br />
Desta forma, a Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná busca<br />
contribuir para o fomento com a publicação de um <strong>do</strong>ssiê específico nesta área. A organização <strong>do</strong><br />
<strong>do</strong>ssiê contou com a colaboração <strong>do</strong> prof. Dr. Toni André Scharlau, cuja seleção abrange artigos<br />
produzi<strong>do</strong>s em diversas regiões brasileiras.<br />
O Dossiê abre com o trabalho de Maria das Graças Ribeiro sobre o histórico da extensão<br />
rural em Minas Gerais. Depois, temos o panorama pernambucano com o texto de Jowania Rosas<br />
e Christina Nunes. O trabalho de Daniela Biondi relata experiências não formais que contribuem<br />
para a educação ambiental. Por sua vez, a jornalista Mônica Pinto discute a responsabilidade da<br />
comunicação inserida na sociedade <strong>do</strong> consumo.<br />
O artigo seguinte é resulta<strong>do</strong> de uma equipe – Luciana Paula Vieira, Juliana Moreira Prudenye<br />
de Oliveira, Kassiana da Silva Miguel, Daniela Frigo Ferraz, André Luis de Oliveira e Anelize<br />
Queiroz Amaral – que investiu nos módulos ambientais na educação básica. O autor Hugo Tavares<br />
relata a extensão rural no Paraná, sob o enfoque histórico. E os catarinenses Silvia Odebrecht, João<br />
Francisco Noll e Sheila E. S. Klein, da Furb, trazem o tema sob o viés da arquitetura. No encerramento<br />
<strong>do</strong> <strong>do</strong>ssiê, os desafios na recuperação de uma nascente é relatada por Júlia Soares Pereira,<br />
Robi Tabolka <strong>do</strong>s Santos, Catyelle M. A. Ferreira e Genival Barros Júnior. E, como é de praxe, a<br />
resenha oferecida possui relação com o tema, e nesta edição conta com a colaboração da instrutora<br />
de educomunicação Evanise Gomes, que escreve sobre o trabalho de Cremilda e Sinval Medina.<br />
A edição 6 da Revista Extensão em Foco apresenta, na categoria Demanda Contínua, o<br />
relato da aplicação <strong>do</strong> méto<strong>do</strong> de massagem em bebês, Shantala, descrito por Arlete Motter. A<br />
educação popular é foco da publicação de Mauricio Mogilka, da UFBA, e a formação continuada<br />
e formação de professores estão presentes nas pesquisas de Alessandra Magro e Kethlen Leite de<br />
Moura e Irizelda Martins de Souza e Silva, respectivamente.<br />
A equipe <strong>do</strong> Pará traz o tema <strong>do</strong>s direitos humanos e os desafios sobre a saúde sexual<br />
de a<strong>do</strong>lescentes são retrata<strong>do</strong>s por Juliana Sampaio; Roseléia Carneiro <strong>do</strong>s Santos e Anna Cléa<br />
Ferreira da Silva. A revista ainda publica a experiência na alfabetização de adultos em Minas Gerais<br />
e também as possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho.<br />
A Revista está repleta de bons temas e ótimos autores contribuin<strong>do</strong> com a disseminação<br />
<strong>do</strong> conhecimento. Esperamos colaborar sempre para que temas relevantes da sociedade estejam<br />
em evidência.<br />
Boa leitura!<br />
Dra. Luciana Panke - editora<br />
!
Sumário<br />
13<br />
Dossiê: Meio Ambiente<br />
Apresentação<br />
15<br />
A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG).<br />
1948-1969<br />
Rural Extention at <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG).<br />
1948-1969 / Extensión Universitaria Rural en la <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
Maria das Graças M. Ribeiro<br />
27<br />
Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de<br />
extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006-2008<br />
Extension policy: the environmental education projects in view of extended UFPE<br />
during 2006-2008 / Políticas de extensión: la educación medioambiental en la<br />
perspectiva de los proyectos de extensión de la UFPE en el perio<strong>do</strong> 2006-2008<br />
Jowania Rosas e Christina Nunes<br />
37<br />
Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
The “Floresta-Escola” Project – environmental nonformal education with public<br />
institutions / Proyecto “Floresta-Escola” – educación medioambiental no formal<br />
con instituciones publicas<br />
Daniela Biondi e Antonio Carlos Batista<br />
47<br />
Comunicação ambiental: os desafios de transcender a lógica da sociedade de<br />
consumo<br />
Environmental communication: challenges to transcend the logic of consumer<br />
society / Comunicación medioambiental: desafíos de trascender la lógica de la<br />
sociedad de consumo<br />
Mônica Pinto<br />
53<br />
Experiências no Programa <strong>Universidade</strong> sem Fronteiras: contribuição de um<br />
módulo didático de educação ambiental em escolas de educação básica<br />
Experiences at “<strong>Universidade</strong> sem Fronteiras” program: contribution of a<br />
Didactic Module about Environmental Education in basic education schools<br />
Experiencias en el “Programa <strong>Universidade</strong> sem Fronteiras”: contribución de un<br />
módulo didáctico de educación medioambiental en escuelas de educación básica<br />
Luciana Paula Vieira, Juliana Moreira Prudente de Oliveira, Kassiana da Silva<br />
Miguel, Daniela Frigo Ferraz, André Luis de Oliveira e Anelize Queiroz Amaral
63<br />
Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
Beginnings of Rural Extension in the state of Paraná, Brazil / Comienzos de la<br />
Extensión Rural en el esta<strong>do</strong> de Paraná, Brasil<br />
Hugo Moura Tavares<br />
73<br />
Sede ONG Nova Rússia Preservada: sustentabilidade na arquitetura<br />
“Nova Rússia Preservada” NGO headquarters: sustainability in architecture<br />
La sede de la ONG “Nova Rússia Preservada”: sostenibilidad en la arquitectura<br />
Silvia Odebrecht, João Francisco Noll e Sheila E. S. Klein<br />
81<br />
Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
Recovery and management of “nascente Chorona” in the rural community of Uruçu<br />
/ Recuperación y gestión del manantial “Chorona” en la comunidad rural de Uruçu<br />
Júlia Soares Pereira, Robi Tabolka <strong>do</strong>s Santos, Catyelle M. A. Ferreira, Genival<br />
Barros Júnior e Fernan<strong>do</strong> G. de Oliveira<br />
Demanda Contínua<br />
93<br />
101<br />
Projeto de Extensão Shantala: massagem para bebês<br />
Shantala Extension Project: baby massage / Proyecto de Extensión Shantala:<br />
masaje para bebés<br />
Arlete Motter, Sacha Fernanda Sartor Porto, Ana Paula Micos, Tharcila Pazinatto<br />
da Veiga, Mônica Fernandes <strong>do</strong>s Santos, Karen de Souza Derussi, Indaiara<br />
Felisbino, Elisiane Krupniski e Camila Ollé da Luz Szklar<br />
A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
Mediation in popular education and its impact in subjectivity<br />
Mediación en la educación popular y su impacto en la subjectividad<br />
Maurício Mogilka<br />
113<br />
Sistema Série Escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
“Série Escola” system: verification resource for continuing education<br />
Sistema “Série Escola”: recurso de verificación para formación continuada<br />
Alessandra Nichele Magro<br />
125<br />
A construção da Rede de Educação em Direitos Humanos: a experiência da UFPA<br />
The construction of the Network for Education in Human Rights: the experience<br />
of UFPA / La construcción de la Red de Educación en Derechos Humanos: la<br />
experiencia de la UFPA<br />
Alberto Damasceno, Émina Márcia Nery <strong>do</strong>s Santos, Ney Cristina Monteiro de<br />
Oliveira, Marcos Vinícius Lobo e Pedro Henrique Queiróz
133<br />
Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na<br />
atenção à saúde sexual e reprodutiva de a<strong>do</strong>lescentes no Vale <strong>do</strong> São Francisco<br />
Challenges in work process reorganizing and networking development in sexual<br />
and reproductive health care for a<strong>do</strong>lescents in the São Francisco Valley<br />
Desafíos para reorganización del proceso de trabajo y desarrollo de la red de<br />
atención a la salud sexual y reproductiva de los a<strong>do</strong>lescentes en el Valle del río<br />
São Francisco<br />
Juliana Sampaio, Roseléia Carneiro <strong>do</strong>s Santos e Anna Cléa Ferreira da Silva<br />
143<br />
Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – a experiência no<br />
Noroeste de Minas Gerais<br />
Youth and Adult Literacy in Agrarian Reform – The Experience at the Brazilian<br />
state of Minas Gerais' Northwestern region / La alfabetización de jóvenes y<br />
adultos en la Reforma Agraria – La experiencia en el Noroeste del Esta<strong>do</strong> de<br />
Minas Gerais, Brasil<br />
Ana Lucia Ferreira Faria, Etelvina Valente <strong>do</strong>s Anjos Silva e Elenice Rosa Costa<br />
151<br />
As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
The possibilities of psychological duty in work place<br />
Las posibilidades del deber psicologico en la oficina<br />
Janaina Lucia Rodrigues e Fernanda Candi<strong>do</strong><br />
161<br />
Orientações da Unesco para a formação de professores no e <strong>do</strong> campo na<br />
década da educação (1997-2007)<br />
Guidelines from Unesco to the formation of teachers in and from the countryside<br />
areas in the decade of education (1997-2007) / Directrices de la Unesco para la<br />
formación de maestros en y del campo en la década de la educación (1997-2007)<br />
Kethlen Leite de Moura e Irizelda Martins de Souza e Silva<br />
Resenha<br />
175<br />
Energia, Meio Ambiente e Comunicação Social<br />
Energy, environment and social communication / Energía, medio ambiente y<br />
comunicación social<br />
Evanise Rodrigues Gomes
DOSSIÊ:<br />
Meio Ambiente<br />
Organiza<strong>do</strong>res:<br />
Luciana Panke e Toni André Scharlau
Apresentação<br />
Nesta edição a revista apresenta diversos artigos nos quais a preocupação com o meio<br />
ambiente vem à tona. Diferentes áreas <strong>do</strong> conhecimento mostram iniciativas de intervenções junto<br />
a comunidades, além de outras ações de extensão universitária.<br />
O assunto é sempre destaque nos noticiários e nas agendas políticas das lideranças mundiais.<br />
A revista mostra como ações extensionistas podem ser importantes aliadas para a preservação<br />
<strong>do</strong> meio ambiente. Os artigos dão conta de projetos onde se pode avaliar como a Extensão<br />
universitária é importante para que a sociedade se conheça melhor e, assim, possa dar mais valor<br />
aos assuntos ambientais.<br />
A questão <strong>do</strong> reaproveitamento <strong>do</strong> óleo residual para produção <strong>do</strong> biodiesel é bastante<br />
importante. É relevante o fato de que o desenvolvimento de novos hábitos de consumo possam<br />
ser ensina<strong>do</strong>s como possibilita<strong>do</strong>res de uma intervenção <strong>do</strong> povo para uma melhora ambiental!<br />
Esse aspecto também é foca<strong>do</strong> no texto que trata da história <strong>do</strong> extensionismo rural em<br />
Minas Gerais. O recorte é o perío<strong>do</strong> <strong>do</strong> final <strong>do</strong>s anos 40 até a década de 60, época da então universidade<br />
estadual rural. No Paraná a recuperação histórica é realizada pela UFPR.<br />
A extensão universitária e sua dedicação aos assuntos de educação ambiental estão presentes<br />
em <strong>do</strong>is textos. São relatos de experiência das <strong>Universidade</strong>s de Pernambuco e <strong>do</strong> Paraná.<br />
Sustentabilidade na arquitetura é o tema <strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong> pessoal de Blumenau, Santa<br />
Catarina. O texto conta a experiência com a ONG Nova Rússia.<br />
Da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Campina Grande, na Paraíba, chega o debate sobre recuperação<br />
de nascentes. No artigo é apresenta<strong>do</strong> um relato sobre o manejo em uma nascente “Chorona”<br />
no município de Uruçu.<br />
Entre os textos recebi<strong>do</strong>s através da Demanda Contínua, os temas mais trabalha<strong>do</strong>s foram<br />
saúde, reforma agrária e educação, especialmente a realizada no campo. Destaca-se, ainda, um<br />
trabalho sobre o plantão psicológico em ambientes de trabalho.<br />
A revista de Extensão da UFPR traz um interessante mosaico de ações em várias regiões<br />
brasileiras. É uma importante forma de ampliar a importância <strong>do</strong> trabalho extensionista e da atualidade<br />
<strong>do</strong> trabalho realiza<strong>do</strong> diretamente nos locais de ocorrência de diferentes fenômenos.<br />
Boa leitura<br />
13
A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas<br />
Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
Rural Extention at <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais<br />
(UREMG). 1948-1969<br />
Extensión Universitaria Rural en la <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de<br />
Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
Maria das Graças M. Ribeiro 1<br />
RESUMO<br />
A <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa (UFV) é uma das mais importantes universidades no ensino de agronomia<br />
no Brasil. Esta <strong>Universidade</strong> nasceu da Escola Superior de Agricultura e Veterinária <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas<br />
Gerais (ESAV), a qual foi criada em 1926. Em 1948, a instituição tornou-se <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
de Minas Gerais (UREMG). Desde as suas raízes, a instituição praticou a extensão rural, mas foi com a<br />
UREMG que esta atividade foi institucionalizada. Contribuiu para este fato um acor<strong>do</strong> entre o governo<br />
<strong>do</strong> esta<strong>do</strong> de Minas Gerais e a American International Association for Economic and Social Development,<br />
visan<strong>do</strong> o estabelecimento de um programa de crédito que deveria estimular a produção agrícola e outras<br />
atividades das comunidades rurais deste esta<strong>do</strong>. A experiência neste programa fez da instituição pioneira<br />
em extensão rural no Brasil.<br />
Palavras-chave: Extensão Rural; <strong>Universidade</strong>; Ensino Agrícola.<br />
ABSTRACT<br />
The <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa (UFV) is one of the most important university in agricultural teaching in<br />
Brazil. This University was born from the Escola Superior de Agricultura e Veterinária <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas<br />
Gerais (ESAV) which was created in 1926. In 1948, the institution became the <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
de Minas Gerais (UREMG). Since its roots the institution has practized agricultural extension, but it was with<br />
UREMG that this activity was institucionalized. It has contributed to this fact an agreement signed between<br />
the government of the state of Minas Gerais and the American International Association for Economic and<br />
Social Development for providing the establishment of a program of credit that would stimulate crop and<br />
livestock production and other activities to the rural community of this state. The experience in the program<br />
has made the institution pioneer in agricultural extension in Brazil.<br />
Keywords: Agricultural Extension; University; Agricultural Teaching.<br />
RESUMEN<br />
La <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa (UFV) és una de las más importantes universidades en Brasil en la enseñanza<br />
de la agronomia. Esta Universidad tuvo su origen en la Escola Superior de Agricultura e Veterinária<br />
<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (ESAV), que ha si<strong>do</strong> creada en 1926. En 1948, la instituición ha cambia<strong>do</strong><br />
para lhamarse <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). Desde temprano, la instituición<br />
há practica<strong>do</strong> la extensión rural, pero esta actividad solo hay si<strong>do</strong> institucionalizada en UREMG. Ha con-<br />
1 Socióloga. Doutora em Educação. Professora Associada da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa. Tel: -31-38911387. e-mail: mariagr@<br />
ufv.br<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
15
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
tribui<strong>do</strong> para este hecho un acuer<strong>do</strong> firma<strong>do</strong><br />
entre el gobierno del esta<strong>do</strong> de Minas Gerais<br />
y la American International Association for<br />
Economic and Social Development con la<br />
finalidad de desarollar un programa de credito<br />
para incentibar la produción agrícola y otras<br />
actividades de las comunidades rurales en este<br />
esta<strong>do</strong>. La experiencia en este programa ha<br />
hecho la instituición pionera en la extensión<br />
agrícola en Brasil.<br />
Palabras-clave: Extensión Rural; Universidad;<br />
Educación Agrícola.<br />
Introdução<br />
A <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa<br />
(UFV) reivindica-se pioneira entre as instituições<br />
de educação superior brasileiras no que<br />
diz respeito à indissociabilidade entre o ensino,<br />
a pesquisa e a extensão. Não obstante sua qualidade<br />
nestas atividades, é possível afirmar que<br />
esta universidade destacou-se excepcionalmente,<br />
desde muito ce<strong>do</strong>, principalmente em razão das<br />
suas atividades de extensão.<br />
O trabalho hora apresenta<strong>do</strong> constitui<br />
uma tentativa de contribuição para a elucidação<br />
da história da extensão na UFV, toman<strong>do</strong> como<br />
objeto as atividades de extensão desenvolvidas<br />
pela antiga <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de<br />
Minas Gerais (UREMG) que lhe deu origem. A<br />
investigação teve como eixo nortea<strong>do</strong>r a busca<br />
<strong>do</strong>s impactos produzi<strong>do</strong>s sobre estas atividades<br />
pelos convênios firma<strong>do</strong>s entre a UREMG e<br />
entidades norte-americanas, no perío<strong>do</strong> compreendi<strong>do</strong><br />
entre mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1940 e final<br />
<strong>do</strong>s anos 1960.<br />
Considerada como uma das finalidades<br />
da educação superior pela Lei de Diretrizes e Bases<br />
da Educação Nacional de 1996, a extensão<br />
universitária também está prevista como atividade<br />
obrigatória para as universidades brasileiras<br />
pela Constituição <strong>Federal</strong> de 1988.<br />
De to<strong>do</strong> mo<strong>do</strong>, o trabalho de extensão<br />
realiza<strong>do</strong> pelas universidades não tem atraí<strong>do</strong>,<br />
enquanto objeto de estu<strong>do</strong>, a atenção <strong>do</strong>s que<br />
têm se dedica<strong>do</strong> à analise <strong>do</strong>s problemas da<br />
educação superior em nosso país. Vários <strong>do</strong>s<br />
trabalhos existentes sobre o tema constituem<br />
relatos de experiência ou referem-se à realidade<br />
posterior à reforma universitária de 1968.<br />
Além disso, há uma curiosidade no que<br />
se refere à literatura sobre o tema – os poucos trabalhos<br />
existentes estão volta<strong>do</strong>s, em sua maioria,<br />
para a extensão rural. É o caso <strong>do</strong>s trabalhos de<br />
Fagundes (1985,1986), Fonseca (1985) e Freire<br />
(1979). Buscamos neles, principalmente nos <strong>do</strong>is<br />
primeiros, o suporte teórico para nossa investigação,<br />
consideran<strong>do</strong> que falar em Extensão na<br />
UREMG significa falar em Extensão Rural.<br />
Para Freire (1971), extensão significa<br />
a ação de estender algo a alguém; no caso <strong>do</strong><br />
extensionista, estender seus conhecimentos e<br />
suas técnicas.<br />
Da<strong>do</strong>s os fins deste trabalho – a extensão<br />
realizada por uma instituição universitária<br />
–, a<strong>do</strong>tamos em nossas análises a perspectiva<br />
de Fagundes (1986), para quem a universidade<br />
sempre esteve comprometida com algum grupo<br />
ou classe social.<br />
O autor critica a concepção de extensão<br />
como “modalidade de compromisso social da<br />
<strong>Universidade</strong> que se efetiva através da prestação<br />
de serviços, sobretu<strong>do</strong> dirigida aos ausentes da<br />
<strong>Universidade</strong>”, colocan<strong>do</strong> como objetivo principal<br />
da extensão “a integração e a melhoria da<br />
vida das comunidades aban<strong>do</strong>nadas e desintegradas”<br />
(FAGUNDES, 1986, p.109,110).<br />
Assim, para Fagundes,<br />
[...] o senti<strong>do</strong> da extensão, enquanto<br />
função da <strong>Universidade</strong>, reside no seu<br />
não-senti<strong>do</strong>. Quan<strong>do</strong> tiver contribuí<strong>do</strong><br />
para a deselitização <strong>do</strong> ensino e da pesquisa,<br />
para as transformações estruturais<br />
da sociedade e para a socialização da<br />
<strong>Universidade</strong>, a extensão tornar-se-á<br />
desnecessária, terá cumpri<strong>do</strong> a sua função<br />
como não-função da <strong>Universidade</strong><br />
(FAGUNDES, 1986, p.110).<br />
16<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
Foi à luz destas considerações que as<br />
práticas extensionistas da antiga UREMG foram<br />
aqui analisadas. Para tanto, foram utilizadas<br />
fontes primárias tais como atas de reuniões, regimentos,<br />
estatutos, cartas, jornais, fotografias e<br />
outros <strong>do</strong>cumentos, to<strong>do</strong>s localiza<strong>do</strong>s no acervo<br />
<strong>do</strong> Arquivo Central e Histórico da UFV.<br />
Origens da extensão universitária e da<br />
extensão rural<br />
As primeiras universidades nasceram<br />
a partir <strong>do</strong> século XII, ten<strong>do</strong> como função a<br />
transmissão <strong>do</strong> conhecimento mediante um<br />
ensino volta<strong>do</strong> para a formação e a reprodução<br />
<strong>do</strong>s quadros dirigentes. A partir <strong>do</strong> século XIX,<br />
na Alemanha, conferiu-se à universidade uma<br />
nova atribuição – a pesquisa.<br />
No que diz respeito à extensão como<br />
atividade universitária, ela apareceria, pela<br />
primeira vez, na Inglaterra, alguns anos após a<br />
Revolução Industrial, em razão das pressões que<br />
eram exercidas sobre a universidade pelas “[...]<br />
camadas que não usufruíam de seus benefícios”.<br />
Foi nesse contexto que a instituição<br />
começou “[...] a desenvolver algumas atividades<br />
para além de seus muros e de sua clientela tradicional<br />
[...]” (FAGUNDES, 1986, p.107).<br />
No que se refere à extensão rural, as<br />
primeiras experiências de que se tem notícia<br />
desenvolveram-se nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, vinculan<strong>do</strong>-se<br />
ao desenvolvimento da agricultura, a partir<br />
da segunda metade <strong>do</strong> século XIX. Esta prática<br />
extensionista iniciou-se através das associações<br />
agrícolas, fundadas por fazendeiros que tinham<br />
a finalidade de discutir e buscar soluções para<br />
os problemas relativos à comercialização e ao<br />
aumento da produtividade de suas culturas e<br />
da pecuária. Nestas associações eram realizadas<br />
palestras, reuniões, feiras e concursos, visan<strong>do</strong><br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
um contato mais estreito entre os chama<strong>do</strong>s<br />
farmers 2 .<br />
Neste mesmo perío<strong>do</strong>, começaram a<br />
ser instituí<strong>do</strong>s os Conselhos de Agricultura, os<br />
quais, junto com as associações, promoviam<br />
conferências públicas e cursos de curta duração<br />
conjuga<strong>do</strong>s aos trabalhos desenvolvi<strong>do</strong>s nos<br />
land grant colleges. Assim, em 1914, quan<strong>do</strong> o<br />
governo norte-americano editou o Smith Lever<br />
Act, a extensão agrícola já estava em marcha<br />
(RIBEIRO, 2006).<br />
De to<strong>do</strong> mo<strong>do</strong>, sem as estações experimentais,<br />
criadas a partir de então, a história da<br />
extensão teria si<strong>do</strong> no máximo uma mera sombra<br />
<strong>do</strong> que se conheceu no século XX. (BOWMAN,<br />
1962, p.537).<br />
Na verdade, ao serem cria<strong>do</strong>s, os land<br />
grant colleges tinham em vista a aplicação prática<br />
<strong>do</strong> conhecimento para a vida das pessoas em<br />
geral, o que implicava levá-lo para fora <strong>do</strong> campus.<br />
Deste mo<strong>do</strong>, tão logo inaugura<strong>do</strong>s, muitos<br />
colleges começaram a organizar atividades extra<br />
muros que envolviam cursos de curta duração<br />
e visitas para demonstração nas fazendas. A<br />
solicitação por esses serviços avolumou-se, levan<strong>do</strong><br />
alguns professores a produzirem artigos<br />
para jornais e boletins, além de continuarem<br />
frequentan<strong>do</strong> os encontros <strong>do</strong>s farmers. Logo<br />
estabeleceu-se nos land grant colleges a tripla<br />
função de ensino, pesquisa e extensão.<br />
No Brasil, as primeiras experiências<br />
de Extensão Universitária de que se tem notícia<br />
apareceram com a <strong>Universidade</strong> de São Paulo.<br />
Não a universidade paulista criada por Fernan<strong>do</strong><br />
de Azeve<strong>do</strong>, em 1934, mas uma outra, fundada<br />
como sociedade civil, em 1911. A instituição<br />
reunia então dez escolas superiores profissionais<br />
e uma escola superior de filosofia, história e literatura.<br />
Esta última, inaugurada, em 1914, como<br />
<strong>Universidade</strong> Popular, não contava com um<br />
quadro regular de professores e estudantes. Suas<br />
atividades consistiam em conferências semanais<br />
2 Utilizamos a palavra na língua inglesa, na qual o termo refere-<br />
-se a proprietários e trabalha<strong>do</strong>res rurais em geral, diferentemente<br />
da palavra fazendeiro de nosso idioma que está referida a grandes<br />
e médios proprietários.<br />
17
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
abertas e gratuitas e em cursos <strong>do</strong>s mais varia<strong>do</strong>s<br />
tipos, desde que não volta<strong>do</strong>s para propaganda<br />
política, religiosa ou comercial.<br />
De existência efêmera, contu<strong>do</strong>, como<br />
quase todas as instituições universitárias no Brasil<br />
<strong>do</strong> início <strong>do</strong> século XX, a universidade paulista<br />
encerrou suas atividades em poucos anos.<br />
Deste mo<strong>do</strong>, no que se refere especificamente<br />
à extensão rural, são sempre apontadas<br />
como pioneiras as experiências desenvolvidas<br />
em Viçosa.<br />
UREMG. Um breve histórico<br />
A UREMG foi criada em 1948, ten<strong>do</strong><br />
a sua origem na antiga Escola Superior de Agricultura<br />
e Veterinária <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais<br />
(ESAV). Inaugurada na Zona da Mata mineira,<br />
em 1926, pelo Presidente Arthur da Silva<br />
Bernardes, então presidente daquele esta<strong>do</strong>, a<br />
construção desta Escola deveu-se a um decreto<br />
governamental que data na verdade de 1920.<br />
A ESAV tinha entre as suas finalidades,<br />
definidas pelo seu Regulamento de 1926, a<br />
aquisição e a disseminação de conhecimentos<br />
“relativos à economia rural, em to<strong>do</strong>s os seus<br />
graus e modalidades”, deven<strong>do</strong> para tanto formar<br />
“agricultores com conhecimentos scientíficos<br />
necessários à exploração racional <strong>do</strong> solo”;<br />
“administra<strong>do</strong>res para os differentes serviços<br />
publicos e particulares que se relacionem com<br />
a vida agrícola em geral”; “technologistas para<br />
as industrias intimamente ligadas à agricultura”;<br />
“engenheiros agrônomos para os serviços de<br />
melhoramentos agrícolas”; “veterinários para<br />
exercício da medicina applicada aos animaes<br />
<strong>do</strong>mésticos” e “professores para o ensino agrícola<br />
em to<strong>do</strong>s os seus aspectos e especialidades” 3 .<br />
É interessante notar que a despeito de<br />
a ESAV ter si<strong>do</strong> concebida como instituição de<br />
ensino superior, a ela foi atribuí<strong>do</strong> não só o papel<br />
3 MINAS GERAES. Decreto n. 7323 de 25 de agosto de 1926.<br />
18<br />
de instituição de ensino para a formação de profissionais<br />
de nível superior, mas também, como<br />
apresenta<strong>do</strong> com clareza em seu Regulamento,<br />
o papel de difundir conhecimentos relaciona<strong>do</strong>s<br />
à atividade agrícola “em to<strong>do</strong>s os seus graus”.<br />
Do mesmo mo<strong>do</strong>, vale ainda notar que<br />
o ensino ministra<strong>do</strong> pela Escola deveria também<br />
ter “o intuito de educar a população agrícola <strong>do</strong><br />
Esta<strong>do</strong> em to<strong>do</strong>s os assumptos pertencentes à<br />
vida rural e melhorar as suas condições moraes,<br />
mentaes e econômicas, no mais breve tempo<br />
possível ” 4 .<br />
As primeiras aulas na ESAV foram<br />
ministradas para os cursos elementar e médio.<br />
Somente em 1928 teve início o curso superior<br />
de agronomia, contan<strong>do</strong> com nove alunos, que<br />
o concluiriam, em 1931. A primeira turma de<br />
veterinária começou o curso em 1932, contan<strong>do</strong><br />
com oito alunos que o concluiriam em 1935.<br />
Da<strong>do</strong>s os seus objetivos, o ensino, a<br />
pesquisa e a extensão sempre estiveram associa<strong>do</strong>s<br />
na Escola, entenden<strong>do</strong>-se a pesquisa<br />
como pesquisa aplicada, cujos resulta<strong>do</strong>s eram<br />
divulga<strong>do</strong>s através <strong>do</strong> trabalho de extensão.<br />
Concebida nos moldes <strong>do</strong>s land grant<br />
colleges 5 , escolas superiores agrícolas norte-<br />
-americanos, a ESAV teve, como seu primeiro<br />
diretor um especialista em ensino agrícola, contrata<strong>do</strong><br />
pelo governo de Minas Gerais junto ao<br />
governo <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Este especialista<br />
era o Dr. Peter Henry Rolfs, o qual chegou ao<br />
Brasil, em 1921, para coordenar os trabalhos de<br />
construção e implementação da Escola.<br />
Rolfs se tornou uma espécie de patriarca<br />
da instituição. Ele vinha <strong>do</strong> Florida Agricultural<br />
College, onde era reitor desde 1915, sen<strong>do</strong><br />
muito prestigia<strong>do</strong> no seu meio.<br />
Rolfs conferiu à ESAV um dinamismo<br />
próprio à sua personalidade. A Escola logo<br />
ganhou projeção, no país e na América Latina.<br />
Alguns anos após o seu afastamento da direção<br />
4 Idem.<br />
5 Sobre os land-grant colleges como modelo para a ESAV, ver<br />
Ribeiro (2006).<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
da ESAV, em 1929 6 , começaram, no entanto,<br />
os problemas na Escola.<br />
Em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1930, as atas de<br />
reuniões da Congregação registravam as dificuldades<br />
da Escola; elas se referiam aos obstáculos<br />
para a aquisição de material, ao atraso no pagamento<br />
de professores e funcionários, a pedi<strong>do</strong>s<br />
de demissão de professores e às dificuldades<br />
em novas contratações. Tais problemas que<br />
envolviam principalmente questões de ordem<br />
financeira não impediram o seu reconhecimento<br />
oficial pelo governo federal em 1935.<br />
De to<strong>do</strong> mo<strong>do</strong>, segun<strong>do</strong> relatos memoriais<br />
de ex-alunos e ex-professores da Escola,<br />
havia neste perío<strong>do</strong> muitos boatos afirman<strong>do</strong><br />
que ela seria desativada, dan<strong>do</strong> lugar a um<br />
quartel de polícia.<br />
Em 1938, apesar da crise, foi criada<br />
uma Estação Experimental. A partir de mea<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong>s anos 1940, foi se apresentan<strong>do</strong> uma tendência<br />
de reversão daquela situação. Antes da<br />
transformação da ESAV em UREMG, em 1948,<br />
a crise da instituição foi se dissipan<strong>do</strong>.<br />
A UREMG foi criada pela lei n.272 de<br />
13 de novembro de 1948. Esta lei estabeleceu<br />
que além de incorporar a antiga Escola Superior<br />
de Agricultura, a nova instituição contaria com<br />
a Escola Superior de Veterinária, que retornava<br />
a Viçosa após ter si<strong>do</strong> transferida para Belo<br />
Horizonte em 1943; com a Escola Superior de<br />
Ciências Domésticas, cuja criação era prevista<br />
naquela lei, e ainda com a Escola de Especialização,<br />
o Serviço de Experimentação e Pesquisa<br />
e o Serviço de Extensão, to<strong>do</strong>s também com<br />
criação prevista pelo mesmo ato.<br />
Com seus Estatutos aprova<strong>do</strong>s em<br />
1950, a UREMG deveria, segun<strong>do</strong> os mesmos,<br />
desenvolver de forma conjugada suas atividades<br />
de ensino, de pesquisa e de extensão.<br />
Houve, desde então, um intenso<br />
processo de expansão e modernização da instituição,<br />
que se estenderia até o início <strong>do</strong>s anos<br />
6 Neste ano, Rolfs transferia-se para Belo Horizonte, onde atuaria<br />
como Consultor Técnico de Agricultura <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas<br />
Gerais. Não há nas fontes levantadas nenhum indício das razões<br />
que levaram o Dr. Rolfs a afastar-se de Viçosa.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
1970. Para os estudiosos (BORGES et. al, 2000;<br />
GOMIDE, 2000; LOPES,1998), esta teria constituí<strong>do</strong><br />
a fase de maior prosperidade na história<br />
da atual <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa.<br />
Este processo vivi<strong>do</strong> pela UREMG, a<br />
partir <strong>do</strong> início <strong>do</strong>s anos 1950, teve também<br />
como cenário um projeto de modernização<br />
da produção agrícola para o país, o qual não<br />
deixava de ter relação com os investimentos de<br />
instituições norte-americanas na nossa universidade.<br />
Tal projeto atendia, em parte, interesses<br />
<strong>do</strong> governo norte-americano em sua estratégia<br />
de manter nosso país como economia agro-<br />
-exporta<strong>do</strong>ra inserida de forma subordinada ao<br />
merca<strong>do</strong> internacional e como alia<strong>do</strong> político no<br />
contexto da Guerra Fria que se iniciava.<br />
A Extensão na UREMG<br />
Desde os seus primórdios, quan<strong>do</strong><br />
estava ainda organizada como escola superior<br />
isolada (ESAV) a UREMG tratou de oferecer os<br />
seus serviços aos agricultores não só <strong>do</strong> esta<strong>do</strong><br />
de Minas Gerais, mas de to<strong>do</strong> o país.<br />
Vale notar que a ESAV desenvolvia um<br />
trabalho de contato direto junto aos agricultores<br />
da Zona da Mata mineira, realizan<strong>do</strong> visitas<br />
<strong>do</strong>s professores com seus alunos às fazendas e<br />
ministran<strong>do</strong> cursos para pequenos grupos de<br />
agricultores que vinham à Escola.<br />
A ESAV também difundia os trabalhos<br />
realiza<strong>do</strong>s através de publicações como jornais,<br />
boletins e revistas. Do mesmo mo<strong>do</strong>, a Escola<br />
participava regularmente de exposições e feiras<br />
de amostras estaduais, nacionais e em outros<br />
países da América Latina, ten<strong>do</strong> organiza<strong>do</strong>, a<br />
partir de 1932, a sua própria exposição anual,<br />
contan<strong>do</strong> ainda, desde 1931, com a Exposição<br />
<strong>do</strong> Milho (COMETTI, 2003).<br />
As constantes visitas de pequenos e<br />
médios proprietários rurais à Escola para cursos<br />
de breve duração acabou dan<strong>do</strong> origem, em<br />
19
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
1929, à “Semana <strong>do</strong> Fazendeiro”, evento que<br />
se inscreveu definitivamente no calendário da<br />
ESAV, perpetuan<strong>do</strong>-se pela <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong><br />
de Viçosa que a realiza anualmente.<br />
A finalidade original da Semana <strong>do</strong><br />
Fazendeiro era, além da propaganda <strong>do</strong> trabalho<br />
agrícola da Escola, a transmissão de conhecimentos<br />
ali produzi<strong>do</strong>s, vin<strong>do</strong> o agricultor receber<br />
orientações, nas suas estações experimentais,<br />
sobre como proceder em relação aos problemas<br />
enfrenta<strong>do</strong>s nas suas terras. Embora este caráter<br />
não tenha se perdi<strong>do</strong> completamente, décadas<br />
mais tarde, o evento iria adquirir também o<br />
senti<strong>do</strong> de feira de agronegócios.<br />
Para alguns autores (COMETTI, 2003;<br />
OLIVEIRA, 1987), a Semana <strong>do</strong> Fazendeiro<br />
pode ser considerada um marco na história da<br />
extensão rural no Brasil.<br />
Este evento anual contou, por um breve<br />
perío<strong>do</strong>, com sua versão feminina – o Mês<br />
Feminino – cria<strong>do</strong> possivelmente em razão da<br />
solicitação de mulheres fazendeiras que também<br />
compareciam aos encontros promovi<strong>do</strong>s pela<br />
Escola.<br />
Em 1939, foi cria<strong>do</strong> o Departamento de<br />
Educação Rural, que tornou-se responsável pela<br />
organização de todas as atividades de extensão<br />
da ESAV.<br />
Foi com a UREMG, todavia, que a<br />
extensão praticada pela universidade de Viçosa<br />
teve o seu reconhecimento.<br />
Em 1948, juntamente com a criação<br />
da UREMG, foi aprova<strong>do</strong> o Regimento <strong>do</strong> seu<br />
Serviço de Extensão. Ele contaria com um corpo<br />
de especialistas constituí<strong>do</strong> por conservacionistas<br />
de solos, zootecnistas, agrônomos, veterinários e<br />
orienta<strong>do</strong>ras de economia <strong>do</strong>méstica. Também<br />
estava prevista neste regimento a criação de<br />
escritórios regionais que atendessem diferentes<br />
regiões <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> de Minas Gerais.<br />
A UREMG já contava com uma boa<br />
infraestrutura para o desenvolvimento de suas<br />
atividades de extensão em to<strong>do</strong> o território<br />
mineiro, quan<strong>do</strong> começou a atuar juntamente<br />
20<br />
com a Associação de Crédito e Assistência Rural<br />
(ACAR).<br />
A ACAR resultou de acor<strong>do</strong>, assina<strong>do</strong><br />
em 1948, entre o governo estadual mineiro e a<br />
American International Association for Economic<br />
and Social Development (AIA), entidade filantrópica<br />
dirigida por Nelson Rockefeller.<br />
Segun<strong>do</strong> Oliveira, o surgimento da<br />
ACAR representou um marco institucional fundamental<br />
para a extensão rural e acabou pon<strong>do</strong><br />
em prática os ideais de uma nova filosofia de<br />
intervenção no campo, agora orientada por<br />
princípios educativos (OLIVEIRA, 1987).<br />
Deste mo<strong>do</strong>, além de voltar-se para<br />
a oferta de crédito aos trabalha<strong>do</strong>res agrícolas,<br />
a Associação prestaria serviços técnicos,<br />
desenvolvi<strong>do</strong>s por agrônomos que visitariam<br />
e inspecionariam os pequenos fazendeiros, e<br />
por supervisoras <strong>do</strong>mésticas que ensinariam às<br />
famílias noções de saneamento, nutrição e puericultura.<br />
Para tanto vieram <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s<br />
especialistas encarrega<strong>do</strong>s de treinar o pessoal<br />
que seria envolvi<strong>do</strong> neste trabalho.<br />
Posteriormente, a UREMG foi assumin<strong>do</strong><br />
a responsabilidade da formação deste<br />
pessoal. Contan<strong>do</strong> com profissionais de outras<br />
entidades, a UREMG ofereceu cursos que<br />
compreendiam o ensino teórico e prático de<br />
agricultura, veterinária, administração agrícola<br />
e crédito supervisiona<strong>do</strong> e, ainda,<br />
aulas de nutrição, horticultura, puericultura,<br />
carpintaria, higiene e saneamento,<br />
costura, sociologia, organização de<br />
clubes, e até ordenha e direção de jeeps 7<br />
conforme está registra<strong>do</strong> no Terceiro Relatório<br />
Anual da ACAR.<br />
Neste mesmo Relatório, afirma-se que<br />
foram lança<strong>do</strong>s nestes cursos “os alicerces para<br />
o estabelecimento de uma escola permanente<br />
7 Associação de Crédito e Assistência Rural (ACAR). Terceiro<br />
Relatório Anual, 1951, p.10,11.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
de economia <strong>do</strong>méstica para integrar o currículo<br />
de Viçosa” 8 .<br />
No início de 1952, a UREMG, em<br />
conjunto com a ACAR e o Ministério da Agricultura<br />
e outras entidades, como o Instituto de<br />
Assuntos Inter-Americanos, Secretarias estaduais<br />
de Agricultura e de Saúde, a AIA, os Colégios<br />
Americano de Porto Alegre e Bennett <strong>do</strong> Rio de<br />
Janeiro e a Embaixada <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, realizou,<br />
em suas instalações, um curso ministra<strong>do</strong><br />
por especialistas da ACAR e por <strong>do</strong>centes da<br />
própria UREMG, com duração de sete semanas,<br />
volta<strong>do</strong> para o treinamento de pessoal para atuar<br />
na área da Extensão Rural.<br />
No mesmo ano, a UREMG e a ACAR<br />
realizaram, em conjunto com a Secretaria de<br />
Agricultura de Minas Gerais, serviços intensivos<br />
de reabilitação rural em dez municípios da Zona<br />
da Mata mineira<br />
É interessante notar as considerações<br />
contidas num <strong>do</strong>cumento anterior a 1948, no<br />
qual deputa<strong>do</strong>s da Assembleia Legislativa de<br />
Minas Gerais, defenden<strong>do</strong> a transformação da<br />
antiga ESAV em universidade rural, propunham<br />
a criação de uma Escola Superior de Ciências<br />
Domésticas naquela instituição, observan<strong>do</strong><br />
que a<br />
falta de estabelecimento de ensino<br />
superior, onde a mulher possa receber<br />
educação objetiva em bases científicas<br />
e de aplicação imediata, tem si<strong>do</strong> em<br />
parte responsável pelo baixo standard<br />
de vida de nossas populações rurais 9 .<br />
o primeiro curso superior de Economia Doméstica<br />
no Brasil nascia, assim, intrinsecamente liga<strong>do</strong><br />
à Extensão Rural e como fruto <strong>do</strong>s acor<strong>do</strong>s de<br />
cooperação firma<strong>do</strong>s entre o Brasil e os Esta<strong>do</strong>s<br />
Uni<strong>do</strong>s no pós-guerra.<br />
Cabe considerar que logo após a assinatura<br />
<strong>do</strong>s acor<strong>do</strong>s de paz que puseram fim à<br />
8 Idem, p.10.<br />
9 ESTADO DE MINAS GERAIS. Anais da Assembléia Legislativa.<br />
Volume I I. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1947, p. 62.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
guerra, em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1940, as rivalidades<br />
entre Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e União Soviética foram<br />
crescen<strong>do</strong> de tal mo<strong>do</strong> que o mun<strong>do</strong> logo passou<br />
a viver o fenômeno da Guerra Fria. Na busca<br />
de estreitamento com seus alia<strong>do</strong>s, os Esta<strong>do</strong>s<br />
Uni<strong>do</strong>s anunciaram então o seu apoio a planos<br />
de reconstrução nacional, nos países europeus,<br />
e programas para o apoio ao desenvolvimento<br />
econômico de países da América Latina.<br />
Neste contexto, o Programa de Cooperação<br />
Técnica <strong>do</strong> Governo <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s<br />
foi lança<strong>do</strong> por Truman, ten<strong>do</strong> em seu bojo o<br />
chama<strong>do</strong> Ponto IV que, volta<strong>do</strong> para os países<br />
latino-americanos, prometia a assistência técnica<br />
aos “países amigos”.<br />
Segun<strong>do</strong> Noam Chomsky, o governo<br />
norte-americano preocupava-se, na verdade,<br />
com um nacionalismo de tipo novo que então<br />
emergia na América Latina, pregan<strong>do</strong> “o aumento<br />
da produção para atender às necessidades<br />
internas” (CHOMSKY, 1997, p. 74).<br />
Para o autor,<br />
Os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s se opunham a isso<br />
veementemente, e propuseram uma<br />
estratégia econômica para o continente<br />
americano, baseada na eliminação<br />
de todas as formas de nacionalismo<br />
econômico e na insistência em que o<br />
desenvolvimento da região fosse “complementar”<br />
ao <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Isso<br />
significaria que os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s teriam<br />
a indústria e a tecnologia mais avançadas,<br />
enquanto os peões na América<br />
Latina produziriam alimentos para exportação<br />
e se incumbiriam de um certo<br />
número de operações mais simples, que<br />
estavam ao seu alcance [...] (CHOMSKY,<br />
1997, p.74).<br />
No caso <strong>do</strong> Brasil, esta estratégia de<br />
intervenção sobre o chama<strong>do</strong> nacionalismo<br />
econômico tinha como alvo aquilo que Truman<br />
e Eisenhower consideravam “desenvolvimento<br />
industrial excessivo”, o qual levava ao temor da<br />
possibilidade de um desenvolvimento capaz de<br />
21
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
fazer face às grandes corporações norte-americanas<br />
na região ao sul <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r (CHOMSKY,<br />
1993).<br />
A despeito de tais considerações, não<br />
tardaram os vários convênios firma<strong>do</strong>s entre<br />
autoridades norte-americanas e as autoridades<br />
brasileiras, tanto com aquelas <strong>do</strong> governo federal<br />
quanto com aquelas <strong>do</strong>s governos estaduais.<br />
Um desses convênios, assina<strong>do</strong> com o<br />
governo de Minas Gerais, em 1951, envolvia a<br />
<strong>Universidade</strong> Rural de Minas Gerais 10 , estabelecen<strong>do</strong><br />
que os norte-americanos<br />
<strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s para a execução de um<br />
programa de cooperação agrícola.<br />
Para dar suporte à implementação deste<br />
acor<strong>do</strong>, era então cria<strong>do</strong> o Escritório Técnico<br />
de Agricultura (ETA), que tinha como “função em<br />
solo brasileiro ”, entre outras responsabilidades<br />
desenvolver projeto em educação e pesquisas<br />
agrícolas de conservação de recursos<br />
naturais, de fomento da produção<br />
agrícola, incluin<strong>do</strong> o planejamento de<br />
armazéns e silos e finalmente, da extensão<br />
rural (FONSECA, 1985, p.86,87).<br />
[...] forneceriam técnicos especializa<strong>do</strong>s<br />
para trabalharem na UREMG,<br />
dan<strong>do</strong> cursos de economia <strong>do</strong>méstica e<br />
de méto<strong>do</strong>s extensivos de agricultura e<br />
desenvolven<strong>do</strong> trabalho extensivo de agricultura,<br />
economia <strong>do</strong>méstica, nutrição<br />
e higiene rural (FONSECA, 1985, p.86).<br />
Contan<strong>do</strong> ainda com o patrocínio <strong>do</strong><br />
Instituto de Ensino Agrícola de Washington, este<br />
convênio foi decisivo para a implementação <strong>do</strong><br />
curso superior em Economia Doméstica e para a<br />
criação <strong>do</strong> Serviço de Extensão da <strong>Universidade</strong><br />
Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais.<br />
Foi, ainda, em razão <strong>do</strong>s trabalhos<br />
desenvolvi<strong>do</strong>s no bojo deste mesmo convênio,<br />
que a <strong>Universidade</strong> de Viçosa teria sua história<br />
irremediavelmente ligada à <strong>Universidade</strong> de<br />
Purdue, a qual, em 1952, enviava para Viçosa<br />
Anita Dickson e O. Winks. A primeira, escolhida<br />
pela sua experiência com a Extensão Rural nos<br />
EUA, vinha com o objetivo de implementar o<br />
curso de Economia Doméstica. Já Winks teria<br />
a responsabilidade de coordenar o Serviço de<br />
Extensão da UREMG.<br />
Em 1953, outro convênio substituía<br />
o anterior. A cooperação agora se dava nos<br />
marcos <strong>do</strong> acor<strong>do</strong> firma<strong>do</strong> entre o Ministério da<br />
Agricultura <strong>do</strong> Brasil e a Missão de Operações<br />
Em 1957, o ETA oficializou o Projeto<br />
39, um convênio com a UREMG, a ACAR, a<br />
Associação Brasileira de Crédito Agrícola (AB-<br />
CAR) 11 e a Associação de Crédito e Assistência<br />
Rural <strong>do</strong> Espírito Santo (ACARES), que levaria<br />
à criação, em 1958, de um Centro de Ensino<br />
de Extensão, localiza<strong>do</strong> no campus da UREMG.<br />
Este Centro ministraria, através da<br />
Escola Superior de Ciências Domésticas da<br />
UREMG, cursos de Extensão Rural, Economia<br />
Doméstica e Crédito Rural Supervisiona<strong>do</strong>.<br />
Para Fonseca (1985), o ETA representou,<br />
nas diretrizes da extensão rural brasileira,<br />
uma nova fase, colocan<strong>do</strong> em vista, além <strong>do</strong>s<br />
seus objetivos específicos, a busca da experimentação<br />
empírica, a valorização <strong>do</strong> tipo de<br />
trabalho exerci<strong>do</strong> pelo técnico extensionista, o<br />
caráter educativo <strong>do</strong> trabalho de extensão e a<br />
difusão da crença em alternativas comunitárias<br />
de autoajuda.<br />
A autora observa que nessa perspectiva,<br />
era necessário que os programas de extensão<br />
produzissem uma ação educativa capaz de<br />
mudar a mentalidade <strong>do</strong> homem <strong>do</strong> campo em<br />
prol das novas exigências feitas ao setor agrícola<br />
pela demanda da economia em seu processo de<br />
modernização (FONSECA, 1985).<br />
10 Sobre a participação da instituição nos convênios de assistência<br />
técnica com entidades norte-americanas, ver Ribeiro (2007).<br />
22<br />
11 Sobre a ABCAR, ver Lima (1985).<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
Além <strong>do</strong>s convênios menciona<strong>do</strong>s,<br />
outros tantos também envolveram a UREMG<br />
em atividades de extensão.<br />
Em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1950, impulsionada<br />
pelo suporte proveniente <strong>do</strong>s mesmos, a<br />
instituição desenvolvia de forma mais sistemática<br />
atividades já iniciadas no perío<strong>do</strong> da antiga<br />
ESAV, como demonstrações para agricultores<br />
em fazendas da região e a organização de feiras<br />
e exposições.<br />
Do mesmo mo<strong>do</strong>, a <strong>Universidade</strong> Rural<br />
de Minas Gerais renovava a prática extensionista<br />
em Viçosa, procuran<strong>do</strong> organizar associações<br />
rurais e realizan<strong>do</strong> novos tipos de eventos como<br />
a Semana Ruralista para Padres e a Semana Ruralista<br />
para freiras, ambas em 1954, e a Primeira<br />
Semana Ruralista Feminina, no ano seguinte.<br />
Ainda em 1954, a UREMG ofereceria<br />
um curso curto para Demonstra<strong>do</strong>res de Agentes<br />
Domésticos da ACAR, outro para mulheres<br />
religiosas e outro para pastores, conforme afirma<br />
Odemar Resende Pimenta, então Chefe <strong>do</strong><br />
Serviço de Extensão da <strong>Universidade</strong>, em carta<br />
enviada ao diretor <strong>do</strong> Departamento de Agricultura<br />
<strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.<br />
Neste perío<strong>do</strong>, houve, da parte <strong>do</strong> Serviço<br />
de Extensão, grande interesse na divulgação<br />
e criação de Cooperativas de Consumo e de<br />
Produção na Zona da Mata mineira.<br />
Dan<strong>do</strong> continuidade a uma prática<br />
a<strong>do</strong>tada nos tempos da ESAV, a UREMG produzia<br />
com frequência boletins sobre assuntos<br />
diversos, volta<strong>do</strong>s para os agricultores mineiros.<br />
Produzia também “circulares” que eram geralmente<br />
distribuídas por ocasião da Semana <strong>do</strong><br />
Fazendeiro.<br />
A partir de mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1960, as<br />
atividades de extensão da UREMG ainda se expandiam<br />
significativamente, envolven<strong>do</strong> novas<br />
unidades da instituição como o recém cria<strong>do</strong><br />
Instituto de Zootecnia, que passava a desenvolver,<br />
entre as suas atividades, a programação<br />
de cursos rápi<strong>do</strong>s volta<strong>do</strong>s para cria<strong>do</strong>res de<br />
animais e líderes rurais.<br />
Este processo de expansão teve seu<br />
ápice com a criação de um curso de pós-graduação<br />
em extensão na UREMG, em 1967 – o<br />
Mestra<strong>do</strong> em Extensão Rural. Desde então o<br />
mesmo passaria a receber estudantes de todas<br />
as regiões <strong>do</strong> país.<br />
Vale notar que a partir <strong>do</strong> início <strong>do</strong>s<br />
anos 1960, to<strong>do</strong>s os convênios que envolviam<br />
a UREMG com organismos norte-americanos<br />
passaram a ser coordena<strong>do</strong>s pela United States<br />
Agency for International Development (USAID).<br />
Apontada como instrumento por excelência<br />
da infiltração imperialista no Brasil, não<br />
por acaso, a USAID envolveria a UREMG, no<br />
final <strong>do</strong>s anos 1960, num treinamento técnico<br />
desenvolvi<strong>do</strong> para voluntários <strong>do</strong> Peace Corps,<br />
cujas atividades de propaganda anticomunista<br />
e de defesa <strong>do</strong> ideário norte-americano foram<br />
muitas vezes denunciadas antes <strong>do</strong> golpe de<br />
Esta<strong>do</strong> que, em 1964, levou o Brasil a uma<br />
ditadura militar.<br />
O treinamento, realiza<strong>do</strong> no campus da<br />
UREMG, era destina<strong>do</strong> a voluntários que então<br />
atuavam junto à população rural de pequenas<br />
comunidades localizadas nos esta<strong>do</strong>s de Minas<br />
Gerais, Rio de Janeiro e Mato Grosso, e que<br />
tentavam ali organizar clubes agrícolas.<br />
Para os rapazes <strong>do</strong>s Corpos da Paz,<br />
o treinamento incluía demonstrações práticas<br />
sobre agricultura, horticultura e silvicultura, e<br />
para as voluntárias eram feitas demonstrações<br />
práticas sobre preparação e conservação de alimentos,<br />
além <strong>do</strong> ensino de corte e costura. Em<br />
ambos os casos as atividades eram coordenadas<br />
por professores da UREMG e por professores da<br />
Purdue University.<br />
A despeito da promoção de atividades<br />
de extensão que atraíam grupos de to<strong>do</strong> o país,<br />
a UREMG privilegiava na sua prática extensionista<br />
o público <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> de Minas Gerais,<br />
especialmente a população da Zona da Mata<br />
mineira. Deste mo<strong>do</strong>, ela realizou, também em<br />
parceria com a USAID e a ACAR, cursos para<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
23
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
feirantes de Viçosa sobre técnicas de produção<br />
de hortaliças e outros.<br />
As atividades de extensão rural desenvolvi<strong>do</strong>s<br />
pela UREMG, ao longo das décadas de<br />
1950 e 1960, não só a projetaram para além das<br />
fronteiras de Minas Gerais, mas se constituíram<br />
como um <strong>do</strong>s elementos dinamiza<strong>do</strong>res da vida<br />
acadêmica na instituição.<br />
Conjugada ao ensino e à pesquisa, a<br />
extensão na UREMG contribuiu significativamente<br />
para um processo acelera<strong>do</strong> de modernização,<br />
expresso no aparecimento de novos<br />
cursos de graduação e pós-graduação, assim<br />
como de novas frentes de pesquisa.<br />
Esse processo de modernização, impulsiona<strong>do</strong>,<br />
em grande parte, pela extensão,<br />
nos leva a pensar que a UREMG, buscan<strong>do</strong> no<br />
início a sua adaptação funcional às demandas da<br />
sociedade, acabou por consolidar a vocação, já<br />
demonstrada pela antiga ESAV, de uma universidade<br />
de prestação de serviços, antecipan<strong>do</strong>-se<br />
a uma tendência mundial seguida pelas universidades<br />
no final <strong>do</strong> século XX.<br />
Já reconhecida nacionalmente como<br />
centro de referência da extensão rural no Brasil,<br />
a UREMG, ao tornar-se, em 1969, <strong>Universidade</strong><br />
<strong>Federal</strong> de Viçosa, tinha, assim, a sua reputação<br />
consolidada nesta área.<br />
Considerações Finais<br />
A despeito <strong>do</strong> pioneirismo da ESAV, foi<br />
com a UREMG que nossa instituição tornou-se<br />
referência para a Extensão Rural no país.<br />
A experiência de extensão rural desenvolvida<br />
pela UREMG não pode ser compreendida<br />
senão no contexto <strong>do</strong> intenso processo de<br />
modernização vivi<strong>do</strong> pela agricultura brasileira,<br />
a partir <strong>do</strong> pós-guerra. Por outro la<strong>do</strong>, não há<br />
como ignorar que este processo esteve inseri<strong>do</strong><br />
nos marcos da cooperação bilateral Brasil-Esta<strong>do</strong>s<br />
Uni<strong>do</strong>s, no mesmo perío<strong>do</strong>, constituin<strong>do</strong><br />
a UREMG uma peça chave na estratégia <strong>do</strong><br />
governo norte-americano de garantir um certo<br />
controle sobre a produção de alimentos no Brasil<br />
e de assegurar o apoio <strong>do</strong> nosso governo aos<br />
Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s na batalha da Guerra Fria.<br />
Neste contexto, a extensão rural constituiu<br />
um eficiente instrumento para os norte-<br />
-americanos. Os extensionistas prepara<strong>do</strong>s pelos<br />
mesmos e imbuí<strong>do</strong>s de seus valores e ideais<br />
apresentavam-se às comunidades rurais credencia<strong>do</strong>s<br />
como técnicos especializa<strong>do</strong>s e difusores<br />
<strong>do</strong> progresso e promotores <strong>do</strong> bem-estar social.<br />
Garantia-se, assim, o controle de áreas<br />
e merca<strong>do</strong>s tradicionais <strong>do</strong>s EUA e se legitimava<br />
a sua pretensa “missão civiliza<strong>do</strong>ra”.<br />
Vale notar que o trabalho <strong>do</strong>s extensionistas<br />
contribuiu decisivamente para apaziguar<br />
a animosidade de uma população miserável e<br />
pre<strong>do</strong>minantemente rural, objeto de um trabalho<br />
educativo no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> seu disciplinamento.<br />
A história da extensão universitária<br />
no Brasil tem na ESAV um importante marco.<br />
Voltada para o ensino prático e para a busca de<br />
soluções imediatas para os problemas da agricultura,<br />
a instituição começou a difundir, desde<br />
os seus primórdios, o conhecimento produzi<strong>do</strong>.<br />
Pelo próprio caráter da instituição, sua prática extensionista<br />
esteve, todavia, voltada inteiramente<br />
para a extensão rural.<br />
24<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RIBEIRO, M.G.M. A Extensão Rural na <strong>Universidade</strong> Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (UREMG). 1948-1969<br />
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Texto recebi<strong>do</strong> em 19 de fevereiro de 2009.<br />
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Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 15-25, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
25
Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s<br />
projetos de extensão da ufpe no perío<strong>do</strong> 2006 - 2008<br />
Extension policy: the environmental education projects in view of<br />
extended UFPE during 2006 - 2008<br />
Políticas de extensión: la educación medioambiental en la perspectiva<br />
de los proyectos de extensión de la UFPE en el perio<strong>do</strong> 2006-2008<br />
Jowania Rosas 1<br />
Christina Nunes 2<br />
RESUMO<br />
O presente artigo propõe, em primeiro lugar, dar um passeio pelo tema Educação ambiental, seus conceitos,<br />
e apresentan<strong>do</strong> alguns esforços <strong>do</strong>s órgãos internacionais na conscientização da sociedade. Em segun<strong>do</strong> lugar<br />
mostrar o empenho desenvolvi<strong>do</strong> pela Pró-Reitoria de Extensão da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Pernambuco,<br />
na busca de uma política extensionista forte dentro da comunidade acadêmica, seu compromisso social<br />
na formação profissional <strong>do</strong> aluno. Finalmente, mostrar os projetos de extensão registra<strong>do</strong>s na PROEXT<br />
volta<strong>do</strong>s para a Educação Ambiental. Como aporte meto<strong>do</strong>lógico foi utilizada pesquisa exploratória conduzida<br />
como estu<strong>do</strong> de caso, através de da<strong>do</strong>s forneci<strong>do</strong>s por esta Pró-Reitoria, com foco em projetos de<br />
extensão na temática educação ambiental, no perío<strong>do</strong> 2006 a 2008. Os resulta<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s confirmaram,<br />
ainda que os índices de envolvimento da comunidade embora tími<strong>do</strong>s demonstram um crescimento de 8%<br />
<strong>do</strong>s <strong>do</strong>centes, 4% <strong>do</strong>s discentes e 8% <strong>do</strong>s técnico-administrativos envolvi<strong>do</strong>s em projetos na área abordada.<br />
Além disso, <strong>do</strong>s 493 projetos registra<strong>do</strong>s neste perío<strong>do</strong> só 6% são volta<strong>do</strong>s ao tema, mas com o apoio da<br />
Administração central, o quadro tende a ser reverti<strong>do</strong>, provavelmente, em médio prazo.<br />
Palavras-chave: Política de Extensão; Educação ambiental; projetos de extensão.<br />
ABSTRACT<br />
This article proposes, first, give a tour of subject concepts and their environmental education efforts of presenting<br />
some international bodies in the awareness of society. Second show the commitment undertaken by the<br />
Pro-Dean for Extension, <strong>Federal</strong> University of Pernambuco, in search of a strong extension within the academic<br />
community, its social commitment in the training of the student. Finally show the extent of projects registered<br />
in PROEXT toward Environmental Education. Intake was used as metho<strong>do</strong>logical research survey conducted<br />
as a case study, using data provided by the Pro-Rectory, with a focus on projects in the thematic scope of<br />
environmental education in the period 2006 to 2008. The results confirmed, although the levels of community<br />
involvement is limited to an 8% growth for teachers, 4% of the students, 8% of the technical-administrative<br />
involved in projects in the area addressed. Moreover, the 493 projects registered during this period only 6%<br />
are dedicated to the theme, but with the support of central government, the framework tends to be reversed,<br />
probably in the medium term.<br />
Keywords: Extension Policy; Environmental Education; Extension Projects.<br />
1 Coordena<strong>do</strong>ra de Gestão da Informação da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Pernambuco-UFPE -Pró-Retoria de Extensão-PROEXT,<br />
Mestranda em Gestão Pública para o Desenvolvimento <strong>do</strong> Nordeste-MPANE. Email: jowania.rosas@ufpe.br. Fone: (81) 21268138<br />
2 Coordena<strong>do</strong>ra de Gestão da Extensão da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Pernambuco-UFPE -Pró-Reitoria de Extensão-PROEXT.<br />
Especialista em Gestão Pública.Email: christina.nunes@ufpe.br. Fone: (81) 21268609<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
27
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
RESUMEN<br />
En este artículo se propone, en primer lugar,<br />
dar un paseo en el tema de educación ambiental,<br />
sus conceptos, y la presentación de algunos<br />
esfuerzos de los organismos internacionales en<br />
la sensibilización de la sociedad. En segun<strong>do</strong><br />
lugar muestran el compromiso asumi<strong>do</strong> por el<br />
Pro-Decano de Extensión, Universidad <strong>Federal</strong><br />
de Pernambuco, en la búsqueda de una fuerte<br />
ampliación en la comunidad académica, su<br />
compromiso social en la formación del estudiante.<br />
Por último mostrar la magnitud de<br />
los proyectos registra<strong>do</strong>s en PROEXT hacia<br />
la Educación Ambiental. Ingesta se utilizó<br />
como meto<strong>do</strong>logía la investigación realizada<br />
como estudio de caso, utilizan<strong>do</strong> los datos<br />
proporciona<strong>do</strong>s por la Pro-Rectoría, con un<br />
enfoque en proyectos en el ámbito temático<br />
de la educación ambiental en el perío<strong>do</strong> 2006<br />
a 2008. Los resulta<strong>do</strong>s confirma<strong>do</strong>s, aunque<br />
los niveles de participación de la comunidad,<br />
pero tími<strong>do</strong>s, muestran un crecimiento del 8%<br />
de los <strong>do</strong>centes, el 4% y 8% de los estudiantes<br />
de técnicos y administrativos que participan<br />
en proyectos en el ámbito aborda<strong>do</strong>. Por otra<br />
parte, los 493 proyectos registra<strong>do</strong>s durante<br />
este perío<strong>do</strong> sólo el 6% están dedica<strong>do</strong>s al<br />
tema, pero con el apoyo del gobierno central,<br />
el marco tiende a ser reversible, probablemente<br />
en el mediano plazo.<br />
Palabras-clave: Políticas de Extensión; Educación<br />
ambiental; Proyectos para ampliar.<br />
Introdução<br />
As universidades públicas tem como<br />
alicerce de sua missão a formação profissional e<br />
um papel de destaque na sociedade sen<strong>do</strong> uma<br />
das responsáveis pela sua consciência crítica.<br />
Essa responsabilidade passa pela extensão universitária,<br />
que forma com o ensino e a pesquisa<br />
os pilares da universidade, e essa relação de<br />
indissociabilidade dá à extensão, entre outras<br />
atribuições, a de contribuir para reduzir as diferenças<br />
sociais criadas pelo sistema capitalista.<br />
As atividades extensionistas,<br />
dentro <strong>do</strong> universo acadêmico, vêm enfrentan<strong>do</strong>,<br />
ao longo <strong>do</strong>s anos, novos e constantes<br />
desafios, tanto nas formas de articulação entre<br />
o saber universitário e suas práticas quanto na<br />
concepção de sua própria existência e de seu<br />
verdadeiro papel.<br />
Para alguns autores a extensão oxigena<br />
o ensino como fonte de enriquecimento<br />
intelectual, social e cultural; para outros, ela<br />
assume, ainda, uma forma assistencialista buscan<strong>do</strong><br />
suprir a função <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />
A temática da sustentabilidade vem<br />
paulatinamente ocupan<strong>do</strong> espaços na extensão<br />
universitária, e a educação é, segun<strong>do</strong> Mayor<br />
(1998), a chave para o desenvolvimento sustentável.<br />
A cultura de sustentabilidade, ainda<br />
em processo de construção, vem se tornan<strong>do</strong><br />
cada vez mais uma exigência da sobrevivência<br />
humana, o que permite que os membros de<br />
uma sociedade moderna possam incorporar<br />
mudanças de concepções de forma a promover<br />
atitudes e comportamentos que os tornem mensageiros<br />
de uma efetiva cultura, considerada<br />
sustentável.<br />
É nesse contexto que as universidades,<br />
como “lócus” da construção e difusão de<br />
conhecimentos e de formação de consciências<br />
críticas, devem trabalhar para preparar novas<br />
gerações para um futuro viável com ações<br />
multiplica<strong>do</strong>ras, e só através delas os atores<br />
institucionais, segun<strong>do</strong> Paulo Freire (1997),<br />
sujeitos históricos, serão capazes de contribuir<br />
para a transformação de suas realidades, suas<br />
vidas quotidianas e profissionais.<br />
No tripé que forma a missão universitária,<br />
é a extensão que se destaca pela função<br />
social que exerce de forma mais ampla, e pela<br />
maior possibilidade de provocar transformações<br />
nos ambientes de sua execução; e dentre as<br />
tipologias de ação, a que consegue promover<br />
de forma mais ampla e consistente as mudanças<br />
na realidade social são os projetos de extensão,<br />
foco <strong>do</strong> nosso estu<strong>do</strong>.<br />
São os projetos que têm um papel<br />
mais relevante nessa integração universidade-<br />
28<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
-sociedade. Eles mesclam conhecimentos<br />
científicos e populares, as teorias e práticas<br />
pedagógicas e vão mais além, são vias de mão<br />
dupla que permitem à universidade trabalhar<br />
a formação <strong>do</strong> aluno e sua interação com a<br />
sociedade.<br />
A extensão universitária tornou-se<br />
obrigatória em to<strong>do</strong>s os estabelecimentos de<br />
ensino superior em 1968, através da Lei 5.540.<br />
A partir daí surge um novo paradigma para a<br />
universidade brasileira, sua relação com a sociedade<br />
e o papel da extensão neste contexto.<br />
Em 1987 foi cria<strong>do</strong> o Fórum de<br />
Pró-Reitores de Extensão - FORPROEXT - e<br />
posteriormente aprovada na Constituição o<br />
princípio de indissociabilidade <strong>do</strong> ensino – pesquisa-extensão<br />
3 . O FORPROEXT criou o Plano<br />
Nacional de Extensão, publica<strong>do</strong> em 1999, em<br />
que estabelece um conceito de extensão 4 , e são<br />
didaticamente constituídas em quatro eixos:<br />
impacto e transformação, interação dialógica,<br />
interdisciplinaridade, indissociabilidade ensino-<br />
-pesquisa-extensão.<br />
O Plano Nacional de Extensão, além<br />
de definir a política de extensão, que inclui o<br />
conceito, as diretrizes e as finalidades, define<br />
ainda todas as suas áreas temáticas, que estão<br />
correlacionadas às áreas <strong>do</strong> conhecimento<br />
definidas pelo CNPq 5 . Assim, as ações são<br />
classificadas: comunicação, cultura, direitos<br />
humanos e justiça, educação, saúde, tecnologia<br />
e produção, trabalho e, finalmente, meio<br />
ambiente.<br />
Este artigo tem por finalidade, inicialmente,<br />
viajar pelo conceito da Educação<br />
Ambiental desenvolvi<strong>do</strong> por diversos autores.<br />
Posteriormente socializar o trabalho desenvol-<br />
3 “Art 207. As universidades gozam de autonomia didático-<br />
-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial<br />
e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre o ensino,<br />
pesquisa e extensão”.<br />
4 “A Extensão Universitária é o processo educativo, cultural e<br />
científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável<br />
e viabiliza a relação transforma<strong>do</strong>ra entre a <strong>Universidade</strong> e a<br />
Sociedade”.<br />
5 Áreas <strong>do</strong> Conhecimento: Ciências Exatas e da Terra, Biológica,<br />
Engenharia/Tecnologia, Saúde, Agrárias, Sociais, Humanas,<br />
Lingüística, Letras e Artes.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
vi<strong>do</strong> pela Pró-Reitoria de Extensão da <strong>Universidade</strong><br />
<strong>Federal</strong> de Pernambuco no fortalecimento<br />
dessa modalidade de atividade extensionista na<br />
comunidade acadêmica e na sensibilização de<br />
professores, alunos e técnicos para a importância<br />
da extensão, mediante o desenvolvimento<br />
de projetos volta<strong>do</strong>s prioritariamente para<br />
setores historicamente excluí<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s direitos e<br />
da cidadania.<br />
Finalmente, apresentar os projetos<br />
de extensão na temática Educação Ambiental,<br />
analisan<strong>do</strong> sua evolução de 2006 a 2008 e sua<br />
importância dentro <strong>do</strong> contexto atual. A meto<strong>do</strong>logia<br />
utilizada é exploratória, quantitativa e<br />
<strong>do</strong>cumental com os indica<strong>do</strong>res forneci<strong>do</strong>s pela<br />
Pró-Reitoria de Extensão e pelo SIEX – Sistema<br />
de Informação de Extensão.<br />
Os resulta<strong>do</strong>s mostram-se, na atualidade,<br />
acanha<strong>do</strong>s, já que só 5% da comunidade<br />
acadêmica, formada por <strong>do</strong>centes, discentes e<br />
técnicos, correspondente a 3874 pessoas, está<br />
envolvida com o tema Educação Ambiental.<br />
Além disso, <strong>do</strong> público de 703.697 atendi<strong>do</strong><br />
direta e indiretamente por projetos de extensão<br />
só 4%, não mais que 28.166, são pessoas<br />
beneficiadas pelos projetos extensionistas nesta<br />
área temática.<br />
É fundamental conscientizar nossos<br />
<strong>do</strong>centes e discentes que o papel da universidade<br />
não é só transformar o aluno em profissional<br />
competente e cidadão comprometi<strong>do</strong> com a<br />
realidade, educan<strong>do</strong> para o desenvolvimento<br />
sustentável <strong>do</strong> planeta, mas, também, buscar<br />
transformar a universidade e a sociedade através<br />
da produção <strong>do</strong> conhecimento pautada em<br />
princípios volta<strong>do</strong>s à democracia, a qualidade<br />
e o compromisso social.<br />
Marco Teórico<br />
Estudar e compreender o tema Gestão<br />
Ambiental é um dever de to<strong>do</strong>s, sejam eles gesto-<br />
29
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
res em todas as esferas de governo, seja federal,<br />
estadual e municipal, como também professores<br />
e estudantes em to<strong>do</strong>s os níveis de escolaridade<br />
formais ou informais.<br />
Por isso concordamos com Philippi Jr.<br />
(2005) quan<strong>do</strong> afirma que Educação Ambiental<br />
deve formar e preparar cidadãos para a reflexão<br />
crítica e para uma ação social corretiva ou transforma<strong>do</strong>ra<br />
<strong>do</strong> sistema, de forma a tornar viável<br />
o desenvolvimento integral <strong>do</strong>s seres humanos.<br />
A Comunidade como um to<strong>do</strong>, representada<br />
pelos seus diversos segmentos da sociedade<br />
civil organizada deve, também, despertar<br />
para os problemas ambientais e ter consciência<br />
de que sua participação é fundamental para<br />
melhoria <strong>do</strong> ambiente para as gerações presentes<br />
e futuras.<br />
A Educação Ambiental, também vista<br />
como um processo de educação política que<br />
busca, conforme Pelicioni (2005), formar consciência<br />
crítica em direção a uma ação transforma<strong>do</strong>ra,<br />
onde a cidadania seja exercida a fim<br />
de melhorar a qualidade de vida da sociedade.<br />
Leff (2001) afirma que a educação é<br />
um processo em que devemos congregar concepções<br />
de ordens socioambientais, ecológicas,<br />
éticas e estéticas objetivan<strong>do</strong> construir novas<br />
formas de pensar a preservação e a recuperação<br />
<strong>do</strong> nosso ambiente. Temas como: acidentes<br />
nucleares, camada de ozônio, poluição marinha<br />
e atmosférica devem permear sempre os conteú<strong>do</strong>s<br />
programáticos das escolas e universidades.<br />
A Conferência Intergovernamental<br />
sobre Educação Ambiental, organizada pela<br />
UNESCO 6 e Pnuma 7 aprovaram a Declaração<br />
de Tbilisi 8 em que convoca os esta<strong>do</strong>s-membros<br />
9 através de suas autoridades educacionais<br />
6 A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência<br />
e a Cultura (UNESCO) fun<strong>do</strong>u-se a 16 de Novembro de 1945<br />
com o objectivo de contribuir para a paz e segurança no mun<strong>do</strong><br />
mediante a educação, a ciência, a cultura e as comunicações.<br />
7 Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNU-<br />
MA - foi cria<strong>do</strong> em 1972 para coordenar as ações internacionais<br />
de proteção ao meio ambiente e de desenvolvimento sustentável.<br />
8 Tbilisi é a capital e maior cidade da República da Geórgia,<br />
nas margens <strong>do</strong> rio Kura.<br />
9 Organização das Nações Unidas (ONU) foi fundada oficialmente<br />
a 24 de Outubro de 1945 em São Francisco. A sua sede atual<br />
30<br />
(universidades) a ativarem pesquisas na área<br />
em questão, intercâmbios, além de criarem uma<br />
política de educação voltada para conteú<strong>do</strong>s,<br />
diretrizes e atividades ambientais que promovam<br />
a conscientização populacional.<br />
O Congresso de NICE sobre interdisciplinaridade<br />
nas universidades, em 1970, foi<br />
fundamental para ratificar uma proposta de consolidação<br />
da construção de um conhecimento<br />
volta<strong>do</strong> à integração <strong>do</strong> homem com a natureza e<br />
os ecossistemas. Essas ideias vieram ao encontro<br />
<strong>do</strong> pensamento de Edgar Morin em seu livro “o<br />
méto<strong>do</strong>”, em que aborda a “complexidade como<br />
um méto<strong>do</strong> de auto-organização das disciplinas<br />
na perspectiva de uma ecologia global.”<br />
Essa interdisciplinariedade a<strong>do</strong>tada<br />
como propósito explicito em diversos programas<br />
e tratada também em Tbilisi, além de ter uma<br />
abordagem holística é um ponto de referência<br />
constante em projetos educacionais, principalmente<br />
nas universidades.<br />
A interdisciplinariedade ambiental,<br />
consolidadada em 1990 na América Latina, é<br />
para Leff (2001) o “ questionamentos <strong>do</strong>s paradigmas<br />
<strong>do</strong>minantes, da formação de professores<br />
e da incorporação de saberes ambientais nos<br />
programas curriculares”.<br />
Os eixos conceituais antropocentrismo<br />
10 e ecocentrismo 11 de Eckersley (1992) que<br />
aborda a sociabilidade humana mostra a educação<br />
ambiental como proposta interdisciplinar<br />
onde devem ser trabalhadas a integração <strong>do</strong><br />
homem com a natureza, seja ele como elemento<br />
principal ou parte <strong>do</strong>s ecossistemas.<br />
Finalizamos com Morin (2004) quan<strong>do</strong><br />
traz uma visão transdisciplinar da educação em<br />
seu livro “Os sete saberes necessários a educação<br />
<strong>do</strong> futuro”. Esses saberes tão basilares para<br />
a qualidade <strong>do</strong> ensino devem contribuir para<br />
é na cidade de Nova Iorque.Em 2006 a ONU tem representação<br />
de 192 Esta<strong>do</strong>s-Membros<br />
10 Antropocentrismo – concepção que considera que a humanidade<br />
deve permanecer no centro <strong>do</strong> entendimento <strong>do</strong>s humanos,<br />
isto é, o universo deve ser avalia<strong>do</strong> de acor<strong>do</strong> com a sua relação<br />
com o homem.<br />
11 Ecocentrismo – concepção em que o homem é apenas um<br />
elemento da natureza.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
conscientizar a “comunidade planetária” <strong>do</strong><br />
seu compromisso na busca de uma sociedade<br />
sustentável, através da educação ambiental,<br />
apoiada na ética, equidade e na justiça social.<br />
Publicizan<strong>do</strong> os números da Pró-Reitoria<br />
de Extensão<br />
A <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Pernambuco,<br />
no espírito empreende<strong>do</strong>r, elaborou o<br />
Planejamento Estratégico Institucional - PEI -<br />
com o objetivo de nortear a instituição para os<br />
próximos 10 anos.<br />
Nesse <strong>do</strong>cumento, a extensão tem<br />
como metas “adequar a atual política de<br />
extensão às tendências de desenvolvimento<br />
social; intensificar atividades integra<strong>do</strong>res de<br />
ensino-pesquisa-extensão; fortalecer as oportunidades<br />
e espaços de discussão, socialização<br />
de experiência, atualização de conhecimento e<br />
interação com a sociedade entre outras de igual<br />
relevância”. 12<br />
Nesta perspectiva, apresentamos da<strong>do</strong>s<br />
coleta<strong>do</strong>s na Pró-Reitoria de Extensão, demonstran<strong>do</strong>,<br />
na Tabela 1, sua evolução nas diversas<br />
áreas, na Tabela 2 os recursos financeiros, e na<br />
Tabela 3 as bolsas concedidas, seja pelo tesouro<br />
ou captadas através de convênios no perío<strong>do</strong> de<br />
2006 a 2008; observa-se, através <strong>do</strong>s números,<br />
uma demonstração clara de eficiência, eficácia<br />
e efetividade em favor da sociedade tanto em<br />
quantitativo de projetos, <strong>do</strong>centes, discentes e<br />
público, quanto em recursos aloca<strong>do</strong>s para atender<br />
essas demandas da comunidade acadêmica<br />
e da sociedade.<br />
TABELA 1<br />
Itens 2006 2007 2008 Total<br />
Projetos<br />
143 166 216<br />
Registra<strong>do</strong>s<br />
525<br />
Docentes<br />
299 411 739<br />
Envolvi<strong>do</strong>s<br />
1.449<br />
Discentes<br />
1.056 833 1.071<br />
Envolvi<strong>do</strong>s<br />
2.960<br />
Técnicos<br />
77 111 20<br />
Envolvi<strong>do</strong>s<br />
208<br />
Parcerias 208 202 111<br />
521<br />
Bolsas<br />
319 254 344<br />
Concedidas<br />
917<br />
Público<br />
175.935 211.017 422.624<br />
Atendi<strong>do</strong><br />
1.080.448<br />
FONTE: PROEXT – COORD. DE GESTÃO DA EXTENSÃO<br />
TABELA 2<br />
Ano Próprios 1 Tesouro Total<br />
2006 2.190.748,01 404.512,67 2.595.260,68<br />
2007 2.038.140,00 628.907,00 2.667.047,00<br />
2008 1.465.552,68 855.396,00 2.295.843,34<br />
Total 5.694.440,69 1.888.815,67 7.558.151,02<br />
FONTE: PROEXT - COORD. DE GESTÃO ORGANIZACIONAL<br />
TABELA 3<br />
Ano<br />
Tesouro<br />
Bolsas Concedidas<br />
Captadas<br />
2006 118 371<br />
2007 131 412<br />
2008 162 181<br />
Total 411 964<br />
FONTE: PROEXT – COORD. DE GESTÃO ORGANIZACIONAL<br />
A PROEXT continua na busca de defender<br />
uma concepção de extensão universitária<br />
como função acadêmica de caráter educativo,<br />
cultural e científico e de aperfeiçoar seus mecanismos,<br />
visan<strong>do</strong> contribuir no processo de transformação<br />
social. Além disso, vem envidan<strong>do</strong><br />
esforços na sensibilização da comunidade interna<br />
para as atividades extensionistas, principalmente<br />
para a modalidade de projetos de extensão,<br />
canal mais efetivo e consistente de reafirmar e<br />
dar visibilidade ao compromisso social da UFPE.<br />
12 Planejamento Estratégico da UFPE -2003.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
31
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
Os Projetos de Extensão na Temática<br />
Educação Ambiental<br />
Uma das formas, segun<strong>do</strong> Munhoz<br />
(2004), de levar a educação ambiental à sociedade<br />
é pelas mãos <strong>do</strong>s professores, de to<strong>do</strong>s os<br />
níveis, principalmente em atividades extracurriculares.<br />
Os projetos extensionistas tornam-se<br />
uma grande oportunidade acadêmica de aprendizagem<br />
teórico-prática, de mostrar aos alunos<br />
a realidade, seus problemas e levá-los a refletir,<br />
criticar e reposicionar atitudes e ações com relação<br />
ao meio ambiente e sua degradação.<br />
Conforme o Gráfico 4 a UFPE apresenta<br />
da<strong>do</strong>s anima<strong>do</strong>res frente às <strong>Universidade</strong>s<br />
Federais no Nordeste 13 na área foco <strong>do</strong> nosso<br />
estu<strong>do</strong>. São 32 projetos registra<strong>do</strong>s na temática<br />
meio ambiente, o que significa 29% <strong>do</strong> total de<br />
projetos registra<strong>do</strong>s nas demais áreas temáticas.<br />
GRÁFICO 4<br />
TABELA 5<br />
ANO<br />
PROJETOS<br />
REGISTRADOS<br />
PROJETOS<br />
REGISTRADOS<br />
TEMÁTICA<br />
MEIO<br />
AMBIENTE PERCENTUAL PÚBLICO<br />
2006 143 10 7% 11.428<br />
2007 166 8 5% 5.340<br />
2008 216 14 6% 11.398<br />
TOTAL 525 32 18% 28.166<br />
FONTE: PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO – COORD. DE GESTÃO<br />
DA EXTENSÃO<br />
O estu<strong>do</strong> permitiu-nos traduzir no<br />
Gráfico 6 a distribuição <strong>do</strong>s projetos por Centros<br />
Acadêmicos. Observa-se que, consideran<strong>do</strong> a<br />
transversalidade <strong>do</strong> tema, o mesmo é pre<strong>do</strong>minantemente<br />
objeto de projetos oriun<strong>do</strong>s de<br />
cursos como Ciências Geográficas, localiza<strong>do</strong> no<br />
Centro de Filosofia e Ciências Humanas – CFCH<br />
–, segui<strong>do</strong> <strong>do</strong> Centro Acadêmico <strong>do</strong> Agreste –<br />
CAA – onde os projetos estão concentra<strong>do</strong>s nos<br />
cursos de Design e Engenharia; segui<strong>do</strong> <strong>do</strong> Centro<br />
de Tecnologia e Geociências – CTG –, onde se<br />
32<br />
15<br />
19<br />
9<br />
1 0 0 1 0 0 0 0<br />
2<br />
UFPB<br />
UFCE<br />
UFPE<br />
UFRPE<br />
UNIVASP<br />
UFPI<br />
UFRN<br />
UFAL<br />
UFBA<br />
UFRB<br />
UFCG<br />
UFRN<br />
UFS<br />
FONTE: SIEX – SISTEMA NACIONAL DE EXTENSÃO – GEREN-<br />
CIADO PELA UFMG -UNIVERSIDADE FEDERAL<br />
DE MINAS GERAIS<br />
Apesar da relevância que o tema<br />
tem desperta<strong>do</strong> no cenário mundial, os projetos<br />
de extensão registra<strong>do</strong>s na PROEXT volta<strong>do</strong>s<br />
para área da Educação Ambiental na UFPE<br />
tem cresci<strong>do</strong>, ainda, de forma tímida dentro <strong>do</strong><br />
universo acadêmico. Os números da Tabela 5<br />
mostram que de 525 projetos de extensão, no<br />
perío<strong>do</strong> de 2006 a 2008, só 18%, isto é, 32<br />
projetos, trabalharam o tema.<br />
situam os cursos de Engenharia e Oceanografia,<br />
que tem se destaca<strong>do</strong> em ações de preservação<br />
<strong>do</strong> ambiente marinho. Foram identificadas ainda<br />
ações desenvolvidas nos Centros de Ciências<br />
Biológicas e de Ciências Sociais Aplicadas.<br />
13 Da<strong>do</strong>s consulta<strong>do</strong>s em abril de 2009<br />
32<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
GRÁFICO 6<br />
32<br />
15<br />
19<br />
9<br />
1 0 0 1 0 0 0 0<br />
2<br />
UFPB<br />
UFCE<br />
UFPE<br />
UFRPE<br />
FONTE: AUTORIA PRÓPRIA<br />
UNIVASP<br />
UFPI<br />
UFRN<br />
UFAL<br />
UFBA<br />
UFRB<br />
UFCG<br />
UFRN<br />
UFS<br />
A Tabela 7 demonstra que a comunidade<br />
acadêmica ainda tem participação tímida nos<br />
projetos vincula<strong>do</strong>s ao tema, pois aponta que só<br />
8% <strong>do</strong>s <strong>do</strong>centes, 4% <strong>do</strong>s discentes e 8% <strong>do</strong>s<br />
técnicos administrativos estão envolvi<strong>do</strong>s nessa<br />
temática. Além disso, o público beneficia<strong>do</strong> em<br />
projetos de extensão nesse perío<strong>do</strong> perfaz um<br />
total 703.697 pessoas, significan<strong>do</strong> que 96%<br />
desse universo, só 4% (28.166) são atendi<strong>do</strong>s em<br />
projetos na área Educação Ambiental (Tabela 8).<br />
TABELA 7<br />
COMUNIDADE<br />
ACADÊMICA<br />
PROJETOS<br />
TEMÁTICA MEIO<br />
AMBIENTE<br />
TOTAL DE<br />
PROJETOS<br />
PERCENTUAL<br />
Docentes 83 926 8%<br />
Discentes 119 2960 4%<br />
Técnicos 18 208 8%<br />
FONTE: PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO –COORD. DE GESTÃO<br />
DA EXTENSÃO<br />
TABELA 8<br />
ANO<br />
PÚBLICO BENEFICIADO<br />
PROJ.TEMÁTICA MEIO AMBIENTE<br />
2006 11.428<br />
2007 5.340<br />
2008 11.398<br />
Total 28.166<br />
FONTE: PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO –COORD. DE GESTÃO<br />
DA EXTENSÃO<br />
Meto<strong>do</strong>logia<br />
A estratégia escolhida para o desenvolvimento<br />
da pesquisa é a exploratória - descritiva,<br />
conduzida sob a forma de estu<strong>do</strong> de caso. Teve<br />
como base a análise <strong>do</strong>cumental, através <strong>do</strong>s<br />
da<strong>do</strong>s que foram forneci<strong>do</strong>s pela Pró-Reitoria<br />
de Extensão da UFPE, cujos procedimentos<br />
meto<strong>do</strong>lógicos foram de caráter eminentemente<br />
quantitativo e o seu foco foi em número de projetos<br />
de extensão, na temática meio ambiente,<br />
registra<strong>do</strong>s na PROEXT, no perío<strong>do</strong> de 2006 a<br />
2008.<br />
Considerações Finais<br />
O Plano Nacional de Extensão determina<br />
as diretrizes da Extensão Universitária<br />
que estão inseridas em todas as ações das Pró-<br />
-Reitorias de Extensão das IES públicas. Elas<br />
são constituídas por quatro importantes eixos:<br />
impacto e transformação; interação dialógica;<br />
interdisciplinaridade e a indissociabilidade<br />
ensino-pesquisa-extensão 14 .<br />
14 Plano Nacional de Extensão Universitária. Fórum de Pró-<br />
-Reitores de Extensão das <strong>Universidade</strong>s Públicas Brasileiras.<br />
Brasília: Ministério de Educação, 2000.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
33
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
A política de extensão universitária,<br />
executada pela comunidade acadêmica, reflete<br />
um campo representativo <strong>do</strong>s diferentes setores<br />
da sociedade que estão diretamente envolvi<strong>do</strong>s<br />
com a vida acadêmica ou que se articula com<br />
ela, a partir de demandas e interesses específicos<br />
e coletivos. Entre os atores coletivos que<br />
definem e influenciam as políticas para a extensão<br />
encontram-se o governo, os segmentos<br />
da sociedade civil organizada, o merca<strong>do</strong> e a<br />
comunidade acadêmica.<br />
Analisan<strong>do</strong> os quatro eixos, podemos<br />
afirmar que a PROEXT tem avança<strong>do</strong> principalmente<br />
quan<strong>do</strong> avaliamos os impactos de suas<br />
atividades na sociedade através <strong>do</strong>s seus 525<br />
projetos executa<strong>do</strong>s no perío<strong>do</strong> de 2006 a 2008.<br />
Atualmente, o projeto de extensão<br />
numa perspectiva ideológica de compromisso<br />
social, disseminada especialmente nos anos<br />
90, está voltan<strong>do</strong> com força total, mesmo com<br />
restrições orçamentárias impostas pelo Ministério<br />
da Educação às universidades públicas. Por<br />
esta razão, como já comenta<strong>do</strong> anteriormente, a<br />
UFPE tem aloca<strong>do</strong> verbas objetivan<strong>do</strong> estimular<br />
a comunidade acadêmica na participação <strong>do</strong>s<br />
seus projetos.<br />
Os projetos na temática da educação<br />
ambiental surgiram com o a finalidade de suscitar<br />
uma consciência ecológica em cada um de nós.<br />
Uma das suas preocupações é criar oportunidades<br />
de conhecimento que permitam ao homem<br />
mudar o seu comportamento frente à natureza.<br />
A <strong>Universidade</strong> não pode se refutar <strong>do</strong> papel de<br />
interlocutora neste cenário. É através da extensão<br />
universitária que a universidade renova o ensino,<br />
incorporan<strong>do</strong> a experiência ao conhecimento<br />
teórico, que vai qualificar a atuação <strong>do</strong> futuro<br />
profissional, com princípios de cidadania e responsabilidade<br />
social.<br />
O estu<strong>do</strong> mostrou que várias são as<br />
áreas <strong>do</strong> conhecimento que tem interface com<br />
a Educação Ambiental (geografia, engenharia,<br />
ciências biológicas dentre outras), o que torna o<br />
tema objeto de pesquisa, estu<strong>do</strong>s e práticas que<br />
se difundem através da extensão universitária.<br />
A prática sistemática da UFPE por meio<br />
de projetos de extensão na área da Educação<br />
Ambiental envolven<strong>do</strong> diversas instâncias é de<br />
total importância para a sociedade, pois mostra<br />
a sintonia com as transformações sociais, nas<br />
quais a prioridade são as atividades que resultem<br />
na inclusão social, na sustentabilidade ambiental<br />
e no fortalecimento da cidadania com alunos-<br />
-cidadãos conscientes e comprometi<strong>do</strong>s com o<br />
futuro <strong>do</strong> planeta.<br />
REFERÊNCIAS<br />
AVALIAÇÃO NACIONAL DA EXTENSÃO/Fórum de<br />
Pró-Reitores de Extensão das <strong>Universidade</strong>s Públicas<br />
Brasileiras. Brasília: MEC/SESU; Paraná: UFPR; IIlheus:<br />
UESC, 2001.<br />
BRÜGGER, P. Educação ou adestramento ambiental<br />
Santa Catarina: Letras Contemporâneas, 1994.<br />
DECLARAÇÃO DE TBILISI - Documento extraí<strong>do</strong> de<br />
Educação ambiental e desenvolvimento: <strong>do</strong>cumentos<br />
oficiais, Secretaria <strong>do</strong> Meio Ambiente, Coordena<strong>do</strong>ria<br />
de Educação o Ambiental, São Paulo, 1994, Série Documentos,<br />
ISSN 0103-264X. Disponível em: . Acesso<br />
em: 22/4/2009.<br />
ECKERSLEY, R. Environmentalism and political theory:<br />
Toward an ecocentric aproach. Albany: State University of<br />
New York Press, 1992.<br />
HERCKERT, Werno. Educação Ambiental. Disponível<br />
em: . Acesso em: 17/5/2005.<br />
LEFF, E. Epistemologia Ambiental. São Paulo: Cortez,<br />
2001.<br />
MAYOR, F. Preparar um futuro viável: ensino superior e<br />
desenvolvimento sustentável. In: CONFERÊNCIA MUN-<br />
34<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR
ROSAS, J; NUNES, C. Política de extensão: a educação ambiental na perspectiva <strong>do</strong>s projetos de extensão da UFPE no perío<strong>do</strong> 2006 – 2008<br />
DIAL SOBRE O ENSINO SUPERIOR. Tendências de<br />
educação superior para o século XXI. Paria. Anais... 1998.<br />
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação <strong>do</strong><br />
futuro. Disponível em: . Acesso em: 10/4/2009.<br />
MORIN, Edgar. Méto<strong>do</strong> 1. Natureza da Natureza. Porto -<br />
Portugal: Europa-américa, 1977.<br />
MUNHOZ, Tânia. Desenvolvimento sustentável e educação<br />
ambiental. Disponível em: . Acesso em: 2004.<br />
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes<br />
necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,<br />
1997.<br />
PHILIPPI JUNIOR, Arlin<strong>do</strong>; PELICIONI, Maria Cecília Focesi.<br />
Educação Ambiental. 2005. Barueri: Manole, 2005.<br />
PLANO NACIONAL DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA.<br />
Fórum de Pró-Reitores de Extensão das <strong>Universidade</strong>s<br />
Públicas Brasileiras. Brasília: Ministério de Educação,<br />
2000.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 29 de julho de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 3 de abril de 2010.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 27-35, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
35
Projeto “floresta-escola” – educação ambiental não formal<br />
com instituições públicas<br />
The "Floresta-Escola" project – envinronmetal nonformal education<br />
with public institutions<br />
Proyecto “Floresta-Escola”- educación medioambiental no formal con<br />
instituciones publicas<br />
Daniela Biondi 1<br />
Antonio Carlos Batista 2<br />
RESUMO<br />
Este trabalho descreve as atividades <strong>do</strong> projeto de extensão Floresta-Escola, desenvolvi<strong>do</strong> por acadêmicos<br />
<strong>do</strong> curso de engenharia florestal no Campus III da UFPR e em várias escolas públicas da cidade de Curitiba.<br />
O objetivo geral <strong>do</strong> projeto foi transmitir conhecimentos conservacionistas através da educação ambiental<br />
não formal tanto numa Floresta (remanescente florestal no campus III – Jardim Botânico-Curitiba-PR)<br />
como nas escolas públicas, através de visitas monitoradas <strong>do</strong>s estudantes das escolas à trilha da Floresta,<br />
planejamento e elaboração de atividades lúdicas, oficinas e palestras nas escolas pelos acadêmicos bolsistas<br />
<strong>do</strong> projeto e realização de pesquisas sobre os diversos componentes <strong>do</strong> ecossistema florestal encontra<strong>do</strong>s<br />
ao longo da trilha para dar suporte às atividades de educação ambiental. Em 2010 foram atendi<strong>do</strong>s 450<br />
estudantes de 12 escolas para as atividades na trilha, foram realizadas 20 palestras em 14 escolas com 486<br />
estudantes e 62 estudantes participaram das oficinas. Vinte acadêmicos <strong>do</strong> curso de engenharia florestal e<br />
um acadêmico <strong>do</strong> curso de biologia participaram <strong>do</strong> projeto. Os resulta<strong>do</strong>s refletem a dimensão alcançada<br />
pelo projeto, concluin<strong>do</strong>-se que os objetivos foram alcança<strong>do</strong>s: o projeto contribuiu significativamente para<br />
complementar a formação <strong>do</strong>s acadêmicos de engenharia florestal em educação ambiental e promoveu<br />
uma conscientização pela educação ambiental não formal para diversas escolas municipais de Curitiba.<br />
Palavras-chave: conservação da natureza; trilha; consciência ambiental.<br />
ABSTRACT<br />
This paper describes the activities of the extension project “Floresta-Escola”, developed by students of forestry,<br />
at the Campus III of <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná and at various public schools in the city of Curitiba.<br />
The project’s overall objective was to transmit knowledge conservation through not formal environmental<br />
education both in a Forest (forest remnant in campus III – Jardim Botânico-Curitiba-PR) as public schools,<br />
through monitored visits of students of schools to track the Forest, planning and development of recreational<br />
activities , workshops and lectures in schools by students and scholars of design research on the various<br />
components of the forest ecosystem found along the trail to support environmental education activities. In<br />
2010 450 students from 12 schools were attending for activities on the trail, there were 20 lectures in 14<br />
schools with 486 students and 62 students participated in the workshops. Twenty students of forestry and<br />
one student of biology course participated in the project in 2010, developing the proposed activities. The<br />
results reflect the scale achieved by the project and may be concluded that the objectives were achieved: the<br />
project contributed significantly to supplement the training of forestry engineering students and promoted<br />
the environmental education by an awareness of non-formal environmental education for several schools<br />
1 Engenheira Florestal, Dra., Professora Associada <strong>do</strong> Curso de Engenharia Florestal da UFPR.<br />
2 Engenheiro Florestal, Dr., Professor Associa<strong>do</strong> <strong>do</strong> Curso de Engenharia Florestal da UFPR.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
37
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
in Curitiba. With this, the project contributed to<br />
the formation of future citizens who will preach<br />
respect for the environment.<br />
Keywords: nature conservation; trail; environmental<br />
awareness.<br />
RESUMEN<br />
En este trabajo se describen las actividades<br />
del proyecto de extensión “Floresta-Escola”,<br />
desarrolla<strong>do</strong> por estudiantes de Ingeniería<br />
Forestal de la <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná<br />
PR en el Campus III y en varias escuelas<br />
públicas de la ciudad de Curitiba. El objetivo<br />
general del proyecto fue transmitir conocimientos<br />
conservacionistas mediante la educación<br />
ambiental no formal tanto en un bosque (remanente<br />
de bosque en el campus III - Jardín<br />
Botánico-Curitiba-PR) como en las escuelas<br />
públicas, a través de las visitas monitoreadas<br />
de los estudiantes a las trillas del bosque, la<br />
planificación y el desarrollo de actividades<br />
recreativas, talleres y conferencias en las escuelas<br />
por los estudiantes becarios del proyecto<br />
y investigación de los distintos componentes<br />
del ecosistema forestal que se encuentran a<br />
lo largo de la trilla del bosque para apoyar<br />
las actividades de educación ambiental. En<br />
el año 2010 450 estudiantes de 12 escuelas<br />
fueron atendi<strong>do</strong>s en visitas a la trilla, hubo 20<br />
conferencias en 14 escuelas con 486 alumnos y<br />
62 alumnos participaron en los talleres. Veinte<br />
estudiantes de ingeniería forestal y uno del<br />
curso de biología participaron del proyecto.<br />
Los resulta<strong>do</strong>s reflejan la escala lograda por<br />
el proyecto y se concluye que los objetivos<br />
se lograron: el proyecto contribuyó significativamente<br />
a complementar la formación de<br />
estudiantes de ingeniería forestal en el tema<br />
de educación ambiental y se incentivó una<br />
concienciación por la educación ambiental<br />
non-formal para varias escuelas municipales<br />
de Curitiba. Además, el proyecto contribuyó<br />
para la formación de futuros ciudadanos<br />
que van preconizar el respecto por el medio<br />
ambiente.<br />
Palabras-clave: conservación de la naturaleza;<br />
trilla; conciencia ambiental.<br />
Introdução<br />
A educação é a base para a conscientização<br />
de um individuo ou grupo social, permitin<strong>do</strong><br />
estabelecer, através de seus julgamentos<br />
morais, uma harmonia entre os homens e entre o<br />
homem e a natureza. Visto que não se sabe tu<strong>do</strong><br />
sobre a natureza <strong>do</strong> homem e nem a natureza<br />
da natureza, a relação homem-natureza deve ser<br />
um processo de contínuo respeito e aprendiza<strong>do</strong><br />
(BIONDI, 2008).<br />
De acor<strong>do</strong> com Dias (2004), desde<br />
sua origem, o conceito de “meio ambiente” tem<br />
si<strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong> como sinônimo de “Natureza” ou<br />
“recursos naturais”. Ainda hoje permanece forte<br />
a influência <strong>do</strong> pensamento conservacionista,<br />
o qual a “Natureza” deve ser reverenciada e<br />
isolada <strong>do</strong> homem para ser salva. No entanto,<br />
reduzir esse conceito a aspectos exclusivamente<br />
“naturais” exclui as interdependências e interações<br />
com a sociedade. O meio ambiente, ou<br />
simplesmente ambiente, não é forma<strong>do</strong> apenas<br />
pela flora e fauna, água, solo e ar, como era<br />
tradicionalmente defini<strong>do</strong>. O referi<strong>do</strong> autor<br />
salienta: “Hoje, as atividades humanas sobre<br />
a Terra produzem tantas influências que a sua<br />
cultura passou a fazer parte da definição de meio<br />
ambiente” (DIAS, 2004).<br />
A educação ambiental é uma ação<br />
interdisciplinar para ser trabalhada por todas as<br />
idades, comunidades e realidades, consideran<strong>do</strong><br />
o meio ambiente em sua totalidade: o resgate<br />
e o surgimento de novos valores sociais que<br />
conduzam a um mo<strong>do</strong> de vida mais consciente<br />
e sustentável. Essa educação deveria preparar<br />
o indivíduo, mediante a compreensão <strong>do</strong>s principais<br />
problemas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> contemporâneo,<br />
proporcionan<strong>do</strong>-lhe conhecimentos técnicos e<br />
as qualidades necessárias para desempenhar<br />
uma função produtiva, com vistas a melhorar a<br />
qualidade de vida e proteger o meio ambiente,<br />
prestan<strong>do</strong> a devida atenção aos valores éticos<br />
(MACIEL et al., 2011).<br />
Entende-se por educação ambiental<br />
não formal as propostas educativas que, sem ser<br />
curriculares, estão integradas em projetos com finalidades<br />
particulares e uma intencionalidade. A<br />
sua maior vantagem é que pode se desenvolver<br />
38<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
processos muito mais flexíveis <strong>do</strong> que no ensino<br />
formal, utiliza meios pedagógicos multivaria<strong>do</strong>s<br />
e tem a função de informar e formar (ARAUJO,<br />
2006)<br />
Articular a educação, em seu senti<strong>do</strong><br />
mais amplo, com os processos de formação <strong>do</strong>s<br />
indivíduos como cidadãos, ou articular a escola<br />
com a comunidade educativa de um território<br />
é um sonho, uma utopia, mas também uma<br />
urgência e uma demanda da sociedade atual<br />
(GOHN, 2006).<br />
Este projeto teve seu início com outro<br />
projeto de extensão intitula<strong>do</strong> Trilha da Floresta<br />
que teve como objetivo realizar atividades de<br />
educação ambiental, demonstran<strong>do</strong> a interdependência<br />
<strong>do</strong> homem com o meio que o envolve,<br />
conscientizan<strong>do</strong> a sociedade da importância<br />
da utilização reflexiva e prudente <strong>do</strong>s recursos<br />
que atendem às necessidades humanas. Em<br />
2009, com a ocorrência da suspensão <strong>do</strong>s ônibus<br />
que transportam as crianças por causa da gripe<br />
A e com a incidência da grande quantidade de<br />
chuvas, buscaram-se novas alternativas para<br />
os acadêmicos <strong>do</strong> curso de engenharia florestal<br />
desenvolverem atividades de educação ambiental<br />
com as crianças de escolas públicas. Devi<strong>do</strong><br />
a isto, procurou-se parceria junto a Secretaria<br />
Municipal de Defesa Social – Programa Guarda<br />
Mirim, para viabilizar a realização de atividades<br />
de educação ambiental nas escolas em forma de<br />
palestras e exposição de produtos florestais. Esta<br />
parceria veio preencher uma lacuna <strong>do</strong> referi<strong>do</strong><br />
programa em relação aos conhecimentos da<br />
conservação da natureza. E ao mesmo tempo<br />
proporcionou uma oportunidade para os acadêmicos<br />
desenvolverem atividades educativas e<br />
extensionistas, carente nos currículos acadêmicos<br />
de engenharia florestal.<br />
O título desta pesquisa “Floresta-Escola”<br />
sugere que: a Floresta é uma escola – quan<strong>do</strong><br />
os acadêmicos recebem o público para as práticas<br />
educativas; e a Floresta vai à escola – quan<strong>do</strong><br />
os acadêmicos vão às escolas para transmitirem<br />
os conhecimentos relaciona<strong>do</strong>s com a floresta.<br />
Na perspectiva acadêmica e social, a<br />
existência deste projeto justifica-se pelas seguintes<br />
razões:<br />
a. A utilização da Floresta, remanescente florestal<br />
no campus III – Jardim Botânico, tanto<br />
para os aspectos científicos (pesquisas) como<br />
para os aspectos sociais (prática de educação<br />
ambiental) que, consequentemente, obriga a<br />
instituição (UFPR) estabelecer uma permanente<br />
manutenção e proteção da área;<br />
b. Devi<strong>do</strong> a falta de disciplinas ou estágios na<br />
área de extensão, as excursões guiadas que são<br />
realizadas criam oportunidades únicas para os<br />
acadêmicos complementarem as lacunas curriculares;<br />
c. A transmissão de conhecimentos ecológicos<br />
e filosofias conservacionistas para as crianças<br />
de escolas públicas ajudam a formar cidadãos<br />
responsáveis pela natureza;<br />
d. O contato <strong>do</strong>s acadêmicos com o público<br />
externo, através das palestras nas escolas, é<br />
um bom treinamento para uma boa oratória,<br />
desenvoltura, autoconfiança, expansividade e<br />
responsabilidade;<br />
e. Com a formação das oficinas, tanto o público<br />
visitante como os acadêmicos terão oportunidade<br />
de desenvolver uma consciência ecológica,<br />
fazen<strong>do</strong> uso da criatividade através das diferentes<br />
práticas realizadas com materiais encontra<strong>do</strong>s<br />
na floresta.<br />
Ten<strong>do</strong> em vista o exposto anteriormente,<br />
o objetivo deste trabalho foi transmitir conhecimentos<br />
conservacionistas através da educação<br />
ambiental tanto numa Floresta (remanescente<br />
florestal no campus III – Jardim Botânico) como<br />
nas escolas públicas, através <strong>do</strong>s seguintes objetivos<br />
específicos:<br />
a. Monitorar estudantes de escolas <strong>do</strong> Ensino<br />
Básico e Fundamental da Rede Pública e Privada,<br />
durante uma excursão à trilha numa área<br />
com Floresta localizada no campus III – Jardim<br />
Botânico, realizan<strong>do</strong> atividades de educação<br />
ambiental com as crianças;<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
39
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
b. Elaborar, desenvolver e exercitar atividades<br />
de educação ambiental junto aos monitores <strong>do</strong><br />
projeto (estudantes bolsistas e voluntários) a fim<br />
de habilitá-los para o atendimento <strong>do</strong> público<br />
externo (escolas);<br />
c. Ampliar o conhecimento <strong>do</strong>s estudantes <strong>do</strong><br />
projeto sobre o remanescente de Floresta da<br />
trilha através da pesquisa, para servir de conteú<strong>do</strong><br />
às atividades desenvolvidas com as escolas<br />
visitantes e visitadas;<br />
d. Estimular os acadêmicos a usarem mais a criatividade<br />
na forma de transmitir os conhecimentos<br />
ecológicos e filosofias conservacionistas para as<br />
crianças (elaboração de dinâmicas);<br />
e. Planejar, elaborar e executar práticas educativas<br />
com produtos da floresta através de oficinas<br />
e palestras.<br />
Material e méto<strong>do</strong>s<br />
Este projeto de extensão tem como<br />
público alvo estudantes <strong>do</strong> ensino básico, fundamental<br />
e médio de Escolas da Rede Pública e<br />
Privada de Ensino. Parte <strong>do</strong> projeto foi realiza<strong>do</strong><br />
na UFPR e outra parte foi realizada em várias<br />
escolas públicas.<br />
O projeto possui parceria com a Secretaria<br />
Municipal de Defesa Social – Departamento<br />
de Promoção da Defesa Comunitária com o<br />
Programa Guarda Mirim que é responsável pela<br />
maioria da demanda das escolas agendadas.<br />
Além desta, tem como parceria, desde a origem<br />
<strong>do</strong> projeto, o PET-Floresta.<br />
A meto<strong>do</strong>logia deste projeto foi dividida<br />
em três atividades distintas: Excursão das<br />
escolas na trilha chamada “Trilha da Floresta” –<br />
UFPR, Palestras nas Escolas – Floresta na Escola<br />
e Oficinas da Floresta.<br />
40<br />
Excursão das escolas na trilha da Floresta – UFPR<br />
A excursão com as escolas conta com<br />
a seguinte infraestrutura: Centro de Educação<br />
Ambiental e um fragmento de floresta (Floresta<br />
Ombrófila Mista) bem conserva<strong>do</strong> com área de<br />
15 ha localiza<strong>do</strong> no Campus Jardim Botânico<br />
– UFPR, onde foi construída uma trilha interpretativa<br />
com um percurso de 750 m, sinalizada<br />
com placas para atividades educativas (Figura 1).<br />
O Centro de Educação Ambiental é<br />
uma construção em madeira de pinus proveniente<br />
de reflorestamento, com uma área aproximada<br />
de 110 m², que foi construída pela MOBASA<br />
- Battistella Indústria e Comércio Ltda. Neste<br />
local é realizada a recepção aos visitantes, além<br />
de dinâmicas que visam a integração <strong>do</strong> grupo<br />
e a sua preparação para o início das atividades<br />
na Trilha da Floresta. O Centro desempenha,<br />
ainda, a função de museu, com a exposição de<br />
diversos produtos da floresta e possui área para<br />
atividades em dias de chuva, quan<strong>do</strong> não é possível<br />
percorrer o percurso da Trilha da Floresta.<br />
A excursão das escolas à Trilha da Floresta<br />
é dividida em três fases:<br />
Recepção – acontece com a chegada das<br />
crianças ao Centro de Visitação, onde to<strong>do</strong>s se<br />
apresentam e participam das primeiras atividades<br />
lúdicas. Em seguida são levadas para o interior<br />
<strong>do</strong> Centro de Visitação onde observarão e terão<br />
informações sobre exsicatas de plantas, sementes,<br />
frutos, insetário, mapas e outros materiais referentes<br />
ao que será visto durante a caminhada na<br />
trilha. Em seguida a turma de estudantes é dividida<br />
em <strong>do</strong>is grupos que entram separadamente,<br />
cada grupo deven<strong>do</strong> ser acompanha<strong>do</strong> de pelo<br />
menos <strong>do</strong>is monitores <strong>do</strong> projeto;<br />
Trilha – ao longo da trilha, são aborda<strong>do</strong>s<br />
conteú<strong>do</strong>s que fazem referência à interdependência<br />
<strong>do</strong> homem e <strong>do</strong> meio ambiente, conscientizan<strong>do</strong> as<br />
crianças sobre a importância de uma utilização sustentável<br />
<strong>do</strong>s recursos naturais presentes na floresta.<br />
Além disso, é repassa<strong>do</strong>, com muita propriedade,<br />
o máximo de informações sobre as espécies ali<br />
presentes na borda da trilha, tais como: nome po-<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
pular, nome científico, família, qual o seu papel na<br />
floresta, usos desta espécie, curiosidades e outros;<br />
Encerramento – ao final da caminhada<br />
na trilha, os participantes voltam para o Centro<br />
de Visitação, onde têm um tempo livre para<br />
realizar brincadeiras e merendar. As atividades<br />
são encerradas com uma dinâmica de grupo<br />
para relembrar os principais pontos discuti<strong>do</strong>s e<br />
o que elas aprenderam ao longo das atividades.<br />
Ao terminar todas as atividades, os estudantes<br />
recebem <strong>do</strong>s monitores um certifica<strong>do</strong> prometen<strong>do</strong><br />
serem defensores da natureza.<br />
As atividades de educação ambiental<br />
realizadas durante a excursão na trilha são desenvolvidas<br />
de maneira não formal, tentan<strong>do</strong><br />
sempre associar os temas pertencentes às disciplinas<br />
da grade curricular das escolas. Busca-se<br />
sempre transmitir as informações ao ar livre, em<br />
contato com natureza.<br />
A interpretação da natureza na Trilha<br />
da Floresta foi desenvolvida com as seguintes<br />
abordagens:<br />
Água – onde se procura transmitir a<br />
importância da água para o homem, demonstran<strong>do</strong><br />
a necessidade e os meios para a sua<br />
conservação, além da inter-relação da mesma<br />
com os demais elementos da floresta;<br />
Solo – é enfatizada e demonstrada a<br />
interdependência floresta/solo;<br />
Flora – a diversidade de espécies<br />
vegetais, a estruturação da floresta, bem como<br />
a relação existente entre as espécies é o maior<br />
enfoque da<strong>do</strong>;<br />
Fauna – é demonstra<strong>do</strong> o papel da<br />
fauna para a manutenção da floresta, sensibilizan<strong>do</strong><br />
os visitantes sobre a relevância de sua<br />
conservação.<br />
Para melhor aprendiza<strong>do</strong> e sensibilização<br />
das crianças, os monitores sempre informam<br />
os conhecimentos <strong>do</strong>s componentes presentes<br />
na floresta para evitar uma abordagem teórica.<br />
FIGURA 1 - PERCURSO DA TRILHA DA FLORESTA<br />
Palestras nas Escolas – Floresta na Escola<br />
As palestras nas escolas são realizadas<br />
pelos acadêmicos com apoio <strong>do</strong> Programa Guarda<br />
Mirim (agendamento das escolas e transporte).<br />
O tema principal das palestras é sempre relativo<br />
à conservação da natureza e principalmente das<br />
florestas. Desde que foi feita a parceria com o<br />
Programa Guarda Mirim, o tema da palestra<br />
é incrementa<strong>do</strong> com a campanha anual deste<br />
programa. Neste ano de 2010 foi introduzida<br />
a abordagem sobre Responsabilidade Fiscal no<br />
tema Conservação da Natureza. Uma exposição<br />
de produtos da floresta (madeira, sementes,<br />
frutos, fibra de papel, remédios etc.) faz parte da<br />
finalização de cada palestra proferida nas escolas.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
41
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
Oficinas da Floresta<br />
A realização das oficinas teve por objetivos:<br />
contribuir para a fixação <strong>do</strong>s conhecimentos<br />
conservacionistas adquiri<strong>do</strong>s na excursão ou nas<br />
palestras; desenvolver a criatividade <strong>do</strong>s acadêmicos<br />
e <strong>do</strong>s estudantes das escolas; e promover também<br />
uma atividade recreativa. Os acadêmicos devem<br />
pesquisar temas que possam ser transforma<strong>do</strong>s em<br />
oficinas, tais como:<br />
a. Oficina da Paisagem – ensinar os estudantes a<br />
criar paisagem numa cartolina com o uso de restos<br />
de folhas, galhos, cascas de frutos, sementes, pedra<br />
etc.;<br />
b. Oficina <strong>do</strong> Barulho – ensinar os estudantes a<br />
fazer instrumentos que produzam sons com restos<br />
de bambu.<br />
Todas as oficinas têm como introdução<br />
uma ligeira visita à floresta e uma apresentação<br />
teórica sobre a meto<strong>do</strong>logia <strong>do</strong> que será realiza<strong>do</strong><br />
na oficina.<br />
A avaliação <strong>do</strong> projeto é feita de forma<br />
quantitativa, consideran<strong>do</strong> o número de participantes<br />
<strong>do</strong> projeto, e qualitativa, através da análise<br />
das fichas de visitantes, que são preenchidas pelos<br />
bolsistas, conten<strong>do</strong> os da<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s perfis <strong>do</strong>s grupos<br />
de visitantes, como: faixa etária, procedência, nome<br />
da instituição, informações de conhecimento <strong>do</strong><br />
projeto etc.<br />
As observações <strong>do</strong>s bolsistas de extensão e<br />
voluntários também servem como avaliação, sen<strong>do</strong><br />
discutidas em reuniões após cada atividade, auxilian<strong>do</strong><br />
os acadêmicos envolvi<strong>do</strong>s nos seus processos<br />
de formação, expressan<strong>do</strong> opiniões e promoven<strong>do</strong><br />
discussões acerca <strong>do</strong>s trabalhos realiza<strong>do</strong>s. Esses<br />
resulta<strong>do</strong>s são anota<strong>do</strong>s nas fichas <strong>do</strong>s grupos de<br />
visitantes (avaliação contínua e participativa).<br />
Após todas as atividades educativas (trilha,<br />
palestras e oficinas), descritas na meto<strong>do</strong>logia deste<br />
projeto, é feita uma enquete com o público e os<br />
monitores <strong>do</strong> projeto para que as falhas sejam imediatamente<br />
corrigidas durante o desenvolvimento<br />
<strong>do</strong> mesmo (avaliação não cumulativa).<br />
Resulta<strong>do</strong>s e discussão<br />
Em 2010 foram atendi<strong>do</strong>s 450 estudantes<br />
de 12 escolas para as atividades na trilha (Figura 2).<br />
FIGURA 2 – ATIVIDADES DOS ESTUDANTES NA TRILHA DA<br />
FLORESTA<br />
42<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
Foram realizadas 20 palestras em 14<br />
escolas com 486 estudantes (Figura 3) e 62<br />
estudantes participaram das oficinas (Figura 4).<br />
Algumas escolas participaram mais de uma vez<br />
das atividades demonstran<strong>do</strong> que o projeto vem<br />
desempenhan<strong>do</strong> um papel muito importante na<br />
complementação da educação formal.<br />
Da avaliação feita pelos professores<br />
que acompanharam os estudantes das escolas<br />
visitantes, os resulta<strong>do</strong>s mais significativos foram:<br />
100% responderam que as atividades <strong>do</strong> projeto<br />
Floresta-Escola corresponderam às expectativas;<br />
95% responderam que o tempo despendi<strong>do</strong><br />
para visita foi suficiente; 90% disseram que o<br />
atendimento pelos monitores foi ótimo; 24%<br />
sugeriram algumas melhorias no espaço físico<br />
que é anexo à trilha (Centro de Educação<br />
Ambiental); 29% afirmaram que a participação<br />
<strong>do</strong>s alunos no projeto serviu para fundamentar<br />
as aulas teóricas dadas em sala de aula; e 81%<br />
deram nota 10 ao projeto.<br />
Além disso, as professoras afirmaram<br />
que o tema “preservação da natureza” presente<br />
no conteú<strong>do</strong> aborda<strong>do</strong> nas atividades é bastante<br />
interessante para as crianças, e as atividades educativas<br />
e lúdicas desenvolvidas são adequadas<br />
às idades e séries escolares das crianças.<br />
FIGURA 3 – PALESTRAS NAS ESCOLAS<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
43
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
isto os acadêmicos têm oportunidade de<br />
exercer conscientemente a práxis de extensão<br />
com as diferentes áreas de conhecimento<br />
deste curso através da educação ambiental.<br />
FIGURA 4 – OFICINAS DA FLORESTA<br />
As atividades <strong>do</strong> projeto foram desenvolvidas<br />
por 19 acadêmicos <strong>do</strong> curso de<br />
engenharia florestal (4 bolsistas e 15 voluntários)<br />
e 1 de biologia (Figura 5). Para estes<br />
acadêmicos, este projeto foi uma grande<br />
oportunidade de praticar a extensão através<br />
da educação ambiental com crianças, experiência<br />
ímpar no seu curso. Tanto o contato com<br />
as crianças quanto a participação permanente<br />
em todas as fases <strong>do</strong> projeto, proporcionaram<br />
aos acadêmicos maior responsabilidade,<br />
autoconfiança, criatividade, expansividade,<br />
experiência e espírito de equipe.<br />
O projeto apresentou ganhos sociais<br />
significativos porque conseguiu, através<br />
da educação ambiental, complementar as<br />
atividades práticas <strong>do</strong> currículo <strong>do</strong>s estudantes<br />
<strong>do</strong> ensino fundamental das escolas<br />
públicas. Além de atender as necessidades<br />
curriculares das escolas visitantes, também<br />
preenche a lacuna relativa às práticas de<br />
educação ambiental inexistentes no currículo<br />
atual <strong>do</strong> curso de Engenharia Florestal. Com<br />
44<br />
FIGURA 5. TREINAMENTO DOS BOLSISTAS DO PROJETO<br />
FLORESTA-ESCOLA<br />
Em todas as ações <strong>do</strong> projeto o acadêmico<br />
logo percebe que não pode dissociar<br />
a trilogia “ensino/pesquisa/extensão”. Da<br />
mesma forma, os acadêmicos não veem os<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
temas e assuntos aborda<strong>do</strong>s nas atividades<br />
educativas com as crianças, como disciplinas<br />
ou matérias isoladas. Tanto na estrutura intelectual<br />
(conhecimentos) como na estrutura<br />
operacional <strong>do</strong> projeto é fácil observar que<br />
tanto os assuntos aborda<strong>do</strong>s e as pessoas envolvidas<br />
(academia e sociedade) fazem parte<br />
de um sistema, onde to<strong>do</strong>s os componentes<br />
são vitais, sem hierarquia de importância.<br />
Isto faz com que eles sintam claramente o<br />
processo de interdisciplinaridade.<br />
Considerações finais<br />
A procura das escolas para a visitação<br />
da trilha é boa, mas é, na maioria das<br />
vezes, prejudicada pela falta de transporte e<br />
pelas condições climáticas adversas, ocorrência<br />
de chuva.<br />
O projeto proporcionou aos acadêmicos<br />
ganhos significativos no âmbito profissional<br />
e pessoal, tais como:<br />
• Sentir que é um dever prestar algum serviço<br />
para a sociedade, enquanto aluno de<br />
universidade pública;<br />
• Adquirir o hábito de pesquisar e estudar<br />
antes de elaborar ou executar alguma atividade;<br />
• Ouvir as críticas visan<strong>do</strong> melhorias <strong>do</strong><br />
projeto;<br />
• Sentir que, embora seja pequena sua<br />
contribuição, está fazen<strong>do</strong> alguma coisa pela<br />
natureza;<br />
• Ter a experiência <strong>do</strong> sucesso (quan<strong>do</strong> dá<br />
tu<strong>do</strong> certo) e a <strong>do</strong> fracasso (quan<strong>do</strong> não foi<br />
como planeja<strong>do</strong>);<br />
• Transformar os conhecimentos técnico-<br />
-científicos para uma linguagem coloquial;<br />
• Ter a oportunidade de lidar e conviver<br />
com crianças;<br />
• Sentir-se responsável pelos conhecimentos<br />
e a disciplina de um grupo de pessoas, mesmo<br />
que seja por duas horas.<br />
Durante o ano 2010 o projeto<br />
“Floresta-Escola” articulou as seguintes ações<br />
com a comunidade interna: reunião semanal<br />
com os acadêmicos para reformular as ações<br />
(dialógica); treinamento <strong>do</strong>s acadêmicos<br />
na forma de expressar os conhecimentos<br />
técnico-científicos para as crianças (ensino/<br />
extensão); treinamento <strong>do</strong>s acadêmicos em<br />
atividades lúdicas (dinâmicas) para as crianças<br />
(extensão); pesquisa com espécies de<br />
plantas e animais da floresta para transmitir<br />
essas informações durante a trilha (pesquisa).<br />
Com a comunidade externa, foram<br />
articuladas as seguintes ações: divulgação,<br />
contato e agendamento das escolas para a trilha;<br />
contatos com escolas para a realização de<br />
palestras; busca de apoio logístico (transporte<br />
– viatura) da Secretaria Municipal de Defesa<br />
social para locomoção <strong>do</strong>s acadêmicos para<br />
as escolas (proferir palestras); visita a uma<br />
trilha elaborada pela empresa CONPACEL –<br />
SP, parte de uma oficina desenvolvida pelo<br />
projeto (Figura 5).<br />
Percebe-se que além das alterações<br />
feitas nas atividades desenvolvidas, que são<br />
analisadas e discutidas durante as reuniões<br />
semanais, o projeto parece estar sempre se<br />
renovan<strong>do</strong>. Isto se deve à grande quantidade<br />
de discentes voluntários envolvi<strong>do</strong>s e a alta<br />
rotatividade <strong>do</strong>s mesmos durante o ano.<br />
REFERÊNCIAS<br />
ARAUJO, I. A. A educação ambiental não formal no<br />
contexto das organizações não governamentais ambientalistas<br />
<strong>do</strong> litoral norte <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> de São Paulo. Dissertação<br />
(Mestra<strong>do</strong> em Educação) - Programa de Pós- Graduação<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
45
BIONDI, D.; BATISTA, A. C. Projeto “Floresta-Escola” – educação ambiental não formal com instituições públicas<br />
em Educação da UNIMEP, <strong>Universidade</strong> Metodista de<br />
Piracicaba, São Paulo, 2006.<br />
BIONDI, D. Arborização aplicada à Educação ambiental.<br />
Curitiba: D. Biondi Ed. independente, 2008. 120 p.<br />
DIAS, G. F. Educação Ambiental – princípios e práticas.<br />
5 ed. São Paulo: Gaia, 2004. 551p.<br />
GOHN, M. G. Educação não formal, participação da<br />
sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas. Ensaio:<br />
aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 14, n. 50, p. 27-<br />
38, jan./mar. 2006.<br />
MACIEL, J. L.; WACHHOLZ, C. B.; ALMINHANA, C. O.;<br />
BITAR, P. G.; MUHLE, R. P. Meto<strong>do</strong>logias de uma educação<br />
ambiental inclusiva. REVISTA EGP. Disponível em:<br />
<br />
Acesso em: 23/4/2011.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 20 de maio de 2011.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 30 de junho de 2011.<br />
46<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 37-46, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Comunicação ambiental: os desafios de transcender a lógica da<br />
sociedade de consumo<br />
Environmental Communication: challenges to transcend the logic of<br />
consumer society<br />
Comunicación medioambiental: desafíos de trascender la lógica de la<br />
sociedad de consumo<br />
Mônica Pinto 1<br />
RESUMO<br />
As questões ambientais estão na ordem <strong>do</strong> dia e ganham cada vez mais espaço no merca<strong>do</strong> midiático.<br />
Entretanto, de mo<strong>do</strong> geral, ações práticas para seu enfrentamento terminam relegadas a um segun<strong>do</strong> plano,<br />
na medida em que transformações na ordem vigente de produção e de aquisição de produtos nem sempre<br />
são bem absorvidas pelo establishment que, via de regra, se nutre da sociedade de consumo. Para a indústria<br />
da mídia, subverter a lógica consumista significa, muitas vezes, romper com a estrutura que a sustenta,<br />
cenário a dificultar a disseminação de informações qualificadas quanto à crise ambiental da atualidade. Isso<br />
porque, como já dito, os veículos tendem a não se debruçar sobre as causas <strong>do</strong>s problemas com o devi<strong>do</strong><br />
aprofundamento. Assim, a Comunicação Social vê-se hoje imersa em desafios, entre os quais reformulações<br />
epistemológicas quanto aos princípios <strong>do</strong> Jornalismo e da Propaganda. O papel da Academia, por sua<br />
vez, mostra-se fundamental para elucidar a importância da a<strong>do</strong>ção de um novo modelo de produção e<br />
consumo, de mo<strong>do</strong> a suprir as lacunas que possam ser verificadas, sob esse viés, no universo midiático.<br />
Palavras-chave: Comunicação social; sociedade de consumo; meio ambiente.<br />
ABSTRACT<br />
Environmental issues are are in the order of the day and gain more and more space in the media market.<br />
However, broadly speaking, practical actions to cope with it end up relegated to a second plane, in the extent<br />
that changes in the current order of production and acquisition of goods are not always well absorbed<br />
by the establishment that, as a rule, is nourished by the society of consumption. For the media industry, to<br />
subvert the logic of consumerism means, quite often, a rupture with the structure that supports it, a scenario<br />
that hampers the dissemination of good quality information about the environmental crisis of today. This<br />
happens because, as already said, the vehicles of propaganda tend not to look into its causes with the due<br />
depth. Thus, the Social Communication finds itself today immersed in challenges, such as epistemological<br />
reformulations about the principles of Journalism and Propaganda. The role of the Academy, in turn, has<br />
proven fundamental to elucidate the importance of a<strong>do</strong>pting a new model of production and consumption,<br />
so as to cover the loopholes that can be verified under this tendency, in the media universe.<br />
Keywords: Social communication; society of consumption; environment.<br />
1 Especialista em Mudanças Climáticas e Sequestro de Carbono (<strong>Universidade</strong> Positivo – PR), mestranda em Comunicação pela<br />
<strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná. Contatos: Rua Dr. Sátilas <strong>do</strong> Amaral Camargo, 31, Tingui, Curitiba (PR), telefone: (41) 8445-2294,<br />
jornalistamonicapinto@gmail.com<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 47-52, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
47
PINTO, M. Comunicação ambiental: os desafios de transcender a lógica da sociedade de consumo<br />
RESUMEN<br />
Las cuestiones ambientales están en el orden<br />
del día y ganan más espacio en el merca<strong>do</strong> de<br />
los medios de comunicación. Sin embargo, en<br />
general, medidas prácticas para hacer frente a<br />
ella terminan relegadas a un segun<strong>do</strong> plan, en<br />
la medida en que los cambios en el orden de<br />
producción y de compras no son siempre bien<br />
absorbi<strong>do</strong>s por el establishment que, por regla<br />
general, se nutre de la sociedad del consumo.<br />
Para la industria de los medios de comunicación,<br />
subvertir la lógica consumista significa romper<br />
con la estructura que la mantiene, lo que dificulta<br />
la difusión de información de calidad sobre la<br />
crisis ambiental de hoy. Eso es porque, como ya<br />
fue dicho, los medios tienden a no detenerse en<br />
las causas de los problemas debi<strong>do</strong> a la profundización<br />
del tema. Por lo tanto, la comunicación<br />
social se encuentra inmersa en los retos actuales,<br />
incluyen<strong>do</strong> los cambios epistemológicos cuanto a<br />
los principios del periodismo y de la propaganda.<br />
El rol de la Academia, a su vez, ha demostra<strong>do</strong><br />
ser crucial para aclarar la importancia en a<strong>do</strong>ptar<br />
un nuevo modelo de producción y consumo<br />
para completar las lagunas que pueden ser verificadas,<br />
con este sesgo, en el universo mediático.<br />
Palabras-clave: Comunicación social; sociedad<br />
del consumo; médio ambiente.<br />
Introdução<br />
ininterrupta <strong>do</strong> meio ambiente mundial são os<br />
padrões insustentáveis de consumo e produção,<br />
especialmente nos países industrializa<strong>do</strong>s”. Com<br />
base nessa premissa, o <strong>do</strong>cumento estabelece,<br />
entre seus objetivos, “desenvolver uma melhor<br />
compreensão <strong>do</strong> papel <strong>do</strong> consumo e da forma<br />
de se implementar padrões de consumo mais<br />
sustentáveis”.<br />
Fica claro o protagonismo da Comunicação<br />
Social no cumprimento desse propósito, paralelo<br />
em relevância e complementar aos esforços<br />
da educação – formal e não formal – no mesmo<br />
senti<strong>do</strong>. Especificamente no âmbito <strong>do</strong> Jornalismo,<br />
Loose e Girardi (2009) defendem que<br />
Muito além da denúncia, o jornalista<br />
pode sim ser um educa<strong>do</strong>r e auxiliar na<br />
formação da opinião pública em prol da<br />
sobrevivência planetária. A difusão de<br />
uma postura ética para o restabelecimento<br />
<strong>do</strong> equilíbrio da vida já coloca o jornalista<br />
ambiental como agente da propagação da<br />
proteção de onde vivemos, oferecen<strong>do</strong><br />
visibilidade e argumentos para cobranças<br />
<strong>do</strong> poder público (LOOSE; GIRARDI,<br />
2009, p. 2).<br />
A Conferência das Nações Unidas sobre<br />
Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, conhecida<br />
como ECO-92, realizada em 1992, no Rio<br />
de Janeiro, é considerada um marco no senti<strong>do</strong> de<br />
nortear políticas públicas em prol <strong>do</strong> conceito de<br />
desenvolvimento sustentável. O resulta<strong>do</strong> prático<br />
desse propósito foi a Agenda 21, um programa de<br />
ações elabora<strong>do</strong> com participação de governos e<br />
entidades civis de 179 países, constituin<strong>do</strong>-se em<br />
um esforço pioneiro de a<strong>do</strong>ção, em escala global,<br />
de um modelo de desenvolvimento basea<strong>do</strong> em<br />
justiça social, conservação <strong>do</strong>s recursos naturais<br />
e em um paradigma evolutivo mensura<strong>do</strong> mais<br />
pela qualidade de vida <strong>do</strong> que pela quantidade<br />
<strong>do</strong> crescimento econômico.<br />
Em seu quarto capítulo, a Agenda 21<br />
coloca que “as principais causas da deterioração<br />
48<br />
No bojo das mudanças climáticas globais,<br />
questão que, no entender de Giddens (2010), “saltou<br />
para o primeiro plano das discussões e debates,<br />
não apenas neste ou naquele país, mas no mun<strong>do</strong><br />
inteiro” (p. 19), popularizar o entendimento quanto<br />
às contribuições individuais para o problema também<br />
se mostra fundamental.<br />
O autor cunhou, inclusive, um comportamento<br />
<strong>do</strong>minante que chamou de “para<strong>do</strong>xo de<br />
Giddens”, para ilustrar o resulta<strong>do</strong> de pesquisas de<br />
atitude a demonstrarem que, enquanto a maior<br />
parte da população mundial reconhece as mudanças<br />
<strong>do</strong> clima como uma grave ameaça, “apenas<br />
uns poucos se dispõem a alterar sua vida de mo<strong>do</strong><br />
significativo em decorrência disso” (GIDDENS,<br />
2010, p. 20).<br />
Pinto (2010) ilustra como sentimentos<br />
associa<strong>do</strong>s à prosperidade e ao sucesso pessoais<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 47-52, jul./dez. 2010. Editora UFPR
PINTO, M. Comunicação ambiental: os desafios de transcender a lógica da sociedade de consumo<br />
contribuem para a manutenção de comportamentos<br />
hoje consagra<strong>do</strong>s como danosos ao meio<br />
ambiente. Dá o exemplo da queima de combustíveis<br />
fósseis, apontada pela Ciência como vilã na<br />
emissão de gases de efeito estufa, mas que nem<br />
por isso obstaculiza o desejo comum de possuir<br />
um carro particular, “alimenta<strong>do</strong> rotineiramente<br />
como pressuposto de status”, no que a autora<br />
chama de “contradição à necessidade imperiosa<br />
de se privilegiar o transporte coletivo, cujo uso, no<br />
Brasil, é fortemente associa<strong>do</strong> à ‘pobreza’” (p. 10).<br />
São transformações culturais que demandam<br />
acesso à informação de qualidade, com o<br />
estabelecimento de causas e efeitos em relação ao<br />
problema. Quan<strong>do</strong> da criação <strong>do</strong> Fórum Brasileiro<br />
de Mudança Global <strong>do</strong> Clima, no ano de 2000, em<br />
seu artigo primeiro já se estabelecia como objetivo<br />
prioritário “conscientizar e mobilizar a sociedade<br />
para a discussão e tomada de posição sobre os<br />
problemas decorrentes da mudança <strong>do</strong> clima por<br />
gases de efeito estufa”.<br />
Destacam-se <strong>do</strong>is verbos plenamente<br />
associa<strong>do</strong>s ao papel da Comunicação, ao menos<br />
em tese: “conscientizar” e “mobilizar”. Entretanto,<br />
voltan<strong>do</strong> ao “para<strong>do</strong>xo de Giddens”, estaria o<br />
merca<strong>do</strong> midiático brasileiro esclarecen<strong>do</strong> de fato,<br />
ao público receptor, a necessidade emergencial de<br />
rever seus padrões de consumo Numa visão pró-<br />
-ativa, estariam os cidadãos sen<strong>do</strong> rotineiramente<br />
municia<strong>do</strong>s de subsídios que os capacitem a cobrar<br />
<strong>do</strong>s setores produtivos e <strong>do</strong>s poderes públicos investimentos<br />
e programas em observância concreta<br />
aos parâmetros <strong>do</strong> desenvolvimento sustentável<br />
Essas são questões recorrentes na esfera<br />
da chamada Comunicação Ambiental, seja sob<br />
uma avaliação baseada em critérios científicos, no<br />
universo acadêmico; seja em meio a observações<br />
empíricas a circularem em fóruns de profissionais<br />
<strong>do</strong> segmento. Contu<strong>do</strong>, o cerne <strong>do</strong> debate é potencialmente<br />
o mesmo: qual a dimensão da responsabilidade<br />
<strong>do</strong>s agentes da Comunicação brasileira<br />
frente à emergencial adequação da sociedade aos<br />
requisitos da nova ordem produtiva e de consumo<br />
Um longo caminho a percorrer<br />
No raio de atuação da chamada Comunicação<br />
Ambiental, emerge um desafio basilar<br />
na trajetória de conscientizar a sociedade quanto<br />
aos impactos <strong>do</strong> modelo de desenvolvimento<br />
vigente sobre os recursos naturais: transcender<br />
a lógica da sociedade de consumo.<br />
O Ministério da Educação <strong>do</strong> Brasil<br />
(2005) expõe que “em suas atividades de consumo,<br />
os indivíduos acabam agin<strong>do</strong> centra<strong>do</strong>s em<br />
si mesmos, sem se preocupar com as consequências<br />
de suas escolhas” (p. 15). Um procedimento<br />
que, na avaliação <strong>do</strong> órgão, reduz o cidadão ao<br />
papel de consumi<strong>do</strong>r, na medida em que impõe<br />
a ele “uma espécie de ‘obrigação moral e cívica<br />
de consumir’” (p. 15).<br />
No entanto, mesmo na esfera da educação<br />
ambiental formal, se observa uma tônica<br />
em apontar caminhos volta<strong>do</strong>s ao “consumo<br />
consciente”, ou seja, à seleção de produtos e<br />
serviços teoricamente comprometi<strong>do</strong>s com o<br />
respeito aos recursos naturais. Entretanto, ao<br />
mesmo tempo, pouco ou nada se fala quanto à<br />
necessidade de que as pessoas mais favorecidas<br />
economicamente repensem seus padrões no<br />
senti<strong>do</strong> de simplesmente consumir menos.<br />
O MEC (2005) registra que o consumo<br />
envolve coesão social, produção e reprodução<br />
de valores, por isso não poden<strong>do</strong> ser considera<strong>do</strong><br />
uma “atividade neutra, individual e despolitizada”<br />
(p. 15). Ao contrário, o ato de consumir é<br />
emblemático da forma como o cidadão encara<br />
o mun<strong>do</strong>, numa conexão entre seus “valores<br />
éticos, escolhas políticas, visões sobre a natureza<br />
e comportamentos” (p. 14) relaciona<strong>do</strong>s à essa<br />
prática cotidiana.<br />
No campo <strong>do</strong> jornalismo ambiental,<br />
Bueno (2007) propõe um caminho para o rompimento<br />
<strong>do</strong> merca<strong>do</strong> midiático com a estrutura<br />
capitalista que, via de regra, o sustenta:<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 47-52, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
49
PINTO, M. Comunicação ambiental: os desafios de transcender a lógica da sociedade de consumo<br />
O Jornalismo Ambiental deve propor-se<br />
política, social e culturalmente engaja<strong>do</strong>,<br />
porque só desta forma conseguirá encontrar<br />
forças para resistir às investidas<br />
e pressões de governos, empresas e<br />
até de universidades e institutos de<br />
pesquisa, muitos deles patrocina<strong>do</strong>s ou<br />
reféns <strong>do</strong>s grandes interesses. (BUENO,<br />
2007, p. 36)<br />
Esse confronto entre a notícia que<br />
potencialmente melindra o establishment e o<br />
direito <strong>do</strong> receptor a conhecer os fatos em profundidade<br />
– pressuposto para fazer sobre eles<br />
seu juízo de valor – denota o papel da mídia<br />
enquanto construtora de senti<strong>do</strong>s. Cria a “nítida<br />
sensação de pertencimento social” de que trata<br />
Gomes (2001) como resulta<strong>do</strong> da absorção de<br />
“imagens e informações que, através da mídia,<br />
estão no <strong>do</strong>mínio de to<strong>do</strong>s” (p. 202).<br />
Fica claro o desafio com que se depara<br />
o merca<strong>do</strong> midiático, se de fato se propuser a<br />
transformar o vigente sentimento de pertença<br />
social, a grosso mo<strong>do</strong> alimenta<strong>do</strong> pelo consumo.<br />
Como demonstram Sousa e Fernandes (2002), a<br />
função pedagógica <strong>do</strong>s meios de comunicação,<br />
particularmente com relação ao meio ambiente,<br />
tem implicações de ordem estrutural, uma vez<br />
que “as grandes redes estão organizadas como<br />
indústrias e como tal buscam sobrevivência<br />
merca<strong>do</strong>lógica dentro <strong>do</strong> sistema capitalista”<br />
(p. 162).<br />
À semelhança <strong>do</strong> que ocorre com o<br />
exercício <strong>do</strong> Jornalismo, configura-se também<br />
uma necessidade o reformular <strong>do</strong>s princípios<br />
epistemológicos da publicidade e da propaganda,<br />
cujo objetivo fundamental é justamente<br />
estimular o consumo, determinante como “diferencia<strong>do</strong>r<br />
identitário”, conforme expõem Ribeiro<br />
e Procópio (2007).<br />
Trata-se de um para<strong>do</strong>xo, pois as autoras<br />
demonstram que, ao mesmo tempo em que<br />
“o sujeito passa a auto-identificar-se pela propriedade”,<br />
o aspecto persuasivo da publicidade<br />
transcende a compulsão de adquirir produtos e/<br />
ou serviços: “visa também a adesão ao consenso<br />
social <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> que certo discurso sugere na<br />
relação <strong>do</strong> sujeito com os objetos e, conseqüentemente,<br />
com a sociedade" (p. 2).<br />
Dito de outro mo<strong>do</strong>, enquanto ao consumi<strong>do</strong>r<br />
aparenta fortalecer o caráter único de<br />
sua identidade, a publicidade reafirma valores e<br />
hábitos, “procura enquadrá-lo em determina<strong>do</strong><br />
molde, assujeitan<strong>do</strong>-o quan<strong>do</strong> o transforma em<br />
sujeito conduzi<strong>do</strong> pelas normas sociais, culturais<br />
e ideológicas” (p. 2).<br />
Marketing verde<br />
O trabalho <strong>do</strong> movimento ambientalista,<br />
na visão de Bedante (2004), foi a mola<br />
propulsora para a emergência de um novo tipo<br />
de consumi<strong>do</strong>r, o “ambientalmente orienta<strong>do</strong>”<br />
(p. 15), isto é, aquele cujo poder decisório de<br />
aquisição tornou-se fortemente pauta<strong>do</strong> pela<br />
“imagem ecologicamente correta de produtos”,<br />
resultante, na prática, em um “apelo diferencial<br />
à venda” (p. 18).<br />
Ainda que figure legítimo colocar sob<br />
suspeita as ideologias a nortearem esse nicho de<br />
negócios relativamente novo, pode-se ao menos<br />
vislumbrar que ele se revele proveitoso enquanto<br />
concepção alternativa a suprir os interesses da<br />
sociedade de consumo. Confronta, por exemplo,<br />
a estratégia apontada por Souza et al (2007),<br />
para quem<br />
é perceptível que, sob o discurso da<br />
inovação, as empresas têm conjuga<strong>do</strong><br />
as estratégias de obsolescência técnica e<br />
física para atender suas necessidades de<br />
curto prazo, em detrimento das necessidades<br />
<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, da sociedade e<br />
<strong>do</strong> ambiente (SOUZA et al, 2007, p. 7).<br />
50<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 47-52, jul./dez. 2010. Editora UFPR
PINTO, M. Comunicação ambiental: os desafios de transcender a lógica da sociedade de consumo<br />
No entanto, os efeitos <strong>do</strong> chama<strong>do</strong><br />
marketing verde ou ecológico sobre as decisões<br />
de compra ainda é terreno a exigir investigações<br />
mais consistentes, como aponta Pereira (2003).<br />
Estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> autor demonstrou uma “aparente indiferença<br />
aos apelos ecológicos nas embalagens<br />
por parte <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res” (p. 60), cenário<br />
que ele aventa dever-se à falta de credibilidade<br />
quanto aos da<strong>do</strong>s forneci<strong>do</strong>s por estas embalagens<br />
e, numa outra possibilidade, à “pouca<br />
informação por parte <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res sobre<br />
questões ambientais” (p. 60).<br />
De mo<strong>do</strong> geral, os resulta<strong>do</strong>s das hipóteses<br />
<strong>do</strong> trabalho de Pereira (2003) corroboram<br />
que as empresas a atuarem compromissadas<br />
com a responsabilidade ambiental agregam valor<br />
a suas marcas, sem que, contu<strong>do</strong>, esse mérito<br />
seja necessariamente transposto à intenção de<br />
compra <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res – “ou seja, estes não<br />
parecem dispostos a comprar produtos apenas<br />
porque estes demonstram preocupação com<br />
questões ambientais” (p. 63).<br />
Delimitar com ética e correção os<br />
preceitos da propaganda e <strong>do</strong> jornalismo nem<br />
sempre é tarefa fácil. Bueno (2007) expõe uma<br />
tendência, por parte de “mídias conserva<strong>do</strong>ras<br />
e comunica<strong>do</strong>res desavisa<strong>do</strong>s”, a tornar o jornalismo<br />
ambiental “refém de ações merca<strong>do</strong>lógicas<br />
ou empresariais e interesses políticos” (p.36).<br />
Nessa trajetória, diz o autor,<br />
Confundem jornalismo ambiental com<br />
marketing verde ou ecopropaganda, termos<br />
e práticas que se situam não apenas<br />
em campos conceituais e epistemológicos<br />
distintos, mas que estão atrela<strong>do</strong>s a<br />
compromissos de outra ordem (BUENO,<br />
2007, p. 36).<br />
Considerações finais<br />
A capacidade <strong>do</strong>s cidadãos em perceber<br />
a distinção concreta entre o discurso publicitário<br />
vela<strong>do</strong> e a informação jornalística confiável<br />
é determinada, fortemente, pelo cabedal de conhecimentos<br />
que cada receptor vai amealhan<strong>do</strong><br />
em seu cotidiano. Novamente, se estabelece um<br />
para<strong>do</strong>xo, da<strong>do</strong> que esse arcabouço é municia<strong>do</strong>,<br />
em grande parte, pela própria mídia.<br />
Se até agora, na qualidade de construtora<br />
de imaginários, a mídia – resguardadas exceções<br />
– mantém-se fornecen<strong>do</strong> nutrientes para<br />
a sociedade de consumo, ao mesmo tempo se vê<br />
diante de um cenário de degradação ambiental<br />
cada vez mais difícil de negligenciar, haja vista a<br />
gradual conscientização sobre o tema.<br />
Revela-se prioritário que o merca<strong>do</strong><br />
da Comunicação invista em capacitação para<br />
operar com responsabilidade e eficácia no bojo<br />
da nova ordem produtiva e de consumo que os<br />
desafios ambientais impõem. Um estímulo para<br />
o engajamento transforma<strong>do</strong>r, sob pena de,<br />
mantida a inércia, veículos jornalísticos sofrerem<br />
abalos em sua credibilidade e, por consequência,<br />
em seus ganhos <strong>do</strong> ponto de vista econômico.<br />
Da mesma forma, a publicidade claramente<br />
evolui se, atenta às demandas atuais,<br />
qualifica-se no senti<strong>do</strong> de subsidiar seus clientes<br />
de da<strong>do</strong>s que os impulsionem a abraçar o compromisso<br />
com o desenvolvimento sustentável,<br />
movimento cuja importância é crescente como<br />
diferencial positivo em competitividade.<br />
Nesse panorama, a Academia desponta<br />
como importante media<strong>do</strong>ra, sobretu<strong>do</strong> face à<br />
possibilidade de atuar diretamente junto aos<br />
varia<strong>do</strong>s extratos sociais, por intermédio de atividades<br />
de extensão. Essa aproximação entre a<br />
<strong>Universidade</strong> e a sociedade pode estabelecer um<br />
movimento de efeitos ímpares no processo de<br />
maior conscientização quanto a causas e efeitos<br />
de nossas práticas cotidianas. É o conhecimento<br />
exercen<strong>do</strong> seu pleno potencial transforma<strong>do</strong>r, no<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 47-52, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
51
PINTO, M. Comunicação ambiental: os desafios de transcender a lógica da sociedade de consumo<br />
esforço inadiável de salvaguardar a biodiversidade<br />
planetária; em especial, a qualidade de vida<br />
da espécie humana.<br />
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52<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 47-52, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Experiências no programa universidade sem fronteiras:<br />
contribuição de um módulo didático de educação ambiental em<br />
escolas de educação básica<br />
Experiences at "<strong>Universidade</strong> sem Fronteiras" program: contribution of<br />
a Didactic Module about Environmental Education<br />
in basic education schools<br />
Experiencias en el "Programa <strong>Universidade</strong> sem Fronteiras":<br />
contribución de un módulo didáctico de educación medioambiental en<br />
escuelas de educación básica<br />
Luciana Paula Vieira 1<br />
Juliana Moreira Prudente de Oliveira 1/2<br />
Kassiana da Silva Miguel 1<br />
Daniela Frigo Ferraz 3<br />
André Luis de Oliveira 4<br />
Anelize Queiroz Amaral 4<br />
RESUMO<br />
No processo de formação de professores, discute-se muito como superar a distância entre a teoria e a<br />
prática, pois normalmente a preparação <strong>do</strong>s cursos de formação é insuficiente para dar conta das realidades<br />
encontradas nos contextos em que os professores irão atuar após sua formação inicial. Uma das<br />
formas de superar esse distanciamento é pelo desenvolvimento de atividades extensionistas nos campos<br />
de atuação profissional, já no início <strong>do</strong> curso. O desenvolvimento desse tipo de projetos favorece a relação<br />
entre a população e a academia, aproximan<strong>do</strong> o saber <strong>do</strong> fazer. Neste trabalho procurou-se analisar as<br />
contribuições <strong>do</strong> projeto de extensão denomina<strong>do</strong> "Articulação entre formação inicial na licenciatura em<br />
Ciências Biológicas e a comunidade escolar: trilhan<strong>do</strong> novos caminhos", promovi<strong>do</strong> nas escolas e realiza<strong>do</strong><br />
por meio das atividades desenvolvidas durante as aplicações de um Módulo Didático (MD) sobre Educação<br />
Ambiental. O módulo envolveu atividades teórico-práticas e dinâmicas relacionadas ao tema, trabalhadas<br />
conforme a meto<strong>do</strong>logia problematiza<strong>do</strong>ra proposta por Delizoicov (2005). Pode-se perceber, em to<strong>do</strong>s os<br />
momentos, grande motivação <strong>do</strong>s alunos. Essas experiências foram únicas e de extrema importância para<br />
a formação inicial <strong>do</strong>s acadêmicos envolvi<strong>do</strong>s, uma vez que possibilitou maior contato com a futura área<br />
de atuação e intensa troca de conhecimento com os já profissionais e atuantes no ensino.<br />
Palavras-chave: Extensão Universitária; Educação Ambiental; Módulo didático; Atividades de sensibilização;<br />
Representação de Meio Ambiente.<br />
1 Acadêmicas de Ciências Biológicas– Licenciatura/UNIOESTE/Campus Cascavel (bolsistas <strong>do</strong> projeto menciona<strong>do</strong> no resumo, o qual é<br />
vincula<strong>do</strong> ao programa <strong>Universidade</strong> Sem Fronteiras e apoia<strong>do</strong> pela SETI/PR). Endereço: Rua Ômega, Quadra 08, Lote 10, Residencial<br />
Grama<strong>do</strong> II – CEP: 85818 – 770 – Cascavel – PR/ Fone: 3220- 3238/ 9114-8748/ Email: lpveacc@yahoo.com.br<br />
2 Licenciada em Ciências Biológicas/UNIOESTE/Campus Cascavel (Bolsista recém-formada <strong>do</strong> projeto cita<strong>do</strong>).<br />
3 Professora Ms. coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> projeto/UNIOESTE/Campus Cascavel.<br />
4 Professores Ms. colabora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> projeto/UNIOESTE/Campus Cascavel.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 53-62, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
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VIEIRA, L. P. et al. Experiências no programa universidade sem fronteiras: contribuição de um módulo didático de educação ambiental...<br />
ABSTRACT<br />
In the process of teachers formation, is a lot<br />
discussed how to overcome the distance between<br />
theory and practice, because normally, the preparing<br />
of the formation courses is insufficiently<br />
to bear the realities found in the contexts that<br />
the teachers will act after their initial graduation.<br />
One of the ways to overcome this distance is by<br />
developing de activities extended in the fields of<br />
professional acting, in the very beginning of the<br />
graduation course. The development of these<br />
sort of projects favors the relation between population<br />
and the academy, enclosing the “knowing”<br />
to the “<strong>do</strong>ing”. In this paper, it was tried to<br />
analyze the contributions of the extension project<br />
called: Articulation between the initial formation<br />
in the graduation course of biological Sciences<br />
and the school community: crossing new paths,<br />
promoted in the schools e <strong>do</strong>ne by means of<br />
the developed activities during the application<br />
of a Didactic Module (DM) over Environmental<br />
Education. The module involved theoreticalpractical<br />
activities and dynamics related to the<br />
theme, worked as the problematizing metho<strong>do</strong>logy<br />
purposed by Delizoicov (2005). We could<br />
notice in every moment, good motivation by the<br />
students. These experiments were unique and<br />
of extreme importance to the initial formation<br />
of the graduating students involved, as it made<br />
possible a better contact with the future area of<br />
acting and intense exchange of knowledge with<br />
the professionals already acting at teaching.<br />
Keywords: Graduating Extension; Environmental<br />
Education; Didactic Module awareness activities;<br />
Representation of Environment.<br />
RESUMEN<br />
En ele proceso de formación de profesores,<br />
demasiadamente se discute acerca de cómo<br />
sobrepasar la distancia entre la teoría y la práctica,<br />
una vez que, normalmente, la preparación<br />
de los cursos de formación es insuficiente para<br />
dar cuenta de las realidades encontradas en<br />
los contextos <strong>do</strong>nde los profesores irán actuar<br />
después de su formación inicial. Unas de las<br />
formas de sobrepasar ese distanciamiento es por<br />
el desarrollo de actividades de extensión en los<br />
campos de actuación profesional, ya al principio<br />
del curso. El desarrollo de este tipo de proyectos<br />
es de gran importancia a la relación entre la<br />
populación y la academia, pues aproxima el<br />
saber del hacer. En este trabajo se buscó analizar<br />
las contribuciones del proyecto de extensión<br />
denomina<strong>do</strong>: Articulación entre formación inicial<br />
en la licenciatura en Ciencias Biológicas y la comunidad<br />
escolar: búsqueda de nuevos caminos,<br />
promociona<strong>do</strong> en las escuelas y realiza<strong>do</strong>, por<br />
medio de las actividades desarrolladas durante<br />
las aplicaciones de un Modulo Didáctico (MD)<br />
acerca de la Educación Ambiental. El modulo<br />
arrolló actividades teórico-practicas y dinámicas<br />
relacionadas al tema, laboradas conforme la<br />
meto<strong>do</strong>logía problematiza<strong>do</strong>ra propuesta por<br />
Delizoicov (2005). Se pu<strong>do</strong> percibir, en to<strong>do</strong>s<br />
los momentos, gran motivación de los alumnos.<br />
Esas experiencias fueran únicas y de extrema<br />
importancia para la formación inicial de los<br />
académicos participantes, una vez que posibilitó<br />
mayor contacto con la futura área de actuación<br />
e intenso cambio de conocimientos con los<br />
profesionales que ya actúan en la enseñanza.<br />
Palabras-clave: Extensión Universitaria; Educación<br />
ambiental; Modulo didáctico; Actividades<br />
de sensibilización; Representación del medio<br />
ambiente.<br />
Introdução<br />
A reflexão sobre formação de professores<br />
deve considerar, entre outros fatores, que o conhecimento<br />
científico produzi<strong>do</strong>, principalmente nas<br />
áreas de ciência e tecnologia, é fator determinante<br />
das transformações ocorridas no mun<strong>do</strong> contemporâneo.<br />
Ao mesmo tempo, não se pode perder<br />
de vista que deve haver um equilíbrio para que<br />
essas transformações não sejam tão danosas ao<br />
meio ambiente, equilíbrio que está estreitamente<br />
relaciona<strong>do</strong> às atitudes humanas.<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, no âmbito educacional, é<br />
necessária a seleção de conteú<strong>do</strong>s e meto<strong>do</strong>logias<br />
que possam nortear as ações em sala de aula, acompanhan<strong>do</strong><br />
a evolução da ciência. É preciso repensar<br />
o perfil <strong>do</strong> professor que se quer formar e o papel<br />
das instituições responsáveis por sua formação.<br />
Seria conveniente que as licenciaturas<br />
incluíssem em seu projeto pedagógico atividades<br />
em que o discente possa assumir efetivamente o<br />
papel <strong>do</strong> professor. O convívio <strong>do</strong> futuro profissional<br />
no âmbito escolar, junto aos alunos, professores e<br />
administra<strong>do</strong>res é importante para propor novas<br />
ideias e analisá-las ativamente (AMARAL, 2006).<br />
Promover uma prática de ensino, pela<br />
qual professores e alunos tenham a oportunidade de<br />
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desenvolver trabalhos de intervenção na realidade<br />
e no cotidiano escolar é uma forma de ensinar e,<br />
ao mesmo tempo, formar pesquisa<strong>do</strong>res reflexivos,<br />
pois estan<strong>do</strong> no ambiente escolar, pode-se discutir<br />
e refletir sobre situações que são próprias dessa realidade,<br />
tanto de forma individual (com cada aluno/<br />
pesquisa<strong>do</strong>r) como coletiva (professores/alunos pesquisa<strong>do</strong>res)<br />
(JUSTINA et al., 2005). Essa perspectiva<br />
também é válida para outras atividades de ensino ou<br />
de extensão que promovam a troca de experiências<br />
entre as escolas de educação básica e as instituições<br />
de ensino superior, analisan<strong>do</strong> e discutin<strong>do</strong> as várias<br />
realidades defini<strong>do</strong>ras dessa formação.<br />
Neste trabalho serão discutidas algumas<br />
propostas para buscar a unidade entre a teoria<br />
e a prática com o intuito de melhor preparar os<br />
acadêmicos para atuar nas realidades escolares da<br />
educação básica. Neste senti<strong>do</strong>, o desenvolvimento<br />
de projetos de extensão é uma alternativa que favorece<br />
a relação entre a população e a academia,<br />
propician<strong>do</strong> um aprofundamento da relação teoria/<br />
prática (FÓRUM, 2001).<br />
Para Ferreira (1986), extensão é “o ato<br />
ou efeito de estender, ampliar, desenvolver”, isto<br />
é, o que almejamos fazer neste projeto: estender a<br />
prática de ensino a municípios distantes <strong>do</strong>s locais<br />
habituais de atuação da <strong>Universidade</strong>, amplian<strong>do</strong><br />
o conhecimento construí<strong>do</strong> na <strong>Universidade</strong> e desenvolven<strong>do</strong><br />
novas meto<strong>do</strong>logias, na perspectiva de<br />
aperfeiçoamento da formação inicial <strong>do</strong> licencian<strong>do</strong>.<br />
Para Rodrigues, Oliveira e Robazzi (1993) as atividades<br />
de extensão possibilitam uma interposição de<br />
ideias e informações e que a partir deste intercâmbio<br />
podem ocorrer transformações.<br />
Objetivan<strong>do</strong> o enriquecimento de experiências<br />
na formação inicial de acadêmicos <strong>do</strong> curso<br />
de Ciências Biológicas, bem como a contribuição às<br />
escolas de educação básica (EEB) foi cria<strong>do</strong> o projeto:<br />
Articulação entre formação inicial na licenciatura<br />
em Ciências Biológicas e a comunidade escolar:<br />
trilhan<strong>do</strong> novos caminhos. Esse projeto de extensão<br />
está liga<strong>do</strong> ao programa: <strong>Universidade</strong> sem fronteiras,<br />
subprograma de apoio às licenciaturas, vincula<strong>do</strong><br />
à Secretaria de Esta<strong>do</strong> da Ciência, Tecnologia e<br />
Ensino Superior <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Paraná – SETI/PR – e<br />
vem sen<strong>do</strong> desenvolvi<strong>do</strong> desde o ano de 2007. O<br />
projeto é desenvolvi<strong>do</strong> em quatro escolas públicas<br />
de educação básica <strong>do</strong>s municípios de Catanduvas,<br />
Ibema e Campo Bonito, escolhi<strong>do</strong>s por possuírem<br />
baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH),<br />
atenden<strong>do</strong> ao que propõe o Fórum de Pró-reitores<br />
de Extensão das <strong>Universidade</strong>s Públicas Brasileiras<br />
(2001): a extensão deve desempenhar o compromisso<br />
que a <strong>Universidade</strong> tem com a sociedade.<br />
Inicialmente foram realizadas visitas a essas<br />
escolas a fim de levantar temáticas prioritárias, ou<br />
seja, quais os temas urgentes para serem trabalha<strong>do</strong>s<br />
com os alunos. Nessas visitas, desenvolveram-se reuniões<br />
com a equipe pedagógica da escola e com professores<br />
de diversas disciplinas que indicaram, como<br />
necessário, o desenvolvimento <strong>do</strong>s seguintes temas:<br />
sexualidade, afetividade/autoestima, educação<br />
ambiental, drogas e higiene/nutrição. No trabalho<br />
aqui apresenta<strong>do</strong> será discuti<strong>do</strong> o desenvolvimento<br />
de um desses temas, que é a Educação ambiental.<br />
Esse trabalho atende à perspectiva sobre extensão<br />
da Avaliação Nacional da Extensão Universitária<br />
proposta pelo Fórum (2001, p. 27): as atividades<br />
de extensão devem focalizar suas ações em grandes<br />
temas sociais e às necessidades locais e/ou regionais.<br />
Com os temas seleciona<strong>do</strong>s a equipe <strong>do</strong><br />
projeto, formada por professores orienta<strong>do</strong>res e<br />
colabora<strong>do</strong>res, acadêmicos bolsistas e colabora<strong>do</strong>res<br />
e um professor recém-forma<strong>do</strong> na licenciatura<br />
em Ciências Biológicas, da <strong>Universidade</strong> Estadual<br />
<strong>do</strong> Oeste <strong>do</strong> Paraná – UNIOESTE, campus de<br />
Cascavel, PR, foram elabora<strong>do</strong>s os Módulos Didáticos<br />
(MD), fundamenta<strong>do</strong>s em uma meto<strong>do</strong>logia<br />
problematiza<strong>do</strong>ra associada a atividades lúdicas.<br />
Segun<strong>do</strong> Delizoicov (2005), a meto<strong>do</strong>logia<br />
problematiza<strong>do</strong>ra tem o potencial de gerar no<br />
aluno a necessidade da obtenção de conhecimento.<br />
Nesse processo o <strong>do</strong>cente pode verificar, também, os<br />
conhecimentos prévios <strong>do</strong>s alunos, poden<strong>do</strong> realizar<br />
discussões na sala de aula e localizar possíveis contradições<br />
e limitações <strong>do</strong>s alunos. Essa meto<strong>do</strong>logia,<br />
na proposição de Delizoicov e Angotti (2000), é<br />
dividida em três momentos pedagógicos principais:<br />
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• Problematização inicial: são apresentadas situações<br />
reais que os alunos conhecem e presenciam<br />
relacionadas a um tema, problematiza-se então o<br />
conhecimento que os alunos vão expon<strong>do</strong>, a partir<br />
de poucas questões propostas; sem necessariamente<br />
respondê-las. Promove-se então uma discussão com<br />
um problema que possa ser enfrenta<strong>do</strong>, fazen<strong>do</strong><br />
com que o aluno sinta a necessidade da aquisição<br />
de outros conhecimentos que ainda não detém;<br />
• Organização <strong>do</strong> conhecimento: trabalha-se<br />
então o conhecimento seleciona<strong>do</strong> acerca <strong>do</strong> tema<br />
sob a orientação <strong>do</strong> professor, para a compreensão<br />
científica da situação problematizada inicialmente;<br />
• Aplicação <strong>do</strong> conhecimento: esse momento<br />
destina-se a abordar sistematicamente o conhecimento<br />
que vem sen<strong>do</strong> incorpora<strong>do</strong> pelo aluno<br />
para observar tanto a situação proposta inicialmente<br />
como outras que possam ser entendidas<br />
pelo mesmo conhecimento. Depois de prontos,<br />
os módulos foram apresenta<strong>do</strong>s aos <strong>do</strong>centes e<br />
responsáveis pelas escolas e adapta<strong>do</strong>s conforme<br />
suas sugestões, pois segun<strong>do</strong> Rodrigues, Oliveira<br />
e Robazzi (1993), para planejar e implementar a<br />
extensão é necessária uma legítima articulação com<br />
a comunidade para que possa ocorrer ampliação <strong>do</strong><br />
papel da <strong>Universidade</strong>. O que é possível por meio<br />
da troca de experiências com a comunidade que<br />
contribui para o conhecimento da academia, e esta,<br />
por sua vez, repassa assim o seu saber acadêmico,<br />
garantin<strong>do</strong> uma legítima e saudável bilateralidade<br />
<strong>do</strong>s benefícios.<br />
O Módulo Didático (MD) de Educação<br />
Ambiental foi planeja<strong>do</strong> com os seguintes objetivos:<br />
refletir sobre a importância da educação ambiental<br />
como instrumento de transformação social; compreender<br />
aspectos gerais <strong>do</strong>s processos de degradação<br />
e cuida<strong>do</strong>s com o meio ambiente; levar informações<br />
para o aluno aplicar não só em sala de aula, mas<br />
na sua vida, transmitin<strong>do</strong> as informações à família,<br />
amigos, entre outros, divulgan<strong>do</strong> a importância da<br />
preservação <strong>do</strong> meio ambiente. Para o desenvolvimento<br />
<strong>do</strong> MD, foram elaboradas atividades de<br />
caráter lúdico, como a Trilha ambiental e a Teia<br />
ecológica.<br />
56<br />
A seguir, apresenta-se um relato da experiência<br />
no desenvolvimento <strong>do</strong> MD aplica<strong>do</strong> nas<br />
escolas participantes <strong>do</strong> projeto e discutem-se as<br />
representações apresentadas pelos alunos sobre<br />
meio ambiente, durante a implementação <strong>do</strong> MD,<br />
e como fazer para ampliar suas percepções sobre<br />
o tema com a aplicação das atividades propostas.<br />
Ao mesmo tempo, visualiza-se a importância <strong>do</strong><br />
desenvolvimento <strong>do</strong> tema para os acadêmicos em<br />
formação inicial em contextos que podem vivenciar<br />
situações reais de ensino nas quais haja o contato<br />
com guias mais experientes, os professores das<br />
escolas envolvidas, promoven<strong>do</strong> uma relação de<br />
troca <strong>do</strong> saber teórico-prático.<br />
O Desenvolvimento <strong>do</strong> Módulo Didático<br />
de Educação Ambiental<br />
Na primeira atividade proposta no<br />
MD, desenvolvida durante o primeiro momento<br />
pedagógico, ou seja, durante a Problematização<br />
Inicial (PI), foi entregue a cada aluno uma folha de<br />
papel sulfite em branco, solicitan<strong>do</strong>-se a eles que<br />
desenhassem o meio ambiente. Esta atividade foi<br />
realizada ao mesmo tempo em que passava um<br />
vídeo anima<strong>do</strong>, ilustran<strong>do</strong> as partes da letra da<br />
música Aquarela, <strong>do</strong> cantor Toquinho (2009), que<br />
fala sobre a viagem que pode ser feita através da<br />
imaginação, utilizada para que os alunos pudessem<br />
relaxar e soltar sua imaginação. O objetivo dessa<br />
atividade foi verificar nos desenhos <strong>do</strong>s alunos se<br />
eles demonstram uma concepção sobre a integração<br />
<strong>do</strong> ser humano com o meio ambiente.<br />
De acor<strong>do</strong> com Mansano (2006), ao<br />
analisar as representações e impressões <strong>do</strong>s alunos,<br />
percebe-se que as suas formas de verem os espaços<br />
vão além <strong>do</strong> que os olhos conseguem identificar,<br />
pois perceber é sentir, é vivenciar, é experimentar.<br />
Neste momento, foi possível notar uma<br />
grande motivação <strong>do</strong>s alunos com a atividade,<br />
visto que perguntavam se poderiam pintar seus<br />
desenhos, o que faziam com muita dedicação.<br />
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Após o término da atividade, verificou-se que a<br />
maioria <strong>do</strong>s desenhos continha apenas plantas<br />
e/ ou animais, o que demonstrou a dificuldade<br />
de os alunos perceberem a integração <strong>do</strong> homem<br />
com o meio, por possuírem uma visão naturalista<br />
de ambiente, que evidencia, segun<strong>do</strong> Reigota<br />
(1998), os aspectos naturais <strong>do</strong> meio ambiente.<br />
Um exemplo de um desses desenhos pode ser<br />
visualiza<strong>do</strong> na Figura. 1<br />
FIGURA 1 - REPRESENTAÇÕES NATURALISTAS<br />
De acor<strong>do</strong> com Reigota (2002), a<br />
grande maioria <strong>do</strong>s alunos representa o meio<br />
ambiente como sinônimo de natureza, “elementos<br />
bióticos e abióticos”, ten<strong>do</strong> a natureza como<br />
algo intoca<strong>do</strong>.<br />
No desenho de outros alunos, verificou-se<br />
uma representação de meio ambiente<br />
globalizante. De acor<strong>do</strong> com Reigota (2002), a<br />
ideia de uma natureza transformada pela ação<br />
humana aparece com maior dificuldade, haja<br />
vista a impossibilidade <strong>do</strong>s alunos incorporarem<br />
espontaneamente questões que satisfaçam<br />
totalidade <strong>do</strong> problema, em que o homem é<br />
apresenta<strong>do</strong> como elemento constitutivo <strong>do</strong><br />
meio ambiente, enquanto ser social, viven<strong>do</strong><br />
em comunidades. Dois desenhos <strong>do</strong>s alunos<br />
são representativos dessa visão, conforme se<br />
visualiza na Figura 2<br />
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FIGURA 2 - REPRESENTAÇÕES GLOBALIZANTES<br />
Na sequência das atividades propostas,<br />
foram seleciona<strong>do</strong>s to<strong>do</strong>s os desenhos que<br />
continham representações globalizantes (que<br />
sempre eram poucos) e apresenta<strong>do</strong>s aos alunos,<br />
ao mesmo tempo em que se discutia com<br />
eles se estes desenhos também representavam<br />
o meio ambiente. Essa atividade tinha como<br />
finalidade demonstrar que o meio ambiente<br />
é muito mais <strong>do</strong> que os ambientes naturais<br />
que costumamos imaginar e que devemos ter<br />
uma visão globalizante de meio ambiente, que<br />
considere as relações recíprocas entre natureza<br />
e sociedade (REIGOTA, 1998) e não apenas<br />
naturalista. Também foi possível constatar que<br />
esta atividade deixou os alunos à vontade para<br />
indagar na busca por um entendimento mais<br />
amplo, conforme falas <strong>do</strong>s alunos:<br />
Ah! Professora, então a escola também<br />
é meio ambiente A1.<br />
Então por que estamos construin<strong>do</strong> e<br />
avançan<strong>do</strong> para dentro da floresta é<br />
que o meio ambiente é tu<strong>do</strong> que nos<br />
rodeia A2.<br />
As falas denotam uma representação<br />
mais abrangente sobre o meio ambiente, porém,<br />
é possível perceber na descrição <strong>do</strong> aluno<br />
A2 uma concepção antropocêntrica acerca da<br />
temática, pois considera o ambiente como os<br />
elementos que estão em seu entorno, ou seja,<br />
à sua disposição. Tal interpretação vem ao encontro<br />
da classificação de representação de meio<br />
ambiente antropocêntrica realizada por Reigota<br />
(1998). Além disso, na visão de Sauvé (1997), o<br />
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ambiente pode ser entendi<strong>do</strong> como: a natureza,<br />
um recurso, um problema, um lugar para se viver,<br />
a biosfera e como um projeto. Nesses relatos, os<br />
alunos revelaram o entendimento de ambiente<br />
como natureza e lugar para viver, evidencia<strong>do</strong><br />
na fala <strong>do</strong> aluno A1.<br />
Almejan<strong>do</strong> visualizar a percepção <strong>do</strong>s<br />
alunos sobre problemática ambiental, ainda<br />
durante a PI, foram escritos sobre um pedaço de<br />
papel par<strong>do</strong> (na forma de cartaz) os problemas<br />
ambientais aponta<strong>do</strong>s pelos alunos. Primeiro,<br />
citaram os problemas de sua cidade, depois,<br />
os problemas nacionais, posteriormente, os<br />
problemas globais. Esta atividade objetivou<br />
levantar com os educan<strong>do</strong>s uma listagem <strong>do</strong>s<br />
principais problemas ambientais locais, com alguns<br />
comentários, diagnostican<strong>do</strong> o seu grau de<br />
preocupação e esclarecimento sobre o assunto,<br />
bem como a percepção <strong>do</strong>s problemas ambientais<br />
mais gerais no globo terrestre.<br />
Por meio desta atividade, identificou-se<br />
a dificuldade que os alunos possuem em organizar<br />
o (vasto) conhecimento que possuem, uma<br />
vez que eles indicavam problemas diretamente<br />
relaciona<strong>do</strong>s e que poderiam ser resumi<strong>do</strong>s em<br />
um só, como nas seguintes falas:<br />
Derretimento das geleiras. A3.<br />
Aquecimento global. A4.<br />
Aumento <strong>do</strong> nível <strong>do</strong> mar. A5.<br />
Estes três exemplos de problemas<br />
poderiam ter si<strong>do</strong> resumi<strong>do</strong>s em “aquecimento<br />
global”, que causa os demais. Então, quan<strong>do</strong><br />
dizíamos isso a eles, estes se empolgavam para<br />
tentar entender qual a forma correta de falar<br />
sobre os problemas, de qual forma eles realmente<br />
eram ocasiona<strong>do</strong>s, tentan<strong>do</strong>, muitas vezes, passar<br />
deste passo meto<strong>do</strong>lógico que era a problematização<br />
para a organização <strong>do</strong> conhecimento.<br />
Outra constatação realizada nesta<br />
atividade foi o grau de interação <strong>do</strong>s alunos e<br />
o alto nível de correlação entre a problemática<br />
ambiental, já que estes, na medida em que citavam<br />
os problemas, exemplificavam suas falas<br />
com um acontecimento real em suas cidades,<br />
escolas, famílias e outros ambientes, como fica<br />
evidente na fala que segue:<br />
Tráfico de animais. A professora sabia<br />
que aqui na cidade tem um homem que<br />
coloca um alçapão na janela da casa<br />
e pega passarinhos para vender Isso<br />
também é trafico, não é professora A7.<br />
A fala citada revela a necessidade <strong>do</strong>s<br />
educa<strong>do</strong>res assumirem, ao longo <strong>do</strong> exercício de<br />
sua profissão, a responsabilidade de sensibilizar<br />
seus alunos em relação aos problemas ambientais<br />
locais. Para tanto, é preciso acreditar que<br />
os problemas serão ameniza<strong>do</strong>s na medida em<br />
que os alunos estiverem conscientes das condições<br />
ambientais que circundam sua realidade<br />
e o quanto é importante tentar restaurar sua<br />
condição original ou preservar sua integridade.<br />
Corroboran<strong>do</strong> esta ideia, Layrargues (2001) observa<br />
que a resolução de problemas ambientais<br />
locais é uma das recomendações da Conferência<br />
de Tbilisi como estratégia meto<strong>do</strong>lógica da ação<br />
educativa. Para o autor, esta estratégia busca:<br />
[...] uma aproximação <strong>do</strong> vínculo entre<br />
os processos educativos e a realidade<br />
cotidiana <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s, onde a ação<br />
local representa a melhor oportunidade<br />
tanto <strong>do</strong> enfrentamento <strong>do</strong>s problemas<br />
ambientais, como da compreensão<br />
da complexa interação <strong>do</strong>s aspectos<br />
ecológicos com os político-econômicos<br />
e socioculturais da questão ambiental<br />
(LAYRARGUES, 2001, p. 133).<br />
No momento de organização <strong>do</strong> conhecimento<br />
foram exibi<strong>do</strong>s slides, com o uso da TV<br />
Pen drive (que é uma TV usada no esta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
Paraná com um dispositivo USB, que possibilita<br />
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VIEIRA, L. P. et al. Experiências no programa universidade sem fronteiras: contribuição de um módulo didático de educação ambiental...<br />
o trabalho com imagens, vídeos e apresentações,<br />
como um Data show que expõe a imagem em<br />
um tamanho menor), segui<strong>do</strong>s da explicação <strong>do</strong>s<br />
acadêmicos trazen<strong>do</strong> o conhecimento científico,<br />
para que os alunos refletissem sobre o meio<br />
ambiente, seus componentes e o uso consciente<br />
<strong>do</strong>s bens naturais.<br />
Nestes slides mostrou-se que o ecossistema<br />
é forma<strong>do</strong> por componentes bióticos<br />
e abióticos, explican<strong>do</strong> resumidamente cada<br />
um destes termos; num segun<strong>do</strong> momento<br />
apresentou-se o vídeo A turma da Clarinha e<br />
o ciclo da água (2008) que trata da água, de<br />
como este bem natural se apresenta na natureza,<br />
sua importância, como ocorre o processo de<br />
tratamento, a importância <strong>do</strong> uso de esgotos e<br />
a questão <strong>do</strong> desperdício de água.<br />
Após esses procedimentos, foram<br />
apresentadas temáticas relacionadas ao solo, ar<br />
e as principais formas de contaminação, sempre<br />
buscan<strong>do</strong> exemplos que permitiam a reflexão<br />
sobre atitudes cotidianas. Explicou-se, também,<br />
o que são cadeias alimentares, a fim de promover<br />
o entendimento de que to<strong>do</strong>s os organismos são<br />
importantes na manutenção <strong>do</strong> ecossistema.<br />
Durante a explicação os alunos fizeram alguns<br />
questionamentos, conforme se pode verificar na<br />
fala a seguir:<br />
Mas professora então até a cobra que<br />
é tão malvada e o tubarão são importantes!<br />
Como fazer então se uma cobra<br />
entrar na minha casa, já que ela é importante,<br />
não posso matar! A6.<br />
Durante a organização <strong>do</strong> conhecimento,<br />
verificou-se que houve um confronto<br />
entre as ideias prévias <strong>do</strong>s alunos e a busca pela<br />
aplicação prática <strong>do</strong>s conhecimentos adquiri<strong>do</strong>s,<br />
conforme exemplifica<strong>do</strong> nas falas <strong>do</strong>s alunos<br />
abaixo:<br />
Já que o uso de agrotóxicos é uma forma<br />
de poluição <strong>do</strong> ar, como devemos fazer<br />
então A7.<br />
Mas na minha cidade só tem fossa, como<br />
fazer para colocar esgoto A8.<br />
Falou-se também sobre o lixo e os problemas<br />
envolvi<strong>do</strong>s nesta questão, com o apoio<br />
<strong>do</strong> vídeo Tá limpo! de Christina Koening (2009),<br />
que mostra os problemas relaciona<strong>do</strong>s ao lixo,<br />
como enchentes, perda da boa aparência e <strong>do</strong>enças<br />
trazidas por vetores que se instalam nos<br />
lixos. Neste mesmo vídeo ao se dar conta destes<br />
problemas, os personagens encontraram uma<br />
boa solução: fizeram separação de lixo e com isso<br />
empregaram pessoas (diminuin<strong>do</strong> a miséria) e<br />
arrecadaram fun<strong>do</strong>s para aquisição de produtos<br />
necessários para eles, como ferramentas, livros<br />
e panelas para as escolas <strong>do</strong> Bairro. Este vídeo<br />
ficou bem contextualiza<strong>do</strong> e, quan<strong>do</strong> iniciada a<br />
discussão, novamente os alunos se mostraram<br />
muito interessa<strong>do</strong>s queren<strong>do</strong> participar, comentar,<br />
como pode ser verifica<strong>do</strong> nas falas abaixo:<br />
Tinha ratos e baratas no lixo e eles transmitem<br />
<strong>do</strong>enças por que levam micróbios<br />
no corpo. A9.<br />
O médico falou que tinham muitos<br />
casos de <strong>do</strong>enças por que tinha muito<br />
lixo ali. A10.<br />
Após esses questionamentos colocamos<br />
questões referentes ao consumo relaciona<strong>do</strong><br />
ao desperdício. De acor<strong>do</strong> Brügger (1994), os<br />
problemas ambientais e sociais liga<strong>do</strong>s ao lixo<br />
têm origem numa mentalidade instrumental refletida<br />
em comportamentos utilitaristas, próprios<br />
de uma sociedade que se organiza de maneira<br />
insustentável. Enfrentar tais problemas, sob o<br />
ponto de vista da autora, implica a construção<br />
de uma crítica profunda a to<strong>do</strong> um modelo de<br />
civilização, pois o privilégio da<strong>do</strong> a soluções<br />
técnicas consolida a alienação e leva à crença<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 53-62, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
59
VIEIRA, L. P. et al. Experiências no programa universidade sem fronteiras: contribuição de um módulo didático de educação ambiental...<br />
equivocada de que a produção <strong>do</strong> lixo é algo<br />
natural, que seus problemas afetam a to<strong>do</strong>s indistintamente<br />
e que a sua correta manipulação<br />
viabiliza a reprodução <strong>do</strong>s padrões atuais de<br />
organização social.<br />
Portanto, no trabalho com a questão<br />
<strong>do</strong> lixo, os professores enfatizam os processos de<br />
coleta seletiva e reciclagem como melhor solução<br />
para amenizar o problema. Dessa forma deixam<br />
de refletir sobre questões como a educação <strong>do</strong><br />
consumo, desperdício e reutilização <strong>do</strong>s produtos<br />
que precedem a questão da reciclagem <strong>do</strong> lixo.<br />
De acor<strong>do</strong> com Cinquetti e Carvalho<br />
(2003):<br />
para a proteção de nascentes e rios. Conforme<br />
defende Krasilchik (2008), o uso de demonstrações<br />
é útil para que to<strong>do</strong>s os alunos possam<br />
visualizar o mesmo fenômeno ao mesmo tempo<br />
e serve como ponto de partida para discussão.<br />
Para esta modalidade didática, utilizamos a maquete<br />
de um rio em que uma margem continha<br />
mata ciliar e a outra não. Assim, ao despejarmos<br />
água sobre as margens (simbolizan<strong>do</strong> a chuva)<br />
ficou evidente que onde não tinha mata ciliar a<br />
terra era levada para dentro <strong>do</strong> rio, como pode<br />
ser visualiza<strong>do</strong> na Figura 3.<br />
60<br />
Causam, por exemplo, menos impacto<br />
ambiental eliminan<strong>do</strong> o consumo de<br />
descartáveis (filtro de café e guardanapos,<br />
fraldas, canu<strong>do</strong>s, copos plásticos)<br />
<strong>do</strong> que reciclan<strong>do</strong> ou reutilizan<strong>do</strong> esses<br />
produtos. A reciclagem de qualquer<br />
material implica impactos ambientais,<br />
pelo gasto de energia no processo industrial<br />
e no transporte <strong>do</strong>s materiais<br />
recicláveis, pelos recursos naturais<br />
adicionais no caso <strong>do</strong>s materiais que<br />
requerem adição de matéria-prima e<br />
por ser uma atividade poluente (utiliza<br />
solventes e alvejantes).(CINQUETTI;<br />
CARVALHO, 2003, p.6)<br />
Ainda com base nos slides, foram<br />
abordadas as principais interferências humanas<br />
no ecossistema, como o tráfico de animais e<br />
desmatamento. Da mesma forma que em outros<br />
momentos, houve grande participação <strong>do</strong>s<br />
alunos. Após estas explicações e discussões com<br />
os alunos, sobre to<strong>do</strong>s esses assuntos, foram<br />
desenvolvidas algumas atividades que os auxiliaram<br />
em sua compreensão das perspectivas<br />
apresentadas.<br />
Para complementar a apresentação <strong>do</strong>s<br />
slides, quanto à discussão sobre a água, utilizou-<br />
-se uma prática demonstrativa de mata ciliar, a<br />
fim de demonstrar a importância da vegetação<br />
FIGURA 3 - PRÁTICA DEMONSTRATIVA DA MATA CILIAR<br />
Durante essa prática, discutiu-se com<br />
os alunos qual é a situação da mata ciliar das<br />
nascentes e rios que conhecem, se existe, se<br />
está sen<strong>do</strong> cuidada e o que poderiam fazer em<br />
relação a isso, ten<strong>do</strong> em vista que grande parte<br />
desses alunos reside na área rural ou próximos a<br />
ela; local onde se encontra um grande número de<br />
nascentes, córregos e rios que precisam ser preserva<strong>do</strong>s.<br />
O que foi esclarece<strong>do</strong>r para os alunos,<br />
que haviam aponta<strong>do</strong> alguns problemas, como:<br />
Aqui perto tem um rio que tá enchen<strong>do</strong><br />
de terra por que não tem mata ciliar.<br />
A11.<br />
Às vezes os animais vão beber água no<br />
rio e destroem a mata ciliar. A12.<br />
Em seguida foi realizada a atividade<br />
Teia ecológica, adaptada de Bottega (2009),<br />
também contextualizada com a apresentação<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 53-62, jul./dez. 2010. Editora UFPR
VIEIRA, L. P. et al. Experiências no programa universidade sem fronteiras: contribuição de um módulo didático de educação ambiental...<br />
<strong>do</strong>s slides. Essa atividade foi introduzida com a<br />
seguinte indagação aos alunos: “Qual organismo<br />
é mais importante na cadeia alimentar” e teve<br />
como objetivo observar se os alunos conseguiriam<br />
propor formas de preservação <strong>do</strong> meio<br />
ambiente. Os alunos foram reuni<strong>do</strong>s em círculo<br />
e a cada um foi distribuí<strong>do</strong> o nome de um animal<br />
ou planta. Com auxílio de um barbante foram se<br />
forman<strong>do</strong> as teias, à medida que cada um <strong>do</strong>s<br />
componentes ia se revelan<strong>do</strong>. A Figura 4 ilustra<br />
esta atividade.<br />
ambiente. Neste momento também se verificou<br />
o grau de sensibilização <strong>do</strong>s alunos com a<br />
questão ambiental, pois durante a atividade,<br />
estes deveriam citar ações/práticas cotidianas<br />
que possibilitassem a preservação ambiental e<br />
pudessem ser realizadas na escola, em casa e em<br />
qualquer lugar, caso eles não soubessem tinham<br />
que “pagar” um castigo, como: voltar 3 casas ou<br />
passar a vez, entre outros.<br />
FIGURA 5 - ATIVIDADE TRILHA AMBIENTAL<br />
FIGURA 4 - ATIVIDADE TEIA ALIMENTAR COM ALUNOS DE<br />
UM DOS COLÉGIOS<br />
Ao terminar a formação da teia, o<br />
condutor da atividade puxava de repente a<br />
parte <strong>do</strong> barbante que estava seguran<strong>do</strong>, dessa<br />
forma desestabilizava toda a teia. Assim, a atividade<br />
foi encerrada, fazen<strong>do</strong>-se uma analogia<br />
ao que acontece quan<strong>do</strong> há um desequilíbrio no<br />
ecossistema: to<strong>do</strong>s são afeta<strong>do</strong>s. Como as falas<br />
demonstradas a seguir:<br />
Ah! Entendi por que cada um precisa <strong>do</strong><br />
outro, de certo mo<strong>do</strong> a capivara precisa<br />
da onça e a onça da capivara! Então<br />
to<strong>do</strong>s são importantes! A9.<br />
Em seguida realizou-se a atividade<br />
lúdica da Trilha ambiental, para promover a<br />
aplicação <strong>do</strong> conhecimento, pois esta atividade<br />
tinha por objetivo observar se os alunos conseguiriam<br />
propor formas de preservação <strong>do</strong> meio<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 53-62, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
Essa atividade levou os alunos a refletirem<br />
sobre como poderiam incorporar ao<br />
seu cotidiano o que aprenderam, e foi o ápice<br />
de todas as aplicações, pois, por meio dela,<br />
verificou-se que os objetivos <strong>do</strong> projeto quanto<br />
à temática Educação Ambiental foram atingi<strong>do</strong>s,<br />
principalmente porque os alunos demonstraram<br />
compreensão <strong>do</strong>s conhecimentos trabalha<strong>do</strong>s,<br />
como pode ser constata<strong>do</strong> nas inúmeras sugestões<br />
de ações que surgiram, a partir deles:<br />
Produzir menos lixo.<br />
Reaproveitar água da máquina para<br />
lavar as calçadas.<br />
Não pescar quan<strong>do</strong> os peixes forem se<br />
reproduzir.<br />
Economizar água.<br />
Fazer adubo com os lixos da cozinha.<br />
Não deixar a torneira ligada enquanto<br />
lava a louça.<br />
Não jogar gordura no ralo.<br />
Separar o lixo.<br />
Fechar vazamentos em canos.<br />
Quan<strong>do</strong> tomar banho desligar o chuveiro<br />
para ensaboar e depois ligar.<br />
61
VIEIRA, L. P. et al. Experiências no programa universidade sem fronteiras: contribuição de um módulo didático de educação ambiental...<br />
62<br />
Quan<strong>do</strong> for lavar as verduras não deixar<br />
muita água vazar.<br />
Espera-se que os alunos possam realizar<br />
essas ações para amenizar os diversos problemas<br />
ambientais, pois, no momento da aplicação <strong>do</strong><br />
módulo eles se mostraram bastante sensibiliza<strong>do</strong>s<br />
com to<strong>do</strong>s os assuntos trabalha<strong>do</strong>s.<br />
A experiência vivenciada neste projeto<br />
foi de extrema importância para a formação inicial<br />
<strong>do</strong>s acadêmicos envolvi<strong>do</strong>s, porquanto possibilitou<br />
maior contato com a futura área de atuação,<br />
por meio <strong>do</strong> projeto de extensão, o que permitiu,<br />
também, grande envolvimento com profissionais<br />
que atuam na área de Ensino, ocorren<strong>do</strong> intensa<br />
troca de experiências, além de ser um trabalho<br />
desenvolvi<strong>do</strong> com municípios de baixo IDH, que<br />
revela diferentes quadros da sociedade, proporcionan<strong>do</strong><br />
a prática real da extensão.<br />
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Texto recebi<strong>do</strong> em 10 de setembro de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 5 de abril de 2010.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 53-62, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
Beginnings of Rural Extension in the state of Paraná, Brazil<br />
Comienzos de la Extensión Rural en el esta<strong>do</strong> de Paraná, Brasil<br />
Hugo Moura Tavares 1<br />
RESUMO<br />
O presente artigo tem como objetivo resgatar os primórdios da extensão rural paranaense. Não<br />
tem a pretensão de ser um estu<strong>do</strong> crítico da história <strong>do</strong> extensionismo rural, mas, apenas, destacar<br />
alguns fatos e práticas desta modalidade educativa. Dentre eles, a criação <strong>do</strong> Escritório Técnico de<br />
Agricultura, ETA 15, o trabalho com as famílias <strong>do</strong>s agricultores, com os jovens, com as cooperativas<br />
e as estratégias de comunicação utilizadas.<br />
Palavras-chave: extensão rural; extensão rural paranaense; escritório técnico de agricultura; cooperativas<br />
rurais.<br />
ABSTRACT<br />
This article aims to rescue the beginnings of agricultural extension of Paraná. It is not intended to<br />
be a critical study of the history of outreaching rural, but only to highlight some facts and practices<br />
of this type of education. Among them, the creation of the Technical Office for Agriculture, ETA<br />
15, working with farm families, with youth, with cooperatives and communication strategies used.<br />
Keywords: Agricultural extension; agricultural extension of Paraná; technical office for agriculture;<br />
rural cooperatives.<br />
RESUMEN<br />
Este artículo tiene como objetivo rescatar a los inicios de extensión agrícola en el Esta<strong>do</strong> de Paraná.<br />
No pretende ser un estudio crítico de la historia de contactos directos rurales, pero sólo para poner<br />
de relieve algunos hechos y las prácticas de este tipo de educación. Entre ellos, la creación de la<br />
Oficina Técnica de Agricultura, ETA 15, trabajan<strong>do</strong> con las familias de agricultores, con los jóvenes,<br />
con las cooperativas y las estrategias de comunicación utilizadas.<br />
Palabras-clave: extensión rural; extensión rural en Paraná; oficina técnica del cultivo; cooperativas<br />
rurales.<br />
1 Doutoran<strong>do</strong> em História, UFPR. Rua Nostradamus, 138, fone 3350-9957, hugomour@yahoo.com.br<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
63
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
No Brasil, a atividade extensionista<br />
rural, de maneira mais sistematizada, teve como<br />
marco o surgimento da Escola Superior de Agricultura<br />
e Medicina Veterinária em Viçosa, Minas<br />
Gerais. Fundada em 1928, pelo norte-americano<br />
Peter Henry Rolfs, foi pioneira na prática <strong>do</strong><br />
extensionismo no Brasil. Em 1930, instituiu a<br />
Semana <strong>do</strong> Fazendeiro na qual os agricultores<br />
e esposas recebiam, em Viçosa, aulas práticas<br />
com demonstrações de méto<strong>do</strong>s em assuntos<br />
agropecuários e economia <strong>do</strong>méstica. Esses cursos<br />
eram cuida<strong>do</strong>samente reuni<strong>do</strong>s em folhetos<br />
e divulga<strong>do</strong>s através de circulares de extensão.<br />
Na década de 1940, três experiências<br />
desenvolvidas pelo Ministério da Agricultura,<br />
com o apoio <strong>do</strong>s órgãos estaduais, merecem<br />
destaque: as Semanas Ruralistas, os Postos<br />
Agropecuários e as Missões Rurais.<br />
As Semanas Ruralistas eram palestras e<br />
demonstrações práticas ministradas por técnicos<br />
que se deslocavam para o interior <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s<br />
com o intuito de transmitir seus conhecimentos<br />
ao povo rural.<br />
Os Postos Agropecuários eram pequenas<br />
fazendas-modelo nas quais equipes formadas<br />
por no mínimo um agrônomo e um veterinário<br />
procuravam prestar assistência aos agricultores<br />
da região servida pelo Posto. Mudas, sementes<br />
selecionadas e reprodutores podiam ser <strong>do</strong>a<strong>do</strong>s,<br />
empresta<strong>do</strong>s ou vendi<strong>do</strong>s aos agricultores.<br />
Desenvolvidas a partir de 1949, as<br />
Missões Rurais envolviam os Ministérios da<br />
Agricultura, Educação e Saúde. Formadas<br />
por equipes interdisciplinares compostas por<br />
agrônomos, médicos, sociólogos, psicólogos e<br />
assistentes sociais tornaram-se verdadeiras caravanas<br />
de assistência rural. Porém, “duraram<br />
pouco e foram das mais onerosas e pouco úteis<br />
experiências visan<strong>do</strong> ajudar as famílias rurais.<br />
As Missões Rurais morreram antes da idade <strong>do</strong><br />
uso da razão”. 2<br />
Paralelamente a essas experiências,<br />
merecem destaque duas realizadas em 1948,<br />
2 OLINGER, Glauco. Ascensão e decadência da extensão rural<br />
no Brasil. Florianópolis: EPAGRI, 1996, p.46.<br />
64<br />
que iriam mudar a história da extensão rural<br />
no Brasil: o Programa Piloto de Santa Rita <strong>do</strong><br />
Passa Quatro em São Paulo e a fundação da Associação<br />
de Crédito e Assistência Rural (ACAR)<br />
em Minas Gerais. Ambas intermediadas pela<br />
American International Association for Economic<br />
and Social Development (AIA), uma instituição<br />
filantrópica criada nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s pelos<br />
irmãos Nelson e David Rockefeller e que atuava<br />
em vários países latino-americanos.<br />
O programa desenvolvi<strong>do</strong> em Santa<br />
Rita <strong>do</strong> Passa Quatro abrangia<br />
assuntos de agropecuária e economia<br />
<strong>do</strong>méstica e tinha por objetivo aumentar<br />
a produção, a produtividade e a renda<br />
das famílias rurais, garantin<strong>do</strong>-lhes um<br />
melhor nível de vida. Marcos [engenheiro<br />
agrônomo responsável] a<strong>do</strong>tava,<br />
como processo pedagógico, a meto<strong>do</strong>logia<br />
educativa da extensão. 3<br />
Em 1946, o Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais vivia<br />
um perío<strong>do</strong> de dificuldades econômicas. Seu<br />
novo governa<strong>do</strong>r eleito, ten<strong>do</strong> consciência <strong>do</strong>s<br />
problemas e procuran<strong>do</strong> superá-los, elaborou<br />
um Plano de Recuperação Econômica e Fomento<br />
da Produção. O plano propunha uma série<br />
de medidas que priorizavam todas as atividades<br />
econômicas e, dentre elas, as agropecuárias. Em<br />
resumo, havia a consciência de que o êxo<strong>do</strong><br />
rural estava comprometen<strong>do</strong> seriamente a produtividade<br />
agrícola mineira e que a efetivação<br />
de propostas concretas nesta área refletiria na<br />
economia <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Nesse contexto, o governo<br />
mineiro encontrava-se extremamente receptivo<br />
à cooperação daqueles que pudessem oferecer<br />
apoio técnico e financeiro para a solução <strong>do</strong>s<br />
seus problemas. Em 6 de dezembro de 1948, era<br />
firma<strong>do</strong> um convênio entre o Governo de Minas<br />
Gerais e a AIA, crian<strong>do</strong> a Associação de Crédito<br />
e Assistência Rural, que iniciou suas atividades<br />
em janeiro de 1949:<br />
3 OLINGER, Glauco. Ascensão..., p. 47.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
Em princípios de 1949, um punha<strong>do</strong><br />
de brasileiros e de norte-americanos,<br />
especialistas em agricultura e em economia<br />
<strong>do</strong>méstica, empreendeu uma nova<br />
tarefa em três comunidades rurais <strong>do</strong><br />
centro e <strong>do</strong> sul de Minas Gerais.<br />
Seis destes técnicos – jovens brasileiros<br />
– fizeram residência nessas pequenas<br />
cidades. Os especialistas norte-americanos<br />
iniciaram uma série ininterrupta de<br />
viagens entre esses vilarejos e o escritório<br />
central de Belo Horizonte, indican<strong>do</strong> as<br />
diretrizes e preparan<strong>do</strong> uma expansão<br />
<strong>do</strong> programa.<br />
Sua tarefa: levantar o nível de vida rural<br />
em Minas Gerais.<br />
O méto<strong>do</strong>: ajudar a população rural a<br />
ajudar a si própria.<br />
Os instrumentos: crédito aos pequenos<br />
lavra<strong>do</strong>res, assistência técnica, ensino<br />
coletivo – ministra<strong>do</strong> em cada comunidade<br />
por um agrônomo e por uma<br />
supervisora <strong>do</strong>méstica.<br />
Esta pequena equipe constituiu o núcleo<br />
a partir <strong>do</strong> qual a Associação de Crédito<br />
e Assistência Rural (ACAR) iniciou sua<br />
ação. 4<br />
Tanto o Programa desenvolvi<strong>do</strong><br />
em Santa Rita <strong>do</strong> Passa Quatro bem como os<br />
leva<strong>do</strong>s a cabo pela ACAR de Minas Gerais,<br />
repercutiram nacionalmente, influencian<strong>do</strong> a<br />
criação de experiências semelhantes em outros<br />
Esta<strong>do</strong>s. Foi assim que surgiu no Nordeste, em<br />
1954, a Associação Nordestina de Crédito e<br />
Assistência Rural-ANCAR e no Rio Grande <strong>do</strong><br />
Sul, em 1955, a Associação Sulina de Crédito e<br />
Assistência Rural-ASCAR.<br />
Em 1956, com o objetivo de coordenar<br />
os Serviços de Extensão Rural no país, foi criada<br />
a Associação Brasileira de Crédito e Assistência<br />
Rural-ABCAR.<br />
Ainda na década de 1950, os governos<br />
brasileiro e americano assinavam o Acor<strong>do</strong> Geral<br />
de Cooperação Técnica que previa uma cooperação<br />
recíproca de intercâmbio de méto<strong>do</strong>s,<br />
4 MINAS GERAIS. ACAR. Relatório 1950/51, p.3. Cita<strong>do</strong> em<br />
DA FONSECA, Maria Teresa Lousa. A extensão rural no Brasil,<br />
um projeto educativo para o capital. São Paulo: Edições Loyola,<br />
1985, p. 82.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
conhecimentos técnicos e atividades afins. Em<br />
consequência desse Acor<strong>do</strong> Geral, em 1953, foi<br />
assina<strong>do</strong> um convênio com o governo americano<br />
crian<strong>do</strong>, com sede no Rio de Janeiro, o Escritório<br />
Técnico de Agricultura - E.T.A. - com a missão de<br />
desenvolver projetos “em educação e pesquisas<br />
agrícolas de conservação de recursos naturais,<br />
de fomento da produção agrícola, incluin<strong>do</strong> o<br />
planejamento de armazéns e silos e, finalmente,<br />
da extensão rural”. 5<br />
O Paraná acompanhou a tendência<br />
nacional. Em 1951, por exemplo, o<br />
governo <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> afirmava que a assistência<br />
ao trabalha<strong>do</strong>r rural era um <strong>do</strong>s pontos fundamentais<br />
<strong>do</strong> plano de governo, pois não havia<br />
“em to<strong>do</strong> o Brasil, oportunidade melhor que a<br />
hora vivida pelo Paraná em suas zonas rurais<br />
para o início dessa assistência”. 6<br />
Reconhecen<strong>do</strong> os benefícios trazi<strong>do</strong>s<br />
pelos serviços de Extensão Rural, o governo estadual<br />
programou uma série de medidas visan<strong>do</strong><br />
à melhoria das condições de vida da população<br />
rural, tais como a criação da Fundação de Assistência<br />
ao Trabalha<strong>do</strong>r Rural, a implantação das<br />
Casas Rurais, a lei <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> de Equipamento<br />
Agropecuário, dentre outras.<br />
A Fundação de Assistência ao Trabalha<strong>do</strong>r<br />
Rural, nesse perío<strong>do</strong>, era a<br />
principal organização voltada para o<br />
agricultor, desenvolven<strong>do</strong> uma série de<br />
atividades como cursos (horticultura,<br />
corte e costura, habilidades <strong>do</strong>mésticas<br />
e trabalhos manuais), ensinos religiosos,<br />
morais e cívicos, alfabetização, higiene,<br />
recreação e assistência técnica. Oferecia<br />
crédito para a aquisição de sementes,<br />
pequenas máquinas, adubos, inseticidas,<br />
fungicidas e meios de transporte.<br />
Prestava assistência veterinária, jurídica,<br />
5 RELATÓRIO. The Avail Development of Brazil’s Cooperative<br />
Agriculture Extension Service, p.2. Cita<strong>do</strong> em DA FONSECA, Maria<br />
Teresa Lousa. A extensão rural no Brasil, um projeto educativo<br />
para o capital. São Paulo: Edições Loyola, 1985, p. 87.<br />
6 Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
por ocasião da abertura da sessão legislativa ordinária de 1957 pelo<br />
Senhor Bento Munhoz da Rocha Neto, Governa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Paraná.<br />
Curitiba – Paraná, 1951. p. 6.<br />
65
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
66<br />
médica, organizava Semanas Ruralistas<br />
e dirigia Clubes Agrícolas.<br />
Foi nesse contexto, que no dia 20 de<br />
janeiro de 1956, foi assina<strong>do</strong> um contrato, com<br />
a duração de cinco anos, entre<br />
a Fundação de Assistência ao Trabalha<strong>do</strong>r<br />
Rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Paraná, o<br />
Departamento de Fronteiras <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
<strong>do</strong> Paraná e o Escritório Técnico de<br />
Agricultura com o fim especial de aumentar<br />
a produtividade o obter melhores<br />
condições de vida para a população<br />
rural <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Paraná, usan<strong>do</strong><br />
os méto<strong>do</strong>s de Extensão, Economia<br />
Domés tica e Crédito Supervisiona<strong>do</strong>. 7<br />
Estava cria<strong>do</strong> o ETA, Projeto número 15.<br />
Para diretor <strong>do</strong> Projeto foi designa<strong>do</strong> o<br />
Doutor Lívio Luiz de Almeida que junto com a<br />
sua primeira equipe de supervisores, “constituída<br />
de 11 moças e 9 agrônomos, pode iniciar a<br />
instalação de sete escritórios locais. Três foram<br />
localiza<strong>do</strong>s na região extremo-oeste, os outros<br />
quatro, na região centro-sul.” 8<br />
Vários eram os obstáculos para desenvolver<br />
o programa de trabalho e, dentre eles,<br />
o fato de que os méto<strong>do</strong>s utiliza<strong>do</strong>s – extensão<br />
rural e economia <strong>do</strong>méstica – eram pouco difundi<strong>do</strong>s<br />
no Paraná. Estabelecer um trabalho de<br />
campo que superasse a assistência e o fomento<br />
então vigentes bem como treinar o pessoal técnico<br />
envolvi<strong>do</strong> foram os primeiros desafios <strong>do</strong><br />
ETA 15.<br />
Cada escritório local atendia um ou<br />
mais municípios próximos. A equipe mínima<br />
era composta por um extensionista rural, uma<br />
extensionista de economia <strong>do</strong>méstica e um ou<br />
uma auxiliar de escritório. As instalações eram<br />
simples e, na concepção vigente, o bom exten-<br />
7 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DO PARANÁ. Curitiba 12<br />
jun. 1956, p. 5<br />
8 ESCRITÓRIO TÉCNICO DE AGRICULTURA BRASIL-<br />
-ESTADOS UNIDOS. Relatório de atividades 1956. Rio de Janeiro,<br />
1956.<br />
sionista não era aquele que ficava no Escritório,<br />
mas o que estava no campo com o agricultor.<br />
O primeiro Escritório Central <strong>do</strong> ETA<br />
Projeto 15 foi instala<strong>do</strong> na Rua José Loureiro,<br />
307. Essa casa (já demolida), construída por<br />
volta de 1929, foi projetada pelo escultor paranaense<br />
João Turin, a pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> então renoma<strong>do</strong><br />
médico local, Bernar<strong>do</strong> Leinig.<br />
Livio Luiz de Almeida, após regressar<br />
<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de treinamento em Ipanema (Projeto<br />
n.° 06), onde foi formada a primeira turma de<br />
Supervisores, constituída de 11 economistas <strong>do</strong>mésticas<br />
e 9 agrônomos, pode iniciar a instalação<br />
<strong>do</strong>s primeiros sete escritórios paranaenses. Três<br />
foram localiza<strong>do</strong>s na região extremo-oeste, os<br />
outros quatro, na região centro-sul, em Tole<strong>do</strong>,<br />
Foz <strong>do</strong> Iguaçu, São Mateus <strong>do</strong> Sul, Rebouças,<br />
Prudentópolis, Campo Largo e União da Vitória. 9<br />
Em 1957, o ETA possuía 10 escritórios<br />
locais nos municípios de Campo Largo, Campo<br />
Mourão, Foz <strong>do</strong> Iguaçu, Pato Branco, Prudentópolis,<br />
Rebouças, Rio Azul, São Mateus <strong>do</strong> Sul,<br />
Tole<strong>do</strong> e União da Vitória.<br />
O Escritório Técnico de Agricultura –<br />
E.T. A. n.° 15 tinha como objetivos:<br />
a. Prestar assistência técnica aos lavra<strong>do</strong>res e<br />
cria<strong>do</strong>res nos moldes de um serviço de extensão;<br />
b. auxiliar os agricultores no levantamento da<br />
sua situação organizan<strong>do</strong> planos para melhorar<br />
o aproveitamento de seus recursos;<br />
c. orientá-los tecnicamente na execução desses<br />
planos;<br />
d. instruí-los como obter crédito;<br />
e. supervisionar uso <strong>do</strong> crédito;<br />
f. rientá-los na colocação <strong>do</strong>s seus produtos;<br />
g. promover a organização de sociedades de<br />
classe e atividades sociais;<br />
h. assistir às famílias <strong>do</strong>s agricultores em economia<br />
<strong>do</strong>méstica;<br />
i. treinar agrônomos, veterinários e supervisoras<br />
<strong>do</strong>mésticas para execução desses trabalhos;<br />
9 Os técnicos responsáveis eram, respectivamente, Divon Scarpin,<br />
Wal<strong>do</strong>miro E. Cezar Valeixo, Nelson, Kochinski Hasselmann,<br />
Francisco Gouveia, José Augusto Wronski, Álvaro Albano San<strong>do</strong>val<br />
e Ivo Hauer.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
j. manter estreita ligação entre os agricultores e<br />
os serviços técnicos oficiais de forma que aqueles<br />
se beneficiem da assistência deste;<br />
k. promover a obtenção de informações que<br />
permitam a apuração das necessidades da agricultura<br />
e <strong>do</strong>s progressos consegui<strong>do</strong>s;<br />
l. manter um programa de propaganda áudio-<br />
-visual;<br />
m. executar outros trabalhos que forem julga<strong>do</strong>s<br />
necessários pelas Partes Contratantes. 10<br />
Os objetivos, seguin<strong>do</strong> o modelo<br />
nacional eram, para a realidade local, no mínimo<br />
audaciosos. Para alcançá-los inicou-se um<br />
programa nacional de capacitação que tinha<br />
como base os Centros de Treinamento.<br />
A extensão rural, pelas suas próprias<br />
características e, sobretu<strong>do</strong>, por utilizar méto<strong>do</strong>s<br />
de trabalho basea<strong>do</strong>s em princípios próprios,<br />
necessitava de pessoal especializa<strong>do</strong> e altamente<br />
treina<strong>do</strong>. Ten<strong>do</strong> em vista a necessidade de um<br />
treinamento adequa<strong>do</strong>, capaz de preparar o seu<br />
pessoal técnico para a execução de um trabalho<br />
repleto de problemas e de características inteiramente<br />
diferentes de outros sistemas assistenciais,<br />
é que foram desenvolvi<strong>do</strong>s o Pré-serviço e os<br />
Centros Regionais de Treinamento.<br />
Um <strong>do</strong>s primeiros e mais importantes<br />
Centros de Treinamento cria<strong>do</strong>s foi o da fazenda<br />
Ipanema, em Sorocaba (SP), que funcionou<br />
de 1955 a 1964. Seu corpo de instrutores era<br />
forma<strong>do</strong> por norte-americanos especialistas em<br />
extensão rural e crédito rural educativo, e brasileiros<br />
que ministravam os cursos mais aplica<strong>do</strong>s<br />
à agropecuária. Os primeiros extensionistas<br />
realizavam seus primeiros pré-serviços nessa<br />
instituição e os agentes paranaenses <strong>do</strong> Projeto<br />
n.° 15 não foram exceção:<br />
Após uma seleção foi realiza<strong>do</strong> um<br />
treinamento de cerca de três meses<br />
em Sorocaba na Fazenda Ipanema,<br />
<strong>do</strong> Ministério da Agricultura, <strong>do</strong> qual<br />
participavam além <strong>do</strong>s agrônomos<br />
10 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DO PARANÁ. Curitiba 12<br />
jun. 1956, p. 5-6.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
também as moças que iriam prestar<br />
orientações às <strong>do</strong>nas de casa <strong>do</strong> meio<br />
rural. Nesse “Pré-Serviço” contamos<br />
com a orientação de grande número de<br />
técnicos norte-americanos, funcionários<br />
<strong>do</strong> ETA (Escritório Técnico de Agricultura).<br />
A maioria das aulas era através<br />
de tradução simultânea. Nesse perío<strong>do</strong><br />
tomamos conhecimento da filosofia da<br />
Extensão Rural.<br />
Após os três meses retornamos, os<br />
futuros extensionistas, à Curitiba onde já encontramos<br />
a primeira sede <strong>do</strong> ETA – Projeto 15, à<br />
Rua José Loureiro, 307. 11<br />
Após uma seleção prévia na Secretaria<br />
de Agricultura, foi escolhi<strong>do</strong> o primeiro<br />
grupo de engenheiros agrônomos e economistas<br />
<strong>do</strong>mésticas para realizarem o primeiro Pré-<br />
-Serviço na Fazenda Ipanema em São Paulo.<br />
O agrônomo Rubens de Moura Rezende assim<br />
recor<strong>do</strong>u o fato:<br />
...pegar um técnico recém-saí<strong>do</strong> ou já<br />
forma<strong>do</strong> na escola e dar para ele noções<br />
<strong>do</strong> que era a extensão rural, como funcionava<br />
a extensão rural, sabe, que não<br />
era apenas um fomento. Então com toda<br />
aquela tecnologia americana, e já com<br />
tecnologia brasileira das experiências<br />
<strong>do</strong> Nordeste e de Minas, foi feito um<br />
primeiro pré-serviço para o pessoal <strong>do</strong><br />
Paraná.<br />
Fui um <strong>do</strong>s escolhi<strong>do</strong>s para fazer parte<br />
desse grupo que ia fazer o pré-serviço<br />
lá na fazenda Ipanema. Não sabíamos<br />
nada como é que era o serviço, não tínhamos<br />
idéia e fomos pra poder receber<br />
a informação <strong>do</strong> que era a extensão<br />
rural, <strong>do</strong> que é que se tratava, qual era a<br />
filosofia <strong>do</strong> trabalho, o que nós devíamos<br />
evitar, o que nós devíamos enfatizar, pra<br />
fazer um serviço novo, completamente<br />
novo.<br />
A parte teórica era a mesma para os<br />
“moços e moças”. A parte de filosofia,<br />
<strong>do</strong> trabalho, tu<strong>do</strong> isso, as turmas eram<br />
11 REZENDE, Rubens de Moura. Depoimento ACARPA. A<br />
História que a Extensão Conta. Curitiba: Assessoria de Relações<br />
Públicas e Imprensa, 1981. (sem paginação)<br />
67
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
juntas, agora, naturalmente, na parte de<br />
economia <strong>do</strong>méstica elas se separavam.<br />
Elas tinham uma aula sobre alimentação,<br />
melhoramento da alimentação da família,<br />
melhoramento da higiene da casa,<br />
a confecção de poço morto, não jogar<br />
resíduos da cozinha pela janela, fazer<br />
casinhas sanitárias, tu<strong>do</strong> isso elas tinham<br />
orientação, confecção de peças de<br />
roupa feita na casa com uma máquina<br />
de costura simples, fazer um colchão de<br />
palha com a palha que eles tinham de<br />
milho, tu<strong>do</strong> isso havia essa orientação.<br />
Era muito interessante esse serviço, mas<br />
a parte filosófica da extensão, o trabalho<br />
em si era em conjunto.<br />
Acho que ninguém, ninguém da minha<br />
turma, tinha contato com o meio rural,<br />
realmente tivemos contato através <strong>do</strong><br />
curso, <strong>do</strong> pré-serviço, e fomos enfrentar<br />
de peito aberto sem saber o que vinha<br />
pela frente.” 12<br />
<strong>do</strong> tipo de trabalho exerci<strong>do</strong> pelo supervisor e<br />
supervisora extensionistas, o caráter educativo<br />
<strong>do</strong> trabalho e a crença em alternativas comunitárias<br />
de autoajuda.<br />
Extensão Rural era, na visão <strong>do</strong> momento,<br />
um empreendimento educativo assumin<strong>do</strong><br />
características de ensino informal, isto é,<br />
“extramuros”. Para um extensionista qualquer<br />
lugar era um lugar de aprendiza<strong>do</strong> e o importante<br />
era “ensinar a fazer fazen<strong>do</strong>”.<br />
A base material <strong>do</strong> processo<br />
educativo era o núcleo familiar <strong>do</strong> agricultor. A<br />
família rural era a unidade sociológica a partir da<br />
qual se esperava a transformação. Assim, era de<br />
extrema importância para o sucesso <strong>do</strong> projeto<br />
convencer e comprometer to<strong>do</strong> o núcleo familiar.<br />
Em 1957, o ETA 15 informava em seu<br />
relatório de atividades:<br />
Técnicos norte-americanos e brasileiros<br />
apresentaram a meto<strong>do</strong>logia e as estratégias que<br />
marcariam os primeiros trabalhos da extensão<br />
rural: economia <strong>do</strong>méstica, juventude rural, clubes<br />
4-S, demonstração de resulta<strong>do</strong>s, liderança<br />
no campo, comunicação rural, levantamento<br />
da realidade <strong>do</strong> município, entre outras. Toda a<br />
parte teórica era acompanhada de aulas práticas,<br />
como as de mecanização, conservação <strong>do</strong> solo,<br />
avicultura, pecuária e apicultura.<br />
Os alunos e alunas eram avalia<strong>do</strong>s durante<br />
o curso inteiro e deviam demonstrar para<br />
a turma e professores tu<strong>do</strong> o que aprendiam,<br />
no entanto não sabiam que estavam sen<strong>do</strong><br />
avalia<strong>do</strong>s constantemente. Ao final <strong>do</strong> intenso<br />
treinamento, a primeira turma de Supervisores,<br />
constituída de 11 moças e 9 agrônomos, estava<br />
preparada para instalar os primeiros escritórios<br />
no Paraná.<br />
Na época <strong>do</strong> Projeto 15, o modelo de<br />
extensão proposto era o difusionista-inova<strong>do</strong>r.<br />
Esse tinha como características principais a<br />
importância da experimentação, a valorização<br />
12 REZENDE, Rubens de Moura. Rubens de Moura Rezende.<br />
Curitiba, 26 jan. 2006. Entrevista concedida a Hugo Moura Tavares.<br />
68<br />
A educação já foi definida como sen<strong>do</strong><br />
um processo que consiste em orientar a<br />
experiência de mo<strong>do</strong> tal, que produza<br />
modificações nos conhecimentos, na<br />
habilidade e na atitude das pessoas. Óra<br />
é evidente, que a extensão rural visa<br />
precisamente êsse objetivo, em razão<br />
<strong>do</strong> que é classificada como méto<strong>do</strong><br />
educativo.<br />
Há que convir, contu<strong>do</strong>, que não é fácil<br />
conseguir-se a alteração das atitudes,<br />
principalmente em pessoas adultas,<br />
particularmente no ambiente rural,<br />
onde tradicionalismo primitivo, longe<br />
de ser simplesmente conserva<strong>do</strong>r é na<br />
realidade profundamente rotineiro.<br />
Por isso, dedica a extensão rural especial<br />
atenção à educação da juventude, eis<br />
que a mentalidade da criança ou <strong>do</strong><br />
a<strong>do</strong>lescente é essencialmente moldável<br />
e suscetível a aprender com muito maior<br />
facilidade, as evoluções e o progresso<br />
das atividades humanas. 13<br />
O ETA 15 iniciou seu trabalho extensionista<br />
ten<strong>do</strong> como foco a agricultura familiar ou,<br />
como era chama<strong>do</strong> na época, o pequeno agricul-<br />
13 ESCRITÓRIO TÉCNICO DE AGRICULTURA BRASIL-<br />
-ESTADOS UNIDOS. Relatório de atividades 1958. Curitiba, 1958.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
tor. O principal méto<strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong> pelos técnicos e<br />
técnicas era a demonstração de resulta<strong>do</strong>s, não<br />
só pela sua natureza prática como por demonstrar<br />
ao agricultor que, em sua própria terra com<br />
seus próprios recursos, a sua produção podia ser<br />
aumentada e a sua vida familiar transformada.<br />
Após realizar o Levantamento da Realidade<br />
Rural <strong>do</strong> Município os extensionistas<br />
partiam para a elaboração <strong>do</strong>s Programas de<br />
Trabalho que compreendiam uma série de projetos<br />
específicos. Em 1958, os principais programas<br />
eram Solo, Produção Agrícola, Rebanhos,<br />
Família Rural, Comunidade, Juventude Rural e<br />
Crédito Rural Supervisiona<strong>do</strong>. Desenvolven<strong>do</strong><br />
projetos como os de correção e conservação <strong>do</strong><br />
solo, adubação, seleção de sementes, mecanização<br />
agrícola, irrigação e drenagem e combate às<br />
pragas e <strong>do</strong>enças das plantas, armazenamento e<br />
a conservação da colheita, pretendia-se atender<br />
o agricultor de uma ponta a outra <strong>do</strong> processo<br />
produtivo.<br />
A atuação <strong>do</strong> ETA Projeto 15 desenvolvia-se<br />
em regiões onde pre<strong>do</strong>minava fundamentalmente<br />
a atividade agrícola, sen<strong>do</strong> a criação de<br />
animais considerada apenas como atividade subsidiária,<br />
com exceção da suinocultura, bastante<br />
intensa, principalmente na região da Fronteira,<br />
onde possuía alta expressão econômica. O porco<br />
tipo banha, pre<strong>do</strong>minante antes da década<br />
de 50, passou a ser substituí<strong>do</strong> pelo suíno tipo<br />
carne. O uso de ração balanceada, a famosa<br />
“ração ACARPA”, de água corrente e limpa,<br />
de instalações higiênicas, de controle sanitário<br />
acompanha<strong>do</strong>s <strong>do</strong> manejo correto eram bases<br />
para o melhoramento da suinocultura.<br />
Além das Demonstrações de Resulta<strong>do</strong>s<br />
também eram importantes as Unidades de<br />
Observação e as Unidades Demonstrativas. A<br />
necessidade de levar o sucesso <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s<br />
a um número maior de produtores incentivou a<br />
organização das feiras de produtores. As feiras<br />
tornaram-se um <strong>do</strong>s méto<strong>do</strong>s utiliza<strong>do</strong>s para difundir<br />
as novas raças e aprimorar sua qualidade<br />
através <strong>do</strong>s cruzamentos.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
A Demonstração de Resulta<strong>do</strong>s, o trabalho<br />
com as lideranças rurais e os Clubes 4-S<br />
eram importantes estratégias de divulgação <strong>do</strong><br />
extensionismo rural. Com o objetivo de divulgar<br />
os resulta<strong>do</strong>s alcança<strong>do</strong>s, incentivan<strong>do</strong> as famílias<br />
rurais à a<strong>do</strong>ção de novas e mais modernas<br />
práticas, foram incentivadas, ao mesmo tempo,<br />
as realizações de exposições, feiras e competições.<br />
Em 1958, o ETA 15 informava:<br />
Na localidade de General Ron<strong>do</strong>n, foi<br />
levada a efeito, e estreita colaboração<br />
com a Prefeitura Municipal de Tole<strong>do</strong><br />
e o Conselho de Desenvolvimento de<br />
Comunidades da Fronteira, a Primeira<br />
Exposição Agropecuária Industrial <strong>do</strong><br />
Município de Tole<strong>do</strong>. O êxito assinala<strong>do</strong><br />
pelo certame em causa, foi sem dúvida,<br />
uma demonstração flagrante, da influência<br />
exercida sobre a população<br />
rural daquele Município, pelo trabalho<br />
de extensão, que ali vem sen<strong>do</strong> desenvolvi<strong>do</strong><br />
desde mea<strong>do</strong>s de 1956. Não só<br />
o volume mas principalmente a qualidade<br />
<strong>do</strong>s produtos expostos, e ainda<br />
a extraordinária influência assinalada<br />
na exposição em causa, atestaram de<br />
forma eloqüente, a excelente receptividade<br />
assinalada naquela região, pelas<br />
práticas extensionistas, sen<strong>do</strong> de se<br />
ressaltar ainda, que a colonização da<br />
área em questão, data de apenas mais<br />
de dez anos. 14<br />
Seis anos mais tarde, em 1964, exposições<br />
e competições como as citadas acima<br />
começavam a se difundir pelas regiões atendidas<br />
pelos escritórios locais com apoio das<br />
autoridades locais e firmas comerciais. Além<br />
<strong>do</strong>s vários prêmios ofereci<strong>do</strong>s, o agricultor que<br />
se destacasse recebia um diploma de “melhor<br />
agricultor <strong>do</strong> ano”.<br />
As feiras e exposições eram ainda uma<br />
oportunidade de fazer negócios, conhecer novas<br />
14 ESCRITÓRIO TÉCNICO DE AGRICULTURA BRASIL-<br />
-ESTADOS UNIDOS. Relatório de atividades 1958. Curitiba, 1958.<br />
69
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
tecnologias e conseguir o apoio de importantes<br />
lideranças agrícolas, comerciais e agropecuárias.<br />
Mais <strong>do</strong> que um evento era o prolongamento <strong>do</strong><br />
resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho no campo.<br />
Ten<strong>do</strong> como base a experiência norte-<br />
-americana <strong>do</strong>s Clubes 4-H (Head, Heart, Health<br />
and Hands) e com o objetivo de orientar<br />
as atividades junto à juventude rural, foi cria<strong>do</strong><br />
um projeto específico denomina<strong>do</strong> Programa<br />
de Clubes 4-S (Saber, Sentir, Saúde e Servir).<br />
Os Clubes 4-S foram muito importantes<br />
na introdução de novas tecnologias já que, em<br />
várias ocasiões, o técnico conseguia convencer<br />
os pais agricultores a partir <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s que os<br />
filhos obtinham nos projetos <strong>do</strong>s clubes.<br />
O ETA 15 deu início aos trabalhos<br />
iniciais com grupos de jovens em mea<strong>do</strong>s de<br />
1958. Fundaram-se os Clubes 4-S forma<strong>do</strong>s por<br />
jovens de ambos os sexos, com idade entre 10 e<br />
18 anos, ten<strong>do</strong> como símbolo um trevo de quatro<br />
folhas e por lema a frase “Progredir Sempre”.<br />
O primeiro clube 4-S <strong>do</strong> Paraná foi<br />
funda<strong>do</strong> em 1° de outubro de 1958, em Campo<br />
Largo, e foi denomina<strong>do</strong> Clube 4-S <strong>do</strong>s Pinheirais.<br />
Cada sócio 4-S devia executar um projeto<br />
individual de agricultura ou participar de um<br />
projeto coletivo.<br />
No final <strong>do</strong> mesmo ano, o clube contava<br />
com 19 associa<strong>do</strong>s<br />
70<br />
...to<strong>do</strong>s intensamente ativos e entusiastas,<br />
dedican<strong>do</strong>-se particularmente à criação<br />
de Suínos, Apicultura e Hortas Domésticas,<br />
no que concerne aos membros<br />
<strong>do</strong> sexo masculino e melhoramentos <strong>do</strong><br />
Lar, nutrição e vestuário, na parte relativa<br />
aos associa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> sexo feminino. 15<br />
No clube eram realizadas reuniões de<br />
formação e planejamento, excursões, projeções<br />
de filmes, torneios esportivos, encontros culturais,<br />
comemorações cívicas e as demonstrações.<br />
15 ESCRITÓRIO TÉCNICO DE AGRICULTURA BRASIL-<br />
-ESTADOS UNIDOS. Relatório de atividades 1958. Curitiba, 1958.<br />
Além de apresentar os resulta<strong>do</strong>s de um projeto<br />
desenvolvi<strong>do</strong>, as demonstrações deveriam influenciar<br />
a mudança das técnicas de trabalho e<br />
produção <strong>do</strong>s agricultores.<br />
Nesta época, na concepção <strong>do</strong>s extensionistas<br />
rurais, o trabalho deveria ser desenvolvi<strong>do</strong><br />
nas famílias e entre as comunidades familiares<br />
a partir <strong>do</strong> incentivo ao Cooperativismo.<br />
Em 1957, o ETA 15 afirmava:<br />
A atuação educacional da extensão<br />
rural, não visa o homem como simples<br />
unidade de produção, ou apenas como<br />
indivíduo isola<strong>do</strong>, mas sim, como participante<br />
de uma comunidade, onde<br />
possui responsabilidades e para cujo<br />
bem estar deve influir e colaborar, o que,<br />
evidentemente, requer uma organização<br />
específica, que embora sem características<br />
formais, venha disciplinar e regular<br />
as relações <strong>do</strong> indivíduo com a sua<br />
comunidade, e desta com os indivíduos<br />
que a constituem.<br />
...os supervisores <strong>do</strong> Escritório Técnico<br />
de Agricultura – Projeto n.° 15, procuram<br />
com to<strong>do</strong>s os meios ao seu alcance, desenvolver<br />
uma intensa ação educativa,<br />
visan<strong>do</strong> despertar e desenvolver o espírito<br />
comunitário, ressaltan<strong>do</strong> os aspectos<br />
de relações de vizinhança, conceitos<br />
de civismo, cidadania e democracia, e<br />
a sua conseqüente aplicação: o desenvolvimento<br />
da comunidade, cooperação<br />
com as organizações cívicas, educativas,<br />
recreativas, agrícolas, cooperativistas,<br />
etc. e ainda princípios de justiça e compreensão<br />
mútua. 16<br />
A experiência cooperativista no Paraná<br />
data de pelo menos o final <strong>do</strong> século XIX e<br />
início <strong>do</strong> XX, onde se destacam os trabalhos <strong>do</strong><br />
agrônomo ucraniano Valentin P. Cuts. Até a promulgação<br />
da Lei 22.239, em 1932, várias foram<br />
as cooperativas que surgiram no Esta<strong>do</strong> sen<strong>do</strong><br />
que uma das pioneiras foi a Sociedade Cooperativista<br />
de Consumo Svitlo (luz em ucraniano)<br />
16 ESCRITÓRIO TÉCNICO DE AGRICULTURA BRASIL-<br />
-ESTADOS UNIDOS. Relatório de atividades 1957. Curitiba, 1957.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
fundada em 1920, na localidade de Carazinho,<br />
comarca de União da Vitória.<br />
Uma das personagens centrais da<br />
história <strong>do</strong> cooperativismo <strong>do</strong> Paraná foi a Extensão<br />
Rural. Em 1962, o relatório da ACARPA<br />
afirmava:<br />
O homem rural é por natureza isola<strong>do</strong>,<br />
e seus problemas são apenas por êle<br />
encara<strong>do</strong>, crian<strong>do</strong> com isso, barreiras<br />
desanima<strong>do</strong>ras.<br />
Desta maneira, nos princípios apregoa<strong>do</strong>s<br />
pela Extensão, procura-se mostrar<br />
ao homem rural que seus problemas,<br />
comuns aos agricultores de uma mesma<br />
região, são facilmente resolvi<strong>do</strong>s pela<br />
união de esforços. Isto chamamos Associativismo<br />
Rural.<br />
No ano de 1962, foram fundadas 3 (três)<br />
novas cooperativas nos municípios de<br />
Campo Largo e União da Vitória. 17<br />
Vários eram os problemas vivi<strong>do</strong>s pelo<br />
agricultor paranaense e, principalmente pela<br />
agricultura familiar. Dentre eles, o baixo preço<br />
consegui<strong>do</strong> pelo produtor; a falta de uma infra-<br />
-estrutura de comercialização que abrangesse os<br />
setores de transporte, beneficiamento, industrialização<br />
e armazenamento da produção, deixan<strong>do</strong><br />
a classe produtora à mercê <strong>do</strong>s atravessa<strong>do</strong>res; a<br />
necessidade de insumos à disposição <strong>do</strong>s produtores<br />
e os eleva<strong>do</strong>s custos <strong>do</strong>s mesmos, causan<strong>do</strong><br />
elevação <strong>do</strong> custo de produção.<br />
Para o extensionismo rural, representa<strong>do</strong>s<br />
pelo ETA 15, depois ACARPA e, posteriormente<br />
a EMATER, o cooperativismo deveria ser<br />
prioridade incentivan<strong>do</strong> a criação de cooperativas,<br />
reorganizan<strong>do</strong> as existentes, estabelecen<strong>do</strong><br />
entrepostos e prestan<strong>do</strong> assistência técnica,<br />
creditícia e administrativa aos sócios.<br />
A extensão rural sempre teve um senti<strong>do</strong><br />
altamente educativo, visan<strong>do</strong> atuar sobre<br />
a mentalidade <strong>do</strong> agricultor e de sua família,<br />
induzin<strong>do</strong>-o à mudança de atitudes e a<strong>do</strong>ção<br />
de novas práticas.<br />
Dentre as dificuldades das equipes de<br />
extensionistas estava a de ter que estar em vários<br />
lugares ao mesmo tempo. Na prática, nas décadas<br />
1950 e 1960, por exemplo, era impossível<br />
aos supervisores atender, na sua área de ação,<br />
to<strong>do</strong>s os que requeriam a sua atuação educativa<br />
e orienta<strong>do</strong>ra:<br />
O extensionista fazia um treinamento<br />
para poder estar em contato com o seu<br />
público e esse treinamento envolvia,<br />
principalmente, os méto<strong>do</strong>s e meios de<br />
comunicação. Então, a carta circular,<br />
o álbum seria<strong>do</strong>, o flanelógrafo, então<br />
existiam especialistas que ensinavam<br />
o pessoal a fazer esse tipo de coisa. E<br />
o interessante é que os especialistas<br />
que ensinavam eram os agrônomos,<br />
agrônomos que se especializaram nesse<br />
tipo de coisa para poder transmitir aos<br />
seus colegas sua experiência. Então, a<br />
gente tinha que procurar fazer as coisas<br />
de uma forma mais fácil, de mais fácil<br />
entendimento por parte <strong>do</strong> agricultor<br />
e o rádio foi uma grande mola mestra<br />
pra isso aí porque você procurava levar<br />
dentro da linguagem <strong>do</strong> produtor. O<br />
extensionista era treina<strong>do</strong> antes de ir<br />
para o campo, para o seu trabalho, pra<br />
se utilizar desses meios e méto<strong>do</strong>s que<br />
possibilitasse ele atingir um número<br />
maior de pessoas.<br />
Então quan<strong>do</strong> você procura levar a<br />
mensagem até onde está o indivíduo ela<br />
assume uma importância muito grande.<br />
Ele tem essa necessidade de se informar,<br />
mas se informar dentro da sua realidade.<br />
Muitas vezes não interessa para ele o que<br />
está acontecen<strong>do</strong> lá no Irã, no Iraque<br />
porque isso diretamente não o afeta,<br />
ele pensa que não afeta a sua maneira<br />
de vida no dia-a-dia, mas ele precisa<br />
saber, dentro da sua realidade, aquilo<br />
que está acontecen<strong>do</strong> e o que ele pode<br />
melhorar. E quan<strong>do</strong> ele não pode ir em<br />
busca da informação ela chegan<strong>do</strong> até<br />
ele é importantíssimo, então hoje o rádio<br />
17 ASSOCIAÇÃO DE CRÉDITO E ASSISTÊNCIA RURAL DO<br />
PARANÁ. Relatório de atividades 1962. Curitiba, 1962.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
71
TAVARES, H. M. Primórdios da Extensão Rural Paranaense<br />
ainda é, o rádio local ainda é o grande<br />
veículo de comunicação. 18<br />
Era necessário a<strong>do</strong>tar estratégias<br />
de comunicação que levassem as informações<br />
a um número cada vez maior de famílias rurais.<br />
Para isso a Extensão Rural lançou mão de uma<br />
meto<strong>do</strong>logia própria caracterizada pelos atendimentos<br />
na época chama<strong>do</strong>s de individual, grupal<br />
e massal.<br />
Na divulgação <strong>do</strong>s conhecimentos<br />
técnicos foram utiliza<strong>do</strong>s os auxílios audiovisuais<br />
como cartazes, folders, folhetos, boletins, artigos<br />
em jornais, programas de rádio, flanelógrafos, slides,<br />
álbum seria<strong>do</strong>, projeções cinematográficas,<br />
e posteriormente produções como Vídeo Rural,<br />
“Projeto VER”.<br />
No ano de 1957, grande parte desses<br />
auxílios audiovisuais era elaborada pela própria<br />
organização, que editou, um total de 17 folhetos,<br />
14 boletins e 3 cartazes, além de um Boletim<br />
Mensal de circulação permanente.<br />
Nas décadas posteriores a ACAR-<br />
PA/EMATER foi se tornan<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s órgãos<br />
integra<strong>do</strong>res da agropecuária paranaense coordenan<strong>do</strong><br />
o Programa Estadual de Exposições e<br />
elaboran<strong>do</strong> os calendários anuais de exposições,<br />
feiras e festas agropecuárias.<br />
Em mea<strong>do</strong>s da década de 1950, um<br />
pequeno grupo de extensionistas iniciou uma<br />
nova experiência de Extensão Rural no Paraná.<br />
O oeste era chama<strong>do</strong> de “fronteira”, o norte era<br />
coloniza<strong>do</strong> pelo café, o su<strong>do</strong>este era ocupa<strong>do</strong><br />
por gaúchos e catarinenses e o sul e leste representavam<br />
o chama<strong>do</strong> Paraná tradicional.<br />
Mais de cinquenta anos depois muita<br />
coisa mu<strong>do</strong>u. A agricultura se transformou no<br />
agronegócio, a industrialização <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> é uma<br />
realidade e o desenvolvimento sustentável deve<br />
ser a referência de qualquer política pública. A<br />
Extensão Rural Paranaense foi um fator importantíssimo<br />
para essa história. Seu desafio sempre<br />
foi o de criar estratégias práticas e rápidas, se<br />
apoian<strong>do</strong> na troca entre a informação técnica e<br />
a realidade e experiência <strong>do</strong> agricultor. Desenvolvida<br />
a partir das experiências norte-americanas,<br />
convive com suas permanências e rupturas<br />
advindas de outros modelos extensionistas. De<br />
qualquer maneira, o resgate histórico de seus<br />
primórdios é sempre importante no embate <strong>do</strong><br />
velho com o novo na construção da agricultura<br />
paranaense.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 1º de março de 2011.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 1º de julho de 2011.<br />
18 PINHEIRO, Josué Gomes. Josué Gomes Pinheiro. Curitiba,<br />
25 jan. 2006. Entrevista concedida a Hugo Moura Tavares.<br />
72<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 63-72, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Sede ong nova rússia preservada: sustentabilidade na<br />
arquitetura<br />
"Nova Rússia Preservada" NGO headquarters: sustainability in<br />
architecture<br />
La Sede de la ONG "Nova Rússia Preservada": Sostenibilidad en la<br />
arquitectura<br />
Silvia Odebrecht 1<br />
João Francisco Noll 2<br />
Sheila E. S. Klein 3<br />
RESUMO<br />
O Programa de Extensão Construir e a ONG Nova Rússia Preservada firmaram uma parceria para a elaboração<br />
de um plano diretor e de projeto arquitetônico para a implantação e construção de um moderno centro de<br />
interpretação da natureza e escola modelo de educação ambiental, visan<strong>do</strong> contribuir para o desenvolvimento<br />
sustentável da região. O objetivo, neste artigo, é relatar essa experiência, com foco no projeto e na sustentabilidade<br />
<strong>do</strong> projeto de arquitetura. Assim, a meto<strong>do</strong>logia de projeto, os conceitos projetuais e construtivos e sua<br />
aplicação são apresenta<strong>do</strong>s com ênfase na abordagem ambiental. A diretoria da ONG Nova Rússia Preservada<br />
considerou que os resulta<strong>do</strong>s alcança<strong>do</strong>s excederam as suas expectativas, o que os motivou a buscar parceiros<br />
comerciais, entre empresários e comerciantes regionais, para viabilizar a execução da almejada obra.<br />
Palavras-chave: sustentabilidade; projeto de arquitetura; extensão comunitária.<br />
ABSTRACT<br />
The Extension Program Building and the NGO Preserved New Russia signed a partnership for developing<br />
a master plan and architectural design for the deployment and construction of a modern interpretation of<br />
nature and environmental education model school in order to contribute to the sustainable development<br />
region’s. The aim of this article, reports this experience, focusing on design and sustainability of the architecture<br />
project. Thus, the design metho<strong>do</strong>logy, the design concepts and construction techniques and their<br />
application are presented with emphasis on environmental approach. The board of the NGO Preserved<br />
New Russia considered that the results exceeded their expectations, what motivated them to seek trading<br />
partners among regional entrepreneurs and traders, to enable the implementation of the envisaged work.<br />
Keywords: sustainability; architectural design; community extension.<br />
RESUMEN<br />
El Programa de Extensión Construir y la ONG Nueva Rusia Preservada firmaran una aparcería para la<br />
elaboración de un plan director y de proyecto arquitectónico, para la ubicación y construcción de un<br />
moderno centro de interpretación de la naturaleza y una escuela modelo de educación ambiental, visan<strong>do</strong><br />
contribuir para el desarrollo sostenible de la región. El objetivo, en este artículo, es relatar esa experiencia,<br />
1 Doutora, <strong>Universidade</strong> Regional de Blumenau - FURB, Rua São Paulo, 1430, Bairro Victor Konder, 89012-000 Blumenau, SC.<br />
Fone: 047 3321 0273, siba@furb.br<br />
2 Doutor, <strong>Universidade</strong> Regional de Blumenau - FURB.<br />
3 Mestre, <strong>Universidade</strong> Regional de Blumenau - FURB.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 73-80, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
73
ODEBRECHT, S. et al. Sede ONG Nova Rússia Preservada: sustentabilidade na arquitetura<br />
con enfoque en el proyecto de una arquitectura<br />
sostenible. Así, la meto<strong>do</strong>logía y los<br />
conceptos de proyectos y constructivos, y su<br />
aplicación son presenta<strong>do</strong>s con énfasis en el<br />
abordaje ambiental. La directoria de la ONG<br />
Nueva Rusia Preservada consideró que los<br />
resulta<strong>do</strong>s logra<strong>do</strong>s desbordaron sus expectativas,<br />
lo que los ha motiva<strong>do</strong> a buscar socios<br />
comerciales, entre empresarios y comerciantes<br />
regionales, para llevar a cabo la ejecución de<br />
la obra deseada.<br />
Palabras-clave: sostenibilidad; proyecto de<br />
arquitectura; extensión comunitaria.<br />
Introdução<br />
O Programa Construir é uma atividade<br />
de extensão universitária desenvolvida junto ao<br />
Departamento de Arquitetura e Urbanismo da<br />
<strong>Universidade</strong> Regional de Blumenau – FURB –, e<br />
é constituí<strong>do</strong> de três projetos: Planejar: produção<br />
arquitetônica; Estruturar: produção complementar;<br />
e Conscientizar: educação ambiental e qualidade<br />
<strong>do</strong>s espaços urbanos e construí<strong>do</strong>s. Nesse<br />
programa são realiza<strong>do</strong>s projetos de arquitetura,<br />
acessibilidade e paisagismo e complementares:<br />
estrutural, elétrico, hidráulico e sanitário e preventivo<br />
de incêndio e, ainda, assessoria técnica<br />
para construção e reforma de equipamentos<br />
comunitários no município de Blumenau. Tem-<br />
-se como objetivo promover uma arquitetura<br />
comunitária, através da efetiva participação <strong>do</strong>s<br />
corpos <strong>do</strong>cente e discente de distintos cursos<br />
acadêmicos <strong>do</strong> Centro de Ciências Tecnológicas<br />
da <strong>Universidade</strong> Regional de Blumenau, na<br />
resolução <strong>do</strong>s problemas e necessidades sociais<br />
e ambientais e na busca da cidadania e de melhores<br />
condições de vida para a comunidade na<br />
qual está inserida, visan<strong>do</strong> contribuir no processo<br />
de desenvolvimento sustentável.<br />
Van Bellen (2006), conceitua desenvolvimento<br />
sustentável como, especificamente, uma<br />
nova maneira da sociedade se relacionar com<br />
seu ambiente de forma a garantir a sua própria<br />
continuidade e a de seu meio externo.<br />
A ONG Nova Rússia Preservada solicitou<br />
uma parceria com o Programa, por meio<br />
de correspondência assinada por seu presidente,<br />
para a elaboração de um plano diretor e de<br />
projetos arquitetônico e complementares de um<br />
moderno centro de interpretação da natureza<br />
e escola modelo de educação ambiental. Essa<br />
organização tem como principal objetivo a preservação<br />
ambiental da região da Nova Rússia<br />
através <strong>do</strong> desenvolvimento sustenta<strong>do</strong> e da<br />
educação ambiental da comunidade, incentivan<strong>do</strong><br />
as ações de ecoturismo na região.<br />
Essa experiência será relatada a seguir,<br />
com foco no projeto e na sustentabilidade de<br />
Arquitetura.<br />
O projeto para a Ong Nova Rússia Preservada<br />
A ONG Nova Rússia Preservada<br />
A Nova Rússia localiza-se no extremo<br />
sul <strong>do</strong> município de Blumenau, SC, nos limites<br />
da zona de amortecimento <strong>do</strong> Parque das Nascentes,<br />
atual Parque Nacional da Serra <strong>do</strong> Itajaí<br />
(PNSI), parque esse com área de 57.374 ha de<br />
Mata Atlântica, distribuí<strong>do</strong>s entre os municípios<br />
de Blumenau, Indaial, Apiúna, Ascurra, Presidente<br />
Nereu, Vidal Ramos, Botuverá, Guabiruba<br />
e Gaspar. O PNSI encontra-se inseri<strong>do</strong> na bacia<br />
hidrográfica <strong>do</strong> Rio Itajaí e abriga as nascentes<br />
<strong>do</strong>s principais ribeirões <strong>do</strong>s nove municípios,<br />
representan<strong>do</strong> 0,05% da área total original <strong>do</strong><br />
bioma Mata Atlântica no Brasil, 0,55% da área<br />
remanescente de Mata Atlântica e é um <strong>do</strong>s três<br />
grandes fragmentos florestais ainda existentes<br />
em Santa Catarina. A área <strong>do</strong> Parque representa<br />
2,5% <strong>do</strong>s remanescentes de Floresta Atlântica<br />
de Santa Catarina e é a segunda maior Unidade<br />
74<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 73-80, jul./dez. 2010. Editora UFPR
ODEBRECHT, S. et al. Sede ONG Nova Rússia Preservada: sustentabilidade na arquitetura<br />
de Conservação de Proteção Integral <strong>Federal</strong> <strong>do</strong><br />
bioma no sul <strong>do</strong> Brasil.<br />
A comunidade local caracteriza-se por<br />
pequenas propriedades agrícolas, cujos <strong>do</strong>nos<br />
dedicam maior tempo a atividades profissionais<br />
nas indústrias ou outra atividade comercial ou de<br />
serviço em Blumenau, e que relegaram a produção<br />
rural para segun<strong>do</strong> plano. As poucas famílias<br />
rurais residentes na localidade ainda preservam<br />
costumes coloniais, como produzir pães caseiros,<br />
geleias, deriva<strong>do</strong>s de leite e cultivar hortaliças e<br />
frutas. Outras pessoas se dedicam à jardinagem<br />
e aos trabalhos manuais.<br />
Existem também algumas propriedades<br />
maiores pertencentes a empresas e pessoas<br />
que residem na cidade de Blumenau e que as<br />
mantêm, principalmente, como sítios de fim de<br />
semana. Além disso, há na região alguns empreendimentos<br />
turísticos, sen<strong>do</strong> três empresas<br />
ligadas ao artesanato, uma agroindústria, uma<br />
pousada e cinco recantos.<br />
Para garantir a manutenção e conservação<br />
da natureza e promover a melhoria<br />
da qualidade de vida através de serviços e<br />
infraestruturas, a ONG relacionou uma série<br />
de prioridades, dentre as quais destacam-se a<br />
urbanização da rua de acesso à Nova Rússia;<br />
a elaboração da sinalização turística e de segurança;<br />
a extensão da linha telefônica para toda<br />
a comunidade; o combate à ocupação irregular,<br />
aos caça<strong>do</strong>res e ladrões de palmitos; a criação<br />
de um centro de cultura rural e ecológica que<br />
abrigue um posto avança<strong>do</strong> para a polícia ambiental<br />
e a sede da ONG; oferecimento de cursos<br />
e palestras volta<strong>do</strong>s à formação profissional na<br />
área de prestação de serviços turísticos e o beneficiamento<br />
de produtos agrícolas. A organização<br />
também pretende realizar, entre outras atividades<br />
na região da Nova Rússia, o saneamento<br />
básico, a elaboração de um folheto informativo<br />
das ações da organização e a construção de um<br />
complexo que abrigue um horto botânico de<br />
plantas nativas, conforme página eletrônica da<br />
ONG Nova Rússia. No senti<strong>do</strong> de viabilizar a<br />
realização de alguns destes trabalhos, entra em<br />
cena o Programa Construir.<br />
O Projeto de Arquitetura na meto<strong>do</strong>logia<br />
de trabalho <strong>do</strong> Programa Construir<br />
Como tema para projeto, foi defini<strong>do</strong><br />
um complexo de cunho ambiental, um moderno<br />
Centro de Interpretação da Natureza, com o<br />
desenvolvimento de um pequeno horto para a<br />
produção de espécies nativas. Os usuários desse<br />
complexo foram dividi<strong>do</strong>s em três categorias: (i)<br />
os dirigentes da organização não governamental<br />
que aí realizarão suas reuniões e outras atividades<br />
diversas de integração com a comunidade<br />
local; (ii) a comunidade em geral, bem como<br />
grupos escolares, na participação de palestras,<br />
cursos ou visitas para a educação ambiental;<br />
e (iii) a polícia ambiental, na criação de um<br />
posto avança<strong>do</strong> como ponto de apoio em suas<br />
atividades diárias de vigilância e fiscalização de<br />
crimes ambientais.<br />
Neste contexto, as atividades <strong>do</strong> Programa<br />
Construir a<strong>do</strong>taram, no caso da ONG<br />
Nova Rússia Preservada, o seguinte sequenciamento:<br />
A equipe de alunos designada para<br />
realizar tal atividade, em companhia de três<br />
professores, realizou a visita para, na presença de<br />
representantes da comunidade, conhecer o local,<br />
as condições físicas e ambientais, as carências e<br />
potencialidades existentes e as reivindicações e<br />
necessidades da comunidade (Figura 1). Nessa<br />
ocasião solicitou-se cópia <strong>do</strong> <strong>do</strong>cumento que<br />
comprove a propriedade <strong>do</strong> imóvel. No caso<br />
dessa entidade, o terreno é de propriedade particular,<br />
gentilmente cedi<strong>do</strong> para a construção da<br />
sede. Solicitou-se, também, que se providenciasse<br />
o levantamento planialtimétrico <strong>do</strong> terreno e a<br />
respectiva sondagem de solo para conhecer sua<br />
consistência e capacidade de suporte.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 73-80, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
75
ODEBRECHT, S. et al. Sede ONG Nova Rússia Preservada: sustentabilidade na arquitetura<br />
Realizou-se a análise <strong>do</strong>s condicionantes<br />
<strong>do</strong> local, como clima, insolação, paisagem<br />
natural, paisagem urbana, infraestrutura,<br />
equipamentos institucionais. Discutiu-se com os<br />
integrantes da diretoria da entidade presentes os<br />
principais aspectos projetuais, como o programa<br />
de necessidades, a estimativa de áreas, o número<br />
de pavimentos, a locação da obra (Figura 2).<br />
FIGURA 1 – LEVANTAMENTO DE DADOS: VISITA DA EQUIPE<br />
DO PROGRAMA CONSTRUIR AO TERRENO NA ONG NOVA<br />
RÚSSIA PRESERVADA<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
sanitários. E como os objetivos deste espaço estão<br />
diretamente vincula<strong>do</strong>s com atividades ambientais<br />
e de preservação da natureza, definiu-se que o<br />
edifício também deveria assumir esses conceitos<br />
e a<strong>do</strong>tar princípios de menor insustentabilidade,<br />
tanto no projeto quanto em sua construção.<br />
Realizaram-se várias reuniões entre a<br />
equipe discente e <strong>do</strong>cente para a efetivação <strong>do</strong><br />
trabalho. De posse da planta <strong>do</strong> terreno, fornecida<br />
pela diretoria da ONG Nova Rússia Preservada,<br />
analisaram-se os condicionantes legais relaciona<strong>do</strong>s<br />
ao Código de Zoneamento <strong>do</strong> Plano Diretor,<br />
avalian<strong>do</strong>-se uso e ocupação <strong>do</strong> solo, coeficiente de<br />
aproveitamento, taxa de ocupação e recuos obrigatórios.<br />
Discutiu-se a implantação e paisagismo, a<br />
disposição e o dimensionamento <strong>do</strong>s setores com<br />
seus compartimentos, a estrutura, a funcionalidade,<br />
a volumetria e a viabilidade técnica, econômica e<br />
ambiental <strong>do</strong> edifício.<br />
Essa etapa concluiu-se com a elaboração<br />
<strong>do</strong> anteprojeto arquitetônico, compreendi<strong>do</strong> por<br />
plantas baixas, cortes, fachadas e perspectivas da<br />
intervenção proposta. O anteprojeto foi apresenta<strong>do</strong><br />
à comunidade requerente e discutida a proposta<br />
e sua viabilidade (Figura 3). Nessa reunião a comunidade<br />
sugeriu pequenas complementações no<br />
projeto que geraram revisão no trabalho. Após discussões<br />
entre a equipe técnica e devidas alterações,<br />
realizaram-se novas reuniões com a comunidade<br />
até obtenção da aprovação final <strong>do</strong> anteprojeto<br />
para, então, iniciar o projeto executivo (Figura 4).<br />
FIGURA 2 – LEVANTAMENTO DE DADOS: DISCUSSÃO DO<br />
PROGRAMA DE NECESSIDADES E DIRETRIZES DO PRO-<br />
JETO COM A DIRETORIA DA ONG<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
O programa de necessidades, assim, ficou<br />
defini<strong>do</strong> com os seguintes espaços: uma ampla<br />
sala de atividades múltiplas (reuniões, palestras,<br />
cursos e aulas), uma sala com pequena copa/<br />
cozinha para o posto avança<strong>do</strong> da polícia ambiental,<br />
um depósito para materiais diversos, espaços<br />
abertos e protegi<strong>do</strong>s para íntima relação interior/<br />
exterior, para contatos diretos com a natureza, e<br />
FIGURA 3 – DISCUSSÃO DAS DIRETRIZES DO PROJETO COM<br />
PRINCÍPIOS DE SUSTENTABILIDADE<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
76<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 73-80, jul./dez. 2010. Editora UFPR
ODEBRECHT, S. et al. Sede ONG Nova Rússia Preservada: sustentabilidade na arquitetura<br />
A equipe <strong>do</strong> Programa Construir estabeleceu<br />
critérios de projeto que propiciassem<br />
soluções projetuais e construtivas de forma a<br />
contribuir no processo de sustentabilidade ambiental<br />
e, também, econômica e sociocultural,<br />
dentro <strong>do</strong> contexto apresenta<strong>do</strong>.<br />
Gonçalves e Duarte (2006) afirmam<br />
que a sustentabilidade de um projeto arquitetônico<br />
começa na leitura e no entendimento <strong>do</strong><br />
contexto no qual o edifício se insere e nas decisões<br />
iniciais de projeto, e Sachs (1993) define<br />
sustentabilidade como um conceito complexo<br />
que envolve de forma integrada variáveis econômicas,<br />
sociais, políticas, culturais e ambientais.<br />
Dentre a série de medidas tomadas<br />
para promover a implantação de um programa<br />
minimamente adequa<strong>do</strong> ao desenvolvimento<br />
sustentável e para a construção da consciência<br />
ambiental da comunidade, a equipe <strong>do</strong> Programa<br />
Construir, com o beneplácito da diretoria da<br />
ONG Nova Rússia Preservada, deu prioridade,<br />
na implantação <strong>do</strong> projeto arquitetônico (Fig.<br />
5), para a preservação da vegetação significativa<br />
existente no terreno e na preservação e recomposição<br />
da mata ciliar das margens <strong>do</strong> Ribeirão<br />
Garcia; nas áreas antropizadas, para a recomposição<br />
da vegetação com espécies nativas, crian<strong>do</strong>-se<br />
um horto florestal para fins educativos; e<br />
para incentivar a comunidade local a observar<br />
e cuidar da natureza, indicou a construção de<br />
composteiras, que gerarão o adubo para as plantas<br />
em fase de crescimento e desenvolvimento.<br />
FIGURA 4 – APRESENTAÇÃO DO ANTEPROJETO À DIRETORIA<br />
DA ONG NOVA RÚSSIA<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
A sustentabilidade no projeto de Arquitetura<br />
FIGURA 5 – IMPLANTAÇÃO DO PROJETO ARQUITETÔNICO<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
No que se refere ao projeto arquitetônico<br />
especificamente, as decisões projetuais<br />
foram baseadas em espaços adequadamente<br />
ventila<strong>do</strong>s e com máxima iluminação natural;<br />
no uso de cobertura verde para o sequestro e<br />
armazenamento de carbono e para minimizar os<br />
efeitos da radiação solar, promoven<strong>do</strong> a inércia<br />
térmica, com consequente conforto térmico nos<br />
espaços interiores; uso de pilotis baixos para<br />
manter inaltera<strong>do</strong> o relevo natural e diminuir o<br />
impacto no solo, evitan<strong>do</strong>-se sua impermeabilização<br />
e para proteger o edifício <strong>do</strong>s eleva<strong>do</strong>s<br />
índices de umidade da região, recoberta de<br />
vegetação arbórea nativa e em eleva<strong>do</strong> estagio<br />
de regeneração; estruturas e materiais de menor<br />
impacto ambiental, dan<strong>do</strong>-se preferência aos<br />
produzi<strong>do</strong>s na região, principalmente renováveis,<br />
com utilização de mão de obra local; uso<br />
racional de recursos naturais como energia e<br />
água; captação da água das chuvas, que poderão<br />
ser utilizadas na irrigação da vegetação<br />
<strong>do</strong> entorno da edificação; grandes beirais para<br />
proteção contra as intempéries; menor geração<br />
de resíduos; durabilidade, flexibilidade no reuso<br />
e reciclagem e baixa manutenção (Figura 6, 7 e<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 73-80, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
77
ODEBRECHT, S. et al. Sede ONG Nova Rússia Preservada: sustentabilidade na arquitetura<br />
8). Esse elenco de possibilidades e soluções, com<br />
vistas a planejar e agir de forma a atingir a pró-<br />
-eficiência desejada, foi o resulta<strong>do</strong> de diversas<br />
reuniões realizadas entre os atores envolvi<strong>do</strong>s ao<br />
longo <strong>do</strong> ano de 2009.<br />
Resulta<strong>do</strong>s<br />
Quan<strong>do</strong> a equipe de professores e<br />
bolsistas <strong>do</strong> Programa Construir apresentou o<br />
FIGURA 6 – VISTA PANORÂMICA DO PROJETO PARA A SEDE<br />
DA ONG NOVA RÚSSIA PRESERVADA<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
FIGURA 7 – PERSPECTIVA POSTERIOR DO PROJETO PARA A<br />
ONG NOVA RÚSSIA PRESERVADA<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
anteprojeto a integrantes da diretoria da ONG<br />
Nova Rússia Preservada, estes consideraram<br />
que os resulta<strong>do</strong>s alcança<strong>do</strong>s excederam as suas<br />
expectativas, o que os motivou no intuito de<br />
buscar parceiros comerciais entre empresários e<br />
comerciantes regionais, para granjear os recursos<br />
financeiros que viabilizarão executar a almejada<br />
obra. Esses resulta<strong>do</strong>s corroboram que bolsistas<br />
e acadêmicos extensionistas voluntários <strong>do</strong> Programa<br />
Construir, devidamente orienta<strong>do</strong>s pelos<br />
professores, desenvolveram extensa e correta<br />
pesquisa de técnicas e materiais adequa<strong>do</strong>s aos<br />
objetivos propostos pela equipe que, adiciona<strong>do</strong>s<br />
aos ensinamentos acadêmicos, resultaram na<br />
equivalente relação ensino, pesquisa e extensão.<br />
Demonstraram que na universidade “a pesquisa<br />
é o céu e a extensão é o chão”, conforme<br />
Ribeiro (2003), e sustentaram que, além de<br />
formar pesquisa<strong>do</strong>res e profissionais idôneos e<br />
gerar conhecimentos científicos e tecnológicos<br />
a universidade, segun<strong>do</strong> Pardal et al. (2005), é<br />
capaz de compreender a realidade e contribuir<br />
com valores e critérios que concorrem ao fortalecimento<br />
de vínculos entre os cidadãos. Esses<br />
vínculos são percebi<strong>do</strong>s no número crescente de<br />
pessoas que se alinham no senti<strong>do</strong> de viabilizar<br />
a plena realização da sede da ONG Nova Rússia<br />
Preservada.<br />
78<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 73-80, jul./dez. 2010. Editora UFPR
ODEBRECHT, S. et al. Sede ONG Nova Rússia Preservada: sustentabilidade na arquitetura<br />
FIGURA 8 – PERSPECTIVA LATERAL MOSTRA O VOLUME<br />
SUSPENSO NO TERRENO COM LEVE DESNÍVEL<br />
FONTE: ACERVO DO PROGRAMA CONSTRUIR<br />
Os resulta<strong>do</strong>s alcança<strong>do</strong>s a partir <strong>do</strong>s<br />
objetivos propostos buscaram a melhoria da<br />
qualidade de vida socioambiental da comunidade<br />
envolvida e a preservação <strong>do</strong> ambiente<br />
natural da região da Nova Rússia, tanto em seu<br />
envolvimento comunitário propriamente dito,<br />
como a educação ambiental em seu enfoque<br />
individual, bem como no desenvolvimento sustentável<br />
em geral.<br />
Considerações finais<br />
O Programa Construir possibilita a troca<br />
de informações técnicas com àquelas oriundas<br />
<strong>do</strong>s habitantes, conhece<strong>do</strong>res de sua realidade,<br />
e oportuniza aos acadêmicos extensionistas a<br />
convivência com a realidade social e a prática<br />
profissional, através <strong>do</strong> contato com o usuário,<br />
da aplicação <strong>do</strong>s conhecimentos adquiri<strong>do</strong>s<br />
em sala de aula e <strong>do</strong> aprofundamento destes<br />
conhecimentos pela pesquisa, num processo de<br />
complementação <strong>do</strong> saber ofereci<strong>do</strong> pelo ensino<br />
curricular.<br />
A comunidade, beneficiada com projetos<br />
ecoéticos, adquire seu espaço de congregação<br />
sociopolítico inerente aos direitos humanos<br />
e, como resposta direta, percebe-se melhoria<br />
na qualidade de vida e observam-se mudanças<br />
socioculturais, que de forma positiva contribuem<br />
para uma inquestionável autoavaliação, converten<strong>do</strong><br />
seus participantes em procria<strong>do</strong>res da<br />
realidade em suas dimensões econômica, social,<br />
política e cultural.<br />
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Texto recebi<strong>do</strong> em abril de 2011.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 27 de maio de 2011.<br />
80<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 73-80, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Recuperação e manejo da nascente “chorona” na comunidade<br />
rural de uruçu<br />
Recovery and management of "nascente Chorona” in the rural<br />
community of Uruçu<br />
Recuperación y gestión del manantial “Chorona” en la comunidad<br />
rural de Uruçu<br />
Júlia Soares Pereira 1<br />
Robi Tabolka <strong>do</strong>s Santos 2<br />
Catyelle M. A. Ferreira 3<br />
Genival Barros Júnior 4<br />
Fernan<strong>do</strong> G. de Oliveira 5<br />
RESUMO<br />
O uso inadequa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s recursos naturais, sem levar em conta as potencialidades <strong>do</strong>s agroecossistemas, é uma<br />
das principais causas da degradação ambiental, com sérios comprometimentos <strong>do</strong> solo, água, biodiversidade<br />
e da qualidade de vida das comunidades. Então o presente trabalho discorre sobre o desenvolvimento <strong>do</strong><br />
Projeto Piloto Recuperação e Manejo das Nascentes de Água, realiza<strong>do</strong> pelo projeto <strong>Universidade</strong>s Cidadãs<br />
na comunidade rural de Uruçu. A ideia surge através da manifestação de lideranças locais que perceberam<br />
diminuição considerável de água da nascente denominada “Chorona”. Assim, a partir deste problema,<br />
começaram a ser realizadas visitas in loco para visualizar o nível de degradação da área, além de reuniões<br />
semanais de planejamento com a equipe da universidade e os representantes da comunidade, a fim de<br />
estabelecerem objetivos e implementar ações para restauração da mata ciliar. Destaca-se ainda a realização<br />
de um grande mutirão, com a mobilização de toda a comunidade (adultos, jovens, crianças e professores<br />
da escola municipal), para recuperação da “Chorona”, com o plantio de 400 mudas de espécies nativas<br />
no entorno da nascente.<br />
Palavras-chave: revitalização; água; mata ciliar.<br />
ABSTRACT<br />
The misuse of natural resources, without taking into account the potential of agroecosystems, it is a major<br />
cause of environmental degradation, with serious commitments of soil, water, biodiversity and quality of<br />
life of communities. Then this paper discusses the development of the Pilot Project Recovery and Management<br />
of Water Nascentes, conducted by University City project in the rural community of Uruçu. The idea<br />
comes through the expression of local leaders who saw considerable decrease of water from the source<br />
called “Chorona”. So from this problem began to be performed on-site visits to view the level of degradation<br />
of the area, and weekly planning meetings with the team of university and community representatives<br />
1 Aluna de Engenharia Agrícola, Bolsista CNPq, Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola/UFCG, Campina Grande, PB, julia_eng@<br />
hotmail.com.br;<br />
2 Engenheiro Florestal, Mestran<strong>do</strong> em Engenharia Agrícola UFCG, Extensionista Rural da EMATER, PB, robytabolka@yahoo.com.<br />
br;<br />
3 Aluna <strong>do</strong> Curso de Ciências Sociais, UACS/UFCG, Campus CG/PB, extensionista CNPq <strong>do</strong> Projeto <strong>Universidade</strong>s Cidadãs UFCG/<br />
COEP, catyelle_maf@hotmail.com<br />
4 Engenheiro Agrônomo, Doutor em Engenharia Agrícola pela UFCG, Professor da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> Rural de<br />
Pernambuco, Campus de Serra Talhada, barrosjnior@yahoo.com.br;<br />
5 Engº de Produção – Prof. Doutor em Sociologia, Coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Projeto <strong>Universidade</strong>s Cidadãs, UFCG/COEP, CG/PB, aquiri48@<br />
hotmail.com<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
81
PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
82<br />
to set goals and implement actions to restore<br />
the forest gallery. It is also the realization of<br />
a great effort, with the mobilization of the<br />
entire community (adults, youth, children and<br />
teachers of municipal schools), for recovery of<br />
“Chorona” with the planting of 400 seedlings<br />
of native species around the source.<br />
Keywords: regeneration; water; riparian.<br />
RESUMEN<br />
El mal uso de los recursos naturales, sin tener<br />
en cuenta el potencial de los agroecosistemas,<br />
es una de las principales causas de la degradación<br />
ambiental, con compromisos serios<br />
de los suelos, el agua, la biodiversidad y la<br />
calidad de vida de las comunidades. Entonces<br />
este <strong>do</strong>cumento se examina el desarrollo del<br />
Proyecto Piloto de Recuperación y Gestión del<br />
Agua Nascentes, llevada a cabo por la Universidad<br />
de la Ciudad de proyecto en la comunidad<br />
rural de Urucu. La idea viene a través de<br />
la expresión de los dirigentes locales que vieron<br />
una considerable disminución de agua de la<br />
fuente denominada “Chorona”. Por lo tanto,<br />
este problema comenzó a realizar visitas sobre<br />
el terreno para ver el nivel de degradación<br />
de la zona, y la planificación de reuniones<br />
semanales con el equipo de la universidad<br />
y representantes de la comunidad para fijar<br />
metas y ejecutar acciones para restaurar el<br />
bosque galería. Es también la realización de un<br />
gran esfuerzo, con la movilización de toda la<br />
comunidad (adultos, jóvenes, niños y maestros<br />
de las escuelas municipales), para la recuperación<br />
de “Chorona”, con la plantación de 400<br />
plántulas de especies nativas en to<strong>do</strong> el fuente.<br />
Palabras-clave: regeneración; el agua; los<br />
ribereños.<br />
Introdução<br />
O Projeto <strong>Universidade</strong>s Cidadãs tem<br />
o objetivo de contribuir para o desenvolvimento<br />
de comunidades de agricultores familiares <strong>do</strong><br />
Nordeste, resultan<strong>do</strong> da parceria entre o Comitê<br />
de Entidades no Combate à Fome e pela Vida<br />
(COEP) e as <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Campina<br />
Grande (UFCG), <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> Rural<br />
de Pernambuco (UFRPe), <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong><br />
<strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Norte (UFRN), <strong>Universidade</strong><br />
<strong>Federal</strong> de Sergipe (UFS), <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong><br />
<strong>do</strong> Piauí (UFPI) e <strong>Universidade</strong> Regional <strong>do</strong> Cariri<br />
(URCA) com atuações efetivas nos Esta<strong>do</strong>s<br />
da Paraíba, Pernambuco, Rio Grande <strong>do</strong> Norte,<br />
Alagoas, Sergipe, Piauí e Ceará.<br />
Na Paraíba existem duas áreas polos,<br />
sen<strong>do</strong> uma no alto-sertão, trabalhada pela<br />
URCA, e outra no Município de Juarez Távora,<br />
onde se desenvolvem as ações da UFCG, sen<strong>do</strong><br />
realizadas atividades de capacitação direcionadas<br />
a grupos de mulheres em comunidades de<br />
agricultores familiares.<br />
No agreste paraibano, o projeto <strong>Universidade</strong>s<br />
Cidadãs trabalha com seis comunidades,<br />
no senti<strong>do</strong> de capacitar e assessorar agricultores<br />
e agricultoras familiares residentes na região<br />
semiárida brasileira, através da meto<strong>do</strong>logia de<br />
Extensão Rural, objetivan<strong>do</strong> melhorar, proporcionar<br />
e desenvolver novas oportunidades de<br />
geração de emprego e renda.<br />
Em cada comunidade existe um telecentro,<br />
que consiste de edificações compostas de<br />
cinco computa<strong>do</strong>res e uma antena que viabiliza<br />
o acesso à internet por satélite, visan<strong>do</strong> garantir<br />
a privacidade e segurança digital <strong>do</strong> cidadão,<br />
sua inserção na sociedade da informação e o<br />
fortalecimento <strong>do</strong> desenvolvimento local.<br />
Para melhor gestão, existe um grupo<br />
denomina<strong>do</strong> Comitê Mobiliza<strong>do</strong>r, constituí<strong>do</strong> por<br />
pessoas da comunidade que irão acompanhar a<br />
execução das metas <strong>do</strong>s projetos. A equipe de<br />
trabalho é composta por professores e alunos<br />
de diferentes áreas, o que confere ao trabalho<br />
uma característica multidisciplinar, agregan<strong>do</strong><br />
ao mesmo uma qualidade diferenciada nos<br />
resulta<strong>do</strong>s finais.<br />
Dentre as comunidades trabalhadas,<br />
destaca-se a comunidade de Uruçu, localizada<br />
no município de Gurinhém – PB, distante 80 km<br />
de Campina Grande, e que vem sen<strong>do</strong> uma das<br />
beneficiadas pelo projeto <strong>Universidade</strong>s Cidadãs<br />
desde janeiro de 2006. O grande destaque com<br />
relação a esta comunidade provém <strong>do</strong> fato de<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR
PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
percepção e entendimento com relação à meto<strong>do</strong>logia<br />
de Extensão a<strong>do</strong>tada pelo projeto.<br />
Caporal et al (2006) sugere que a Extensão<br />
Rural brasileira contribua para o enfretamento<br />
da crise socioambiental resultante <strong>do</strong>s<br />
modelos de desenvolvimento e de agricultura<br />
convencionais, implementa<strong>do</strong>s principalmente<br />
a partir de 1970 com o advento da “Revolução<br />
Verde”.<br />
Através da adesão à revolução verde,<br />
com o desmatamento, uso e manejo inadequa<strong>do</strong><br />
<strong>do</strong>s recursos naturais, têm provoca<strong>do</strong>, dentre<br />
outros efeitos, a deterioração <strong>do</strong>s solos agricultáveis,<br />
alterações nas redes de drenagens com<br />
perdas qualitativas e quantitativas das águas<br />
<strong>do</strong>s rios, lagos e reservatórios. A ocupação<br />
inapropriada favorece os processos erosivos,<br />
reduzin<strong>do</strong> a produtividade <strong>do</strong> solo com consequente<br />
transporte e acúmulo de sedimentos<br />
para os reservatórios, diminuin<strong>do</strong> a quantidade<br />
e qualidade da água.<br />
Costa (2000) relatou que uma readequação<br />
na condução <strong>do</strong>s problemas ambientais<br />
dentro de uma concepção sistêmica, entre<br />
diferentes áreas <strong>do</strong> conhecimento (interdisciplinaridade)<br />
e instituições participantes (multinstitucionalidade),<br />
aumenta a possibilidade<br />
da complementação de ações, sen<strong>do</strong> esta uma<br />
forma de planejamento e gerenciamento mais<br />
adequa<strong>do</strong> de microbacias hidrográficas.<br />
O uso inadequa<strong>do</strong> destes recursos já<br />
está sen<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> pelas pessoas da Comunidade<br />
de Urucu, localizada no município de Gurinhém<br />
– PB, que notaram drástica diminuição da água<br />
que transcorre no leito <strong>do</strong> córrego que atravessa<br />
a comunidade. Esta percepção foi despertada<br />
principalmente pelo projeto Espaço da Água<br />
realiza<strong>do</strong> pela <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Campina<br />
Grande, que teve como principal foco a atualização<br />
de professores <strong>do</strong> ensino fundamental e<br />
médio sobre a questão da conservação e o uso<br />
racional da água desde o ano de 2006, e pelas<br />
próprias lideranças que atuam na comunidade.<br />
Após esta atualização, as pessoas notaram diminuição,<br />
com maior impacto principalmente no<br />
ano de 2006, devi<strong>do</strong> à baixa precipitação anual.<br />
O semiári<strong>do</strong> Nordestino se caracteriza<br />
por temperaturas elevadas e chuvas relativamente<br />
escassas e irregulares, distribuídas entre 3 e 6<br />
meses <strong>do</strong> ano, e um potencial de evaporação<br />
que supera, em muito, as alturas da precipitação<br />
(SILVA, et al. 1987). No ambiente semiári<strong>do</strong> os<br />
reservatórios estão submeti<strong>do</strong>s a processos de<br />
evaporação elevada que causam concentrações<br />
de sais, deterioran<strong>do</strong> a qualidade da água,<br />
particularmente para consumo humano e para<br />
irrigação (TUNDISI, 2003).<br />
A região semiárida da Paraíba compreende<br />
uma área de aproximadamente 20.000 km²<br />
e caracteriza-se, <strong>do</strong> ponto de vista geoambiental,<br />
pela diversidade de suas paisagens, ten<strong>do</strong> como<br />
elemento marcante, no quadro natural da região,<br />
a condição de semiaridez que atinge grande<br />
parte <strong>do</strong> seu território e a alta variabilidade pluviométrica<br />
espacial e temporal inerente a esse<br />
tipo climático (SALES, 2002).<br />
A vegetação pre<strong>do</strong>minante <strong>do</strong> Nordeste<br />
é a caatinga, com uma flora geneticamente<br />
rica e biodiversidade única, pouco conhecida<br />
e atualmente muito ameaçada pela atividade<br />
humana nesses cenários, que tem acentua<strong>do</strong> a<br />
degradação <strong>do</strong>s recursos naturais, originan<strong>do</strong><br />
em várias áreas os núcleos de desertificação.<br />
Ecologicamente, é uma área muito devastada<br />
devi<strong>do</strong> à luta que o homem enfrenta com a natureza<br />
na tentativa de sobrevivência. A região é<br />
caracterizada por condições sociais e ambientais<br />
muito vulneráveis.<br />
Segun<strong>do</strong> Carpanezzi (2000), o papel<br />
hidrológico da floresta resulta de uma rede de<br />
interações, em que a vegetação em geral, principalmente<br />
a floresta, permite a infiltração e armazenamento<br />
temporário de água no solo. Assim, a<br />
cobertura vegetal controla a erosão, conservan<strong>do</strong><br />
os solos e regulan<strong>do</strong> a vazão <strong>do</strong>s rios.<br />
Para Rocha (2005), as coroas de proteção<br />
de nascentes são conceituadas como a área<br />
compreendida entre o divisor de águas e a base<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
83
PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
das ravinas, aproximadamente, a meia encosta.<br />
Esta área tem grande importância para o afloramento<br />
da água subterrânea, pois sua principal<br />
característica é propiciar a infiltração das águas<br />
das chuvas, e também evitar erosão.<br />
A mata ciliar é uma área de preservação<br />
permanente, que segun<strong>do</strong> o Código Florestal<br />
(Lei n 4.771/65) deve-se manter intocada, e<br />
caso esteja degradada deve-se prever a imediata<br />
recuperação. Essa lei já existe há 40 anos! Mas<br />
nem sempre foi cumprida. Toda a vegetação<br />
natural (arbórea ou não) presente ao longo das<br />
margens <strong>do</strong>s rios, e ao re<strong>do</strong>r de nascentes e de<br />
reservatórios, deve ser preservada. De acor<strong>do</strong><br />
com o artigo 2° desta lei, a largura da faixa de<br />
mata ciliar a ser preservada está relacionada<br />
com a largura <strong>do</strong> curso d’água. Na Figura 1<br />
visualizam-se as dimensões das faixas de mata<br />
ciliar em relação à largura <strong>do</strong>s rios, lagos, represas<br />
e nascentes.<br />
De um mo<strong>do</strong> geral, é percebi<strong>do</strong> que as<br />
matas ciliares encerram um conjunto de características<br />
que lhe são próprias. Nesse senti<strong>do</strong>, a<br />
vegetação ciliar ocorre nas porções de terreno<br />
que incluem tanto a ribanceira de um curso de<br />
água, como também a planície de inundação<br />
(LIMA, 1989). Este tipo de vegetação é bem<br />
definida em regiões de <strong>do</strong>mínio de formações<br />
savânicas ou campestres, porém menos diferenciada<br />
nas regiões de <strong>do</strong>mínio de florestas, onde<br />
se distingue principalmente pela composição<br />
florística (MANTOVANI et al., 1989).<br />
Material e méto<strong>do</strong>s<br />
Para modificar o quadro atual da comunidade,<br />
pois as fontes de abastecimento da<br />
população vêm de 40 cisternas, um açude de<br />
FIGURA 1 – LARGURA DA MATA CILIAR RELACIONADA A<br />
NASCENTES E A LARGURA DO ESPELHO DE<br />
ÁGUA DOS RIOS, LAGOS E REPRESAS<br />
Conforme Plano Estadual de Recursos<br />
Hídricos da Paraíba, a Sub-bacia Hidrográfica <strong>do</strong><br />
Baixo Paraíba, onde encontra-se a Comunidade<br />
de Urucu, contém apenas 4,7% de vegetação<br />
natural.<br />
84<br />
porte razoável pertencente a um fazendeiro da<br />
região, um poço artesiano com água salobra e<br />
caminhões pipas forneci<strong>do</strong>s pelo governo municipal,<br />
torna-se necessário o desenvolvimento de<br />
um programa racional de utilização e manejo <strong>do</strong>s<br />
recursos naturais, enfatizan<strong>do</strong> o solo e a água,<br />
e contan<strong>do</strong> com a participação direta desta co-<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR
PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
munidade rural. Assim, a proposta <strong>do</strong> trabalho<br />
para Recuperação de Nascentes é a capacitação,<br />
de forma a preparar as famílias de agricultores<br />
para gestão <strong>do</strong>s recursos hídricos que dispõem<br />
na comunidade.<br />
Desta forma, inicialmente foram estabelecidas<br />
condições para formação de um grupo<br />
de trabalho interdisciplinar, definin<strong>do</strong> uma agenda<br />
de ações com identificação de turmas, perío<strong>do</strong>s<br />
de realização e as devidas responsabilidades<br />
no processo. Estes grupos foram orienta<strong>do</strong>s a<br />
desenvolver as seguintes atividades:<br />
- Projetar e realizar um inventário que<br />
identifique todas as fontes de captação e abastecimento<br />
de água da comunidade, estabelecen<strong>do</strong><br />
planos para o gerenciamento desta água;<br />
- Elaborar materiais pedagógicos como<br />
manuais, folder, cartilhas, vídeos e cartazes sobre<br />
saúde, meio ambiente e gestão da água, volta<strong>do</strong>s<br />
à realidade existente na área da comunidade,<br />
levan<strong>do</strong> em consideração inclusive o problema<br />
<strong>do</strong> analfabetismo;<br />
- Produzir programas radiofônicos<br />
enfatizan<strong>do</strong> os problemas ambientais liga<strong>do</strong>s<br />
ao manejo da água, desmatamento, erosão e<br />
<strong>do</strong>enças de veiculação hídrica;<br />
Uma outra ação de caráter permanente<br />
que deverá ser desencadeada e que tem influência<br />
direta sobre a recuperação e conservação<br />
das nascentes diz respeito à reconstituição das<br />
formações vegetais. Sen<strong>do</strong> assim, deverá ser<br />
realiza<strong>do</strong> um outro diagnóstico que permita<br />
caracterizar as matas ciliares ainda existentes<br />
e as formações vegetais que ainda podem ser<br />
caracterizadas como tal, o que permitirá a realização<br />
de um monitoramento da vegetação a cada<br />
ano. Neste senti<strong>do</strong> os grupos serão orienta<strong>do</strong>s a<br />
executarem as seguintes atividades:<br />
- Construir e estruturar um viveiro de<br />
mudas nativas para reprodução de espécies silvícolas<br />
a serem destinadas a recomposição da<br />
flora nas áreas degradadas;<br />
- Implementar a recomposição e conservação<br />
das matas ciliares e demais formações<br />
vegetais das áreas de proteção, como também<br />
nas áreas urbanizadas e outras que interfiram na<br />
qualidade <strong>do</strong>s recursos hídricos;<br />
- Incentivar o manejo florestal sustentável,<br />
como forma de aumentar a cobertura vegetal<br />
e a geração de renda;<br />
- Desenvolver ações de recuperação<br />
de áreas degradadas que possam ter influência<br />
direta nas nascentes e cursos d’água;<br />
- Desenvolver na comunidade escolar<br />
uma ampla e sistemática programação, com<br />
atividades de campo e em sala de aula voltadas<br />
para o tema em questão; através da utilização<br />
de vídeos, produção de textos, cartazes, murais,<br />
criação, montagem e apresentação de encenações<br />
teatrais, cantos e danças; e da realização<br />
de excursões com base em “Trilhas Ecológicas<br />
que levem às fontes de captação de água”, com<br />
a criação de Estações devidamente sinalizadas<br />
nos reservatórios e nas fontes de água mapeadas.<br />
Resulta<strong>do</strong>s e discussão<br />
Conforme “Diagnóstico da comunidade<br />
de Uruçu” e com relatos <strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res da<br />
comunidade, existe um poço que está localiza<strong>do</strong><br />
às margens <strong>do</strong> riacho da “Chorona”, denomina<strong>do</strong><br />
“poço de Zé de Zefinha”, que, segun<strong>do</strong> informações<br />
obtidas, fornece água para consumo<br />
humano de inúmeras famílias durante o perío<strong>do</strong><br />
de estiagem.<br />
Para reconhecimento total <strong>do</strong> riacho da<br />
chorona, bem como das ravinas da área, foram<br />
necessárias visitas a campo, visto que várias<br />
pessoas da comunidade acompanharam.<br />
Conforme relatos, há aproximadamente<br />
um ano, pessoas da comunidade juntamente<br />
com integrantes <strong>do</strong> Projeto universidade Cidadãs,<br />
visitaram, constataram e registraram grande<br />
quantidade de água armazenada (Figura 2),<br />
além de fluxo intenso de água no córrego.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
85
PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
Na primeira visita, no dia 20 de junho<br />
de 2008, percorreu-se o córrego da comunidade<br />
até a nascente denominada “Chorona”. De<br />
acor<strong>do</strong> com os mora<strong>do</strong>res, descobriu-se que a<br />
nascente denominada, outrora com muita água,<br />
encontra-se totalmente assoreada (Figura 3) com<br />
as recentes chuvas.<br />
FIGURA 2 – NASCENTE “CHORONA” COM ÁGUA EM<br />
AGOSTO DE 2007<br />
FIGURA 3 – NASCENTE “CHORONA” TOTALMENTE AS-<br />
SOREADO EM JUNHO DE 2008<br />
Percebe-se que o córrego está com<br />
grau eleva<strong>do</strong> de assoreamento e de matéria<br />
orgânica. Problema esse que se agrava com as<br />
fortes chuvas de inverno, onde há carreamento<br />
de solo - tornan<strong>do</strong>-se voçoroca em alguns casos,<br />
restos de cultura e de produtos químicos para<br />
o leito <strong>do</strong>s rios. Esses fatores são ocasiona<strong>do</strong>s<br />
principalmente devi<strong>do</strong> ao manejo inadequa<strong>do</strong><br />
<strong>do</strong> solo e pela falta da vegetação arbustiva e<br />
arbórea nas margens <strong>do</strong>s rios.<br />
86<br />
Após georeferenciamento, registro fotográfico,<br />
análise, interpretação e discussão <strong>do</strong><br />
local, concluiu-se que o lugar não se tratava da<br />
nascente, e sim <strong>do</strong> local onde fica uma quantidade<br />
relativamente grande de água armazenada no<br />
solo, devi<strong>do</strong> às condições geográficas existentes.<br />
Diante disso, decidiu-se chegar até o início das<br />
ravinas que formam a nascente.<br />
A poucos metros acima da chorona<br />
existe uma divisão de córregos. Após esta divisão<br />
percorreram-se por 500 metros dentro <strong>do</strong><br />
roça<strong>do</strong> de milho e 200 metros de cerca<strong>do</strong> com<br />
pasto, chegan<strong>do</strong> ao ponto inicial <strong>do</strong> córrego na<br />
encosta esquerda.<br />
Em uma segunda visita no dia 25 de<br />
junho de 2008, percorreu-se o la<strong>do</strong> direito <strong>do</strong><br />
córrego acima da chorona, onde após percorrer<br />
200 metros encontra-se nova divisão de córregos.<br />
Diante disso, opta-se por percorrer o la<strong>do</strong><br />
esquer<strong>do</strong>, com uma distância de 300 metros no<br />
meio <strong>do</strong> plantio de milho consorcia<strong>do</strong> com fava.<br />
Logo após inicia-se uma área cercada<br />
de arame farpa<strong>do</strong>, com regeneração natural em<br />
estágio bem desenvolvi<strong>do</strong>, classificada como<br />
sen<strong>do</strong> de segun<strong>do</strong> estágio de sucessão. Segun<strong>do</strong><br />
as pessoas da comunidade presentes, nesta área<br />
o plantio de culturas anuais foi aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong> há<br />
mais de 10 anos. Sen<strong>do</strong> assim, avista-se várias<br />
espécies representativas como aroeira, pau<br />
d’arco, pau ferro, quixabeira, jurema preta entre<br />
outras. Nota-se também que a área é cercada,<br />
com animais caminhan<strong>do</strong> e se alimentan<strong>do</strong>. No<br />
entanto, o número de indivíduos está abaixo da<br />
capacidade de suporte forrageiro, pois o desenvolvimento<br />
das plantas arbustivas e arbóreas está<br />
em bom estágio.<br />
Após retornar até a divisão antes encontrada,<br />
percorre-se a encosta até a ravina <strong>do</strong><br />
la<strong>do</strong> direito. Nesta, observa-se grande quantidade<br />
de plantas em estágio inicial de desenvolvimento,<br />
com grandes clareiras. Em conversa<br />
com as pessoas da comunidade, estas informam<br />
que a área era cultivada até três anos atrás,<br />
compreenden<strong>do</strong> assim o motivo de ter grande<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR
PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
quantidade de plantas de sucessão inicial, como<br />
jurema, marmeleiro, pereiro entre outras.<br />
Analisan<strong>do</strong> as ravinas que formam o<br />
córrego, percebe-se que em duas cabeceiras a<br />
vegetação inicial está em bom estágio de desenvolvimento.<br />
No entanto, entre as cabeceiras e a<br />
junção das três ravinas, os agricultores cultivam<br />
a terra até as margens, não respeitan<strong>do</strong> a legislação<br />
sobre mata ciliar.<br />
Diante <strong>do</strong> fato exposto, e em acor<strong>do</strong><br />
com to<strong>do</strong>s os presentes, definiu-se fazer a intervenção<br />
na encosta totalmente descoberta,<br />
e também nas matas ciliares <strong>do</strong>s córregos que<br />
formam a chorona.<br />
Também ficou acorda<strong>do</strong> que serão realizadas<br />
palestras e capacitações com os alunos<br />
e os proprietários das áreas onde se encontram<br />
estas nascentes, com o objetivo de conscientizar<br />
a população local sobre restauração e/ou recuperação,<br />
utilização, conservação e preservação<br />
<strong>do</strong>s recursos naturais.<br />
Logo que foi iniciada a mobilização<br />
para o mutirão as professoras da escola começaram<br />
a organizar um concurso de redação e<br />
desenho em torno <strong>do</strong> assunto, com o objetivo<br />
de impulsionar os alunos a contribuírem mais<br />
na ação <strong>do</strong> projeto na comunidade. Este estilo<br />
de concurso já foi realiza<strong>do</strong> em outro projeto<br />
em Uruçu.<br />
Segun<strong>do</strong> Assunção et al. (1996) a conscientização<br />
sobre a necessidade de conservação<br />
e defesa <strong>do</strong> meio ambiente para presentes e futuras<br />
gerações é incontestável; o conhecimento da<br />
lei para entendimento <strong>do</strong>s deveres e prerrogativa<br />
<strong>do</strong>s cidadãos é imprescindível; a importância de<br />
se começar a educação ambiental na infância é<br />
inquestionável; fazer com que as crianças entendam<br />
as leis ambientais, para contribuir com<br />
a preservação e defesa <strong>do</strong> meio ambiente como<br />
cidadãos responsáveis; conseguir, de forma<br />
criativa, mudar o comportamento de um maior<br />
número possível de estudantes e torná-los agentes<br />
de defesa <strong>do</strong> meio ambiente ecologicamente<br />
equilibra<strong>do</strong> e saudável.<br />
FIGURA 4 – REUNIÕES PARA DEFINIÇÃO DAS AÇÕES DO<br />
MUTIRÃO<br />
FIGURA 5 – SLOGAN CRIADO PELA COMUNIDADE PARA O<br />
PROJETO DE RECUPERAÇÃO DE NASCENTES<br />
Como resulta<strong>do</strong> desta atividade foi realiza<strong>do</strong><br />
no dia 15 de agosto de 2008 um grande<br />
mutirão para revitalização da nascente Chorona.<br />
Foi realiza<strong>do</strong> em três etapas. São elas:<br />
I etapa – Plantio de Mudas na Nascente<br />
“Chorona”<br />
Com a participação de 30 alunos, 10<br />
professores da Escola Municipal Anália Arruda<br />
da Silva e parte da equipe <strong>do</strong> projeto <strong>Universidade</strong><br />
Cidadãs, foram plantadas 400 mudas<br />
(Figura 6) de diferentes espécies e diferentes<br />
funções ecológicas.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
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PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
Dentre as espécies plantadas destacam-<br />
-se ipê, baraúna, aroeira, ingá, pau-brasil, oiti<br />
(Figura 7), jaca, aroeira, pau d’arco, pau ferro,<br />
quixabeira e jurema preta. As mudas foram<br />
<strong>do</strong>adas pela <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> da Paraíba,<br />
Campus de Areia, permanecen<strong>do</strong> na comunidade<br />
por duas semanas até o mutirão para plantio.<br />
Algumas delas são espécies pioneiras e outras<br />
secundárias, ou seja, espécies que participam<br />
<strong>do</strong>s estágios iniciais e intermediários da sucessão.<br />
Apesar de estar fora <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de<br />
inverno, o mutirão de plantio foi realiza<strong>do</strong> em<br />
época com grande intensidade de chuvas na<br />
região, sen<strong>do</strong> assim as chances de pega e desenvolvimento<br />
das plantas são grandes.<br />
II etapa - Avaliação didática<br />
Na segunda parte <strong>do</strong> mutirão foram realizadas<br />
apresentações (Figura 8) sobre a importância<br />
da água para a vida. Estas apresentações<br />
enfatizaram o uso e conservação <strong>do</strong>s recursos<br />
naturais de forma sustentável.<br />
III etapa - Apresentação cultural e encerramento<br />
Na ultima etapa <strong>do</strong> evento, foram<br />
apresentadas peças teatrais (Figuras 9) com<br />
encenação, musicas e fantoches relacionadas<br />
ao meio ambiente. Estas apresentações foram<br />
elaboradas, montadas e encenadas pelos professores<br />
e alunos da escola.<br />
FIGURA 6 – MUTIRÃO DE PLANTIO DE MUDAS<br />
FIGURA 8 – PALESTRA RELACIONADA COM O TEMA ÁGUA<br />
FIGURA 7 – PLANTIO DE MUDA DE OITI<br />
FIGURA 9 – APRESENTAÇÃO TEATRAL SOBRE MEIO AM-<br />
BIENTE<br />
88<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR
PEREIRA, J. S. et al. Recuperação e manejo da nascente “Chorona” na comunidade rural de Uruçu<br />
E por último foram realizadas as premiações<br />
<strong>do</strong> concurso de redação e desenho.<br />
Logo em seguida iniciou-se uma gincana com<br />
perguntas sobre meio ambiente com o intuito de<br />
aguçar o aprendiza<strong>do</strong> <strong>do</strong> aluna<strong>do</strong> que estavam<br />
em sua maioria presente.<br />
Duas semanas após o mutirão foram<br />
feitas avaliações sobre o mesmo, aproveitan<strong>do</strong><br />
para elencar e reparar os erros questiona<strong>do</strong>s<br />
pelos mora<strong>do</strong>res, alunos e coordena<strong>do</strong>res (líderes<br />
<strong>do</strong> projeto na comunidade e a equipe <strong>do</strong><br />
<strong>Universidade</strong>s Cidadãs) em geral.<br />
Passo <strong>do</strong> Pilão: Estu<strong>do</strong> e Adequação de Uso da terra Relaciona<strong>do</strong><br />
aos Sistemas Agrícolas. Dissertação de Mestra<strong>do</strong>,<br />
<strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Santa Maria, 2000.<br />
EMBRAPA SEMI-ÁRIDO. II Plano Diretor Embrapa Semi-<br />
Ári<strong>do</strong> 2000-2003. Petrolina, PE, 2000. 55 p.<br />
IBGE. Produção da extração vegetal e da silvicultura. Rio<br />
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LIMA, W. DE P.; ZAKIA, M. J. B. Hidrologia de Matas<br />
Ciliares. In: Matas Ciliares Conservação e Recuperação.<br />
São Paulo: Editora <strong>Universidade</strong> de São Paulo, 2000.<br />
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SIMPÓSIO SOBRE MATA CILIAR. Anais...Campinas:<br />
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MAIA, G. N. Caatinga: árvores e arbustos e suas utilidades<br />
1. ed. São Paulo: D&Z, 2004.<br />
Conclusões<br />
Através <strong>do</strong> presente artigo conclui-se<br />
que:<br />
As reuniões na comunidade foram<br />
extremamente proveitosas, geran<strong>do</strong> subsídios<br />
para implementação <strong>do</strong> projeto.<br />
A mobilização da população na comunidade<br />
de Uruçu foi realizada com perfeição<br />
entre as crianças, jovens e adultos, pertencentes<br />
ao projeto e/ou voluntários.<br />
Foram elabora<strong>do</strong>s materiais pedagógicos,<br />
com divulgação sobre as ações de recuperação<br />
e proteção das nascentes.<br />
O mutirão para plantio das mudas foi<br />
realiza<strong>do</strong> com grande sucesso, plantan<strong>do</strong> 400<br />
mudas.<br />
MANTOVANI, W. Conceituação e fatores condicionantes.<br />
In: SIMPÓSIO SOBRE MATA CILIAR. Anais. Campinas:<br />
Fundação Cargill, 1989. p 11-19<br />
ORMOND, J. G. P. Glossário de termos usa<strong>do</strong>s em atividades<br />
agropecuárias, florestais e ciências ambientais. Rio<br />
de Janeiro: BNDES, 2006. p 124 - 125.<br />
ROCHA, J. S. M. da. Diagnóstico de Vegetação. In: Projeto<br />
CIPAM. UFSM, 2005.<br />
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no nordeste brasileiro. GEOUSP – Espaço e Tempo, São<br />
Paulo, n. 11, p.115-126, 2002.<br />
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climatológico <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> da Paraíba. 2. ed. Campina<br />
Grande: UFPB, 1987.<br />
TUNDISI, J. G. Água no século XXI: enfrentan<strong>do</strong> a escassez.<br />
São Carlos: RIMA, IIE, 2003. 248 p.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 12 de março de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 18 de setembro de 2010.<br />
REFERÊNCIAS<br />
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à extensão rural para o desenvolvimento sustentável:<br />
Enfrentar desafios para romper a inércia, 2006.<br />
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e ambientais. EMBRAPA Florestas, 2000.<br />
COSTA, F. A. da. Aplicação de Geoprocessamento na<br />
Análise e Modelagem Ambiental da Microbacia Arroio<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 81-89, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
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Demanda contínua
Projeto de extensão shantala: massagem para bebês<br />
Shantala Extension Project: Baby Massage<br />
Proyecto de Extensión Shantala: masaje para bebés<br />
Arlete Ana Motter 1<br />
Sacha Fernanda Sartor Porto 2<br />
Ana Paula Micos 2<br />
Tharcila Pazinatto da Veiga 2<br />
Mônica Fernandes <strong>do</strong>s Santos 2<br />
Karen de Souza Derussi 2<br />
Indaiara Felisbino 2<br />
Elisiane Krupniski 2<br />
Camila Ollé da Luz Szklar 2<br />
RESUMO<br />
O Projeto de Extensão Shantala (massagem para bebês) tem o objetivo de estreitar os laços entre a família e o<br />
bebê, por meio da divulgação e aplicação da técnica em Centros de Educação Infantil de Matinhos/PR. O projeto<br />
possibilita a integração entre os fundamentos teóricos práticos (ensino), pesquisa e extensão, para estudantes<br />
<strong>do</strong> Curso de Fisioterapia da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná, Setor Litoral. O objetivo deste relato é descrever<br />
as atividades desenvolvidas no projeto de extensão no perío<strong>do</strong> de março a julho de 2010. Nesse perío<strong>do</strong> as<br />
atividades se concentraram em uma escola da rede pública de educação infantil, onde pais, cuida<strong>do</strong>res e bebês<br />
participaram de oficinas e de intervenções realizadas pela equipe <strong>do</strong> estu<strong>do</strong>. A experiência proporcionou a interação<br />
entre alunos e a comunidade e a vivência de resulta<strong>do</strong>s positivos como o relaxamento e a melhora <strong>do</strong><br />
sono <strong>do</strong>s bebês, a importância da familiarização prévia às intervenções, o interesse da escola na continuidade<br />
<strong>do</strong> projeto e o prazer e satisfação das estudantes em participar da experiência. Por outro la<strong>do</strong> conviveram com<br />
dificuldades como local impróprio para aplicação da técnica, ruí<strong>do</strong>s de outras crianças, baixa adesão de alguns<br />
pais e problemas em estabelecer vínculos com as crianças quan<strong>do</strong> não foi possível um perío<strong>do</strong> de familiarização.<br />
Palavras-chave: massagem; bebês; educação em saúde; vínculo família-bebê.<br />
ABSTRACT<br />
The Extension Project Shantala (baby massage) aims to strengthen ties between the family and baby,<br />
through the dissemination and application of the technique in Early Childhood Education Centres of<br />
Matinhos / PR. The project enables integration between the theoretical practical (teaching), research and<br />
extension, to students of Physiotherapy, from the <strong>Federal</strong> University of Parana, coastal sector. The purpose<br />
of this report is to describe the activities in the extension project in the period from March to July 2010.<br />
During this period the activities were concentrated in a public school early childhood education, where<br />
parents, caregivers and infants participated in workshops and interventions conducted by the study team.<br />
The experience provided the interaction between students and the community and experiencing positive<br />
results such as relaxation and improvement on infant sleep, the importance of familiarization prior to the<br />
interventions, the school’s interest in continuing the project and the pleasure and satisfaction of students<br />
to participate in the experience. On the other hand they lived with difficulties as an inappropriate place for<br />
application of the technique, noise of other children, poor compliance of parents, problems in establishing<br />
ties with the children when it was not possible a familiarization period.<br />
Keywords: massage; babies; health education; family-baby bond.<br />
1 Professora Adjunta <strong>do</strong> Curso de Fisioterapia da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná.<br />
2 Acadêmicas <strong>do</strong> Curso de Fisioterapia da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
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MOTTER, A.A. et al. Projeto de Extensão Shantala: massagem para bebês<br />
RESUMEN<br />
El proyecto de extensión Shantala (masaje<br />
para bebés) tiene el objetivo de estrechar los<br />
lazos entre la familia y el bebé, por medio de<br />
la divulgación y aplicación de la técnica en<br />
Centros de Educación Infantil de Matinhos/PR.<br />
El proyecto posibilita la integración entre los<br />
fundamientos teoricos prácticos (enseñanza),<br />
pesquisa y extensión, para estudiantes del<br />
Curso de Fisioterapia de la <strong>Universidade</strong><br />
<strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná, Setor Litoral. El objetivo<br />
de este informe es drescribir las actividades<br />
desarrolladas en el proyecto de extensión en<br />
el perio<strong>do</strong> de marzo a julio de 2010. En ese<br />
perio<strong>do</strong> las actividades concentráronse en<br />
una escuela de la red pública de educación<br />
infantil, <strong>do</strong>nde padres, cuida<strong>do</strong>res, y bebés<br />
participaron de talleres y de intervenciones realizadas<br />
por el equipo de estudios. La experiéncia<br />
proporcionó la interación entre alumnos<br />
y la comunidad y la vivencia de resulta<strong>do</strong>s<br />
positivos como el relaxamiento y la mejora<br />
del sueño de los bebés, la importancia de la<br />
familiarización previa a las intervenciones,<br />
el interés de la escuela en la continuidad<br />
del proyecto y el placer y satisfacción de las<br />
estudiantes en participar de la experiéncia.<br />
Por otro la<strong>do</strong> convivieron con dificultades<br />
como sitio improprio para aplicación de la<br />
técnica, rui<strong>do</strong>s de otros niños, baja adhesión<br />
de algunos padres y problemas en establecer<br />
lazos con los niños cuan<strong>do</strong> no fue posible un<br />
perio<strong>do</strong> de familiarización.<br />
Palabras-clave: masaje; bebés; educación en<br />
salud; lazos familia-bebé.<br />
Introdução<br />
A Shantala é uma técnica de massagem<br />
para bebês que foi descrita inicialmente por Fréderick<br />
Leboyer, médico obstetra. Por volta <strong>do</strong>s<br />
anos 1970, Leboyer, andan<strong>do</strong> pelas ruas <strong>do</strong> sul<br />
da Índia, avistou uma mulher sentada ao chão<br />
com seu bebê entre as pernas. Ficou encanta<strong>do</strong><br />
com a cena, observan<strong>do</strong> a expressão singela <strong>do</strong><br />
bebê e a concentração da mãe, forman<strong>do</strong> um<br />
vínculo intensamente afetivo. Perceben<strong>do</strong> que<br />
massagear bebês é um costume da cultura local,<br />
o médico aprofun<strong>do</strong>u-se no assunto, pesquisan<strong>do</strong><br />
sobre os efeitos fisiológicos da massagem.<br />
Da pesquisa, surgiu um livro, colocan<strong>do</strong> como<br />
título o nome da mãe observada inicialmente:<br />
Shantala (BRÊTAS, 1999).<br />
Estu<strong>do</strong>s comprovam a eficácia da<br />
massagem. O toque na pele <strong>do</strong> bebê estimula<br />
a percepção cutânea e acelera o crescimento<br />
psicomotor (VICTOR ; MOREIRA, 2004). Efeitos<br />
sistêmicos abrangem os sistemas músculo-esquelético,<br />
nervoso e circulatório. A estimulação<br />
da digestão e <strong>do</strong> sistema respiratório também é<br />
alcançada com a Shantala (BRÊTAS ; SILVA,<br />
1998; CRUZ ; CAROMANO, 2005). A criança<br />
relaxa e tem um sono mais tranquilo, diminui-se<br />
a ocorrência de cólicas e o vínculo entre mãe e<br />
bebê é aumenta<strong>do</strong>, geran<strong>do</strong> um melhor desenvolvimento<br />
infantil (FIELD et al, 1996b, cita<strong>do</strong><br />
por ONOZAWA et al, 2001).<br />
A massagem baseia-se no toque. Os<br />
atos de tocar e sentir são transmiti<strong>do</strong>s fisicamente<br />
entre mãos, braços, pernas, tronco e pés, com<br />
contato direto sobre a pele. A mão <strong>do</strong> massagea<strong>do</strong>r<br />
deve estar aquecida, proporcionan<strong>do</strong> o<br />
melhor contato com a pele <strong>do</strong> bebê. A massagem<br />
inicia com deslizamento das mãos sobre o peito,<br />
seguin<strong>do</strong> para braços, mãos, barriga, pernas, pés<br />
e, assim, costas. Por último, o rosto é massagea<strong>do</strong><br />
(VICTOR ; MOREIRA, 2004). O toque terapêutico<br />
é uma prática milenar de imposição das mãos<br />
sobre o corpo. É muito utiliza<strong>do</strong> por profissionais<br />
da saúde a fim de promover relaxamento, reduzir<br />
ansiedade, controlar <strong>do</strong>r, edema e outros efeitos<br />
(GOMES; SILVA ; ARAÚJO, 2008).<br />
O Projeto de Extensão Universitário<br />
Shantala: massagem para bebês, é um projeto<br />
<strong>do</strong> Curso de Fisioterapia da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong><br />
<strong>do</strong> Paraná, que se iniciou em março de 2009. A<br />
ideia <strong>do</strong> projeto surgiu a partir de uma oficina<br />
sobre cuida<strong>do</strong>s com o bebê ministrada pela<br />
coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> projeto no semestre anterior,<br />
no eixo Interações Culturais e Humanísticas, o<br />
qual faz parte <strong>do</strong> Projeto Político e Pedagógico<br />
da UFPR-Litoral. Está cadastra<strong>do</strong> na <strong>PROEC</strong><br />
sob número 535/09. Inicialmente trabalhou-se<br />
para adequar o projeto às normas <strong>do</strong> Comitê de<br />
94<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOTTER, A.A. et al. Projeto de Extensão Shantala: massagem para bebês<br />
Ética em Pesquisa da própria universidade, ten<strong>do</strong><br />
si<strong>do</strong> aprova<strong>do</strong> em agosto de 2009 sob o número<br />
777.112.09.08. No primeiro ano <strong>do</strong> projeto o<br />
enfoque foi na elaboração de material didático<br />
e divulgação <strong>do</strong> méto<strong>do</strong>, fase em que participaram<br />
duas alunas bolsistas e três voluntárias.<br />
Neste segun<strong>do</strong> ano, além das oficinas, também<br />
foram introduzidas intervenções da massagem<br />
em crianças <strong>do</strong> ensino público de Matinhos/PR.<br />
No perío<strong>do</strong> descrito <strong>do</strong> projeto, contava-se com<br />
cinco alunas bolsistas e duas alunas voluntárias,<br />
que neste relato foram identificadas por número.<br />
O presente estu<strong>do</strong> desenvolveu-se de<br />
março a julho de 2010, em um Centro de Educação<br />
Infantil (CEI) de Matinhos/PR. To<strong>do</strong>s os pais<br />
ou responsáveis <strong>do</strong> Berçario 1, que participaram<br />
da reunião inicial, foram convida<strong>do</strong>s a autorizar<br />
a participação de seus filhos no protocolo<br />
de atendimento. Inicialmente foram incluídas<br />
dez crianças, porém duas delas apresentaram<br />
problemas de saúde e faltaram diversas vezes,<br />
sen<strong>do</strong> excluídas <strong>do</strong> protocolo. Participaram<br />
efetivamente oito bebês de ambos os sexos (4<br />
meninas e 4 meninos), de idade entre 6 meses e<br />
1 ano e 5 meses, cujos pais assinaram um Termo<br />
de Compromisso Livre e Esclareci<strong>do</strong>, elabora<strong>do</strong><br />
para esse estu<strong>do</strong>. A fim de garantir o sigilo em<br />
relação à identificação <strong>do</strong>s sujeitos <strong>do</strong> estu<strong>do</strong>, as<br />
crianças receberam nomes fictícios.<br />
As oito crianças receberam oito aplicações<br />
da técnica Shantala. Entretanto, em seis<br />
lactentes foram realizadas quatro semanas de<br />
familiarização no berçário I, com o objetivo de<br />
favorecer o vínculo entre o acadêmico e o bebê.<br />
Dois bebês não participaram da familiarização<br />
devi<strong>do</strong> à entrada tardia de uma das discentes no<br />
projeto, participan<strong>do</strong> somente das aplicações da<br />
massagem.<br />
Desenvolvimento<br />
O Projeto de Extensão Shantala<br />
desenvolveu-se em quatro etapas. A primeira,<br />
dita familiarização, contemplou 4 semanas de<br />
vivência das estudantes na escola, com a finalidade<br />
de facilitar a interação acadêmica-bebê.<br />
Nesta etapa, as alunas basicamente brincavam<br />
com os bebês e auxiliavam na alimentação <strong>do</strong>s<br />
mesmos, permanecen<strong>do</strong> no CEI por cerca de<br />
duas horas em cada encontro.<br />
Na segunda etapa, o projeto foi apresenta<strong>do</strong><br />
aos pais e cuida<strong>do</strong>res, que receberam<br />
uma cartilha, elaborada pelo grupo de extensionistas,<br />
sobre a técnica Shantala e orientação<br />
quanto à realização da massagem em <strong>do</strong>micílio.<br />
Nessa ocasião, cada criança foi avaliada<br />
com uma ficha de avaliação estruturada para<br />
a pesquisa, onde haviam informações a serem<br />
coletadas junto aos pais ou responsáveis.<br />
A terceira etapa constituiu-se das oito<br />
intervenções realizadas no CEI, uma ou duas<br />
vezes por semana, sen<strong>do</strong> atendidas sempre<br />
pela mesma acadêmica <strong>do</strong> projeto. Após cada<br />
aplicação da massagem, cada discente foi orientada<br />
a anotar suas próprias percepções sobre o<br />
desenrolar das atividades <strong>do</strong> projeto, desse mo<strong>do</strong><br />
favorecen<strong>do</strong> a coleta de da<strong>do</strong>s qualitativos. Na<br />
quarta etapa <strong>do</strong> projeto de extensão, cada criança<br />
foi reavaliada e houve novo encontro com os<br />
pais ou responsáveis, pois deveriam questionar<br />
sobre a realização da massagem em <strong>do</strong>micílio,<br />
a observação de mudanças no comportamento<br />
<strong>do</strong>s filhos, alterações no desenvolvimento motor<br />
e padrão <strong>do</strong> sono <strong>do</strong> bebê.<br />
Uma das acadêmicas, que não fazia<br />
intervenções atuou como observa<strong>do</strong>ra externa,<br />
também anotan<strong>do</strong> suas percepções sobre as vivências<br />
<strong>do</strong> projeto. Esses da<strong>do</strong>s junto às outras<br />
percepções e fichas de avaliação e reavaliação,<br />
permitiram que se refletisse sobre os pontos de<br />
fragilidades e pontos fortes <strong>do</strong> projeto.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
95
MOTTER, A.A. et al. Projeto de Extensão Shantala: massagem para bebês<br />
Pontos de Fragilidade<br />
A acadêmica que não realizou o perío<strong>do</strong><br />
de familiarização encontrou muita dificuldade<br />
em estabelecer vínculos com as crianças<br />
em quem aplicava a massagem. Nesse senti<strong>do</strong>,<br />
houve dificuldade em adquirir a confiança das<br />
crianças, conforme ela descreve: “Não participei<br />
das semanas de familiarização, pois entrei tardiamente<br />
no projeto. Esse foi o primeiro ponto que<br />
dificultou a aplicação da técnica nos bebês. Como<br />
não tive este primeiro contato, precisei, em toda<br />
sessão, conquistar e me aproximar das crianças”<br />
(Acadêmica 2). Diante de tal experiência, recomenda-se<br />
que, sempre que possível, prever um<br />
perío<strong>do</strong> inicial às intervenções destina<strong>do</strong> para<br />
as vivências com as crianças, que contemplem<br />
o lúdico favorecen<strong>do</strong> a relação terapeuta-bebê.<br />
Quan<strong>do</strong> trata-se da aplicação da<br />
massagem pelos familiares, esse problema<br />
não aparece, pois já existe um vínculo estabeleci<strong>do</strong><br />
e que poderá ser amplia<strong>do</strong> com<br />
a massagem. Também permite refletir sobre a<br />
frequência das intervenções, pois a dificuldade<br />
enfrentada pela aluna poderia ter si<strong>do</strong> minimizada<br />
se fossem aplicadas sessões diárias, pois para<br />
a criança se sentir segura e aproveitar mais esse<br />
toque, precisa-se de certo tempo adaptativo e<br />
de certa frequência de realização da massagem<br />
(LEBOYER, 1995). Assim, se os pais também<br />
realizassem a massagem em <strong>do</strong>micílio, conforme<br />
orientação <strong>do</strong> projeto, provavelmente o bebê se<br />
adaptaria melhor ao toque, seja <strong>do</strong> familiar ou<br />
da acadêmica.<br />
A aplicação <strong>do</strong> protocolo semanal<br />
foi prejudica<strong>do</strong>, em alguns casos, pela falta<br />
de assiduidade de algumas crianças, ten<strong>do</strong><br />
como exemplo problemas de saúde de <strong>do</strong>is<br />
bebês e por alterações climáticas. No litoral<br />
<strong>do</strong> Paraná, especialmente na cidade de<br />
Matinhos os perío<strong>do</strong>s chuvosos são longos.<br />
Não há proposição para resolver esses problemas,<br />
pois tanto os problemas de saúde<br />
apresenta<strong>do</strong>s, quanto alterações climáticas<br />
fogem ao controle <strong>do</strong>s pesquisa<strong>do</strong>res.<br />
Devi<strong>do</strong> à limitação de espaço físico <strong>do</strong><br />
CEI e a precária infraestrutura da escola, foi necessário<br />
realizar as intervenções na própria sala<br />
<strong>do</strong> berçário onde conviviam crianças atendidas<br />
pelo projeto e crianças que não recebiam as intervenções.<br />
Sen<strong>do</strong> assim, no momento em que<br />
era realizada a massagem, haviam ruí<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s<br />
outros bebês e uma tentativa de chamar atenção<br />
das estudantes a to<strong>do</strong> momento, tornan<strong>do</strong>-se um<br />
ambiente desfavorável para prender a atenção<br />
daqueles que recebiam a massagem.<br />
O ideal seria ter um espaço reserva<strong>do</strong><br />
para que a massagem fosse feita individualmente,<br />
assim a criança não iria se dispersar<br />
com fatores adversos e poderia ficar ainda mais<br />
envolvida com a acadêmica, pois, segun<strong>do</strong><br />
Figueire<strong>do</strong> (2007) o “tocar” a criança pode ir<br />
além <strong>do</strong> próprio toque com as mãos, pode ser<br />
tocada com os olhos (observan<strong>do</strong> atentamente<br />
a criança e suas necessidades), tocá-la com a<br />
voz (conversan<strong>do</strong> com a criança), tocá-la com o<br />
corpo (a entrega recíproca), e, até mesmo tocá-la<br />
com o cheiro (o próprio perfume).<br />
O CEI não oferecia ambiente climatiza<strong>do</strong><br />
(conforme preconiza o méto<strong>do</strong> Shantala), sala<br />
reservada para a execução das massagens e sala<br />
para reuniões com os pais, tais dificuldades podem<br />
ser ilustradas pelos relatos das acadêmicas:<br />
O pedi<strong>do</strong> da mãe de não despir a criança<br />
devi<strong>do</strong> ao frio dificultou a atividade,<br />
pois em alguns dias a massagem teve<br />
que ser realizada por cima da roupa ou<br />
colocan<strong>do</strong> as mãos por baixo da vestimenta<br />
da criança. (Acadêmica 1)<br />
A estrutura <strong>do</strong> local também foi um limitante<br />
porque é um ambiente pequeno,<br />
as salas não são devidamente aquecidas<br />
e as crianças ficam ‘amontoadas’.<br />
(Acadêmica 2)<br />
96<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOTTER, A.A. et al. Projeto de Extensão Shantala: massagem para bebês<br />
A solução poderia contemplar melhorias<br />
e ampliação <strong>do</strong> local, como construção<br />
de novas salas e implantação de climatiza<strong>do</strong>res<br />
de ar, medidas estas que deveriam ser tomadas<br />
pelos órgãos gestores da escola. Nesse senti<strong>do</strong>,<br />
pretende-se apresentar os resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> estu<strong>do</strong><br />
ao Secretário Municipal de Educação <strong>do</strong> município,<br />
para que seja conscientiza<strong>do</strong> das reais<br />
necessidades <strong>do</strong> CEI, no qual se realizou as<br />
intervenções.<br />
Outra possibilidade seria encaminhar<br />
os bebês à Clínica Escola de Fisioterapia da<br />
UFPR-Litoral, onde seria possível o atendimento<br />
em ambiente mais adequa<strong>do</strong>. Entretanto, não se<br />
sabe como seria a adesão de pais e responsáveis<br />
com a mudança de local.<br />
Na percepções das alunas extensionistas,<br />
em alguns momentos, houve pouca<br />
colaboração por parte de algumas cuida<strong>do</strong>ras<br />
em distrair as crianças que não faziam parte <strong>do</strong><br />
protocolo, tornan<strong>do</strong>-se um fator limitante a aplicação<br />
da massagem pelas acadêmicas, conforme<br />
relato a seguir: “Houve um dia em que eu estava<br />
tentan<strong>do</strong> iniciar a aplicação da massagem e a<br />
criança estava meio irritada. Uma das cuida<strong>do</strong>ras<br />
colocou uma música agitada e, em vez de auxiliar<br />
cuidan<strong>do</strong> das outras crianças, pegou a Júlia no<br />
colo e disse: ‘Não quer fazer Shantala hoje Fica<br />
aqui dançan<strong>do</strong> com a tia’. Nesse dia não houve<br />
aplicação, devi<strong>do</strong> ao barulho e a atitude de não<br />
cooperação da cuida<strong>do</strong>ra.” (Acadêmica 2)<br />
Há necessidade, portanto, de maior<br />
conscientização das cuida<strong>do</strong>ras sobre a importância<br />
de sua participação nesse processo de<br />
divulgação e promoção de saúde infantil. Outra<br />
possibilidade de solução seria a inserção de um<br />
aluno somente para interagir com as crianças<br />
que não recebem as intervenções.<br />
A baixa adesão de alguns pais foi um<br />
ponto de fragilidade <strong>do</strong> projeto. Tal problema<br />
pode ter correlação com o horário <strong>do</strong>s encontros<br />
(final <strong>do</strong> horário da tarde), pois os pais e bebês<br />
estavam cansa<strong>do</strong>s e ansiosos em ir para casa.<br />
Como dito anteriormente, o local para as reuniões<br />
com os pais não eram adequa<strong>do</strong>s. Assim, o<br />
pai ou responsável ficava em pé com a criança<br />
no colo, enquanto recebia as informações das<br />
extensionistas, crian<strong>do</strong> uma situação desconfortável.<br />
“... a dificuldade era em falar com alguns<br />
pais que não se mostravam muito interessa<strong>do</strong>s<br />
com o que eu tinha a dizer ou o que eu estava<br />
fazen<strong>do</strong> no local, sempre estavam com pressa.”<br />
(Acadêmica 6).<br />
Na continuidade <strong>do</strong> projeto, poderá<br />
ser necessário alterar o horário para divulgar a<br />
técnica e demonstrá-la, procuran<strong>do</strong> abranger<br />
o coletivo <strong>do</strong>s pais, com o intuito de aumentar<br />
sua adesão. Também pretende-se conseguir<br />
sala própria para reuniões, seja no próprio CEI,<br />
seja na UFPR – Litoral ou na Clínica Escola de<br />
Fisioterapia. Além disso, pretende-se atuar precocemente<br />
divulgan<strong>do</strong> a massagem Shantala,<br />
em grupo de gestantes, pois verificou-se pela<br />
literatura (HOGA; REBERTE, 2006) que se a<br />
conscientização sobre a importância e benefícios<br />
da técnica for realizada durante o perío<strong>do</strong><br />
gestacional, a adesão é maior no pós-parto, pois<br />
as mães iniciam a aplicação da massagem já nos<br />
primeiros meses de vida e a criança se adapta<br />
ao toque.<br />
Os bebês maiores de 1 ano queriam<br />
brincar e correr pela sala, tornan<strong>do</strong> o processo<br />
mais lento e complica<strong>do</strong>, como mostra o relato<br />
a seguir: “Como iniciei tardiamente a aplicação,<br />
acabei fican<strong>do</strong> com duas crianças com mais de 1<br />
ano. Uma delas corria quan<strong>do</strong> percebia que era<br />
hora da Shantala, fazen<strong>do</strong> gesto de ‘não’ com o<br />
dedinho. O tamanho também influenciou, porque<br />
era difícil colocar a criança na posição deitada<br />
em cima das pernas estendidas”.(Acadêmica<br />
2). Pela experiência <strong>do</strong> projeto, quanto antes<br />
se iniciam as primeiras aplicações da Shantala,<br />
maior o vínculo estabeleci<strong>do</strong> entre familiar-bebê<br />
ou entre acadêmico-bebê. Se as intervenções<br />
iniciarem até o terceiro mês de vida, conforme<br />
recomendação de Leboyer (1995), de maneira<br />
gradual a criança vai se adaptan<strong>do</strong> à técnica.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
97
MOTTER, A.A. et al. Projeto de Extensão Shantala: massagem para bebês<br />
Pontos fortes <strong>do</strong> projeto<br />
O perío<strong>do</strong> de familiarização (4 semanas)<br />
foi de grande importância para as intervenções<br />
posteriores, pois nesse perío<strong>do</strong> as acadêmicas<br />
interagiam com as crianças, com brincadeiras<br />
e atividades lúdicas, até que se desenvolveu o<br />
binômio acadêmica-bebê.<br />
Se por um la<strong>do</strong> houve diversas dificuldades<br />
ligadas à execução <strong>do</strong> projeto, por outro<br />
la<strong>do</strong> a experiência foi muito gratificante para<br />
to<strong>do</strong>s os envolvi<strong>do</strong>s. O contato com as crianças<br />
proporcionou a incrível sensação de relaxamento<br />
e serenidade, tanto para quem aplicou<br />
a massagem quanto para quem recebeu. Quem<br />
estava apenas olhan<strong>do</strong>, observan<strong>do</strong> cada gesto<br />
e cada sentimento, se encantou com o que viu.<br />
A vivência foi única, em cada sessão de Shantala<br />
se obtinha uma nova percepção e (re)conhecimento<br />
sobre o corpo humano.<br />
Acredito que toda a experiência que vivi,<br />
tu<strong>do</strong> o que senti, é inexplicável e com<br />
certeza o fim desse trabalho envolveu<br />
muito mais que um simples papel com<br />
escritas. Esse trabalho resultou num<br />
despertar de cuida<strong>do</strong> e carinho pelo<br />
próximo por meio de um leve toque<br />
e um singelo sorriso, tive um verdadeiro<br />
crescimento como ser humano.<br />
(Acadêmica 3)<br />
O carinhoso toque das acadêmicas,<br />
que passava tranquilidade e confiança<br />
aos bebês, criou importantes laços afetivos.<br />
A fascinação <strong>do</strong>s bebês pelas discentes era<br />
visível e cativava aos que compartilhavam <strong>do</strong><br />
momento.“Marina ainda não anda e pouco<br />
engatinha. Sempre que eu chegava ao CEI, ela<br />
estava no chão e vinha até mim se arrastan<strong>do</strong><br />
com o bumbum, sabia que era hora da Shantala.”<br />
(Acadêmica 1)<br />
Cada movimento era percebi<strong>do</strong> pela<br />
criança. Elas gostavam de atenção e da ideia<br />
de ter alguém ali, interagin<strong>do</strong> diretamente. Cada<br />
toque gerava um sorriso, um tanto desconfia<strong>do</strong><br />
em princípio, mas que foi progredin<strong>do</strong> com o<br />
andar da experiência. A leve desconfiança permaneceu<br />
até que a ida das acadêmicas ao CEI<br />
tornou-se rotina e, então, to<strong>do</strong>s ficavam ansiosos<br />
pela chegada da equipe <strong>do</strong> projeto.<br />
Notei que durante a massagem ela (a<br />
criança) gostou muito, ficava olhan<strong>do</strong><br />
bem atenta to<strong>do</strong>s os movimentos e até<br />
tentou falar algumas palavras. Gostava<br />
quan<strong>do</strong> eu tocava seu rosto e seus pés –<br />
dava risadas e relaxava principalmente<br />
quan<strong>do</strong> massageava o peito, braços e<br />
mãos.” (Acadêmica 1)<br />
A vivência dentro <strong>do</strong> Centro de Educação<br />
Infantil foi de muita valia para a vida. As<br />
realizações que aconteceram nesse espaço não<br />
só contribuíram para o crescimento profissional,<br />
mas também para a vida (inter)pessoal. As cuida<strong>do</strong>ras,<br />
assim como as acadêmicas, perceberam<br />
diferenças nas crianças após as sessões.“As crianças<br />
melhoram muito nos dias de atendimento.<br />
Ficam mais calmas e tranquilas. Nos dias que não<br />
tem atendimento, elas ficam mais agitadas e se<br />
um bebê acorda, to<strong>do</strong>s acordam. […] Crianças<br />
que não conseguiam <strong>do</strong>rmir ou <strong>do</strong>rmiam pouco,<br />
agora ficam mais relaxadas a maior parte <strong>do</strong> tempo,<br />
graças à intervenção das meninas.” (Relato<br />
de uma Cuida<strong>do</strong>ra)<br />
Os pais que realizaram a Shantala<br />
em casa, relataram que os bebês ficavam mais<br />
tranquilos após as massagens e <strong>do</strong>rmiam melhor.<br />
Tal observação também foi descrita pelas<br />
extensionistas em suas percepções. Pais que se<br />
envolveram e demonstraram maior integração,<br />
participan<strong>do</strong> das experiências, aprenden<strong>do</strong> e<br />
aplican<strong>do</strong> as orientações em suas casas, proporcionaram<br />
benefícios tanto para si quanto para<br />
os bebês (SIMPSON, 2001).<br />
98<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOTTER, A.A. et al. Projeto de Extensão Shantala: massagem para bebês<br />
De maneira geral, o projeto Shantala<br />
contribuiu para a aproximação, o afeto, o carinho<br />
e a comunicação entre aqueles que cuidam,<br />
educam e compartilham <strong>do</strong> conjunto de méto<strong>do</strong>s<br />
aplica<strong>do</strong>s junto aos processos que ocorrem no<br />
desenvolvimento infantil.<br />
A direção da escola prontamente acolheu<br />
a equipe <strong>do</strong> projeto e mesmo com poucos<br />
recursos, procurou viabilizar o que era possível,<br />
favorecen<strong>do</strong> a comunicação com os pais ou responsáveis.<br />
A receptividade foi tão positiva que<br />
motivou aos participantes <strong>do</strong> projeto a continuar<br />
desenvolven<strong>do</strong> ações por um semestre a mais <strong>do</strong><br />
perío<strong>do</strong> pretendi<strong>do</strong>.<br />
As acadêmicas <strong>do</strong> curso de fisioterapia<br />
desenvolveram-se tecnicamente durante esta experiência<br />
<strong>do</strong> projeto, pois tal qual o enfermeiro,<br />
o fisioterapeuta, no seu processo de formação<br />
acadêmica, deve passar obrigatoriamente pelo<br />
ensino teórico e pelo saber fazer (vivências práticas)<br />
que somente serão possíveis nos campos<br />
de estágio (SALOMÉ; ESPÓSITO, 2008) e em<br />
experiências proporcionadas por projetos de<br />
extensão. Também houve condições oportunas<br />
para o amadurecimento relativo a questões operacionais,<br />
características desse tipo de atividade<br />
que envolvem ações extensionistas.<br />
Portanto, acredita-se estar favorecen<strong>do</strong><br />
a integração <strong>do</strong> ensino-pesquisa e extensão, com<br />
a continuidade <strong>do</strong> projeto de extensão Shantala:<br />
massagem para bebês.<br />
Considerações finais<br />
O perío<strong>do</strong> de familiarização foi de suma<br />
importância para o bom desenvolvimento da<br />
técnica, pois a confiança expressa pelas crianças<br />
se deu graças a essa etapa. Tal constatação se<br />
deu pela dificuldade em criar vínculos com os<br />
bebês da acadêmica que não participou desse<br />
processo. As intervenções que iniciam nos primeiros<br />
meses de vida <strong>do</strong> bebê e realizadas com<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
maior frequência semanal favorecem a adaptação<br />
ao toque terapêutico e o aumento <strong>do</strong> vínculo<br />
familiar ou acadêmico-bebê.<br />
As intervenções foram essenciais para<br />
comprovar que a massagem Shantala exige um<br />
ambiente adequa<strong>do</strong> (climatização, ambiente<br />
calmo e tranquilo) para sua realização. Assim,<br />
torna-se imprescindível a utilização de um local<br />
apropria<strong>do</strong> que ofereça o conforto necessário<br />
aos bebês e aplica<strong>do</strong>res, visan<strong>do</strong> alcançar o relaxamento<br />
que a massagem promove. A aplicação<br />
da massagem envolve uma entrega de quem<br />
aplica e de quem recebe a massagem. Os pais<br />
que aderiram à prática da Shantala observaram<br />
seus benefícios para a saúde e tranquilidade <strong>do</strong>s<br />
bebês, o que também foi observa<strong>do</strong> pelas alunas.<br />
As atividades realizadas propiciaram a<br />
integração <strong>do</strong>s estudantes <strong>do</strong> Curso de Fisioterapia<br />
com a comunidade litorânea e favoreceram<br />
a integração <strong>do</strong> ensino-pesquisa e extensão. O<br />
projeto é viável, pois exige poucos recursos e<br />
com alguns ajustes será possível continuar esse<br />
trabalho em outros centros de educação infantil<br />
<strong>do</strong> município ou com grupos de gestantes.<br />
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SIMPSON, Robbie. Baby massage classes and the work<br />
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Therapies in Nursing & Midwifery, Leicester, v.<br />
7, p. 25-33, 2001.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 22 de setembro de 2010.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 10 de maio de 2011.<br />
100<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 93-100, jul./dez. 2010. Editora UFPR
A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
Mediation in popular education and its impact in subjectivity<br />
Mediación en la educación popular y su impacto en la subjectividad<br />
Maurício Mogilka 1<br />
RESUMO<br />
A discussão travada neste artigo pretende ser uma contribuição ao complexo problema das questões psicossociais<br />
presentes na relação de mediação em educação popular. A discussão toma como ponto específico<br />
o impacto que esta relação tem ou pode ter no desenvolvimento da subjetividade popular. Este tema é de<br />
fundamental importância para as práticas de mediação com caráter liberta<strong>do</strong>r, paradigma que é o principal<br />
fundamento deste texto. Contu<strong>do</strong>, o termo liberta<strong>do</strong>r é toma<strong>do</strong> aqui em senti<strong>do</strong> amplo, para designar não<br />
apenas o pensamento de autores latino-americanos fundamentais para se compreender a nossa realidade<br />
social, como Paulo Freire, Carlos Rodrigues Brandão ou Pablo Richard, mas também qualquer outro<br />
autor que possa contribuir para os processos de libertação <strong>do</strong> ser humano. Neste texto específico, foram<br />
trabalhadas reflexões vindas da própria prática <strong>do</strong> autor no trabalho social, há mais de duas décadas, e<br />
algumasdeias de autores como Dewey, Sartre, Hegel e Galeffi.<br />
Palavras-chave: mediação; educação popular; subjetividade.<br />
ABSTRACT<br />
This article makes a reflection about complex problem of the psicossocial question in the educational relationship<br />
in popular education. The main focus of the discussion is the impact that this relationship have in<br />
the development of the subjectivity of the poor peoples. This matter is of fundamental importance to the<br />
educational practices with liberator nature, pedagogic paradigm that is the main theoretical support of this<br />
text. However, the word liberator is take here in the large sense, meaning the thought of Latin American<br />
authors, like Paulo Freire, Carlos Rodrigues Brandão or Pablo Richard, that have a great importance to<br />
the understand our social reality; but liberator here in this text means too the thought of others authors, that<br />
can contribute to the liberation of the human being. In this specific article, was used reflections of the own<br />
practices of the author in the social work, and some ideas of authors like Dewey, Sartre, Hegel e Galeffi.<br />
Keywords: educational relationship; popular education; subjectivity.<br />
RESUMEN<br />
La discusión planteada en este artículo desea ser una contribución al complexo problema de las cuestiones<br />
psicossociales presentes en la relación educativa en el trabajo social. La discusión toma como punto específico<br />
el impacto que esta relación ten o pode tener en el desarrollo de las personas de las camadas más<br />
pobres de la población. Esta temática es de fundamental importancia para las prácticas educativas del tipo<br />
liberta<strong>do</strong>r, paradigma que es el fundamento de este texto. Todavía, la palabra liberta<strong>do</strong>r es usada aquí en<br />
senti<strong>do</strong> amplio, significan<strong>do</strong> no solamente el pensamiento de autores latino-americanos fundamentales para<br />
se comprehender la nuestra realidad social, como Paulo Freire, Carlos Rodrigues Brandão ou Pablo Richard,<br />
mas también cualquier otro autor que posa contribuir para los procesos de liberación del ser humano. En<br />
este texto específico, se trabajó con las reflexiones de la propia práctica del autor de este artículo, como<br />
1 Professor Adjunto de Didática da Faculdade de Educação da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> da Bahia. Doutor em Educação pela FACED/<br />
UFBA. Coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> projeto de extensão “Educação e Libertação”. Da<strong>do</strong>s para contato: Faculdade de Educação da UFBA – Av.<br />
Reitor Miguel Calmon, s/n, Canela – 40110-100 - Salva<strong>do</strong>r – BA; Tel. (71)32837230; e-mail: mmogilka@ufba.br<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
101
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
102<br />
también con algunas ideas de autores como<br />
Dewey, Sartre, Hegel e Galeffi.<br />
Palabras-clave: relación educativa; educación<br />
popular; subjectividad.<br />
Relação de mediação e desenvolvimento<br />
da subjetividade popular<br />
A discussão travada neste artigo pretende<br />
ser uma contribuição ao complexo problema<br />
das questões psicossociais presentes na relação<br />
de mediação em educação popular. A discussão<br />
toma como ponto específico o impacto que esta<br />
relação tem ou pode ter no desenvolvimento da<br />
subjetividade popular. Pretende também avaliar as<br />
consequências práticas e subjetivas desta relação<br />
para a construção da autonomia <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s.<br />
Este tema é de fundamental importância para<br />
as práticas de mediação com caráter liberta<strong>do</strong>r,<br />
paradigma que é o principal fundamento <strong>do</strong> meu<br />
trabalho na área social, e também a inspiração<br />
teórica deste texto.<br />
Contu<strong>do</strong>, é importante ressaltar que<br />
eu tomo aqui o termo liberta<strong>do</strong>r em um senti<strong>do</strong><br />
amplo, para designar não apenas o pensamento<br />
de autores latino-americanos fundamentais para<br />
se compreender a nossa realidade social, como<br />
Paulo Freire, Carlos Rodrigues Brandão ou Pablo<br />
Richard, mas também qualquer outro autor que<br />
possa contribuir para os processos de libertação<br />
<strong>do</strong> ser humano, seja Marx, Gramsci, A<strong>do</strong>rno<br />
ou Dewey. Neste texto específico, eu trabalharei<br />
com reflexões vindas da minha própria prática no<br />
trabalho social, há mais de duas décadas, e com<br />
algumas ideias de autores como Dewey, Sartre,<br />
Hegel e Galeffi.<br />
A relação de mediação no trabalho social<br />
já é complexa em si mesma, devi<strong>do</strong> à complexidade<br />
<strong>do</strong> educar. Os efeitos desta complexidade se<br />
mostram ainda mais graves quan<strong>do</strong> se trata de práticas<br />
de mediação em projetos e movimentos sociais<br />
que trabalham com crianças, jovens e adultos<br />
que vivem em precárias condições sociais em nosso<br />
país ou até mesmo em situação de risco. Abordar<br />
e se relacionar com os educan<strong>do</strong>s em qualquer<br />
tipo de situação educativa a partir <strong>do</strong>s modelos<br />
pedagógicos convencionais tem produzi<strong>do</strong> grandes<br />
dificuldades de aprendizagem e desenvolvimento<br />
nesta população. Mas a presença <strong>do</strong>s paradigmas<br />
pedagógicos conserva<strong>do</strong>res ainda é forte, de forma<br />
secreta e sutil, em muitos media<strong>do</strong>res que se<br />
propõem a um trabalho de auto-libertação popular.<br />
A relação de mediação “montada”<br />
(muitas vezes inconscientemente) a partir destes<br />
modelos tem leva<strong>do</strong> à intervenções autoritárias ou<br />
paternalistas, para que se alcancem os objetivos<br />
defini<strong>do</strong>s, geralmente sem a participação da própria<br />
população. As dificuldades de aprendizagem<br />
ocorrem porque é impossível para os educan<strong>do</strong>s<br />
aprender e se desenvolver de forma sadia se ela<br />
não consegue atribuir significa<strong>do</strong>s àquilo que lhe<br />
é proposto, sejam conceitos, ideias, valores ou<br />
normas de convivência.<br />
Contu<strong>do</strong>, como atribuir significa<strong>do</strong>s, senão<br />
a partir da experiência e <strong>do</strong>s conhecimentos<br />
prévios <strong>do</strong> grupo, que frequentemente são considera<strong>do</strong>s<br />
um obstáculo às atividades educativas<br />
A influência de uma persistente e subliminar epistemologia<br />
positivista mantém uma cissão artificial<br />
entre o mun<strong>do</strong> da vida cotidiana e o logos <strong>do</strong>s<br />
saberes e reflexões chama<strong>do</strong>s elabora<strong>do</strong>s. Esta<br />
cissão provoca uma desqualificação, mesmo que<br />
“delicada”, da experiência e da cultura popular.<br />
Este é um <strong>do</strong>s fatores que irão dificultar a construção<br />
de uma relação de mediação baseada em<br />
afetividades positivas e um respeito genuíno, que<br />
supera tanto o autoritarismo positivista como uma<br />
idealização romântica da cultura popular.<br />
Estas reflexões poderiam contribuir para<br />
uma qualificação teórica e também para uma<br />
mudança de atitudes por parte de educa<strong>do</strong>res<br />
sociais, e por parte <strong>do</strong>s cursos de formação destes<br />
profissionais. Mesmo no campo da chamada educação<br />
popular, ainda é muito forte a compreensão<br />
convencional de intervenção junto aos educan<strong>do</strong>s,<br />
fortemente centrada no saber instituí<strong>do</strong> e nos valores<br />
<strong>do</strong>minantes. Se para qualquer educan<strong>do</strong> isto é<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
um problema, pois oprime o seu ser, para aqueles<br />
que vem de situações de risco é ainda mais grave,<br />
exigin<strong>do</strong> <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res sociais muito preparo<br />
teórico e muita flexibilidade.<br />
As situações de mediação são, por excelência,<br />
momentos onde a subjetividade gera mais<br />
subjetividade. Isto é, elas são situações forma<strong>do</strong>ras<br />
onde a subjetividade joga um forte papel, ao<br />
menos nas práticas presenciais. Considerar estes<br />
fatores subjetivos no trabalho social não significa<br />
cair em posições subjetivistas ou psicologizantes,<br />
pois aqui entendemos os fatores subjetivos sempre<br />
articula<strong>do</strong>s com os aspectos materiais, políticos e<br />
sociais que deixam suas fortes marcas em qualquer<br />
prática social de formação. Estas práticas e<br />
seus resulta<strong>do</strong>s são entendi<strong>do</strong>s desta forma como<br />
situações multicausais e complexas, nunca imunes<br />
aos fatores sociais e subjetivos que influem<br />
na suas trajetórias, embora seja difícil determinar<br />
com precisão o peso que cada fator representa na<br />
constituição da prática.<br />
Mesmo consideran<strong>do</strong> o peso <strong>do</strong>s fatores<br />
mais objetivos na estruturação da situação<br />
de mediação, eu creio que a subjetividade, como<br />
fator forma<strong>do</strong>r de mais subjetividade, tem uma<br />
força maior <strong>do</strong> que lhe é atribuída pela maioria<br />
das teorias pedagógicas. Em 1910, no livro Como<br />
pensamos, Dewey já nos alertava para a importância<br />
<strong>do</strong>s fatores subjetivos na relação pedagógica:<br />
Raras vezes (e jamais completamente) é<br />
o educa<strong>do</strong>r um “meio transparente” para<br />
fazer o educan<strong>do</strong> conhecer determina<strong>do</strong><br />
assunto. Para os educan<strong>do</strong>s a influência da<br />
personalidade <strong>do</strong> educa<strong>do</strong>r influi intimamente<br />
sobre o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> seu ensino. Não<br />
só eles não separam as duas coisas, como<br />
não as distinguem. E como as reações<br />
<strong>do</strong> educan<strong>do</strong> o aproximam ou afastam<br />
de tu<strong>do</strong> o que lhe ensinam, ele associa<br />
continuamente suas sensações de prazer<br />
ou desprazer, de simpatia ou aversão, não<br />
só aos atos <strong>do</strong> educa<strong>do</strong>r, como também<br />
ao assunto trata<strong>do</strong> por este. (DEWEY,<br />
1953, p. 51).<br />
O caráter formativo (ou deformativo, se<br />
exerci<strong>do</strong> de forma desumana) <strong>do</strong>s fatores subjetivos<br />
nas relações de mediação ocorre sempre, em<br />
maior ou menor grau. Contu<strong>do</strong>, ele é mais intenso<br />
quan<strong>do</strong> as relações são mais longas no tempo: ser<br />
trata<strong>do</strong> de forma severa pelo funcionário de um<br />
banco atinge a pessoa bem menos <strong>do</strong> que ser trata<strong>do</strong><br />
de forma semelhante pelos media<strong>do</strong>res, com<br />
quem elas convivem por vários meses ou anos.<br />
Este tipo de clima emocional afeta a aprendizagem<br />
e o desenvolvimento de educan<strong>do</strong>s de qualquer<br />
origem social, mas produz efeitos ainda mais devasta<strong>do</strong>res<br />
quan<strong>do</strong> se tratam de pessoas em situação<br />
de risco ou pertencentes a minorias, como já foi<br />
explicita<strong>do</strong>. Por que isto acontece<br />
Estas pessoas geralmente já têm a auto-<br />
-estima comprometida, pelas características das<br />
próprias condições sociais em que vivem. Aprendizagem<br />
e desenvolvimento não são processos<br />
simples, e dependem muito de fatores afetivos,<br />
como tentarei desenvolver a seguir. No caso <strong>do</strong><br />
desenvolvimento de atitudes, valores, interesses e<br />
consciência crítica, elementos básicos <strong>do</strong> trabalho<br />
social em perspectivas liberta<strong>do</strong>ras, que envolvem<br />
mudanças nas atitudes políticas, esta dificuldade<br />
fica ainda mais clara.<br />
É difícil as pessoas mudarem os seus<br />
valores e atitudes, pois eles constituem a própria<br />
personalidade, aquilo que a pessoa é: mudar<br />
valores é, de certa forma, mudar o próprio eu.<br />
Além disto, o trabalho social com valores e atitudes<br />
é difícil pelas escolhas éticas que ele coloca.<br />
Quem garante ao educa<strong>do</strong>r social ou à liderança<br />
comunitária que aquele valor social ou político é<br />
preferível a outro, mais conserva<strong>do</strong>r, por exemplo<br />
Onde encontrar um critério de legitimidade<br />
para defender um comportamento político, e<br />
mais difícil, convencer as pessoas a defendê-lo<br />
e praticá-lo Isto é essencial aos projetos educativos<br />
e políticos de inspiração liberta<strong>do</strong>ra, pois<br />
aqui não se aceita a prática da <strong>do</strong>utrinação e nem<br />
a atitude política de se considerarem os media<strong>do</strong>res<br />
a “vanguarda” que vai “guiar o povo” rumo à<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
103
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
libertação. O conceito de auto-libertação popular<br />
não combina com <strong>do</strong>utrinação.<br />
As práticas de mediação liberta<strong>do</strong>ras, ao<br />
menos na minha interpretação, ao trabalharem<br />
com desenvolvimento de valores, exigem que estes<br />
valores e atitudes sejam pratica<strong>do</strong>s para serem<br />
desenvolvi<strong>do</strong>s. Isto significa construir relações interpessoais<br />
coerentes com tais valores, o que depende<br />
fortemente <strong>do</strong> preparo psicossocial <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res<br />
e das lideranças comunitárias: aqui, o discurso não<br />
basta. Aliás, eu acredito que a credibilidade social<br />
de qualquer trabalho de inspiração liberta<strong>do</strong>ra<br />
depende de uma rigorosa coerência entre discurso,<br />
teoria e prática por parte <strong>do</strong>s profissionais, inclusive<br />
intelectuais acadêmicos, que trabalham neste<br />
campo ou tentam aí produzir influências.<br />
Incoerências desta natureza comprometem<br />
os resulta<strong>do</strong>s de experiências alternativas, em<br />
projetos ou movimentos sociais, que são representa<strong>do</strong>s<br />
socialmente, muitas vezes, como não<br />
distintos das práticas e atitudes conserva<strong>do</strong>ras.<br />
Valores essenciais à construção de experiências<br />
sociais mais justas e humanas, como a ética e a<br />
sociabilidade cooperativa, precisavam ser vivi<strong>do</strong>s<br />
e experimenta<strong>do</strong>s na prática, pois o discurso<br />
separa<strong>do</strong> da experiência é pouco eficaz para o<br />
desenvolvimento das pessoas.<br />
Outros discursos corroboram esta posição,<br />
mostran<strong>do</strong> como a experiência prática e a<br />
qualidade da relação interpessoal são fundamentais<br />
para o desenvolvimento de valores e atitudes.<br />
Por exemplo Galeffi (1998), a partir de um enfoque<br />
fenomenológico, nos chama a atenção para a<br />
conexão entre relação, senti<strong>do</strong> e autonomia política.<br />
A consciência e a autonomia político-social,<br />
consideradas nos jogos de relação com os outros<br />
sujeitos e com as estruturas de poder, só podem<br />
se dar se há uma correspondência de senti<strong>do</strong> da<br />
autonomia em cada pessoa em desenvolvimento.<br />
Não há condição de ocorrer nenhuma forma<br />
consistente de consciência politico-social, capaz de<br />
sustentar um projeto genuinamente democrático<br />
de sociedade, se o sujeito singular não desenvolver<br />
uma pessoalidade própria e um exercício de<br />
autonomia inter e intrapessoal (GALEFFI, 1998).<br />
Para isto, é necessário a instauração de<br />
relações interpessoais adequadas, que permitam<br />
ao grupo viver a sua diferença e experimentar a<br />
sua autonomia de forma concreta, de tal maneira<br />
que os participantes tenham uma base prática<br />
para elaborar um senti<strong>do</strong> para a autonomia social.<br />
Desta forma, qualquer discussão e tentativa<br />
de democracia real e de autonomia social só tem<br />
senti<strong>do</strong> a partir <strong>do</strong> desenvolvimento concreto de<br />
sujeitos sociais, com uma singularidade construída<br />
culturalmente (GALEFFI, 1998). Sem esta<br />
correspondência de senti<strong>do</strong>, os discursos sobre a<br />
consciência político-social e a cidadania têm grande<br />
chance de se tornarem formais e abstratos, ou<br />
ainda mais grave, normativos, pois não têm senti<strong>do</strong><br />
para aquela pessoa específica, e dificilmente terão<br />
o seu conteú<strong>do</strong> pratica<strong>do</strong> por ela.<br />
Contu<strong>do</strong>, as relações interpessoais não<br />
exercem influência importante apenas na elaboração<br />
da consciência política, mas na própria<br />
estruturação <strong>do</strong> sujeito, isto é, no processo de<br />
formação humana. O sujeito não se constitui sozinho,<br />
ele precisa da relação com seus semelhantes.<br />
A autonomia de uma pessoa, se por um la<strong>do</strong> não<br />
pode ser <strong>do</strong>ada por um outro, também não nasce<br />
de uma decisão pessoal, de um ato isola<strong>do</strong> e<br />
auto-suficiente. Ela precisa ser reconhecida, não se<br />
estrutura na solidão: a sua constituição é interativa.<br />
Analisan<strong>do</strong> o pensamento de Hegel,<br />
Sartre (1998) nos mostra a importância das ideias<br />
deste autor alemão para compreendermos o processo<br />
de constituição da consciência que o sujeito<br />
elabora de si. Sartre nos mostra como Hegel desvela<br />
este fenômeno sutil e complexo: para se constituir<br />
enquanto consciência, é necessário que o eu seja<br />
percebi<strong>do</strong> por outra consciência. Logo, ser para o<br />
outro é uma etapa necessária no desenvolvimento<br />
da consciência que o eu elabora de si, de tal forma<br />
que o eu precisa obter o reconhecimento <strong>do</strong> seu ser<br />
no outro. Hegel procura provar sua tese através <strong>do</strong><br />
princípio da identidade: o que caracteriza o eu é a<br />
sua identidade consigo mesmo, e sua consequente<br />
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Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
não identidade com o resto <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, inclusive<br />
com o outro (SARTRE, 1998; HEGEL, 1978).<br />
Só assim, se opon<strong>do</strong> ao outro (em termos<br />
de representação identitária), é que o eu é<br />
o que é, ou seja, é ele mesmo. Somente assim<br />
o eu consegue se definir, obter um estatuto de<br />
ser. Não haveria possibilidade e senti<strong>do</strong> no eu, se<br />
ele fosse contínuo com tu<strong>do</strong> que o rodeia; seria<br />
não-eu, seria o próprio to<strong>do</strong>. Mas este reconhecimento,<br />
esta identidade consigo mesmo, ainda<br />
carece <strong>do</strong> reconhecimento <strong>do</strong> outro. Ou seja,<br />
depende que o outro reconheça o eu como um<br />
objeto, como algo externo a si mesmo (externo<br />
ao outro). Esta é a prova conclusiva, pois o eu<br />
não poderia ser objeto para o outro, se fosse<br />
ele mesmo (o outro). Isto explicaria porque a<br />
consciência precisa ser reconhecida por outra<br />
consciência, para ser:<br />
Assim, a intuição genial de Hegel é a de<br />
fazer-me dependente <strong>do</strong> outro em meu<br />
ser. Eu sou – diz ele – um ser Para-si<br />
(consciência) que só é Para-si por meio<br />
<strong>do</strong> outro. Portanto, o outro me penetra<br />
em meu âmago. Não poderia colocálo<br />
em dúvida sem duvidar de mim<br />
mesmo, pois “a consciência de si é real<br />
somente enquanto conhece seu eco (e<br />
seu reflexo) no outro” (...) Ao invés de o<br />
problema <strong>do</strong> outro se colocar a partir da<br />
consciência, é, ao contrário, a existência<br />
<strong>do</strong> outro que faz a consciência possível<br />
como o momento abstrato em que o eu<br />
se apreende como objeto. (SARTRE,<br />
1998, p. 307-308).<br />
Trazen<strong>do</strong> esta discussão para a área de<br />
formação política, creio que a compreensão deste<br />
fenômeno é fundamental para a constituição<br />
de práticas favoráveis à libertação. O educa<strong>do</strong>r e<br />
a liderança comunitária representam importantes<br />
outros no processo de estruturação política da<br />
população. Principalmente com populações<br />
marginalizadas, cuja relação com a autoridade<br />
instituída é vertical e tende a negar a afirmação<br />
da autonomia e de um auto-conceito positivo.<br />
Aliás, este é um perverso mecanismo <strong>do</strong>s processos<br />
históricos de <strong>do</strong>minação na América Latina,<br />
face subjetiva complementar e imprescindível<br />
destes processos de opressão secular, atuan<strong>do</strong><br />
de forma conjugada com os processos de <strong>do</strong>minação<br />
física, material e jurídica.<br />
Logo, a forma como estes agentes sociais<br />
enxergam e tratam a população afeta sensivelmente<br />
o auto-conceito que esta elabora de si<br />
mesma, embora não o determine completamente.<br />
Tal fenômeno é agrava<strong>do</strong> pelo fato que esta<br />
influência muitas vezes não é percebida pelos<br />
educan<strong>do</strong>s. Isto nos alerta para a força que irão<br />
jogar as representações, preconceitos e expectativas<br />
<strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res no delica<strong>do</strong> processo de<br />
constituição da autonomia <strong>do</strong>s grupos populares<br />
participantes <strong>do</strong>s projetos e movimentos sociais<br />
com os quais atuamos.<br />
A relação de mediação e as aprendizagens<br />
conceituais<br />
O conjunto de argumentos acima parece<br />
mostrar as conexões entre a subjetividade<br />
<strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res e <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s e o desenvolvimento<br />
de atitudes e valores favoráveis às<br />
lutas por direitos e por sociedades mais justas.<br />
Ou seja, sociedades capazes de humanizar a<br />
humanidade, de jogar a humanidade para novos<br />
patamares de vida, de convivência e de relação<br />
com o planeta, além <strong>do</strong>s parâmetros limitantes<br />
e mercantilistas da ordem capitalista. É, sem<br />
dúvida, um campo complexo de se trabalhar<br />
em educação popular. Será, contu<strong>do</strong>, que estas<br />
questões subjetivas também não atingem, talvez<br />
em menor grau, as aprendizagens no campo<br />
mais cognitivo, como conceitos e fatos Será a<br />
aprendizagem neste campo mais fácil, e talvez<br />
até, isenta <strong>do</strong>s fatores subjetivos Ou serão as<br />
aprendizagens no campo conceitual também<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
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MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
afetadas pela natureza e qualidade das relações<br />
interpessoais<br />
As aprendizagens <strong>do</strong> campo cognitivo,<br />
como fatos, conceitos e princípios, são também<br />
muito importantes em propostas de educação<br />
liberta<strong>do</strong>ra. Primeiro, porque a própria aprendizagem<br />
da ciência e da cultura elaborada constitui<br />
em si um fator de cidadania, um direito e uma<br />
necessidade da população. E uma parte <strong>do</strong>s<br />
conhecimentos desta cultura estão no campo<br />
conceitual. Em segun<strong>do</strong> lugar, apesar de eu não<br />
acreditar que conceitos e ideias modifiquem<br />
comportamentos, eles são importantes, pois são<br />
portas de entrada, são provocações, possibilidades<br />
de mudanças futuras de valores, atitudes e<br />
formas de sociabilidade.<br />
A crença iluminista de mudança <strong>do</strong><br />
sujeito a partir de conceitos e ideias é problemática<br />
na área educativa, pois simplifica o que<br />
é complexo. Os processos de mudança <strong>do</strong> ser<br />
humano são muito mais complexos e envolvem<br />
bem mais <strong>do</strong> que o campo cognitivo e intelectual.<br />
Uma parte <strong>do</strong> pensamento social mais engaja<strong>do</strong>,<br />
e inclusive <strong>do</strong> ativismo social, esteve durante os<br />
séculos XIX e XX fortemente liga<strong>do</strong> a duas ideias<br />
de base racionalista, herança da concepção de<br />
sujeito <strong>do</strong> século XVIII. A primeira é a crença<br />
segun<strong>do</strong> a qual quanto mais informação e conhecimento,<br />
mais pensamento, e quanto mais<br />
pensamento, mais consciência sobre a realidade.<br />
Ou seja, o processo de superação da alienação<br />
política é um processo prioritariamente cognitivo.<br />
Esta ideia sustentou e sustenta ainda<br />
parte das propostas mais engajadas de formação<br />
para a cidadania na modernidade. A sua representação<br />
gráfica poderia ser feita da seguinte<br />
forma:<br />
práticas de mediação<br />
construção <strong>do</strong> conhecimento<br />
autonomia intelectual e política<br />
Na educação popular temos um modelo<br />
<strong>do</strong>minante, ainda muito forte, cuja base<br />
filosófica repousa sobre ideia semelhante:<br />
conhecimento<br />
conscientização<br />
mudanças no comportamento<br />
Mas as mudanças subjetivas, especialmente<br />
aquelas de caráter político, não são tão<br />
simples. Elas necessitam de outros elementos<br />
para acontecerem. Que elementos seriam estes<br />
conhecimento<br />
conscientização<br />
<br />
A manutenção de propostas de formação<br />
baseadas nestas ideias, é uma herança<br />
da racionalidade constituída nos séculos XVII e<br />
XVIII, na forma como ela foi apropriada pelas<br />
estruturas políticas <strong>do</strong>minantes nas sociedades<br />
capitalistas. Estas propostas têm o mérito de<br />
mostrar a importância <strong>do</strong>s elementos cognitivos<br />
e intelectuais para o processo de constituição da<br />
autonomia das pessoas. Mas falta uma ênfase<br />
maior nos demais elementos necessários para<br />
esta constituição: o desejo pela mudança; aspecmudanças<br />
no<br />
comportamento<br />
<br />
<br />
<br />
106<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
tos subjetivos como afetividade, auto-conceito e<br />
autoconfiança; a identificação com o coletivo; e<br />
a estruturação de uma ambiência social que dê<br />
suporte e alguma segurança para a coletividade<br />
experimentar processos de mudança.<br />
A segunda ideia, incorporada mesmo<br />
em abordagens com um pensamento social bastante<br />
avança<strong>do</strong>, é a crença de que uma lúcida e<br />
penetrante consciência <strong>do</strong>s problemas leva necessariamente<br />
o sujeito a desenvolver uma ação para<br />
transformar a realidade, ou seja, leva à práxis.<br />
Inclusive, o conceito freireano de conscientização<br />
é uma síntese, uma integração entre o exercício<br />
da consciência crítica e a práxis. Isto é altamente<br />
desejável, mas não ocorre sempre junto.<br />
Ao menos na minha experiência de<br />
trabalho comunitário, tenho visto que o salto<br />
da conscientização para a práxis não é inevitável,<br />
ele não acontece sempre. E inversamente:<br />
uma pessoa ou comunidade que não se põe a<br />
transformar uma realidade problemática, mesmo<br />
ten<strong>do</strong> condições potenciais para isto, não está<br />
necessariamente alienada, inconsciente das causas<br />
<strong>do</strong>s problemas. Outros autores, com sólida<br />
formação liberta<strong>do</strong>ra e riquíssimo trabalho na<br />
área comunitária, como Valla (1996), parecem<br />
corroborar esta interpretação.<br />
Embora a conscientização não ocorra<br />
separada da ação, nem sempre uma comunidade<br />
prosseguirá em um processo de práxis. Não<br />
podemos desconsiderar que em seu cotidiano,<br />
em uma luta contínua pela sobrevivência, uma<br />
comunidade vive e exercita uma série de ações,<br />
sen<strong>do</strong> que muitas destas ações (não todas) são<br />
gera<strong>do</strong>ras de conscientização. Nós percebemos,<br />
em movimentos sociais e associações comunitárias,<br />
que um grupo pode estar consciente <strong>do</strong>s<br />
problemas e suas causas, mas concluir que naquele<br />
momento um processo de enfrentamento<br />
com os poderes instituí<strong>do</strong>s não é promissor.<br />
Mas é inegável que o conceito, em<br />
certas situações, coloca as pessoas conscientemente<br />
em contato com certas questões, e<br />
abre a possibilidade delas serem trabalhadas.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
Um exemplo típico desta abertura é o fato de<br />
muitas pessoas no Brasil, milhões de pessoas,<br />
aliás, sequer sabem que possuem certos direitos.<br />
Como lutar por algo que desconhecemos Outro<br />
exemplo importante, para quem trabalha na área<br />
social, é ajudar as pessoas de uma comunidade<br />
a conhecer certas formas de reivindicação e luta,<br />
que deram certo em outras situações semelhantes.<br />
Este conhecimento estimula a confiança <strong>do</strong><br />
grupo e a participação.<br />
Logo, este campo conceitual também<br />
é importante para os que trabalham com a relação<br />
entre educação e processos de organização<br />
popular. Contu<strong>do</strong>, creio que as aprendizagens<br />
nesta área são também afetadas pelos fatores<br />
subjetivos da relação. O trabalho educativo é<br />
muito absorvente e complexo. Ele exige um<br />
grau de comprometimento e envolvimento que<br />
é incomum em muitas outras atividades. Se os<br />
media<strong>do</strong>res não possuem uma relação afetiva<br />
forte com seu trabalho, isto dificulta uma ação<br />
educativa eficaz. 2 Ele tem, então, menos motivação<br />
para “entrar” nas questões problemáticas<br />
<strong>do</strong> trabalho educativo.<br />
Além de ser exigente e complexo, o trabalho<br />
educativo expõe muito os media<strong>do</strong>res aos<br />
seus parceiros, os educan<strong>do</strong>s: as contradições<br />
ficam muito claras. Isto é ainda mais transparente<br />
nos movimentos e projetos sociais, pois aí não<br />
existem as autoritárias regras escolares ou acadêmicas<br />
para calar os alunos, ao menos não com a<br />
mesma força e organização. Para intensificar este<br />
efeito, há ainda o fato de que as crianças e jovens<br />
são mais sensíveis aos aspectos emocionais das<br />
relações <strong>do</strong> que a maioria <strong>do</strong>s adultos.<br />
Um fator subjetivo muito grave, que<br />
normalmente nos escapa, é o fato que a relação<br />
de uma pessoa consigo mesma afeta fortemente<br />
a sua relação com outras pessoas. Isto é ainda<br />
mais grave no caso das relações que envolvem<br />
2 Afetividade aqui neste artigo é usa<strong>do</strong> não apenas como sinônimo<br />
de sentimentos, mas de acor<strong>do</strong> com seu significa<strong>do</strong> mais amplo,<br />
como utiliza<strong>do</strong> na psicologia e na filosofia. Neste caso, a dimensão<br />
afetiva inclui sentimentos e emoções, interesses, impulsos e tendências,<br />
além da vontade e <strong>do</strong>s valores da pessoa, que a dirigem<br />
voluntariamente para certos objetos e atividades, e não para outros.<br />
107
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
uma grande desigualdade de acesso ao saber<br />
elabora<strong>do</strong> e à compreensão <strong>do</strong>s mecanismos<br />
políticos de funcionamento das sociedades capitalistas.<br />
E assim são geralmente as relações entre<br />
media<strong>do</strong>res e grupos populares, secularmente<br />
excluí<strong>do</strong>s na América Latina <strong>do</strong>s instrumentos<br />
culturais necessários à esta compreensão. Media<strong>do</strong>res<br />
em conflito com sua profissão, méto<strong>do</strong><br />
de trabalho ou consigo mesmos, dificilmente<br />
deixam de expressar isto, crian<strong>do</strong> geralmente<br />
um clima socio-emocional severo, frio e distante.<br />
Esta falta de envolvimento afetivo <strong>do</strong>s<br />
media<strong>do</strong>res, contu<strong>do</strong>, produz um efeito ainda<br />
mais sutil e poderoso, com fortes reflexos na<br />
aprendizagem: ela é lida por muitos educan<strong>do</strong>s<br />
como falta de afetividade por eles, e não somente<br />
pelo trabalho, pois em alguns casos é impossível<br />
estabelecer uma distinção entre os <strong>do</strong>is<br />
fenômenos. Esta mensagem involuntária <strong>do</strong>s<br />
media<strong>do</strong>res afeta negativamente a auto-estima<br />
e o autoconceito <strong>do</strong> grupo. Para complicar ainda<br />
mais, muitas vezes esta relação fria ou autoritária<br />
com os profissionais afeta até as relações entre<br />
os educan<strong>do</strong>s, desagregan<strong>do</strong> o grupo. Este quadro<br />
complexo provoca diferentes reações <strong>do</strong>s<br />
participantes, como o desinteresse pelo assunto<br />
a aprender, o ressentimento com o media<strong>do</strong>r, a<br />
indisciplina ou mesmo a submissão.<br />
Todas estas reações são desfavoráveis<br />
à cidadania e à participação social. Contu<strong>do</strong>,<br />
é importante compreender que os educan<strong>do</strong>s<br />
não reagem assim por estratégia consciente e<br />
voluntária contra a severidade ou despreparo<br />
psicossocial <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res. É realmente difícil<br />
para o ser humano conviver em ambientes e situações<br />
“frias” ou permeadas por afetos negativos.<br />
Através de uma atitude negativa ou até mesmo<br />
tentan<strong>do</strong> bloquear o trabalho educativo, através<br />
da dispersão, os educan<strong>do</strong>s estão na verdade<br />
reagin<strong>do</strong>. Desta forma, estão tentan<strong>do</strong> restabelecer<br />
o equilíbrio interno através da recuperação<br />
da sua auto-estima, que é um mecanismo de<br />
regulação da energia vital da pessoa.<br />
Aprendizagem e desenvolvimento não<br />
são processos simples, e exigem fortes relações<br />
afetivas para serem bem sucedi<strong>do</strong>s. Isto ocorre<br />
porque a aprendizagem e a emoção são processos<br />
que não estão separa<strong>do</strong>s, mas juntos. Isto<br />
vale mesmo para os adultos. Qual de nós negará<br />
que aprende mais quan<strong>do</strong> gosta <strong>do</strong> assunto, <strong>do</strong><br />
méto<strong>do</strong>, <strong>do</strong> grupo e da pessoa que nos ensina<br />
Ou seja, quan<strong>do</strong> nos sentimos bem afetivamente<br />
e em segurança Porque seria diferente<br />
com crianças e jovens, ainda mais de minorias<br />
e grupos sociais excluí<strong>do</strong>s, que já vivem em um<br />
cotidiano severo e violento<br />
É verdade que o desafio intelectual<br />
é importante, para provocar o desequilíbrio<br />
cognitivo que nos leva a pensar e investigar.<br />
Contu<strong>do</strong>, se este estímulo se torna impositivo<br />
e desagradável, ele deixa de ser desafio e se<br />
converte em ameaça ao eu. Ter que conviver<br />
em ambiente emocional desta natureza contribui<br />
para desagregar a pessoa, e não para uma<br />
formação integral.<br />
Além disto, a falta de envolvimento<br />
afetivo produz ainda outro impacto desfavorável<br />
à aprendizagem. Se entendemos o conhecimento<br />
como resulta<strong>do</strong> de uma construção ativa por<br />
parte da pessoa, e não como cópia de conceitos<br />
externos, apresenta<strong>do</strong>s ao educan<strong>do</strong> e<br />
assimila<strong>do</strong>s passivamente por ele, isto significa<br />
que aprender é um fenômeno ativo, e não passivo.<br />
Por isto, envolve um grande engajamento<br />
<strong>do</strong> educan<strong>do</strong>, exigin<strong>do</strong> altos níveis de energia,<br />
atenção e disciplina. Os participantes não irão<br />
dedicar esta energia e nem se engajar na atividade<br />
proposta, indispensável à aprendizagem,<br />
se não estiverem genuinamente interessa<strong>do</strong>s,<br />
direcionan<strong>do</strong>-se voluntariamente para o objeto<br />
<strong>do</strong> conhecimento.<br />
Assim, o problema não é apenas o fato<br />
que o educa<strong>do</strong>r obterá melhores resulta<strong>do</strong>s na<br />
aprendizagem e no desenvolvimento de uma<br />
consciência política por parte <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s,<br />
se forem construídas relações afetivamente positivas<br />
com o grupo. A natureza deste fenômeno<br />
108<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
parece ser mais radical: a dimensão afetiva de<br />
uma prática educativa não é opcional, ela não<br />
pode ser evitada, pois é inerente a qualquer<br />
prática que seja realizada diretamente através<br />
de relações interpessoais. Os agentes envolvi<strong>do</strong>s<br />
estabelecerão algum tipo de afetividade – positiva<br />
ou negativa – para levar à frente processo tão<br />
absorvente como o educativo. O envolvimento<br />
afetivo com a prática e com os outros participantes<br />
será provavelmente negativo se não for<br />
positivo, pois é muito difícil a existência de uma<br />
afetividade neutra em atividade que demanda<br />
tanto envolvimento.<br />
Sempre se poderá argumentar que<br />
a afetividade também pode ser usada para<br />
manipular, para omitir ou para <strong>do</strong>minar. Isto é<br />
verdadeiro. Relações afetivas podem esconder<br />
o desejo de <strong>do</strong>minar, como também podem<br />
representar uma postura paternalista, que não<br />
contribui para processos de emancipação e participação<br />
da comunidade. Isto, contu<strong>do</strong>, não desqualifica<br />
o que foi afirma<strong>do</strong> acima. Apenas nos<br />
mostra que a afetividade, sozinha, não garante<br />
um trabalho social que promova a autonomia<br />
e libertação.<br />
A afetividade positiva é imprescindível<br />
ao trabalho de mediação liberta<strong>do</strong>ra, mas<br />
ela é insuficiente. Para favorecer este trabalho,<br />
relações afetivamente positivas precisam estar<br />
intrinsecamente articuladas à aprendizagem, ao<br />
exercício da consciência crítica e à mobilização<br />
para a práxis. Neste caso, estas práticas e relações<br />
envolvem uma tentativa coletiva de compreensão<br />
das estruturas políticas que, de forma direta<br />
ou mediada, interferem na vida <strong>do</strong> grupo.<br />
Há ainda um outro problema causa<strong>do</strong><br />
pelo inadequa<strong>do</strong> tratamento da afetividade na<br />
relação de mediação: o estímulo à dependência e<br />
à falta de autonomia <strong>do</strong> educan<strong>do</strong>, que em nada<br />
contribui para uma formação crítica. Dewey<br />
chama a atenção para este risco:<br />
Os educa<strong>do</strong>res – e pode-se dizer isto<br />
especialmente <strong>do</strong>s mais enérgicos e<br />
melhores – tendem a recorrer às suas<br />
principais qualidades pessoais para<br />
dirigirem o trabalho <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s, e<br />
assim, a fazerem que sua influência pessoal<br />
vá substituin<strong>do</strong> a <strong>do</strong> assunto, como<br />
estímulo para o trabalho. Com o tempo<br />
o educa<strong>do</strong>r descobre que sua própria<br />
influência pessoal mostra eficácia em<br />
casos em que é quase nulo o poder <strong>do</strong><br />
assunto para atrair a atenção; utiliza-se<br />
então da mesma até que a relação entre<br />
o educan<strong>do</strong> e o conhecimento seja substituída<br />
pela relação entre o educan<strong>do</strong> e<br />
o educa<strong>do</strong>r. Assim, a personalidade <strong>do</strong><br />
educa<strong>do</strong>r transforma-se em uma fonte<br />
de dependência e enfraquecimento<br />
da personalidade <strong>do</strong> educan<strong>do</strong>, e esta<br />
circunstância torna a este indiferente<br />
pelo conhecimento ensina<strong>do</strong>. (DEWEY,<br />
1953, p. 52).<br />
Ressalva<strong>do</strong>s estes cuida<strong>do</strong>s necessários<br />
na relação afetiva, a preparação psico-<br />
-emocional <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res só tem a acrescentar<br />
no trabalho com populações marginalizadas,<br />
geralmente com a autoestima muito comprometida.<br />
A autoestima constitui um forte exemplo<br />
das articulações entre os fatores subjetivos, a<br />
aprendizagem e o trabalho social volta<strong>do</strong> para<br />
a conquista de direitos. O poder instituí<strong>do</strong>, em<br />
uma sociedade fragmentada em classes, precisa<br />
trabalhar a subjetividade <strong>do</strong>s indivíduos para<br />
reforçar o seu <strong>do</strong>mínio neste intenso campo<br />
de batalha que é o eu. Uma das formas mais<br />
perversas e sutis de enfraquecer uma pessoa e<br />
aumentar a sua dependência em relação à autoridade<br />
é atacar a sua auto-estima, pois aí ela<br />
fica mais insegura na relação com o instituí<strong>do</strong>.<br />
Isto é bem visível nas pessoas que<br />
integram grupos sociais subordina<strong>do</strong>s. Com<br />
frequência os educa<strong>do</strong>res entram neste jogo<br />
(muitas vezes sem perceber), para conseguir se<br />
impor e manter autoridade frente ao grupo de<br />
educan<strong>do</strong>s, devi<strong>do</strong> às dificuldades <strong>do</strong> próprio ato<br />
educativo. Outra causa deste comportamento é o<br />
fato destes profissionais terem passa<strong>do</strong> por uma<br />
formação tradicional, na maioria <strong>do</strong>s casos, e ser<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
109
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
esta a sua única referência de trabalho educativo.<br />
Uma terceira causa são as pressões sociais<br />
sobre os educa<strong>do</strong>res. Contu<strong>do</strong>, isoladas, elas são<br />
incapazes de produzir um comportamento no<br />
modelo tradicional.<br />
A formação <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res é um ponto<br />
crítico para a relação entre educação e libertação.<br />
Sem viver experiências alternativas de formação,<br />
de onde os educa<strong>do</strong>res poderão extrair<br />
outros paradigmas para o trabalho educativo<br />
Isto ocorre inclusive nos projetos e movimentos<br />
sociais, isto é, na educação popular. Minha<br />
experiência nesta modalidade de educação tem<br />
mostra<strong>do</strong> que somente o trabalhar em situações<br />
alternativas (não escolares) é insuficiente para<br />
gerar práticas alternativas (não convencionais).<br />
Infelizmente parte <strong>do</strong>s projetos de trabalho social<br />
importou para dentro de suas práticas as soluções<br />
tradicionais, a não ser naqueles casos em que os<br />
profissionais tiveram acesso a referências teóricas<br />
e experiências alternativas.<br />
Os educa<strong>do</strong>res não podem dar aquilo<br />
que não tem. Ou colocan<strong>do</strong> de outra maneira,<br />
não podem proporcionar aquilo que não experimentaram<br />
antes. Isto nos mostra como é<br />
importante uma formação alternativa para os<br />
media<strong>do</strong>res, fora <strong>do</strong>s desgastantes e centraliza<strong>do</strong>s<br />
modelos da educação conserva<strong>do</strong>ra. Por to<strong>do</strong>s<br />
os argumentos coloca<strong>do</strong>s acima, tal formação<br />
precisaria colocar em destaque, entre outros<br />
elementos da formação <strong>do</strong> profissional da área<br />
social, a importância das suas habilidades relacionais,<br />
uma das capacidades que considero<br />
fundamentais para a formação <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res<br />
nas propostas liberta<strong>do</strong>ras.<br />
As relações interpessoais são a ponte<br />
para educa<strong>do</strong>res e educan<strong>do</strong>s desenvolverem<br />
os vários objetivos da formação humana, inclusive<br />
aqueles de caráter político. A natureza e a<br />
qualidade destas relações contamina tu<strong>do</strong> o que<br />
os educan<strong>do</strong>s sentem, percebem e aprendem.<br />
Se a ponte não está bem construída, a travessia<br />
se torna difícil, instável ou pouco interessante.<br />
Por melhores que sejam as intenções <strong>do</strong> projeto<br />
político desenvolvi<strong>do</strong>, elas naufragam se não<br />
estiverem baseadas em relações afetivamente positivas,<br />
ao menos na perspectiva defendida aqui.<br />
Cuidar e retrabalhar as relações das<br />
quais participamos é fundamental tanto por<br />
razões sociais como pessoais. Sociais, porque<br />
a reconstrução das relações é essencial para a<br />
instauração de novas éticas e novas políticas,<br />
favoráveis à construção de sociedades mais justas.<br />
Pessoais, porque nós vivemos mergulha<strong>do</strong>s<br />
em um oceano social. Nós estamos imersos em<br />
relações to<strong>do</strong> o tempo, em to<strong>do</strong>s os lugares. Isto<br />
está em nossa ontologia, o isolamento é uma<br />
condição desumana. Felizmente nós estamos<br />
condena<strong>do</strong>s à convivência, e dependen<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
seu caráter, esta convivência pode ser um forte<br />
fator de crescimento e felicidade. Cuidar das<br />
nossas relações é simultaneamente cuidar de<br />
nós mesmos e <strong>do</strong> outro. O reconhecimento, a<br />
afeição e a companhia <strong>do</strong>s nossos semelhantes<br />
são o maior bem da vida humana.<br />
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DEWEY, John. Como pensamos. São Paulo: Nacional,<br />
1953.<br />
DEWEY, John. Pode a Educação participar na reconstrução<br />
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FREIRE, Paulo. Pedagogia <strong>do</strong> oprimi<strong>do</strong>. Rio de Janeiro:<br />
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FREIRE, Paulo. Conscientização. Teoria e prática da libertação.<br />
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1998.<br />
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110<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOGILKA, M. A mediação na educação popular e seu impacto na subjetividade<br />
talismo. 216p. Tese (Doutora<strong>do</strong> em Educação) - FACED/<br />
UFBA, Salva<strong>do</strong>r, 2004.<br />
MOGILKA, Maurício. O que é educação democrática<br />
Contribuições para uma questão sempre atual. Curitiba:<br />
Editora da UFPR, 2003.<br />
MOGILKA, Maurício. Educação, desenvolvimento humano<br />
e cosmos. Educação e pesquisa, São Paulo, v. 31, p. 363-<br />
377, USP, dez. 2005. Disponível em: .<br />
SARTRE, Jean-Paul. O ser e o nada. Ensaio de ontologia<br />
fenomenológica. Petrópolis: Vozes, 1998.<br />
VALLA, Victor. A crise de interpretação é nossa: procuran<strong>do</strong><br />
compreender a fala das classes subalternas. Educação<br />
& Realidade, Porto Alegre, n. 21, p. 177-190, dez. 1996.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 1º de dezembro de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 14 de dezembro de 2010.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 101-111, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
111
Sistema série escola: recurso de verificação para formação<br />
continuada<br />
"Série Escola" system: verification resource for continuing education<br />
Sistema "Série Escola": recurso de verificación para formación<br />
continuada<br />
Alessandra Nichele Magro 1<br />
RESUMO<br />
A formação <strong>do</strong>cente, num viés da práxis educativa, se configura como uma política voltada à qualidade<br />
pessoal e profissional. Como consequência são evidentes as exigências de mudança comportamental <strong>do</strong><br />
<strong>do</strong>cente no atual cenário educacional. Buscou-se investigar de que maneira os da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Sistema SERIE,<br />
um programa computacional de estatísticas disponível nas escolas estaduais de Santa Catarina, podem ser<br />
utiliza<strong>do</strong>s para o planejamento de formação continuada, nas escolas da rede pública estadual de abrangência<br />
da Sétima Gerência Regional de Educação. Procurou-se entender, também, em que medida esse Sistema é<br />
utiliza<strong>do</strong> para diagnosticar as áreas de menor rendimento educacional, que, consequentemente, precisam<br />
de intervenção, utilizan<strong>do</strong> estes da<strong>do</strong>s para reflexão e aprimoramento pedagógico. A pesquisa realizada<br />
é de cunho qualitativo, ten<strong>do</strong> o questionário estrutura<strong>do</strong> como técnica da pesquisa, envolven<strong>do</strong> todas as<br />
escolas de abrangência da Sétima Gerência Regional de Educação. Constatou-se que as equipes pedagógicas<br />
das escolas utilizam, na sua maioria, os da<strong>do</strong>s estatísticos de aprendizagem para o planejamento<br />
de formação <strong>do</strong>cente, mas contradizem-se na seleção das temáticas da formação a ser proposta, uma vez<br />
que não analisam os da<strong>do</strong>s e, em grande parte, consultam aleatoriamente o interesse <strong>do</strong>s <strong>do</strong>centes. Outra<br />
variável diagnosticada é o posicionamento da equipe pedagógica que reconhece a eficácia da formação<br />
continuada quan<strong>do</strong> é realizada por área de ensino. No entanto, essa equipe realiza uma formação conjunta<br />
com to<strong>do</strong>s os profissionais da educação nas unidades escolares. Dessa forma, é possível constatar que o<br />
Sistema SERIE possibilita recursos de análise para o aumento <strong>do</strong>s índices da qualidade <strong>do</strong> ensino público<br />
estadual, mas está disperso e sem organização para seu uso adequa<strong>do</strong> e promissor.<br />
Palavras-chave: Formação Docente; Planejamento; Sistema SERIE.<br />
ABSTRACT<br />
The teaching background, in an approach of educational practice, is characterized as a policy aimed to the<br />
professional and personal quality, and as a result the requirements of teacher’s behavioral change have been<br />
clear to the educational scenery. From such suppositions, we investigated how the data from the SERIE<br />
System, a statistical computer software that is available in public schools in Santa Catarina, can be used<br />
to plan the extended education in the state public schools reaching the Seventh Regional Office of Education.<br />
We also attempted to understand how this System has been used to diagnose the environments with<br />
lower educational efficiency, and consequently which environments need intervention, using these data<br />
for a better reflection and pedagogical improvement. It is a qualitative research, which used a structured<br />
questionnaire as research technique, reaching every school from the Seventh Regional Office of Education.<br />
We observed that the pedagogical team from the schools has used, in most of the cases, the learning<br />
statistical data to plan the teachers’ education, nevertheless the selection of the education theme to be pro-<br />
1 Mestre em Educação pela <strong>Universidade</strong> <strong>do</strong> Oeste de Santa Catarina (Unoesc), aluna <strong>do</strong> Curso Especialização em Administração<br />
Pública da Unoesc. E-mail: alessandra.magro@unoesc.edu.br.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
113
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
posed is conflicting, because the data are not<br />
analyzed and most of the times the teachers’<br />
interests are examined at ran<strong>do</strong>m. Another<br />
variable diagnosed is the pedagogical team’s<br />
positioning, which recognizes the efficiency<br />
of the extended education when it is carried<br />
out in the area of teaching, therefore teachers<br />
have had joint education together with all the<br />
professionals of education in school units. This<br />
way, it is possible to evidence that the SERIE<br />
System enables analysis resources to improve<br />
the quality indexes of state public teaching,<br />
however it is dispersedly and disorganized for<br />
an adequate and flattering use.<br />
Keywords: Teaching Background; Planning;<br />
SERIE System.<br />
RESUMEN<br />
La formación <strong>do</strong>cente, en el segmento de la<br />
praxis educativa, es configurada como una<br />
política que se vuelve a la calidad personal y<br />
profesional; como consecuencia son evidentes<br />
las exigencias de mudanza de comportamiento<br />
del <strong>do</strong>cente en el actual escenario educacional.<br />
Se buscó investigar de que manera<br />
los datos del Sistema SERIE, un programa<br />
computacional de estadísticas, disponible en<br />
las escuelas estaduales de Santa Catarina,<br />
pueden ser utiliza<strong>do</strong>s para el planeamiento<br />
de formación continuada en las escuelas de<br />
red pública estadual que hacen parte de la<br />
Séptima Gerencia Regional de Educación.<br />
Se intentó entender, también, en que medida<br />
ese sistema es utiliza<strong>do</strong> para diagnosticar las<br />
áreas de menor rendimiento educacional, que,<br />
por consecuencia, necesitan de intervención,<br />
utilizan<strong>do</strong> estos datos para reflexión y mejoría<br />
pedagógica. La investigación realizada es<br />
de carácter cualitativo, con un cuestionario<br />
estructura<strong>do</strong> como técnica de investigación,<br />
envolvien<strong>do</strong> todas las escuelas que componen<br />
la Séptima Gerencia Regional de Educación.<br />
Fue constata<strong>do</strong> que los equipos pedagógicos<br />
de las escuelas utilizan, en su gran mayoría,<br />
los datos estadísticos de aprendizaje para el<br />
planeamiento de formación <strong>do</strong>cente, sin embargo<br />
son contradictorios en la selección de<br />
las temáticas de formación a ser propuesta,<br />
una vez que no analizan los datos y, en gran<br />
parte, consultan de mo<strong>do</strong> aleatorio el interés<br />
de los <strong>do</strong>centes. Otra variable diagnosticada es<br />
el posicionamiento del equipo pedagógico que<br />
reconoce la eficacia de la formación continuada<br />
cuan<strong>do</strong> es realizada por área de enseño.<br />
No obstante, ese equipo realiza una formación<br />
conjunta con to<strong>do</strong>s los profesionales de la<br />
educación en las unidades escolares. De esa<br />
manera, es posible constatar que el Sistema<br />
SERIE posibilita recursos de análisis para el<br />
crecimiento de los índices de la calidad de enseño<br />
publico estadual, pero está disperso y sin<br />
organización para su uso adecua<strong>do</strong> y promisor.<br />
Palabras-clave: Formación Docente; Planeamiento;<br />
Sistema SERIE.<br />
Introdução<br />
A educação pública brasileira apresenta<br />
o caráter democrático como uma das principais<br />
variáveis para sua qualidade. Observa-se que a<br />
democratização da escola e <strong>do</strong> ensino é propulsora<br />
da nova caracterização da escola pública no<br />
país, da<strong>do</strong>s os registros legais que norteiam toda<br />
ação pedagógica. Com essa ideia, é necessário<br />
refletir sobre o que significa na prática a democratização,<br />
como qualidade da escola pública.<br />
Para que o processo democrático seja<br />
real e valida<strong>do</strong> cotidianamente nas escolas públicas,<br />
há vieses que devem fazer parte da rotina da<br />
instituição, e, nessa perspectiva, a gestão escolar<br />
abrange o exercício de poder, incluin<strong>do</strong> os processos<br />
de planejamento, a tomada de decisões<br />
e a avaliação <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s alcança<strong>do</strong>s.<br />
Consideran<strong>do</strong>-se que o ponto de partida<br />
e de chegada da escola é a aprendizagem <strong>do</strong><br />
aluno, é imprescindível o olhar atento de como<br />
está esse processo. Para isso, as unidades escolares<br />
da rede pública estadual de Santa Catarina<br />
dispõem de recursos humanos e tecnológicos<br />
que possibilitam a leitura panorâmica e processual<br />
de como está a evolução acadêmica de cada<br />
aluno e o desempenho de cada área de ensino.<br />
Inúmeras ações podem ser desenvolvidas<br />
para a democratização da escola pública e,<br />
nesse senti<strong>do</strong>, a busca permanente <strong>do</strong> aprimoramento<br />
de ferramentas que auxiliem no acompanhamento<br />
pedagógico é uma premissa para o<br />
alcance de um eixo importante no processo educacional,<br />
a avaliação. Para tanto, todas as escolas<br />
públicas estaduais têm à disposição um programa<br />
desenvolvi<strong>do</strong> pela Secretaria de Esta<strong>do</strong> que<br />
114<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
possibilita aos profissionais da educação liga<strong>do</strong>s<br />
diretamente ao departamento pedagógico da<br />
instituição − os assistentes técnicos pedagógicos,<br />
especialistas, coordena<strong>do</strong>res pedagógicos, entre<br />
outros − uma leitura panorâmica de como está o<br />
processo ensino-aprendizagem, estatisticamente.<br />
Esse programa é denomina<strong>do</strong> Sistema SERIE e,<br />
por meio dele, é possível diagnosticar, durante<br />
o ano letivo, variáveis que possam dificultar o<br />
processo de ensino-aprendizagem. Além disso,<br />
os resulta<strong>do</strong>s possibilitam a promoção de formação<br />
continuada, eficiente, com os <strong>do</strong>centes<br />
das áreas que apresentem menor rendimento<br />
escolar, ou seja, esse sistema é uma ferramenta<br />
que possibilita verificar, acompanhar e subsidiar<br />
a intervenção na formação <strong>do</strong>s <strong>do</strong>centes das<br />
escolas da rede pública estadual, priman<strong>do</strong> pela<br />
qualidade de ensino.<br />
Os índices nacionais comprovam que<br />
a educação da rede pública estadual de Santa<br />
Catarina está acima da média nacional, conforme<br />
está publica<strong>do</strong> no site <strong>do</strong> Ideb (http://<br />
sistemasideb.inep.gov.br/resulta<strong>do</strong>), o que instiga<br />
a pesquisar como as equipes pedagógicas das<br />
escolas acompanham o processo educacional<br />
e em que medida utilizam os da<strong>do</strong>s para a proposição<br />
da formação continuada nas Unidades<br />
Escolares, bem como a busca por uma política<br />
de formação eficiente que melhore ainda mais<br />
os índices estatísticos das unidades escolares<br />
da rede pública estadual da Sétima Gerência<br />
Regional de Educação.<br />
Diante da necessidade de reconhecer<br />
como são diagnosticadas as áreas que<br />
precisam de maior planejamento, investimento<br />
e formação continuada <strong>do</strong>s profissionais,<br />
serão utiliza<strong>do</strong>s os da<strong>do</strong>s coleta<strong>do</strong>s,<br />
com o intuito de servir de base para o reconhecimento<br />
de como acontece o planejamento<br />
regional de formação <strong>do</strong>cente, ten<strong>do</strong><br />
a possibilidade de conhecer as estratégias de<br />
planejamento utilizadas até o momento pela<br />
equipe pedagógica das escolas, voltadas à<br />
formação <strong>do</strong>cente.<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, o uso de ferramentas<br />
que apresentam da<strong>do</strong>s reais e atualiza<strong>do</strong>s para<br />
a eficácia <strong>do</strong> acompanhamento pedagógico e de<br />
sua intervenção é de grande valia, o que evidencia<br />
a importância da utilização <strong>do</strong> Sistema SERIE<br />
para planejar ações pedagógicas, pois esse sistema<br />
dispõe de vários módulos, sen<strong>do</strong> considera<strong>do</strong><br />
por seus usuários um sistema acadêmico<br />
e de gestão. Acadêmico porque engloba to<strong>do</strong>s<br />
os da<strong>do</strong>s referentes aos discentes. De gestão<br />
porque contém todas as informações necessárias<br />
<strong>do</strong>s servi<strong>do</strong>res públicos estaduais, com subsídios<br />
reais e concretos, que servem como ferramenta<br />
para os gestores da setorial da educação pública<br />
estadual. Esse sistema está instala<strong>do</strong> em todas<br />
as Unidades Escolares Estaduais e é diariamente<br />
atualiza<strong>do</strong> pelas próprias escolas, sen<strong>do</strong> delas<br />
a inteira responsabilidade pela veracidade das<br />
informações, bem como os resulta<strong>do</strong>s advin<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s inseri<strong>do</strong>s no programa.<br />
Nesse viés de análise, a democratização<br />
da escola e <strong>do</strong> ensino configurar-se-á nos<br />
momentos de verificação <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s com<br />
análise, estu<strong>do</strong> e proposições coletivas para a<br />
qualidade <strong>do</strong> ensino na escola pública estadual.<br />
Aportan<strong>do</strong> o levantamento de como se tem<br />
planeja<strong>do</strong> a formação <strong>do</strong>cente nas escolas, a<br />
Gerência Regional de Educação poderá propor<br />
e dinamizar a utilização de critérios para a<br />
execução de formação continuada, de mo<strong>do</strong><br />
que sejam eficientes no uso de recursos para<br />
a capacitação <strong>do</strong>cente das unidades escolares<br />
estaduais de abrangência da Sétima Gered.<br />
No entanto, procurou-se entender<br />
como o Sistema SERIE está sen<strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong> pelas<br />
escolas para gerar conhecimento e informações<br />
de planejamento para a capacitação <strong>do</strong>cente e<br />
qual é a utilização da equipe pedagógica das<br />
escolas envolvidas nesse sistema. Para responder<br />
ao objetivo <strong>do</strong> trabalho, foi desenvolvida uma<br />
pesquisa qualitativa descritiva, utilizan<strong>do</strong>-se um<br />
questionário estrutura<strong>do</strong> para coleta de da<strong>do</strong>s.<br />
Optou-se pela pesquisa qualitativa, uma vez<br />
que essa abordagem oferece base para a com-<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
115
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
preensão e interpretação <strong>do</strong>s processos sociais<br />
subjacentes à administração (GEPHART, 1999).<br />
Entende-se que esta pesquisa se enquadra<br />
na abordagem qualitativa, pois as respostas<br />
<strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s, apesar de serem agrupadas e<br />
tabuladas objetivamente, resguardam um eleva<strong>do</strong><br />
grau de subjetividade. Além disso, entende-se<br />
que, conforme sugere Minayo (1995), a pesquisa<br />
qualitativa trabalha com um universo de significa<strong>do</strong>s,<br />
motivos, aspirações, crenças e percepções<br />
<strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s, como é o caso deste estu<strong>do</strong>.<br />
O universo da pesquisa foi constituí<strong>do</strong><br />
pelas trinta e duas escolas estaduais de abrangência<br />
da Sétima Gerência Regional de Educação<br />
de Joaçaba. O questionário foi aplica<strong>do</strong> entre<br />
maio e junho de 2010, e apenas vinte escolas<br />
o devolveram.<br />
O processo de análise e interpretação<br />
<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s foi referencia<strong>do</strong> nas teorias vigentes<br />
relacionadas ao tema de pesquisa, bem como<br />
nas inferências das pesquisa<strong>do</strong>ras a partir <strong>do</strong>s<br />
da<strong>do</strong>s coleta<strong>do</strong>s, utilizan<strong>do</strong> procedimentos interpretativos.<br />
O presente artigo está estrutura<strong>do</strong> nesta<br />
introdução, uma revisão bibliográfica, que versará<br />
sobre o espaço educativo, a avaliação e a<br />
prática <strong>do</strong>cente reflexiva, uma análise <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s<br />
e as considerações finais.<br />
A escola como espaço organiza<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
trabalho educativo<br />
116<br />
As mudanças vividas na atualidade,<br />
processadas desde a década de 1980 em âmbito<br />
mundial, como eleições diretas, democracia, gestão<br />
participativa, entre outras, desenvolveram-se<br />
e indicaram novos paradigmas de administração,<br />
o que repercutiu na gestão educacional. Não<br />
alheias à sociedade, essas e outras temáticas<br />
passaram a complementar a formação continuada<br />
<strong>do</strong>s <strong>do</strong>centes e a reconfigurar o contexto<br />
educacional. É pertinente que temáticas discutidas<br />
mundialmente sejam incluídas nos debates<br />
educacionais, trazen<strong>do</strong> para dentro da escola a<br />
inquietação de toda a sociedade.<br />
A gestão escolar, bem como a escola<br />
como um to<strong>do</strong>, tem seus fins historicamente e<br />
socialmente diversifica<strong>do</strong>s; contu<strong>do</strong>, na tentativa<br />
de nos aproximar de uma definição de escola<br />
atual, os aspectos que devemos abordar em<br />
relação à educação são referentes às relações<br />
sociais, políticas e econômicas que são estabelecidas<br />
em um determina<strong>do</strong> contexto. Isso porque<br />
a sociedade como um to<strong>do</strong> está mudan<strong>do</strong> seu<br />
mo<strong>do</strong> organizacional, que interfere diretamente<br />
no percurso <strong>do</strong> desenvolvimento da educação,<br />
já que envolve todas as esferas. Ter a intenção<br />
de definir a finalidade pura da escola e tratar<br />
dela não é possível porque somos impedi<strong>do</strong>s<br />
pelas inúmeras visões e concepções acerca da<br />
responsabilidade e abrangência dessa instituição.<br />
Segun<strong>do</strong> Tardif:<br />
Os fins da escola atual não são “claros”<br />
e “evidentes”, quer dizer, da<strong>do</strong>s de<br />
uma vez por todas, mas que se trata,<br />
ao contrário, de verdadeiros problemas<br />
hermenêuticos que abrem espaço, por<br />
exemplo, a reforma escolar, a grandes<br />
debates ideológicos e políticos. Não<br />
há nada de surpreendente nisso, pois<br />
a escola é uma organização social tão<br />
importante que é normal que esteja<br />
no centro de um “conflito de interpretações”:<br />
ela não é lugar de maior poder<br />
para o controle e desenvolvimento da<br />
sociedade Desse ponto de vista, vê-se<br />
que o caráter “aberto” e “variável” <strong>do</strong>s<br />
fins da escola não tem nada de acidental,<br />
mas, ao contrário, trata-se de uma<br />
característica intrínseca a esse tipo de<br />
organização presta<strong>do</strong>ra de serviços a<br />
seres humanos em função de valores e<br />
finalidades sociopolíticas (TARDIF, 2005,<br />
p. 199, grifos <strong>do</strong> autor).<br />
Estruturalmente, a escola, como instituição<br />
organizada <strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong>cente, prevê<br />
resulta<strong>do</strong>s da ação educativa por meio <strong>do</strong><br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
processo de ensino-aprendizagem integra<strong>do</strong>,<br />
articulan<strong>do</strong> aspectos intelectuais, emocionais<br />
e práticos. Para isso, desenvolve seu trabalho<br />
com peculiaridades que são restritas a essa instituição,<br />
que busca organizar seu espaço e sua<br />
mediação pedagógica por meio de programas,<br />
áreas de ensino, meto<strong>do</strong>logias, recursos tecnológicos,<br />
entre outros, utiliza<strong>do</strong>s por seus agentes<br />
almejan<strong>do</strong> fins. Bidwell se inspira na teoria das<br />
organizações:<br />
O objetivo geral das escolas é a socialização<br />
técnica e moral <strong>do</strong>s jovens. Elas<br />
visam a preparar os jovens para a vida<br />
adulta, forman<strong>do</strong>-os para os saberes e<br />
as habilidades necessárias à vida profissional,<br />
educan<strong>do</strong>-os moralmente em<br />
função das orientações básicas <strong>do</strong> status<br />
de adultos. Em suma, são organizações<br />
orientadas a uma dupla missão: educar<br />
e instruir, socializar e formar (BIDWELL,<br />
1965 apud TARDIF, 2005, p. 198, grifo<br />
<strong>do</strong> autor).<br />
No entanto, o novo modelo de organização<br />
educativo aponta para a coparticipação<br />
e responsabilidade de to<strong>do</strong>s os segmentos da<br />
comunidade organizacional para o sucesso<br />
educativo. Parafrasean<strong>do</strong> Moran (2000), educar<br />
é envolver-se num processo preven<strong>do</strong> o alcance<br />
daquilo que esperamos de cada criança no fim<br />
de cada etapa, o que, muitas vezes, é imprevisível,<br />
pois alguns resulta<strong>do</strong>s da educação têm<br />
sua aplicabilidade a longo prazo. Diante disso,<br />
há uma grande preocupação com a educação<br />
de qualidade, para que os resulta<strong>do</strong>s, independentemente<br />
<strong>do</strong> tempo, sejam positivos. O autor<br />
aponta os desafios de ensinar e educar com qualidade<br />
e, na sua concepção, ensino e educação<br />
são conceitos diferentes:<br />
No ensino organiza-se uma série de<br />
atividades didáticas para ajudar os<br />
alunos a compreender áreas específicas<br />
<strong>do</strong> conhecimento. [...] Na educação<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
o foco, além de ensinar, é ajudar a<br />
integrar ensino e vida, conhecimento e<br />
ética, reflexão e ação, a ter uma visão<br />
de totalidade. Educar é ajudar a integrar<br />
todas as dimensões da vida, a encontrar<br />
nosso caminho intelectual, emocional,<br />
profissional, que nos realize e que contribua<br />
para modificar a sociedade que<br />
temos. Educar é [...] ajudar os alunos<br />
na construção da sua identidade, <strong>do</strong> seu<br />
caminho pessoal e profissional – <strong>do</strong> seu<br />
projeto de vida, no desenvolvimento das<br />
habilidades de compreensão, emoção<br />
e comunicação que lhes permitam encontrar<br />
seus espaços pessoais, sociais e<br />
profissionais e tornar-se cidadãos realiza<strong>do</strong>s<br />
e produtivos. Educamos de verdade<br />
quan<strong>do</strong> aprendemos com cada coisa [...]<br />
(MORAN, 2000, p. 12-13).<br />
Acredita-se que to<strong>do</strong>s são responsáveis<br />
por uma educação de qualidade, e que o<br />
professor fará, com ajuda <strong>do</strong>s demais, com que<br />
sua mediação torne o caminho da construção <strong>do</strong><br />
conhecimento mais significativo, selecionan<strong>do</strong><br />
as informações mais relevantes, para torná-las<br />
compreensíveis de maneira que possam reverter<br />
informação em conhecimento aplica<strong>do</strong> e útil.<br />
O educa<strong>do</strong>r torna-se, assim, canal de acesso<br />
<strong>do</strong> processo de interação <strong>do</strong> aluno com fatores<br />
externos e internos.<br />
O conhecimento se dá fundamentalmente<br />
no processo de interação, de<br />
comunicação. A informação é o primeiro<br />
passo para conhecer. [...] Conseguimos<br />
compreender melhor o mun<strong>do</strong> e os outros<br />
equilibran<strong>do</strong> os processos de interação<br />
e de interiorização. Pela interação<br />
entramos em contato com tu<strong>do</strong> o que<br />
nos rodeia. [...] Mas a compreensão só<br />
se completa com a interiorização, com o<br />
processo de síntese pessoal, de reelaboração<br />
de tu<strong>do</strong> o que captamos por meio<br />
da interação (MORAN, 2000, p. 25).<br />
Conclui-se, portanto, que os educa<strong>do</strong>res,<br />
na busca constante dessa interação/interio-<br />
117
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
rização, vislumbram na prática <strong>do</strong>cente também<br />
a responsabilidade de educar para a cidadania,<br />
para que os alunos sejam capazes de construir<br />
a própria realização, tornan<strong>do</strong>-os competentes<br />
para conquistar, a partir de seus esforços, melhorias<br />
pessoais e coletivas.<br />
Avaliação: um princípio da gestão democrática<br />
A educação escolar, numa perspectiva<br />
de gestão democrática, tem características e<br />
exigências próprias. Para efetivá-la é necessário<br />
compreender como conduzir os procedimentos<br />
que promovam o envolvimento, o comprometimento<br />
e a participação das pessoas, expandin<strong>do</strong><br />
para a divisão de responsabilidades, exercen<strong>do</strong><br />
na escola a cidadania.<br />
Para tanto, é necessário superar as formas<br />
conserva<strong>do</strong>ras de organização e de gestão.<br />
Parafrasean<strong>do</strong> Libâneo (2004), a perspectiva da<br />
principal função social e pedagógica da escola<br />
é assegurar o desenvolvimento das capacidades<br />
cognitivas, operativas, sociais e morais <strong>do</strong><br />
aluno a partir da dinamização <strong>do</strong> currículo, no<br />
desenvolvimento <strong>do</strong>s processos <strong>do</strong> pensar, na<br />
formação da cidadania participativa e na formação<br />
ética.<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, Libâneo (2004) apresenta<br />
alguns princípios da organização e gestão<br />
escolar democrático-participativa que devem ser<br />
relembra<strong>do</strong>s:<br />
1. Autonomia das escolas e da comunidade<br />
educativa.<br />
2. Relação orgânica entre a direção e a participação<br />
<strong>do</strong>s membros da equipe escolar.<br />
3. Envolvimento da comunidade no processo<br />
escolar.<br />
4. Planejamento das tarefas.<br />
5. Formação continuada para o desenvolvimento<br />
pessoal e profissional <strong>do</strong>s integrantes da<br />
comunidade escolar.<br />
118<br />
6. Utilização de informações concretas e análise<br />
de cada problema em seus múltiplos aspectos,<br />
com ampla democratização das informações.<br />
7. Relações humanas produtivas e criativas assentadas<br />
na busca de objetivos comuns.<br />
8. Avaliação compartilhada.<br />
Com foco na reflexão no princípio da<br />
gestão democrática, que se volta à avaliação<br />
compartilhada, todas as decisões e procedimentos<br />
organizativos precisam ser acompanha<strong>do</strong>s<br />
e avalia<strong>do</strong>s com base no princípio da relação<br />
orgânica entre a direção e a participação <strong>do</strong>s<br />
membros da equipe escolar. Ressalta-se que a<br />
ação de organização <strong>do</strong> trabalho na escola deverá<br />
voltar-se para as ações pedagógico-didáticas,<br />
em função <strong>do</strong>s objetivos da escola, num senti<strong>do</strong><br />
de entrosamento das ações administrativas e<br />
pedagógicas (LIBÂNEO, 2004, p. 146).<br />
Percepção <strong>do</strong> ato de avaliar<br />
A avaliação processual escolar não<br />
deve assumir uma função disciplina<strong>do</strong>ra nem<br />
ter como objetivo menosprezar seus envolvi<strong>do</strong>s.<br />
Entretanto, não se pode fugir <strong>do</strong> fato de que é<br />
sempre um juízo de valor sobre um fenômeno<br />
ocorri<strong>do</strong> no processo de aprendizagem, juízo este<br />
que pode se referir a um aluno, a uma turma<br />
específica, a uma série ou até ao conjunto <strong>do</strong>s<br />
alunos de uma instituição escolar. Assim, a avaliação<br />
conduz a um juízo de valor, mas também é<br />
um meio para a obtenção de da<strong>do</strong>s que orientem<br />
a tomada de decisões, ten<strong>do</strong> como pressuposto<br />
final o diagnóstico da aprendizagem. Nesse<br />
senti<strong>do</strong>, a avaliação possibilita a apreciação da<br />
aprendizagem <strong>do</strong> aluno e remete à análise das<br />
estratégias utilizadas pelo <strong>do</strong>cente para atingir<br />
os objetivos propostos. O resulta<strong>do</strong> da avaliação<br />
pode, portanto, levar a uma revisão das estratégias<br />
<strong>do</strong>centes e, no limite, pode levar a uma<br />
revisão <strong>do</strong>s próprios objetivos da ação <strong>do</strong>cente.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
A avaliação é um termo geral que diz respeito<br />
a um conjunto de ações voltadas<br />
para o estu<strong>do</strong> sistemático de um fenômeno,<br />
uma situação, um processo, um<br />
evento, uma pessoa, visan<strong>do</strong> a emitir um<br />
juízo valorativo. Considera-se, em geral,<br />
que os processos de avaliação implicam<br />
a coleta de da<strong>do</strong>s (de informação), a<br />
análise e uma apreciação (juízo) valorativa<br />
com base em critérios prévios,<br />
ten<strong>do</strong> em vista a tomada de decisões<br />
para novas ações. [...] A avaliação supõe<br />
uma coleta de da<strong>do</strong>s e informações,<br />
por meio de diferentes instrumentos de<br />
verificação, para saber se os objetivos<br />
previstos estão sen<strong>do</strong> atingi<strong>do</strong>s (HADJI,<br />
2001, p. 21).<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, a avaliação deve ir muito<br />
além da verificação de da<strong>do</strong>s, mas se completar<br />
com a reflexão sobre os da<strong>do</strong>s empíricos obti<strong>do</strong>s<br />
com a verificação; em suma, trata-se de<br />
interpretá-los. Só assim a avaliação pode diagnosticar<br />
e, dessa forma, identificar as razões <strong>do</strong>s<br />
erros, acertos e buscar diretrizes para o alcance<br />
de resulta<strong>do</strong>s positivos.<br />
Dessa forma, ela não deve ser vista<br />
como um controle, mas como uma possibilidade<br />
de auxiliar os alunos a construir aprendizagens e<br />
de propor aos <strong>do</strong>centes a reflexão da práxis educativa,<br />
ou seja, a avaliação, nesse senti<strong>do</strong>, é de<br />
caráter formativo. Segun<strong>do</strong> Hadji (2001), há um<br />
critério que permite designar <strong>do</strong> exterior quan<strong>do</strong><br />
uma avaliação é formativa: é aquele <strong>do</strong> lugar<br />
da avaliação em relação à ação de formação.<br />
Quan<strong>do</strong> a avaliação precede a ação, fala-se da<br />
avaliação prognóstica ou diagnóstica, e quan<strong>do</strong><br />
a avaliação ocorre depois da ação, fala-se da<br />
avaliação cumulativa, que faz um balanço final.<br />
De acor<strong>do</strong> com esse mesmo autor:<br />
Quan<strong>do</strong> a avaliação situa-se no centro<br />
da ação, temos a avaliação formativa,<br />
porque “sua função principal é contribuir<br />
para uma boa regulação da atividade de<br />
ensino. Trata-se de levantar informações<br />
úteis à regulação <strong>do</strong> processo de ensinoaprendizagem.<br />
[...] uma avaliação<br />
formativa informa os <strong>do</strong>is principais<br />
atores <strong>do</strong> processo. O professor, que<br />
será informa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s efeitos reais de seu<br />
trabalho pedagógico, poderá regular sua<br />
ação a partir disso. O aluno, que não<br />
somente saberá onde anda, mas poderá<br />
tomar consciência das dificuldades que<br />
encontra e tornar-se-á capaz, na melhor<br />
das hipóteses, de reconhecer e corrigir<br />
ele próprio seus erros.” (HADJI, 2001,<br />
p. 19-20).<br />
Perrenoud (1999), referin<strong>do</strong>-se à avaliação<br />
formativa, retrata a interferência desta no<br />
processo da aprendizagem. Segun<strong>do</strong> ele:<br />
A avaliação formativa apresenta-se, então,<br />
antes de mais nada, sob a forma de<br />
uma regulação interativa, isto é, de uma<br />
observação e de uma intervenção em<br />
tempo real, praticamente indissociáveis<br />
das interações didáticas propriamente<br />
ditas (PERRENOUD, 1999, p. 123).<br />
Nessa perspectiva, a intervenção<br />
pedagógica que será proposta e refletida conjuntamente<br />
com a equipe pedagógica/<strong>do</strong>cente<br />
propõe a busca pelo alcance <strong>do</strong>s objetivos básicos<br />
da escola. Diante disso, a visão <strong>do</strong> processo<br />
de acompanhamento pedagógico por meio <strong>do</strong><br />
Sistema SERIE deverá voltar-se aos benefícios<br />
de que o programa dispõe na leitura de como<br />
está o processo de aprendizagem, justamente<br />
para, em tempo real, valer-se de indica<strong>do</strong>res que<br />
demonstrem onde é necessário intervir e refletir<br />
nas possíveis falhas existentes no processo educacional.<br />
Com esse comportamento, estar-se-á<br />
realizan<strong>do</strong> na escola um <strong>do</strong>s princípios da gestão<br />
democrático-participativa: o envolvimento <strong>do</strong>s<br />
profissionais da educação na verificação, análise<br />
e proposições de melhoria da educação.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
119
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
Prática <strong>do</strong>cente e reflexão, ações interligadas<br />
Propor a reflexão para profissionais<br />
da educação parece um tanto ambíguo, pois se<br />
trata se um ato indissociável da efetiva prática a<br />
que se propôs como profissional. Considera-se<br />
que to<strong>do</strong>s pensam e planejam ações rotineiras e<br />
habituais; no entanto, refletir sobre a costumeira<br />
ação, que por vezes é planejada, torna-se uma<br />
tarefa que exige desprendimento e aceitação em<br />
avaliar a maneira como são conduzidas suas<br />
ações diárias.<br />
Perrenoud (2002) propõe a noção de<br />
prática reflexiva remeten<strong>do</strong> a <strong>do</strong>is processos<br />
mentais que devem ser distingui<strong>do</strong>s, consideran<strong>do</strong><br />
seus vínculos. Trata-se de refletir para agir e<br />
refletir sobre a ação:<br />
Não há ação complexa sem reflexão durante<br />
o processo; a prática reflexiva pode<br />
ser entendida, no senti<strong>do</strong> mais comum<br />
da palavra, como reflexão acerca da situação,<br />
<strong>do</strong>s objetivos, <strong>do</strong>s meios, <strong>do</strong> lugar,<br />
[...] Refletir durante a ação consiste em<br />
se perguntar o que está acontecen<strong>do</strong><br />
ou o que vai acontecer, o que podemos<br />
fazer, o que devemos fazer, qual melhor<br />
tática, [...] Refletir sobre a ação já é algo<br />
bem diferente. Nesse caso, tomamos<br />
nossa própria ação como objeto de<br />
reflexão, seja para compará-la com um<br />
modelo prescritivo, que poderíamos ou<br />
deveríamos ter feito, o que outro profissional<br />
teria feito, seja para explicá-la ou<br />
criticá-la (PERRENOUD, 2002, p. 30,<br />
grifos <strong>do</strong> autor).<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, refletir sobre a ação requer<br />
desejo para isso, pois acontece no momento<br />
da transição ou a posteriori, enquanto alterar<br />
o que já havia si<strong>do</strong> proposto no planejamento<br />
é uma decisão que exigirá remanejamento de<br />
ações e posturas, em síntese, é mais trabalhoso<br />
e nem to<strong>do</strong>s estão dispostos a isso. Contu<strong>do</strong>, é<br />
nato da profissionalização de educa<strong>do</strong>r rever,<br />
replanejar e, principalmente, refletir sobre a ação<br />
para o alcance de suas proposições.<br />
Em contraponto, alerta que “a postura<br />
e as competências reflexivas não garantem nada;<br />
contu<strong>do</strong>, ajudam a analisar os dilemas, a construir<br />
escolhas e a assumi-las.” (PERRENOUD,<br />
2002, p. 56). Mais além, este autor afirma que<br />
ela promove a possibilidade de perceber como<br />
podem ser melhoradas as atitudes, principalmente<br />
no que se refere às relações interpessoais.<br />
Analisan<strong>do</strong> o perfil de educa<strong>do</strong>res idealiza<strong>do</strong><br />
como proposta de ação, obtém-se como<br />
ideário o profissional crítico reflexivo, que, na<br />
conceituação de Libâneo (2004), é aquele que<br />
“<strong>do</strong>mina uma prática-reflexiva”. No entanto,<br />
quan<strong>do</strong> se estuda sobre educação, suas possibilidades<br />
e limitações, tem-se por hábito visualizar<br />
a escola como espaço único de organização <strong>do</strong><br />
conhecimento, mais especificamente a sala de<br />
aula e, diretamente, os professores.<br />
Assmann (2001) apresenta treze colocações<br />
sobre a qualidade cognitiva e social da<br />
educação, destacan<strong>do</strong>-se, neste artigo, a décima<br />
colocação deste autor:<br />
É preciso substituir a pedagogia das<br />
certezas e <strong>do</strong>s saberes pré-fixa<strong>do</strong>s por<br />
uma pedagogia da pergunta, <strong>do</strong> melhoramento<br />
das perguntas e <strong>do</strong> acessamento<br />
de informações. Em suma, por uma<br />
pedagogia da complexidade, que saiba<br />
trabalhar com conceitos transversáteis,<br />
abertos para a surpresa e o imprevisto<br />
(ASSMANN, 2001, p. 30).<br />
É necessária abertura <strong>do</strong>s processos<br />
vivos para a incerteza, questionar e questionar-<br />
-se sempre em todas as ações. Ainda segun<strong>do</strong><br />
esse mesmo autor, “[...] parece recomendável<br />
uma pedagogia plástica e sinuosa que incentive<br />
certezas operacionais imprescindíveis, capacite<br />
para modelizações da realidade.” (ASSMANN,<br />
2001, p. 32).<br />
120<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, é imprescindível a<br />
vitalização <strong>do</strong> trabalho educativo que apoia e<br />
acompanha as ações educacionais nas instituições<br />
de ensino, partin<strong>do</strong> da ação reflexiva da<br />
maneira como aprimorar ainda mais o trabalho<br />
técnico-burocrático, que é essencial na eficiência<br />
educativa.<br />
Coleta e análise <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s: a percepção<br />
pedagógica das escolas estaduais pertencentes<br />
à Sétima Gerência Regional<br />
de Educação<br />
Buscan<strong>do</strong> conhecer a percepção <strong>do</strong>s<br />
envolvi<strong>do</strong>s no processo ensino-aprendizagem<br />
das escolas públicas estaduais, referente à formação<br />
<strong>do</strong>cente, foram convida<strong>do</strong>s para participar<br />
da pesquisa os assistentes técnicos pedagógicos<br />
das escolas públicas estaduais pertencentes à<br />
Sétima Regional de Educação, representan<strong>do</strong><br />
a equipe pedagógica de cada unidade escolar,<br />
que conta com 32 instituições de ensino regular.<br />
A coleta de da<strong>do</strong>s, em diferentes<br />
unidades escolares, teve por objetivo alcançar<br />
uma amostra que contemplasse a realidade<br />
educacional da Sétima Gerência Regional de<br />
Educação de Joaçaba, não haven<strong>do</strong> o propósito<br />
de estabelecer diferenças ou semelhanças na<br />
caracterização dessas instituições.<br />
As respostas foram analisadas com<br />
foco nos objetivos, decorrentes <strong>do</strong> agrupamento<br />
de questões, com 20 escolas, que representam<br />
62,5% <strong>do</strong> total das escolas convidadas a participar<br />
<strong>do</strong> estu<strong>do</strong>.<br />
Para a análise da utilização de da<strong>do</strong>s<br />
estatísticos para “planejamento de formação<br />
continuada”, foram consideradas as respostas<br />
<strong>do</strong> questionamento feito a assistentes técnicos<br />
pedagógicos acerca <strong>do</strong> que consideram como<br />
cursos eficazes. Verificou-se nas respostas que,<br />
para 90% <strong>do</strong> total participantes, a formação<br />
continuada é mais eficaz quan<strong>do</strong> é realizada<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
por área <strong>do</strong> conhecimento. Esse da<strong>do</strong> revela a<br />
importância demonstrada pelos profissionais da<br />
educação da área pedagógica em conhecer quais<br />
são as áreas de conhecimento mais defasadas<br />
na unidade escolar para o planejamento e a<br />
intervenção pedagógica por meio de formação<br />
<strong>do</strong>cente.<br />
Contu<strong>do</strong>, para a seleção das temáticas<br />
para os cursos de formação continuada, os profissionais<br />
que integram a equipe pedagógica, em<br />
sua maioria (44,8%), consultam aleatoriamente<br />
o interesse <strong>do</strong>s professores em realizar cursos de<br />
formação, enquanto 27,5% têm como base os<br />
da<strong>do</strong>s estatísticos para elaborar planos de formação;<br />
em 24,1% <strong>do</strong>s casos, a equipe pedagógica<br />
decide com base na percepção geral que curso<br />
irá propor; e 3,4% informaram que a temática<br />
<strong>do</strong>s cursos é selecionada de outro mo<strong>do</strong>, sem<br />
especificar qual é a maneira.<br />
Em resposta à “reflexão pedagógica”,<br />
55% <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s afirmam que o que foi<br />
apreendi<strong>do</strong> na formação <strong>do</strong>cente é algumas<br />
vezes aplica<strong>do</strong>, enquanto para 45%, os novos<br />
conhecimentos são sempre aplica<strong>do</strong>s no âmbito<br />
escolar. A percepção da aplicabilidade <strong>do</strong> que se<br />
aprendeu em cursos é diagnosticada pela equipe<br />
pedagógica em 34,4% <strong>do</strong>s casos nos conselhos<br />
de classe, em 31,2% a partir de acompanhamento<br />
pedagógico durante a realização de atividades<br />
cotidianas, em 25% por meio de análise<br />
de da<strong>do</strong>s e em 9,3% de mo<strong>do</strong> informal. Assim,<br />
entenden<strong>do</strong>-se que a melhoria da qualidade da<br />
educação básica depende substancialmente da<br />
formação <strong>do</strong>s professores e <strong>do</strong> acompanhamento<br />
pedagógico das atividades curriculares, os<br />
da<strong>do</strong>s revelam que as equipes pedagógicas das<br />
escolas estão no caminho certo no acompanhamento<br />
<strong>do</strong> processo ensino-aprendizagem, pois<br />
a prática pedagógica deve estar alicerçada em<br />
bases teórico-práticas, num viés de reflexão permanente<br />
da práxis educativa, conforme sugere<br />
Libâneo (2004).<br />
Os assistentes técnicos pedagógicos<br />
revelaram que 50% <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s identificam<br />
121
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
a melhoria e diversidade das práticas utilizadas<br />
pelos professores após a participação <strong>do</strong>s cursos<br />
por meio de diferentes técnicas utilizadas, enquanto<br />
34,6% percebem no resulta<strong>do</strong> positivo <strong>do</strong><br />
desempenho <strong>do</strong>s alunos e 15,3% nas avaliações<br />
mais bem elaboradas por esses professores. Além<br />
de a prática pedagógica ser critério de averiguação<br />
posterior aos cursos, 75% <strong>do</strong>s assistentes<br />
técnicos pedagógicos afirmam que a unidade<br />
escolar disponibiliza espaço para compartilhar as<br />
novas aprendizagens com os demais professores<br />
nas reuniões pedagógicas organizadas conforme<br />
calendário escolar, enquanto 15% asseguram<br />
que esse espaço é ofereci<strong>do</strong> somente algumas<br />
vezes.<br />
Referin<strong>do</strong>-se aos “benefícios <strong>do</strong> Sistema<br />
SERIE” para planejamento, aplicação e melhoria<br />
na qualidade <strong>do</strong> ensino-aprendizagem por meio<br />
<strong>do</strong>s cursos de formação <strong>do</strong>cente, identificou-se<br />
que, <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s, 60% afirmam que utilizam<br />
os da<strong>do</strong>s estatísticos <strong>do</strong> Sistema SERIE para<br />
propor formação <strong>do</strong>cente, enquanto 40% não<br />
utilizam esse instrumento para a proposição de<br />
estu<strong>do</strong>s. Contu<strong>do</strong>, 80% asseguram que utilizam<br />
os da<strong>do</strong>s para reuniões pedagógicas, enquanto<br />
20% não utilizam os da<strong>do</strong>s estatísticos para a<br />
reflexão e análise pedagógica nesses encontros.<br />
Em contrapartida, 90% afirmam que os da<strong>do</strong>s<br />
extraí<strong>do</strong>s com maior frequência <strong>do</strong> Sistema<br />
SERIE são as notas <strong>do</strong>s alunos, enquanto 10%<br />
utilizam o sistema para outros fins. Dessa forma,<br />
pode-se averiguar que os da<strong>do</strong>s disponíveis são<br />
conheci<strong>do</strong>s e emprega<strong>do</strong>s, mas poderiam ser<br />
mais bem utiliza<strong>do</strong>s e, consequentemente, teriam<br />
melhores resulta<strong>do</strong>s, uma vez que as funções<br />
pedagógicas respondem pela viabilização <strong>do</strong> trabalho<br />
pedagógico-didático e por sua integração<br />
e articulação com os professores em função da<br />
qualidade de ensino.<br />
Em síntese, é de competência da equipe<br />
gestora e pedagógica acompanhar, organizar<br />
e coordenar as atividades <strong>do</strong> planejamento e <strong>do</strong><br />
Projeto Político Pedagógico, propon<strong>do</strong> e supervisionan<strong>do</strong><br />
a elaboração de diagnósticos para<br />
o projeto da escola; orientan<strong>do</strong> a organização<br />
curricular e o desenvolvimento <strong>do</strong> currículo;<br />
estimulan<strong>do</strong> a realização de projetos conjuntos<br />
entre os professores; diagnostican<strong>do</strong> problemas<br />
de ensino e aprendizagem; estimulan<strong>do</strong> a a<strong>do</strong>ção<br />
de medidas pedagógicas preventivas, a adequação<br />
de conteú<strong>do</strong>s, meto<strong>do</strong>logias e práticas<br />
avaliativas; oferecen<strong>do</strong> assistência pedagógica<br />
sistematizada aos professores; desenvolven<strong>do</strong><br />
ações de formação continuada; e realizan<strong>do</strong> as<br />
ações com base em da<strong>do</strong>s com a segurança de<br />
que o foco e a necessidade real de intervenção<br />
pedagógica não será infrutuosa.<br />
Destarte, o estu<strong>do</strong> revela que as escolas<br />
públicas estaduais de abrangência da Sétima<br />
Gered, em sua maioria, empregam os da<strong>do</strong>s<br />
disponíveis no Sistema SERIE e que esse sistema<br />
apresenta variáveis importantes para que<br />
a equipe pedagógica dessa gerência planeje a<br />
formação <strong>do</strong>cente, envolven<strong>do</strong> os professores<br />
que a compõem. Contu<strong>do</strong>, a mudança e a melhoria<br />
da práxis educativa envolvem diretamente<br />
o querer pessoal de cada profissional que deseja<br />
resulta<strong>do</strong>s significativos na prática <strong>do</strong>cente.<br />
Considerações finais<br />
Percebeu-se que as equipes pedagógicas<br />
das escolas envolvidas no estu<strong>do</strong> reconhecem<br />
a importância <strong>do</strong> uso de da<strong>do</strong>s para o planejamento<br />
<strong>do</strong>cente e a facilidade proporcionada<br />
pelo Sistema SERIE, contu<strong>do</strong>, para a seleção<br />
das temáticas a serem estudadas, os critérios são<br />
vagos e incoerentes com o posicionamento <strong>do</strong><br />
que julgam eficiente para a formação <strong>do</strong>cente.<br />
Outra variável significativa diagnosticada<br />
é a percepção da aplicabilidade e mudança<br />
de postura didática após a formação <strong>do</strong>cente.<br />
Ao tempo em que se nota a melhoria didática,<br />
não há instrumento para o registro de tais mudanças,<br />
fican<strong>do</strong> à mercê da “sensibilidade” da<br />
equipe pedagógica em perceber o comporta-<br />
122<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MAGRO, A. N. Sistema série escola: recurso de verificação para formação continuada<br />
mento diferencia<strong>do</strong>. Contu<strong>do</strong>, a utilização <strong>do</strong>s<br />
da<strong>do</strong>s disponíveis no Sistema SERIE ocorre em<br />
momentos importantes da avaliação pedagógica,<br />
tais como reuniões pedagógicas, conselhos de<br />
classe e extração de notas <strong>do</strong>s alunos.<br />
Esses da<strong>do</strong>s remetem à Gerência Regional<br />
de Educação a consideração de como as<br />
escolas que estão sob sua supervisão organizam-<br />
-se para a formação continuada de seus <strong>do</strong>centes<br />
e demais profissionais, revelan<strong>do</strong> fragilidades e<br />
aspectos positivos que devem ser considera<strong>do</strong>s.<br />
Atribuem ainda à Gerência de Educação a missão<br />
de ser elemento decisivo para o planejamento<br />
de formação <strong>do</strong>cente e tornar úteis os da<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong> Sistema SERIE, os quais, como se percebe,<br />
revelam a configuração processual de cada área<br />
de ensino, tornan<strong>do</strong> assim a formação <strong>do</strong>cente<br />
eficaz naquilo a que se propõe, ou seja, na qualidade<br />
de ensino como investimento humano.<br />
REFERÊNCIAS<br />
ASSMANN, Hugo. Metáforas novas para reencantar a<br />
educação: epistemologia e didática. 3. ed. Piracicaba:<br />
Unimep, 2001.<br />
DERMEVAL, Saviani (Org.). Educa<strong>do</strong>r: novo milênio,<br />
novo perfil São Paulo: Paulus, 2000.<br />
GEPAHART, R. Paradigmas and research methods.<br />
Disponível em: .<br />
Acesso em: 1/8/2004.<br />
HADJI, Charles. Avaliação desmistificada. Porto Alegre:<br />
Artmed, 2001.<br />
IDEB. Resulta<strong>do</strong>s e metas. Disponível em: .<br />
Acesso em: 7/5/2010.<br />
LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, João Ferreira de;<br />
TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,<br />
estrutura e organização. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2006.<br />
_____. Organização e gestão da escola: teoria e prática.<br />
5. ed. Goiânia: Alternativa, 2004.<br />
MINAYO, M. C. S. Pesquisa social: teoria, méto<strong>do</strong> e criatividade.<br />
Petrópolis: Vozes, 1995.<br />
MORAN, José Manuel. Novas tecnologias e mediação<br />
pedagógica. Campinas, SP: Papirus, 2000.<br />
PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para<br />
ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2000.<br />
_____. A prática reflexiva no ofício de professor: profissionalização<br />
e razão pedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2002.<br />
TARDIF, Maurice. O trabalho <strong>do</strong>cente: elementos para uma<br />
teoria da <strong>do</strong>cência como profissão de interações humanas.<br />
Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 1º de agosto de 2010.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 15 de março de 2011.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 113-123, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
123
A construção da rede de educação em direitos humanos: a<br />
experiência da ufpa<br />
The construction of the Network for Education in Human Rights: the<br />
experience of UFPA<br />
La construcción de la Red de Educación en Derechos Humanos: la<br />
experiencia de la UFPA<br />
Alberto Damasceno 1<br />
Émina Márcia Nery <strong>do</strong>s Santos 2<br />
Ney Cristina Monteiro de Oliveira 3<br />
Marcos Vinícius Lobo 4<br />
Pedro Henrique Queiróz 5<br />
RESUMO<br />
Este trabalho apresenta a experiência da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Pará no Projeto REDE DE EDUCAÇÃO<br />
EM DIREITOS HUMANOS (REDH), cujo objetivo é desenvolver ações para a implementação de uma cultura<br />
de Direitos Humanos nos sistemas de ensino por meio da capacitação e desenvolvimento de atividades<br />
em educação em direitos humanos para e com a comunidade escolar (educa<strong>do</strong>res, técnicos e gestores)<br />
da rede de educação básica, lideranças, profissionais das cinco áreas <strong>do</strong> Plano Nacional de Educação em<br />
Direitos Humanos e profissionais da área de saúde. O curso proposto pela UFPA é realiza<strong>do</strong> na cidade de<br />
Belém (PA) e em mais três municípios da Ilha <strong>do</strong> Marajó (Breves, Gurupá e Soure).<br />
Palavras-chave: Educação; Direitos Humanos e Extensão Universitária.<br />
ABSTRACT<br />
This study presents the experience of <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Pará in the project NETWORK FOR EDU-<br />
CATION IN HUMAN RIGHTS, whose objective is to develop actions towards a culture of Human Rights<br />
in education systems through training and development activities in education for human rights aiming<br />
the school community (teachers, technicians and managers) of the network of basic education, leaders,<br />
professionals in five areas of the National Plan for Human Rights Education and health professionals in the<br />
area. The course offered by UFPA is held in the city of Belém (PA) and in three more districts of the Marajó<br />
island (Breves, Gurupá and Soure).<br />
Keywords: Education; Human rights and Science outreach.<br />
1 Doutor em Educação (PUC/SP), professor associa<strong>do</strong> da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Pará lota<strong>do</strong> no Instituto de Ciências da Educação,<br />
pesquisa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> GESTAMAZON . Atualmente é titular da Diretoria de Assistência e Integração Estudantil da Pró-Reitoria de Extensão.<br />
2 Doutora em Ciências Ambientais (NAEA/UFPA), professora <strong>do</strong> Instituto de Ciências da Educação da UFPA, pesquisa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />
GESTAMAZON, atualmente é Diretora de Programas e Projetos da Pró Reitora de Extensão.<br />
3 Doutora em Educação (PUC/SP), professora da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Pará lotada no Instituto de Ciências da Educação,<br />
pesquisa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> GESTAMAZON . Atualmente é Pró Reitora de Extensão da UFPA, presidente <strong>do</strong> Fórum de Pró-Reitores de Extensão<br />
das <strong>Universidade</strong>s Públicas Brasileiras - FORPROEX.<br />
4 Acadêmico <strong>do</strong> Curso de O<strong>do</strong>ntologia da UFPA, membro <strong>do</strong> Programa MULTICAMPISOCIAL.<br />
5 Acadêmico <strong>do</strong> Curso de O<strong>do</strong>ntologia da UFPA, membro <strong>do</strong> Programa MULTICAMPISOCIAL, bolsista <strong>do</strong> REDH/UFPA.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
125
DAMASCENO, A. et al. A construção da rede de educação em direitos humanos: a experiência da UFPA<br />
126<br />
RESUMEN<br />
Esto trabajo presenta la experiencia de la<br />
<strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Pará en el Proyecto<br />
de Red de Educación en Derechos Humanos<br />
(REDH), cuyo objetivo es desarrollar acciones<br />
hacia una cultura de los derechos humanos<br />
en los sistemas educativos mediante la capacitación<br />
y las actividades de desarrollo en<br />
la educación de los derechos humanos y la<br />
comunidad escolar (profesores, técnicos y<br />
directivos) de la red de la educación básica, los<br />
dirigentes, los profesionales en cinco áreas del<br />
Plan Nacional para la Educación en Derechos<br />
Humanos y de los profesionales de la salud. El<br />
curso es ofreci<strong>do</strong> por UFPA, celebra<strong>do</strong> en la<br />
ciudad de Belém (Pará) y en otros tres distritos<br />
de la isla del Marajó (Breves, Gurupá y Soure)<br />
Palabras-clave: Educación; Derechos Humanos<br />
y Extensión Universitaria.<br />
A ressignificação da extensão universitária<br />
e seu papel na construção de estratégias<br />
de controle social<br />
As ressignificações das relações entre<br />
esta<strong>do</strong>, sociedade civil e merca<strong>do</strong> presentes na<br />
dinâmica de organização político-administrativa<br />
<strong>do</strong> território nacional, geraram a exigência de<br />
novos posicionamentos por parte de suas instituições<br />
com a finalidade de incluir e dar visibilidade<br />
a grupos sociais tradicionalmente excluí<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />
cenário da vida pública brasileira.<br />
Na lógica de institucionalização de um<br />
novo contrato social que agregue novos protagonistas<br />
e novas demandas sociais, as <strong>Universidade</strong>s<br />
públicas assumiram como missão a organização<br />
de redes dialogais com setores da sociedade na<br />
perspectiva da produção de novos saberes capazes<br />
de qualificar a vida das populações da região<br />
amazônica.<br />
Importante nesse contexto, a atividade<br />
da extensão universitária adquiriu maior significa<strong>do</strong>,<br />
pois é potencialmente capaz de maximizar<br />
as condições para a participação da <strong>Universidade</strong><br />
Pública na elaboração das políticas de Esta<strong>do</strong><br />
voltadas para a maioria da população, bem como<br />
para sua constituição em organismo legítimo no<br />
controle social da implantação de tais políticas.<br />
Altera-se, deste mo<strong>do</strong>, a dimensão e a<br />
substância das ações extensionistas universitárias<br />
para além de políticas assistencialistas, elemento<br />
que estruturou a existência de tal atividade como<br />
tripé da missão institucional da universidade,<br />
qualifican<strong>do</strong>-a como processo acadêmico defini<strong>do</strong><br />
e efetiva<strong>do</strong> em função das exigências da<br />
realidade, indispensável na formação <strong>do</strong> aluno,<br />
na qualificação <strong>do</strong> professor e no intercâmbio<br />
com a sociedade.<br />
O entendimento <strong>do</strong> salto de qualidade<br />
exerci<strong>do</strong> por estas atividades carece de argumentação<br />
teórico-conceitual para que não transpareça<br />
a sensação de naturalização das atividades humanas<br />
a partir de determinismos sem substância e,<br />
desta forma, possa ser resgatada a importância<br />
histórica da extensão na construção de uma universidade<br />
sustentável.<br />
Os primeiros <strong>do</strong>cumentos que tratam da<br />
questão de extensão nas universidades brasileiras<br />
datam <strong>do</strong> início <strong>do</strong>s anos 30 <strong>do</strong> século passa<strong>do</strong>.<br />
Na “Exposição de Motivos sobre a Reforma das<br />
<strong>Universidade</strong>s Brasileiras”, de abril de 1931, a<br />
“extensão universitária se destina a dilatar os<br />
benefícios da atmosfera universitária aqueles<br />
que não se encontram diretamente associa<strong>do</strong>s à<br />
vida da universidade”. Em outro <strong>do</strong>cumento, <strong>do</strong><br />
mesmo ano, os cursos de extensão universitária<br />
eram “destina<strong>do</strong>s a propagar, em benefício coletivo,<br />
a atividade técnica e científica <strong>do</strong>s institutos<br />
universitários”.<br />
A ambiguidade da expressão “benefício<br />
coletivo” permite questionar o compromisso<br />
social da política de extensão das universidades<br />
brasileiras à época. Permite, também, concluir<br />
que a diretriz de um assistencialismo difuso, mas<br />
direciona<strong>do</strong> concreta e ideologicamente, nunca<br />
esteve tão bem explicitada como no Estatuto das<br />
<strong>Universidade</strong>s Brasileiras data<strong>do</strong> de 1931.<br />
O golpe de 1937 e a ditadura Varguista<br />
estenderam suas marcas até o final <strong>do</strong>s anos 60.<br />
Durante quarenta anos os <strong>do</strong>cumentos trataram<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR
DAMASCENO, A. et al. A construção da rede de educação em direitos humanos: a experiência da UFPA<br />
a extensão universitária de forma secundária,<br />
acessória ou simplesmente não trataram.<br />
A extensão, definida como um <strong>do</strong>s<br />
objetivos-fim da <strong>Universidade</strong> Brasileira e institucionalizada<br />
de forma sistemática e oficial no interior<br />
da Academia, foi produto da Reforma Universitária<br />
de 1968 6 , marco normativo que estabelece que “as<br />
universidades e as instituições de ensino superior<br />
estenderão à comunidade, sob forma de cursos<br />
e serviços especiais, as atividades de ensino e os<br />
resulta<strong>do</strong>s da pesquisa que lhe são inerentes”.<br />
Anteriormente à Reforma, as experiências<br />
que poderiam caber dentro desse espectro de<br />
preocupação representavam iniciativas isoladas,<br />
geralmente assistemáticas, quan<strong>do</strong> não episódicas,<br />
limitadas por um contexto histórico onde a<br />
<strong>Universidade</strong>, quan<strong>do</strong> muito, era vista como uma<br />
boa escola de terceiro grau, forma<strong>do</strong>ra de quadros<br />
profissionais educa<strong>do</strong>s dentro de padrões culturais<br />
e técnicos importa<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s centros mais dinâmicos<br />
<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> capitalista ocidental, particularmente<br />
os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, França e Inglaterra.<br />
Entretanto, as ambiguidades ou desatenções<br />
das políticas públicas para as atividades<br />
de extensão não lograram impedir que algumas<br />
experiências socialmente compromissadas 7 existissem<br />
à sombra ou à margem das universidades<br />
brasileiras ao longo desses anos.<br />
Essas divergências quanto ao papel que<br />
a universidade deveria cumprir no interior de uma<br />
sociedade periférica e dependente acirraram-<br />
-se com o golpe de 64 pois, a partir de então,<br />
as atividades de extensão foram canceladas tal<br />
como eram e assimiladas e retrabalhadas pelas<br />
reformas introduzidas em 1968, quan<strong>do</strong> passa a<br />
pre<strong>do</strong>minar no espaço universitário a concepção<br />
de extensão enquanto “prestação de serviços”,<br />
6 Por meio <strong>do</strong> artigo 20 da Lei nº 5.540, de 28 de novembro<br />
de 1968.<br />
7 Algumas vivências não podem passar desapercebidas, dentre<br />
elas: O Movimento da Cultura Popular, os CPC’s (Centro de Cultura<br />
Popular, ativa<strong>do</strong>s pela UNE), a campanha “De Pé no Chão<br />
Também se Aprende a Ler”, o Movimento de Educação de Base<br />
(MEB), o Serviço de Extensão Rural da UFPE, a <strong>Universidade</strong><br />
Volante (da UFPR) e, até um certo momento, o CRUTAC - Centro<br />
Rural Universitário de Treinamento e Ação Comunitária, são experiências<br />
que representavam vertentes ideológicas diferenciadas<br />
dentro da academia.<br />
a exemplo de instituições norte-americanas, à<br />
reboque <strong>do</strong>s Acor<strong>do</strong>s MEC-USAID 8 .<br />
No que tange à UFPA, a introdução <strong>do</strong><br />
seu Plano Diretor de Extensão para 1976-1979<br />
revela não só a percepção dessas diferenças,<br />
como sugere caminhos para a sua “correção”. O<br />
assistencialismo e a descontinuidade, enquanto<br />
características das atividades extensionistas das<br />
universidades brasileira se reproduz na nossa<br />
universidade desde sua fundação, em 57, até<br />
a criação <strong>do</strong> CRUTAC 9 em 1972.Ten<strong>do</strong> como<br />
origem em sua maioria, os Departamentos <strong>do</strong>s<br />
Centros de Exatas e de Saúde e como destino a<br />
população da cidade de Belém. A extensão na<br />
UFPA variava das prestações de serviços técnicos<br />
a entidades públicas e privadas até o atendimento<br />
o<strong>do</strong>ntológico às comunidades da capital <strong>do</strong><br />
esta<strong>do</strong>. Em menor escala ocorreram atividades<br />
oriundas das áreas de ciências humanas e socioeconômicas<br />
e na área cultural.<br />
Com o advento da reforma universitária<br />
e a criação da Subreitoria de Assuntos de Extensão<br />
e Natureza Estudantil, a UFPA deu início a<br />
uma série de medidas de caráter administrativo<br />
com o objetivo de oferecer aos agentes de extensão<br />
condições para um trabalho mais integra<strong>do</strong>,<br />
interdisciplinar e homogêneo, <strong>do</strong> ponto de vista<br />
institucional.<br />
A partir <strong>do</strong>s anos 80 o foco das atividades<br />
de extensão se deslocou para o atendimento<br />
de propostas mais “regionais”, voltadas para as<br />
necessidades que emergissem da própria comunidade.<br />
Mesmo após a realização <strong>do</strong> I Seminário e<br />
Extensão da Amazônia – articula<strong>do</strong> e coordena<strong>do</strong><br />
pela UFPA - onde se detectou uma nova retórica<br />
extensionista, foram poucas as propostas estruturadas<br />
de forma participativa. Entretanto uma das<br />
maiores demonstrações <strong>do</strong> poder transforma<strong>do</strong>r da<br />
8 Foram acor<strong>do</strong>s produzi<strong>do</strong>s nos anos 1960 <strong>do</strong> século passa<strong>do</strong>,<br />
entre o Ministério da Educação <strong>do</strong> Brasil (MEC) e a United States<br />
Agency for International Development (USAID). Tais acor<strong>do</strong>s<br />
visavam garantir assistência técnica e cooperação financeira à<br />
educação brasileira em seus diferentes níveis. O perío<strong>do</strong> que foi<br />
de junho de 1964 e janeiro de 1968 foi o de maior intensidade<br />
nos acor<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> firma<strong>do</strong>s nada menos que <strong>do</strong>ze deles.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
127
DAMASCENO, A. et al. A construção da rede de educação em direitos humanos: a experiência da UFPA<br />
extensão universitária na UFPA foi dada a partir da<br />
implantação <strong>do</strong>s campi no interior <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, fator<br />
estruturante no dimensionamento multicampi da<br />
universidade 10 , sobretu<strong>do</strong> com o estabelecimento<br />
de duas unidades na ilha <strong>do</strong> Marajó 11 .<br />
Naquela região se encontram os piores<br />
índices de desenvolvimento humano <strong>do</strong> País e<br />
<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de mo<strong>do</strong> que seus municípios apresentam<br />
baixíssimo índice de qualidade de vida e,<br />
ainda que tenham apresenta<strong>do</strong> algum crescimento<br />
na década passada, a situação global ainda é<br />
de profundas necessidades, corroboran<strong>do</strong> a tese<br />
de que a ilha ainda é uma fronteira social a ser<br />
conquistada por meio de ações de desenvolvimento<br />
humano e cidadania.<br />
IDH<br />
(1)<br />
IDEB*<br />
(2)<br />
IDI<br />
(3)<br />
Taxa de<br />
Escolarização<br />
líquida EF<br />
(4)<br />
<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> nas opções culturais e condições de<br />
moradia muito pobres em termos materiais.<br />
O problema <strong>do</strong> abuso e exploração sexual<br />
de crianças e a<strong>do</strong>lescentes, que já era grave,<br />
chegou a níveis alarmantes, pois agora se trata<br />
da comercialização <strong>do</strong> corpo de meninas a partir<br />
de onze anos de idade com aval das próprias<br />
famílias, posto que esta é a única forma de verem<br />
garantidas a sua sobrevivência. As balsas e navios<br />
que transportam merca<strong>do</strong>rias ficam para<strong>do</strong>s<br />
em pontos combina<strong>do</strong>s, esperan<strong>do</strong> as barcaças<br />
atracarem e as meninas passarem para elas.<br />
Tais denúncias são oriundas de diversas<br />
fontes, feitas por inúmeros setores da sociedade,<br />
desde a Igreja Católica até o Ministério Público<br />
<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Em síntese, as crianças não vão à<br />
Taxa de<br />
Escolarização<br />
líquida EM<br />
(4)<br />
Taxa de<br />
analfabetismo (10<br />
a 15 anos)<br />
(5)<br />
Taxa de<br />
analfabetismo (15<br />
ou mais)<br />
(5)<br />
População<br />
(6)<br />
Breves 0,630 2,5 0,360 77,0 5,1 35,80 35,80 94.458<br />
Gurupá 0,630 2,1 0,340 76,6 1,8 31,90 35,00 24.384<br />
Soure 0,723 2,6 0,690 22.244 83,5 11,60 13,10 21.395<br />
FONTE: (1) ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO - PNUD - 2000; (2) MEC 2007; 3) ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO<br />
DA INFÂNCIA - UNICEF - 2004; (5) IBGE - CENSO DEMOGRÁFICO DE 2000 (6) IBGE - CONTAGEM 2007; *IDEB<br />
ANOS INICIAIS<br />
Uma análise ainda que sucinta <strong>do</strong>s<br />
indica<strong>do</strong>res sociais <strong>do</strong>s municípios da ilha<br />
permite-nos concluir pela existência de grande<br />
concentração da renda, elevada mortalidade infantil,<br />
desnutrição, malária e óbitos por <strong>do</strong>enças<br />
parasitárias. Acrescente-se a isso uma grande<br />
carência por obras de infra-estrutura para saneamento<br />
ambiental, tratamento mais abrangente<br />
<strong>do</strong>s serviços de saúde pública e a necessidade<br />
de mais escolaridade, o que se representa por<br />
elevada taxa de analfabetismo, pouca presença<br />
10 Foi a partir de ações de assistência à saúde da população e de<br />
ações de ensino - que remontam mais freqüentemente à década de<br />
1950 - que a instituição percebeu a necessidade de se estabelecer<br />
formalmente em outras cidades <strong>do</strong> Pará já nos anos de 1980. Antes<br />
de serem concebidas no conjunto de uma política de extensão,<br />
as atividades sofreram o impacto das variações no conceito de<br />
extensão universitária ocorridas em to<strong>do</strong> o país. Ganharam marcos<br />
regulatórios e atualmente são estimuladas a estarem cada vez<br />
mais aliadas à pesquisa e ao ensino e a provocarem novamente<br />
mudanças nas instâncias acadêmicas.<br />
11 Campi Universitários de Breves e Soure.<br />
128<br />
escola porque a trocam pela necessidade de sobrevivência<br />
e se prostituem com o aval <strong>do</strong>s pais. Por<br />
isso este projeto tem características preponderantemente<br />
educativo-culturais, cujos resulta<strong>do</strong>s dependem<br />
de outros vetores político-sociais e cujo prazo<br />
não é curto. Todavia, teremos possibilidade de êxito<br />
na medida em que contarmos com uma rede de<br />
proteção que precisa ser construída e fortalecida<br />
permanentemente, sobretu<strong>do</strong> em se tratan<strong>do</strong> das<br />
áreas da educação, saúde e assistência social no<br />
âmbito <strong>do</strong> município.<br />
Confrontada com seu inestimável papel<br />
social e sua missão institucional, a <strong>Universidade</strong><br />
<strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Pará, em conjunto com as Secretarias<br />
Municipais de Educação, de Saúde e de Assistência<br />
Social, possui um papel decisivo na efetividade das<br />
políticas sociais naquela região, em particular na<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR
DAMASCENO, A. et al. A construção da rede de educação em direitos humanos: a experiência da UFPA<br />
formação inicial e continuada de agentes multiplica<strong>do</strong>res<br />
<strong>do</strong>s Direitos Humanos.<br />
Construin<strong>do</strong> a rede nacional de educação<br />
em direitos humanos<br />
A Temática <strong>do</strong>s Direitos Humanos e<br />
Justiça 12 , que é constituinte <strong>do</strong> Plano Nacional de<br />
Extensão desde 2001, fato que contribuiu com a<br />
sistematização de diversas experiências em direitos<br />
humanos nas universidades brasileiras.<br />
Dentre estas experiências, destacamos as<br />
ações <strong>do</strong> projeto Educação em Direitos Humanos,<br />
concebi<strong>do</strong> pela <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> da Paraíba-<br />
-UFPB 13 e executa<strong>do</strong> por meio da sua Pró-Reitoria<br />
de Extensão e Assuntos Comunitários (Núcleo de<br />
Cidadania e Direitos Humanos). Sua estrutura de<br />
financiamento institucional se originou na Secretaria<br />
de Educação Continuada, Alfabetização e<br />
Diversidade – SECAD, <strong>do</strong> Ministério da Educação<br />
e no âmbito da parceria executiva contou com a<br />
presença <strong>do</strong> Fórum de Pró-Reitores de Extensão das<br />
<strong>Universidade</strong>s Públicas Brasileiras - FORPROEX.<br />
As ações <strong>do</strong> Projeto tiveram início em<br />
agosto de 2007, ten<strong>do</strong> como parceiros os seguintes<br />
esta<strong>do</strong>s: Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia,<br />
Distrito <strong>Federal</strong>, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso<br />
<strong>do</strong> Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Rio de Janeiro,<br />
Rio Grande <strong>do</strong> Sul e Sergipe, que por meio de suas<br />
<strong>Universidade</strong>s Públicas executaram as ações <strong>do</strong> Projeto.<br />
As IFES envolvidas são: UNIFAP, UFAC, UFAM,<br />
UFPA, UFAL, UFS, UFBA, UFES, UFRJ,UFVJM,<br />
UNB, UFG, UFMS, UFPR e FURG;<br />
Destacam-se como objetivos específicos<br />
da Rede ações voltadas para a concepção, planejamento,<br />
execução, monitoramento e avaliação,<br />
sistematização e publicização de experiências de<br />
formação de agentes direta ou indiretamente en-<br />
volvi<strong>do</strong>s com a inserção da temática <strong>do</strong>s direitos<br />
humanos em ações educativas das unidades escolares<br />
<strong>do</strong>s esta<strong>do</strong>s referi<strong>do</strong>s.<br />
Meto<strong>do</strong>logicamente as ações da REDH<br />
são executadas em um curso de 132 horas/aula<br />
(onde 60 são presenciais, 24 são práticas e 40<br />
referem-se à orientação à distância) dispostas em 4<br />
módulos assim dispostos:<br />
1. Fundamentos históricos e ético-filosóficos da<br />
Educação em Direitos Humanos;<br />
2. Fundamentos Políticos e Jurídicos da Educação<br />
em Direitos Humanos;<br />
3. Fundamentos Culturais da Educação em Direitos<br />
Humanos;<br />
4. Fundamentos Educacionais da Educação em<br />
Direitos Humanos.<br />
A parceria com as universidades nos<br />
15 esta<strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s, a partir <strong>do</strong> intercâmbio de<br />
professores envolvi<strong>do</strong>s na temática, permite que,<br />
em um primeiro momento os módulos aconteçam<br />
concomitantemente nas 15 capitais-sede e sejam<br />
replica<strong>do</strong>s, em um momento posterior, de acor<strong>do</strong><br />
com o Plano de Trabalho proposto por cada universidade,<br />
em municípios circunvizinhos, eleitos a<br />
partir <strong>do</strong>s seguintes critérios: baixos índices no IDEB,<br />
presença e citação no mapa nacional de violência,<br />
ser sede de outros projetos federais que façam referência<br />
aos Direitos Humanos, como o “Escola que<br />
Protege”, por exemplo, dentre outros.<br />
Como resulta<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s parcialmente<br />
pelo projeto podemos elencar o acervo bibliográfico<br />
de autoria de vários professores, que em parceria<br />
com a SECAD/MEC idealizaram e levaram à produção<br />
<strong>do</strong> livro “Direitos Humanos:capacitação de educa<strong>do</strong>res”,<br />
composto por <strong>do</strong>is volumes, que serviu<br />
de subsídio para os cursistas durante a capacitação,<br />
além de um CD-ROM conten<strong>do</strong> as mesas-re<strong>do</strong>ndas<br />
gravadas e apresentadas durante os módulos e com<br />
vídeos utiliza<strong>do</strong>s como instrumentos meto<strong>do</strong>lógicos<br />
na capacitação; e, por fim, em processo de finalização,<br />
uma coletânea de textos, com um texto para<br />
12 Além desta, outras seis temáticas compõem o PNE, que são:<br />
Educação, Saúde, Meio Ambiente, Tecnologia e Produção, Cultura<br />
e Comunicação.<br />
13 Maiores informações podem ser encontradas no site: www.<br />
redhbrasil.net/oprojeto_restrito.php<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
129
DAMASCENO, A. et al. A construção da rede de educação em direitos humanos: a experiência da UFPA<br />
cada IFES com o relato de experiência de cada<br />
projeto, conten<strong>do</strong> da<strong>do</strong>s qualitativos e quantitativos<br />
de to<strong>do</strong>s os Esta<strong>do</strong>s.<br />
A experiência no Pará<br />
No Pará, os módulos de capacitação da<br />
REDH, além de ocorrerem na capital, foram realiza<strong>do</strong>s<br />
nos municípios de Breves, Gurupá e Soure,<br />
sedia<strong>do</strong>s na ilha <strong>do</strong> Marajó, em função de corresponderem<br />
aos critérios de escolha defini<strong>do</strong>s pelas<br />
instituições parceiras <strong>do</strong> Programa, isto soma<strong>do</strong> à<br />
existência de contatos consolida<strong>do</strong>s anteriormente<br />
por intermédio de professores da UFPA que já possuíam<br />
trabalhos de pesquisa e extensão na região,<br />
fator que facilitou a relação mais estreita com suas<br />
respectivas Secretarias de Educação, de Saúde e de<br />
Assistência Social. Estas condições os avalizaram<br />
como potenciais parceiros e loci de irradiação de<br />
ações de planejamento, gestão e execução de políticas<br />
sociais relacionadas às diretrizes <strong>do</strong> programa, o<br />
que contribuiu para a premissa de sustentabilidade<br />
e continuidade das proposições implementadas.<br />
Dividida em 4 (quatro) módulos o processo<br />
de capacitação aconteceu primeiramente em<br />
Belém, onde o módulo Fundamentos Histórico-<br />
-Filosóficos <strong>do</strong>s Direitos Humanos foi realiza<strong>do</strong><br />
no perío<strong>do</strong> de 1º a 2 de agosto de 2008, quan<strong>do</strong><br />
se discutiu a construção de uma rede nacional de<br />
educa<strong>do</strong>res em Direitos Humanos, assim como a<br />
inserção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Pará como parte da mesma.<br />
A “Capacitação de Educa<strong>do</strong>res da Rede<br />
Básica de Ensino em Educação em Direitos Humanos”<br />
tem como objeto a promoção de mudanças<br />
no sistema educacional de ensino no senti<strong>do</strong> de<br />
implementar uma cultura de Direitos Humanos nas<br />
escolas por meio da capacitação de educa<strong>do</strong>res,<br />
técnicos e gestores da rede básica de educação,<br />
lideranças comunitárias, profissionais das cinco<br />
áreas (Educação básica, superior, nãoformal, <strong>do</strong>s<br />
profissionais <strong>do</strong>s sistemas de justiça e segurança e<br />
educação e mídia) <strong>do</strong> Plano Nacional de Educação<br />
130<br />
em Direitos Humanos, junto a quinze esta<strong>do</strong>s da<br />
federação.<br />
Um aspecto de grande relevância foi a<br />
participação efetiva de diversos representantes das<br />
esferas governamentais estaduais e municipais,<br />
Organizações Não-Governamentais e membros e<br />
entidades <strong>do</strong> Movimento Social, além da presença<br />
de Professores da Rede Básica de Ensino, público-<br />
-alvo desse projeto.<br />
DISTRIBUIÇÃO DOS CURSISTAS POR<br />
GÊNERO<br />
23%<br />
Homens<br />
DISTRIBUIÇÃO DOS CURSISTAS POR<br />
COR / ETNIA<br />
DISTRIBUIÇÃO DOS CURSISTAS POR FOR-<br />
MAÇÃO SUPERIOR<br />
Frequência<br />
30<br />
25<br />
20<br />
15<br />
10<br />
5<br />
0<br />
14%<br />
Preta<br />
1 2<br />
5<br />
19%<br />
Não<br />
declarou<br />
10<br />
2 1<br />
4<br />
1<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
4<br />
Formação<br />
0<br />
27<br />
10<br />
1<br />
77%<br />
Mulheres<br />
22%<br />
Branca<br />
44%<br />
Parda<br />
30<br />
1%<br />
Indígena<br />
4<br />
21
DAMASCENO, A. et al. A construção da rede de educação em direitos humanos: a experiência da UFPA<br />
DISTRIBUIÇÃO DOS CURSISTAS POR ESCO-<br />
LARIDADE<br />
por objetivo final, informar a comunidade <strong>do</strong><br />
entorno escolar a respeito <strong>do</strong> assunto, fazen<strong>do</strong><br />
valer os direitos fundamentais previstos na constituição<br />
brasileira.<br />
Conclusões: perspectivas de continuidade<br />
da REDH<br />
DISTRIBUIÇÃO DOS CURSISTAS POR FAIXA<br />
ETÁRIA<br />
Nos municípios de Breves, Gurupá e<br />
Soure, localiza<strong>do</strong>s na Ilha <strong>do</strong> Marajó, o projeto<br />
ainda se encontra em fase de conclusão, com<br />
previsão de término para o 1º semestre de 2009,<br />
porém está sen<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong> de mo<strong>do</strong> semelhante<br />
à capital, embora adapta<strong>do</strong> às realidades locais.<br />
Uma dificuldade considerável na realização <strong>do</strong>s<br />
módulos no interior da Amazônia, consiste nas<br />
dinâmicas de mobilização <strong>do</strong>s cursistas, preocupação<br />
maior da coordenação no Esta<strong>do</strong>.<br />
Ao final <strong>do</strong>s módulos tanto na capital<br />
como nos municípios da Ilha <strong>do</strong> Marajó, será<br />
cria<strong>do</strong> um Plano de Ação em Educação em e<br />
para Direitos Humanos, onde serão planejadas<br />
ações com a comunidade escolar, construin<strong>do</strong><br />
metas que visam levar informações básicas relativas<br />
ao objeto <strong>do</strong> programa, capacitan<strong>do</strong> os<br />
<strong>do</strong>centes para a elaboração de materiais didáticos<br />
a respeito <strong>do</strong>s Direitos Humanos e, ten<strong>do</strong><br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
Ensino, Pesquisa e Extensão são classicamente<br />
os três pilares da universidade pública<br />
brasileira. Entretanto, enquanto os <strong>do</strong>is primeiros<br />
são campos consagra<strong>do</strong>s e bem consolida<strong>do</strong>s, a<br />
Extensão continua objeto de controvérsias. Por<br />
vários anos a academia entendeu a Extensão<br />
apenas como uma forma de prestação de serviços<br />
à Sociedade, com enfoque ao caráter assistencialista<br />
da ação. Depois de muitos debates e<br />
experiências acumuladas, esse conceito está mudan<strong>do</strong>.<br />
Hoje, Extensão é, principalmente, troca<br />
de saberes entre a Academia e a Sociedade. É,<br />
portanto, um processo de aprendizagem mútua.<br />
As transformações ocorridas na gestão<br />
da Extensão exigem agora da <strong>Universidade</strong> a<br />
instalação de dinâmicas de acompanhamento e<br />
avaliação das suas ações, a partir de um processo<br />
permanente de registro e controle pelas unidades<br />
acadêmicas e de uma nova lógica de significação<br />
das ações baseada na vinculação orgânica da extensão<br />
às atividades de ensino, posto que a UFPA<br />
coloca como desafio até 2009 institucionalizá-la<br />
por meio <strong>do</strong>s projetos pedagógicos <strong>do</strong>s cursos<br />
de graduação, em atendimento à Meta 23 <strong>do</strong><br />
Plano Nacional de Educação em cumprimento<br />
ao seu novo Regulamento da Graduação. Tais<br />
marcos têm desafia<strong>do</strong> a UFPA, seus <strong>do</strong>centes,<br />
discentes e técnicos, no senti<strong>do</strong> de institucionalizar<br />
a vivência de ações extensionistas enquanto<br />
síntese <strong>do</strong> fazer universitário e a realidade social,<br />
questionan<strong>do</strong> o seu papel e redimensionan<strong>do</strong>-o<br />
rumo à uma atuação mais eficaz na sociedade.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, é essencial compreender<br />
que a dimensão inclusiva da extensão, mani-<br />
131
DAMASCENO, A. et al. A construção da rede de educação em direitos humanos: a experiência da UFPA<br />
festa na consolidação das políticas de assistência<br />
estudantil, ainda são um desafio cuja superação<br />
apresenta naturezas diversas (de proteção, de<br />
diversidade, de sensibilidade e de inovação),<br />
afinal, seu fortalecimento como dimensão<br />
estratégica representa, sem dúvida, uma real<br />
contribuição para a retomada da democracia e<br />
da cidadania em nosso país.<br />
A experiência aqui apresentada pretende<br />
atender um total de 500 (quinhentas)<br />
pessoas e agrega na perspectiva extensionista<br />
uma prática acadêmica na qual estudantes<br />
da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Pará, <strong>do</strong>s cursos<br />
de Ciências da Computação, Comunicação,<br />
Enfermagem, Farmácia, Medicina, Nutrição,<br />
O<strong>do</strong>ntologia, Pedagogia e Serviço Social atuam<br />
de forma direta e indireta junto às populações,<br />
oportunizan<strong>do</strong> o aprendiza<strong>do</strong> e a prática <strong>do</strong>s<br />
Direitos Humanos, estimulan<strong>do</strong> a criticidade<br />
e, por sua vez, motivan<strong>do</strong>-as a reivindicar seus<br />
direitos junto às autoridades, observan<strong>do</strong> que<br />
a participação popular nas políticas públicas é<br />
fundamental para o monitoramento e compreensão<br />
<strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s cidadãos como um to<strong>do</strong>.<br />
Revela-se, portanto, para além <strong>do</strong> ensino e da<br />
pesquisa, ação extensionista no mais puro senti<strong>do</strong><br />
de serviço à sociedade, à sua emancipação e<br />
desenvolvimento humano e, porque educativa,<br />
de maneira sustentável.<br />
REFERÊNCIAS<br />
GOMIDE, Denise (org.). Governo e Sociedade Civil: um<br />
debate sobre espaços públicos democráticos. São Paulo:<br />
ABONG, 2003.<br />
GONH, Maria da Glória. Movimentos Sociais no Início<br />
<strong>do</strong> Século XXI: antigos e novos atores sociais. Petrópolis:<br />
Vozes, 2003.<br />
UFPA. Pró-Reitoria de Extensão. Anteprojeto da Política<br />
de Assistência Estudantil/UFPA/Belém/Dezembro de 2007.<br />
UFPA. Centro de Educação. Relatório da pesquisa sobre<br />
a questão racial na UFPA. Belém, UFPA, Novembro de<br />
2004.<br />
UFPA. Instituto de Ciências da Educação. Projeto Multicampisocial/UFPA/Belém/Dezembro<br />
de 2008.<br />
UFPB. Pró-Reitoria de Extensão. Projeto de capacitação<br />
em Direitos Humanos. Disponivel em: . Acesso em: 05/2/2009.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 16 de janeiro de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 19 de junho de 2009.<br />
132<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 125-132, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e<br />
articulação de redes na atenção à saúde sexual e reprodutiva<br />
de a<strong>do</strong>lescentes no vale <strong>do</strong> são francisco<br />
Challenges in work process reorganizing and networking development<br />
in sexual and reproductive health care for a<strong>do</strong>lescents in the São<br />
Francisco Valley<br />
Desafíos para reorganización del proceso de trabajo y desarrollo de la<br />
red de atención a la salud sexual y reproductiva de los a<strong>do</strong>lescentes<br />
en el Valle del río São Francisco 1<br />
Juliana Sampaio 2<br />
Roseléia Carneiro <strong>do</strong>s Santos 3<br />
Anna Cléa Ferreira da Silva 4<br />
RESUMO<br />
A Atenção Básica da Saúde no Brasil é organizada, prioritariamente, pela Estratégia de Saúde da Família<br />
(ESF) e deve desenvolver ações democráticas e participativas nos espaços coletivos, dentre elas as direcionadas<br />
à atenção <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes. Partin<strong>do</strong> desta prerrogativa, o presente trabalho tem como objetivo tecer<br />
algumas reflexões sobre os desafios para a articulação de redes sociais na implantação de novas modalidades<br />
de cuida<strong>do</strong> à saúde sexual e reprodutiva de a<strong>do</strong>lescentes. Para tanto, foi desempenhada uma pesquisaação<br />
(MORIN, 2004), com o suporte teórico <strong>do</strong> Construcionismo Social (SPINK; MEDRADO, 1999), na<br />
qual foram realizadas oficinas de trabalho com 72 profissionais de saúde objetivan<strong>do</strong> o desenvolvimento<br />
de 128 rodas de conversas sobre sexualidade com cerca de 240 a<strong>do</strong>lescentes, autoriza<strong>do</strong>s por seus pais ou<br />
responsáveis. Para construção das redes de cuida<strong>do</strong>, foram articuladas 7 escolas municipais, 1 escola militar,<br />
1 CRAS, 1 ONG dirigida a jovens e 1 igreja católica. Os resulta<strong>do</strong>s indicam diversas dificuldades para o<br />
desenvolvimento de ações em saúde com a<strong>do</strong>lescentes e sobre sexualidade. Tais dificuldades envolvem<br />
desde o perfil <strong>do</strong>s profissionais de saúde, centra<strong>do</strong> no modelo de atenção medicamentoso e especialista,<br />
que dificulta trabalhos participativos e dialógicos entre os profissionais, e entre eles e os a<strong>do</strong>lescentes; até<br />
a falta de articulação da equipe de saúde com os equipamentos sociais locais, evidencian<strong>do</strong> a dificuldade<br />
<strong>do</strong>s mesmos trabalharem de forma intersetorial e no território, com vistas a uma atenção integral em saúde.<br />
Palavras-chave: a<strong>do</strong>lescentes; estratégia de saúde da família; práticas dialógicas; promoção da saúde sexual<br />
e reprodutiva; rede social.<br />
ABSTRACT<br />
The Primary Health in Brazil is organized primarily by the Strategy Family Health (ESF) and must develop<br />
democratic and participatory actions in collective spaces, among them directed to the attention of teenagers.<br />
Based on this prerogative, this work aims to make some reflections on the challenges to the articulation<br />
1 Apoio CNPq<br />
2 Doutora em Saúde Coletiva; Profª da UFCG; julianasmp@hotmail.com. Endereço: Av. Eng. José Celino Filho, nº 380/504. Mirante.<br />
Campina Grande – PB CEP: 58.407-664. Fone: (83) 3310 9996/ 8756 8756<br />
3 Graduanda em Psicologia pela UNIVASF; rose_psi_univasf@hotmail.com<br />
4 Graduanda em Psicologia pela UNIVASF; clea_anna@yahoo.com.br<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
133
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
of social networks in the implementation of<br />
new forms of care for sexual and reproductive<br />
health of a<strong>do</strong>lescents. The work was performed<br />
an Action Research (Morin, 2004), with the<br />
theoretical suport of Social Construccionism<br />
(SPINK, MEDRADO, 1999), which were held<br />
workshops with 72 health professionals aimed<br />
at developing 128 wheels of conversations<br />
about sexuality with around 240 teenage<br />
authorized by their parents or guardians. For<br />
construction of networks of care were articulated<br />
7 municipal schools, 1 military school,<br />
CRAS 1, 1 ONG aimed at young people and<br />
1 Catholic church. The results indicate several<br />
difficulties for the development of health interventions<br />
with a<strong>do</strong>lescents and sexuality. These<br />
difficulties involve from the profile of health<br />
professionals, centered care model and medical<br />
expert who makes work and participatory<br />
dialogue between professionals and between<br />
them and teenagers, even the lack of articulation<br />
of the healthcare team with the social<br />
welfare sites, showing the difficulty of such<br />
intersectoral work and in territory, with a view<br />
to a comprehensive health care.<br />
Keywords: a<strong>do</strong>lescents; strategy family health;<br />
dialogical practices; promotion of sexual and<br />
reproductive health; social network.<br />
RESUMEN<br />
Primaria de la salud en Brasil está organiza<strong>do</strong><br />
principalmente por la Estrategia de Salud de<br />
la Familia (ESF) y debe desarrollar acciones<br />
democrática y participativa en los espacios<br />
colectivos, entre ellos dirigi<strong>do</strong>s a la atención de<br />
los a<strong>do</strong>lescentes. En base a esta prerrogativa,<br />
este trabajo pretende hacer algunas reflexiones<br />
sobre los retos para la articulación de redes<br />
sociales en la aplicación de nuevas formas de<br />
cuida<strong>do</strong> de la salud sexual y reproductiva de<br />
los a<strong>do</strong>lescentes. El trabajo fue conçus com<br />
una investigación-acción (Morin, 2004), com<br />
el marco teórico del Construccionismo Social<br />
(Spink, Medra<strong>do</strong>, 1999), que se llevaron a<br />
cabo 72 talleres con profesionales de la salud<br />
destinadas a desarrollar 128 ruedas de conversaciones<br />
sobre la sexualidad con alrede<strong>do</strong>r de<br />
240 a<strong>do</strong>lescentes autoriza<strong>do</strong>s por sus padres o<br />
tutores. Para la construcción de redes de atención<br />
fueron articuladas 7 escuelas municipales,<br />
1 escuela militar, 1 CRAS, 1 ONG destinadas a<br />
los jóvenes y 1 iglesia católica. Los resulta<strong>do</strong>s<br />
indican varias dificultades para el desarrollo de<br />
intervenciones de salud con los a<strong>do</strong>lescentes<br />
y la sexualidad. Estas dificultades implican<br />
desde el perfil de los profesionales de la salud,<br />
la modelo centra<strong>do</strong> en la atención y el perito<br />
médico que hace el trabajo y el diálogo participativo<br />
entre profesionales y entre éstos y los<br />
a<strong>do</strong>lescentes, incluso la falta de articulación del<br />
equipo de salud con el bienestar social sitios,<br />
mostran<strong>do</strong> la dificultad de ese trabajo en una<br />
intersectoriales y el territorio, con vistas a una<br />
atención integral de salud.<br />
Palabras-clave: a<strong>do</strong>lescentes; estrategia de<br />
salud de la familia; prácticas dialógicas; promoción<br />
de la salud sexual y reproductiva; red<br />
social.<br />
Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo<br />
de trabalho e articulação de redes na<br />
atenção à saúde sexual e reprodutiva de<br />
a<strong>do</strong>lescentes no Vale <strong>do</strong> São Francisco<br />
Introdução<br />
A Estratégia de Saúde da Família surge<br />
na proposição de um modelo de atenção à<br />
saúde que tem como prerrogativa a prevenção<br />
de agravos e promoção da saúde, a partir de<br />
uma atenção integral, cujo objetivo é melhorar<br />
a qualidade de vida da população. A integralidade<br />
desta atenção, por sua vez, se opera em<br />
um conjunto articula<strong>do</strong> de ações e serviços preventivos<br />
e assistenciais, individuais e coletivos,<br />
nos diversos níveis de complexidade <strong>do</strong> sistema,<br />
reconhecen<strong>do</strong> o sujeito em seus diversos contextos<br />
e demandas (BRASIL, 2005a).<br />
Para tanto, é imprescindível que<br />
as ações de saúde sejam interdisciplinares, rompen<strong>do</strong><br />
com a dicotomia entre os saberes e fazeres<br />
<strong>do</strong>s diversos profissionais e da comunidade. Para<br />
que isso aconteça, é necessário que os agentes<br />
de saúde exercitem uma rede de comunicação<br />
efetiva e eficaz.<br />
De acor<strong>do</strong> com Corbo e Morosini<br />
(2005), a integralidade no cuida<strong>do</strong> à saúde<br />
ainda é um desafio para to<strong>do</strong>s os atores envolvi<strong>do</strong>s<br />
com o processo de mudança da formação<br />
profissional e das práticas em saúde. Entende-se<br />
como o maior desafio dessas práticas, não só sua<br />
134<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
dimensão institucional ou política, mas também<br />
o rompimento de formas cristalizadas de entender<br />
e realizar ações técnicas, que conformam<br />
padrões de intervenção em saúde já toma<strong>do</strong>s<br />
como tradição, a exemplo <strong>do</strong>s tratamentos medicamentosos<br />
e hospitalocêntricos.<br />
No que se referem ao público a<strong>do</strong>lescente,<br />
estu<strong>do</strong>s apontam para uma prática<br />
profissional que reforça modelos de gênero e<br />
sexualidade basea<strong>do</strong>s em valores machistas<br />
e normatiza<strong>do</strong>res, que dificultam o exercício<br />
<strong>do</strong>s direitos sexuais e reprodutivos. Muitas das<br />
atividades que tematizam as práticas sexuais se<br />
restringem, quan<strong>do</strong> muito, à prescrição de méto<strong>do</strong>s<br />
contraceptivos, não oferecen<strong>do</strong> um espaço<br />
de troca dialógica entre profissionais de saúde<br />
e a<strong>do</strong>lescentes (PAIVA, 2001). Nesta mesma direção,<br />
Villela (1999) e Paiva (2006) evidenciam<br />
práticas de saúde orientadas pela compreensão<br />
da sexualidade na a<strong>do</strong>lescência como algo a ser<br />
controla<strong>do</strong>, <strong>do</strong>mestica<strong>do</strong>, deven<strong>do</strong>-se adiar ao<br />
máximo as primeiras práticas sexuais.<br />
Assim, Costa (2000) aponta para<br />
a necessidade <strong>do</strong>s profissionais investirem no<br />
potencial <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes para opinar, apontar<br />
ideias e participar no planejamento de seu futuro;<br />
e Parker (2000) defende que os jovens têm de<br />
falar em nome próprio sobre suas experiências,<br />
expressan<strong>do</strong>-se com suas próprias palavras,<br />
gestos, senti<strong>do</strong>s e significa<strong>do</strong>s. Para tanto, é<br />
imprescindível que os profissionais permitam<br />
a distribuição <strong>do</strong> poder <strong>do</strong> discurso, abrin<strong>do</strong><br />
mão de suas próprias verdades, possibilitan<strong>do</strong><br />
a construção coletiva.<br />
O Estatuto da Criança e <strong>do</strong> A<strong>do</strong>lescente<br />
(BRASIL, 1990) prevê que todas as crianças e<br />
a<strong>do</strong>lescentes são sujeitos de direitos, em diferentes<br />
condições sociais e individuais; e que a<br />
condição de pessoa em desenvolvimento não as<br />
priva de gozar desses direitos. Nesta perspectiva,<br />
o Ministério da Saúde (BRASIL, 2005b) vem<br />
desenvolven<strong>do</strong> ações para fortalecer os direitos<br />
sexuais e reprodutivos e a relevância desses para<br />
o público a<strong>do</strong>lescente. A proposta ministerial é<br />
desenvolver atividades educativas, abordan<strong>do</strong><br />
informações sobre méto<strong>do</strong>s contraceptivos e<br />
esclarecimentos sobre a legislação federal vigente<br />
a respeito <strong>do</strong> planejamento familiar.<br />
O Ministério da Saúde desenvolverá<br />
esforços visan<strong>do</strong> à sensibilização <strong>do</strong>s<br />
gestores de saúde para a organização<br />
de ações e serviços de atenção à<br />
saúde sexual e à saúde reprodutiva de<br />
a<strong>do</strong>lescentes e jovens, que respeitem<br />
os princípios de confidencialidade e<br />
de privacidade e que contemplem as<br />
especificidades da a<strong>do</strong>lescência, garantin<strong>do</strong><br />
o acolhimento, o acesso a ações<br />
educativas e méto<strong>do</strong>s contraceptivos<br />
e para prevenção das DST/HIV/Aids<br />
(BRASIL, 2005b, p. 20-21)<br />
Para tanto, a atenção básica de saúde<br />
por meio das equipes de Saúde da Família, assim<br />
como as escolas e CRAS, configuram-se como<br />
importantes espaços para ações que visem à<br />
garantia <strong>do</strong>s direitos sexuais e reprodutivos <strong>do</strong>s<br />
a<strong>do</strong>lescentes. Estes equipamentos sociais devem,<br />
ainda, para maximizar seus esforços, trabalhar<br />
em conjunto.<br />
A articulação de redes prevê aproximar<br />
pessoas e ações, em mútuo “apoio social”. Este é<br />
defini<strong>do</strong> por Valla (2000) “como sen<strong>do</strong> qualquer<br />
informação, falada ou não, e/ou auxílio material,<br />
ofereci<strong>do</strong>s por grupos e/ou pessoas que se conhecem,<br />
que resultam em efeitos emocionais e/<br />
ou comportamentos positivos” (VALLA, 2000,<br />
p. 41). Assim, o objetivo maior é o de potencializar<br />
recursos e criar alternativas novas para<br />
a resolução de problemas e/ou atendimento de<br />
necessidades, o que no campo da saúde significa<br />
aumentar a qualidade <strong>do</strong>s serviços presta<strong>do</strong>s e<br />
consequentemente melhorar os indica<strong>do</strong>res de<br />
saúde da população.<br />
A perspectiva de rede fundamenta-se<br />
na valorização de ações mais integrais, de<br />
mo<strong>do</strong> que os diversos serviços trabalhem articuladamente,<br />
objetivan<strong>do</strong> o apoio social necessário<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
135
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
ao bom desenvolvimento e bem-estar das pessoas.<br />
Partin<strong>do</strong> de tal compreensão, Ribeiro (2005)<br />
chama a atenção para o papel da Estratégia de<br />
Saúde da Família como importante articula<strong>do</strong>r<br />
de redes sociais, por estabelecer contato com a<br />
família, os vizinhos e lideranças comunitárias,<br />
“poden<strong>do</strong> incentivar a interação entre as várias<br />
iniciativas de apoio, incorporan<strong>do</strong> as práticas de<br />
apoio social às ações de saúde” (RIBEIRO, 2005,<br />
p. 02). Entretanto, como destaca a autora, essa<br />
prática não é devidamente valorizada por grande<br />
parte <strong>do</strong>s profissionais, que não reconhecem as<br />
ações de apoio social como parte <strong>do</strong> processo<br />
terapêutico.<br />
Assim, o presente estu<strong>do</strong> circunscreve-<br />
-se numa experiência de implantação, em conjunto<br />
com profissionais das ESF das cidades<br />
de Petrolina-PE e Juazeiro-BA, de rodas de<br />
conversas sobre direitos sexuais e reprodutivos<br />
com a<strong>do</strong>lescentes, como estratégia de criação<br />
de espaços dialógicos entre sujeitos.<br />
Nestas cidades, assim como na maioria<br />
das localidades brasileiras, poucas são as ações<br />
de saúde destinadas aos a<strong>do</strong>lescentes, que não<br />
são percebi<strong>do</strong>s como uma população prioritária<br />
<strong>do</strong> serviço. Nas unidades de saúde faltam insumos<br />
de prevenção, em especial a camisinha, e<br />
demais materiais educativos de saúde sexual e<br />
reprodutiva. Ao mesmo tempo, observam-se<br />
posturas conserva<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s profissionais frente<br />
aos a<strong>do</strong>lescentes, e o sentimento de despreparo<br />
para trabalhar sexualidade, principalmente com<br />
esta população. Em contrapartida, os a<strong>do</strong>lescentes<br />
não se interessam pelas atividades <strong>do</strong> serviço<br />
de saúde e quan<strong>do</strong> convoca<strong>do</strong>s, resistem em<br />
participar das ações propostas (SAMPAIO, 2007)<br />
Partin<strong>do</strong> de tal constatação, pretende-<br />
-se nesse trabalho tecer algumas reflexões a<br />
respeito da articulação de redes sociais ao longo<br />
<strong>do</strong> processo de construção, com profissionais das<br />
ESF de Petrolina e Juazeiro, de novas modalidades<br />
de cuida<strong>do</strong> à saúde sexual e reprodutiva<br />
de a<strong>do</strong>lescentes. Assim, serão apontadas dificuldades<br />
encontradas no processo, pon<strong>do</strong> em foco<br />
a forma como os dispositivos sociais existentes<br />
nas comunidades trabalhadas foram articula<strong>do</strong>s<br />
ao longo da intervenção.<br />
Material e méto<strong>do</strong>s<br />
O estu<strong>do</strong> em tela segue o méto<strong>do</strong> qualitativo<br />
em saúde (MINAYO, 2007), que busca<br />
privilegiar os significa<strong>do</strong>s e senti<strong>do</strong>s produzi<strong>do</strong>s<br />
pelos atores sociais. Fundamenta-se na perspectiva<br />
<strong>do</strong> Construcionismo Social, que segun<strong>do</strong><br />
Spink e Frezza (2000), busca compreender as<br />
ações, as práticas sociais e os sistemas de significações<br />
pelos quais as pessoas dão senti<strong>do</strong> ao<br />
mun<strong>do</strong>. Nesse ínterim, a linguagem é compreendida<br />
como uma produção social, historicamente<br />
datada, fruto <strong>do</strong> compartilhamento de senti<strong>do</strong>s<br />
entre os sujeitos (SPINK, MEDRADO, 1999).<br />
Nessa direção, foi realizada uma<br />
pesquisa-ação (MORIN, 2004), a partir da qual<br />
o conhecimento se articula com a prática, num<br />
processo reflexivo sobre si mesmo. O pesquisa<strong>do</strong>r<br />
– aquele que busca construir conhecimentos<br />
– deve propor a constante reflexão das práticas<br />
produzidas, abrin<strong>do</strong>-se a novas realidades, num<br />
processo de aprendizagem experiencial.<br />
A experiência que sustenta este estu<strong>do</strong><br />
caracteriza-se pelo desenvolvimento de oficinas<br />
de trabalho junto a 72 profissionais de oito<br />
unidades de saúde da família das cidades de<br />
Petrolina e Juazeiro. O objetivo foi realizar 128<br />
rodas de conversas com aproximadamente 240<br />
a<strong>do</strong>lescentes de ambos os sexos, entre 10 e 19<br />
anos, dividi<strong>do</strong>s em <strong>do</strong>is grupos de acor<strong>do</strong> com<br />
a faixa etária (10-15/16-19). Para a escolha<br />
das equipes de saúde, foram consideradas as<br />
localizadas em comunidades populares, com<br />
alta densidade populacional, grande número de<br />
a<strong>do</strong>lescentes, alto índice de gravidez e DST entre<br />
a<strong>do</strong>lescentes e que dispunham de equipamentos<br />
sociais como escola e/ou Centro de Referência<br />
em Assistência Social (CRAS). A escolha foi<br />
136<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
ainda orientada pela própria indicação <strong>do</strong>s gestores<br />
da saúde como áreas de maior prioridade<br />
para o trabalho no campo <strong>do</strong>s direitos sexuais e<br />
reprodutivos e pela disponibilidade <strong>do</strong>s próprios<br />
profissionais em participar <strong>do</strong> projeto.<br />
Para a pactuação dessas ações, foram<br />
convida<strong>do</strong>s, em cada unidade de saúde, representantes<br />
de to<strong>do</strong>s os equipamentos sociais da<br />
área. O conjunto <strong>do</strong>s atores convida<strong>do</strong>s variou<br />
de acor<strong>do</strong> com cada unidade trabalhada e sua<br />
rede social estabelecida. Assim, nas oito comunidades<br />
foi possível articular sete escolas publicas<br />
municipais, uma escola militar, um CRAS, uma<br />
ONG que trabalha com jovens e uma igreja<br />
católica.<br />
Para a realização das rodas de conversas,<br />
também foram contata<strong>do</strong>s os pais e responsáveis<br />
pelos a<strong>do</strong>lescentes para apresentação e<br />
pactuação da proposta.<br />
Resulta<strong>do</strong>s e discussões<br />
Como propor o novo numa estrutura velha<br />
No primeiro momento, a proposta<br />
foi lançada aos profissionais de saúde, sen<strong>do</strong><br />
apresenta<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s de uma pesquisa anterior<br />
(SAMPAIO, 2007) que evidenciava a ausência<br />
de trabalhos no campo <strong>do</strong>s direitos sexuais e<br />
reprodutivos com a<strong>do</strong>lescentes e a vulnerabilidade<br />
destes frente às DST/Aids e gravidez não<br />
planejada. A proposta foi bem recebida por parte<br />
das equipes, que reconheceram o problema e sua<br />
necessidade de capacitação para o trabalho com<br />
a<strong>do</strong>lescentes e para o uso de técnicas dialógicas<br />
com grupo e com o tema sexualidade.<br />
Entretanto, corroboran<strong>do</strong> com da<strong>do</strong>s<br />
de outros pesquisa<strong>do</strong>res (PAIVA, 2006; VI-<br />
LELLA, 1999) ao longo <strong>do</strong> processo de pactuação<br />
com a comunidade e de planejamento das<br />
atividades, foi possível perceber a resistência<br />
<strong>do</strong>s profissionais de saúde em se engajaram em<br />
ações de educação sexual. Sua expectativa era<br />
que a “equipe da universidade” realizasse todas<br />
as ações, sen<strong>do</strong> eles os especta<strong>do</strong>res <strong>do</strong> processo.<br />
Como o objetivo <strong>do</strong> projeto era fornecer<br />
suporte técnico para que os próprios profissionais<br />
tornassem-se capazes de realizar as atividades<br />
educativas com os a<strong>do</strong>lescentes, tais expectativas<br />
não foram atendidas e muitos profissionais,<br />
que no primeiro momento se interessaram pela<br />
proposta, afastaram-se <strong>do</strong> processo.<br />
Em uma unidade da zona rural de<br />
Juazeiro/BA a dificuldade de articular os profissionais<br />
foi tão significativa, que o projeto teve<br />
que ser remaneja<strong>do</strong> para outra comunidade,<br />
que apesar de participar, não fugiu ao perfil das<br />
demais equipes de saúde trabalhadas. Destas,<br />
em apenas uma foi possível contar com a adesão<br />
de <strong>do</strong>is enfermeiros que coordenavam as duas<br />
equipes da unidade. Nas demais, os agentes<br />
comunitários de saúde (ACS) foram os únicos<br />
profissionais que se engajaram no processo.<br />
Um <strong>do</strong>s fatores elenca<strong>do</strong>s como justificativa<br />
para a não adesão foi o pouco tempo<br />
disponível para trabalhar com processos de<br />
educação em saúde. Os profissionais de nível superior,<br />
em especial as enfermeiras, encontram-se<br />
sobrecarregadas com a coordenação da unidade;<br />
e a grande maioria das equipes encontra-se<br />
incompleta, sem o profissional de medicina,<br />
ocasionan<strong>do</strong> grande demanda reprimida para<br />
os atendimentos ambulatoriais.<br />
Outro problema constata<strong>do</strong> foi a<br />
grande rotatividade <strong>do</strong>s profissionais. Durante<br />
o desenvolvimento <strong>do</strong> projeto, aconteceram<br />
várias demissões e com isso, após a pactuação<br />
com determinada equipe de saúde, quan<strong>do</strong> a<br />
extensionista chegava à unidade na semana<br />
seguinte, havia modificações intensas no quadro<br />
funcional <strong>do</strong> serviço, sen<strong>do</strong> necessário repactuar<br />
o processo novamente. Infelizmente, essa rotatividade<br />
não prejudicou apenas o desenrolar <strong>do</strong><br />
projeto, mas teve impactos diretos no processo<br />
de trabalho <strong>do</strong> serviço, tanto porque interferia<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
137
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
no vínculo estabeleci<strong>do</strong> entre a comunidade e a<br />
equipe, quanto porque implica num sistemático<br />
recomeço de projetos de trabalho, sem garantias<br />
de continuidade, o que também finda por desmotivar<br />
os profissionais.<br />
Chamou a atenção ainda a falta de integração<br />
da equipe de saúde, que se organizava<br />
por especialidades (MEHRY, 2009). A equipe<br />
de saúde bucal (o<strong>do</strong>ntólogos e auxiliares) não<br />
se envolvia com outras demandas de saúde<br />
que não as estritamente relacionadas com seu<br />
núcleo de saber (saúde bucal). Este modelo de<br />
gestão <strong>do</strong> trabalho é antagônico à proposta da<br />
interdisciplinaridade que possibilita a integralidade<br />
<strong>do</strong> cuida<strong>do</strong>. Desta forma, ao contrário de<br />
uma equipe de saúde, que trabalha de forma<br />
colegiada e partilhada na análise das condições<br />
de vida da população sob sua responsabilidade<br />
sanitária, assim como no planejamento e execução<br />
de projetos terapêuticos singulares, proposta<br />
pela política de humanização das práticas em<br />
saúde (BRASIL, 2008), tem-se um conjunto de<br />
profissionais que compartimentalizam a gestão<br />
<strong>do</strong> cuida<strong>do</strong>, atribuin<strong>do</strong> a cada categoria profissional<br />
uma atividade especifica ao seu núcleo de<br />
saber (CAMPOS, 2007a).<br />
Outro fator relevante neste contexto<br />
é a própria demanda gerencial <strong>do</strong>s municípios<br />
centrada na computação de procedimentos<br />
realiza<strong>do</strong>s (produtividade). Este da<strong>do</strong> põe em<br />
questão a necessidade da própria gestão de saúde<br />
permitir a construção de novos modelos assistenciais,<br />
centra<strong>do</strong>s em processos participativos<br />
de cuida<strong>do</strong> (CAMPOS, 2007b). Ou seja, para a<br />
implantação de uma gestão <strong>do</strong> cuida<strong>do</strong>, centrada<br />
em processos longitudinais de acompanhamento<br />
das pessoas, é preciso a valorização de novos<br />
mo<strong>do</strong>s de organização das práticas de saúde,<br />
e este tipo de mudança não implica apenas na<br />
transformação <strong>do</strong> perfil profissional, mas também<br />
da própria gerência governamental. Sem o<br />
respal<strong>do</strong> institucional, que se concretiza, dentre<br />
outras coisas, no reconhecimento e legitimação<br />
de diferentes práticas em saúde não centralizadas<br />
em procedimentos, os profissionais de saúde não<br />
encontram tempo, nem estrutura gerencial e política<br />
para o desenvolvimento de outras práticas<br />
de saúde além <strong>do</strong>s atendimentos ambulatoriais<br />
que geram códigos de produtividade.<br />
Por fim, deve-se considerar o próprio<br />
perfil <strong>do</strong>s profissionais de saúde. O modelo de<br />
formação a que foram submeti<strong>do</strong>s é denuncia<strong>do</strong><br />
por Merhy (2002) como incompatível com a<br />
proposta da integralidade no cuida<strong>do</strong>. Trata-se<br />
de uma formação centrada em procedimentos<br />
técnicos específicos, que não instrumentalizam os<br />
profissionais para o encontro com outros saberes<br />
e o trabalho em equipe. Assim, em pesquisas<br />
anteriores (SAMPAIO, 2007) já havia si<strong>do</strong> identificada<br />
a priorização de um caráter biomédico de<br />
atenção, em detrimento das ações de promoção<br />
de saúde e práticas que visem o empoderamento<br />
<strong>do</strong>s jovens (PARKER, 2000).<br />
Esta formação tem como foco a <strong>do</strong>ença<br />
(e seus processos de detecção, tratamento<br />
e prevenção) (LUZ, 2005), não habilitan<strong>do</strong> os<br />
profissionais em tecnologias relacionais (MERHY,<br />
2002) que permitem o encontro com as pessoas<br />
e a produção coletiva de novos mo<strong>do</strong>s de gestão<br />
da vida, com vistas à promoção da saúde.<br />
Compreende-se, com isso, o fato <strong>do</strong>s profissionais<br />
relatarem que se sentiam desprepara<strong>do</strong>s<br />
para realizar atividades de educação sexual e<br />
que nunca haviam desenvolvi<strong>do</strong> ações de educação<br />
em saúde fora <strong>do</strong> modelo das palestras<br />
meramente informativas. Para os profissionais de<br />
enfermagem envolvi<strong>do</strong>s no projeto, as atividades<br />
deveriam ser pautadas em informes sobre DST,<br />
gravidez e méto<strong>do</strong>s contraceptivos, marcan<strong>do</strong><br />
o tecnicismo e a transmissão de informação<br />
(PAIVA, 2001) como forma de controle <strong>do</strong>s<br />
corpos, característico <strong>do</strong> perfil assistencialista e<br />
medicamentoso que ainda estrutura as ações de<br />
saúde (LIMA, 2007).<br />
Já os ACS apontaram a necessidade<br />
de ouvir os jovens para saber sobre suas reais<br />
demandas. Esta preocupação <strong>do</strong>s ACS pode ser<br />
interpretada a partir de duas leituras: Primeira,<br />
138<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
que os ACS envolvi<strong>do</strong>s no projeto são os mais<br />
afina<strong>do</strong>s com a proposta <strong>do</strong> mesmo, e assim,<br />
são os mais interessa<strong>do</strong>s na construção de novas<br />
práticas em saúde. O segun<strong>do</strong> aspecto que<br />
parece relevante é o engajamento de alguns<br />
desses atores em movimentos sociais, associação<br />
de mora<strong>do</strong>res e de mulheres. Pode-se supor que<br />
esta inserção social favoreça a valorização <strong>do</strong><br />
saber da comunidade, a legitimação <strong>do</strong> outro<br />
na cogestão da saúde e a construção coletiva<br />
de projetos comunitários.<br />
Este resulta<strong>do</strong> evidencia a importância<br />
<strong>do</strong>s ACS para o desenvolvimento de processos<br />
de cuida<strong>do</strong>. Neste senti<strong>do</strong>, aposta-se no<br />
seu reconhecimento como parte da equipe de<br />
saúde e não apenas como um “elo” entre ela e<br />
a comunidade. Em grande parte das equipes<br />
participantes <strong>do</strong> projeto, as agentes de saúde não<br />
discutiam casos, nem participavam das reuniões<br />
de equipe, restringin<strong>do</strong> seu papel ao contato com<br />
a comunidade e/ou apoio às ações de saúde na<br />
unidade, sob gerência das enfermeiras.<br />
Por fim, merece destaque no processo<br />
de gestão <strong>do</strong> trabalho nas unidades de saúde,<br />
a relação que os profissionais buscavam estabelecer<br />
com as equipes <strong>do</strong>s Núcleos de Apoio<br />
à Saúde da Família (NASF). Em 2008, a cidade<br />
de Juazeiro deu início à implantação <strong>do</strong>s NASF.<br />
Inicialmente, as ESF, assim como os próprios<br />
profissionais <strong>do</strong>s NASF e gestores, tinham como<br />
expectativa que tais núcleos funcionassem como<br />
unidades para o referenciamento <strong>do</strong>s casos mais<br />
complica<strong>do</strong>s que as ESF tivessem dificuldades de<br />
resolver (BASTOS; SAMPAIO, 2009), o que não<br />
condizia com a perspectiva de apoio matricial ao<br />
qual a proposta <strong>do</strong> NASF estava atrelada (CAM-<br />
POS, 2007b). Com isso, para as ESF de Juazeiro,<br />
os NASF deveriam desenvolver, dentre outras, as<br />
atividades educativas com os a<strong>do</strong>lescentes, o que<br />
denota a intenção de uma desresponsabilização<br />
pelo desenvolvimento de tais ações.<br />
A partir <strong>do</strong> exposto, conclui-se<br />
que para a construção de novos mo<strong>do</strong>s de cuida<strong>do</strong>,<br />
que trabalhem na perspectiva da integralidade<br />
e interdisciplinaridade, construin<strong>do</strong> redes<br />
de atenção, em parceria com diversos atores, é<br />
importante desenvolver processos de educação<br />
permanente (CECCIM, 2005) que contribuam<br />
com a reconstrução <strong>do</strong> perfil <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res<br />
em saúde, buscan<strong>do</strong> romper com o tradicional<br />
modelo de atenção centra<strong>do</strong> na especialidade<br />
clínica, que põe em foco a <strong>do</strong>ença e que normatiza<br />
e compartimentaliza o sujeito, que não<br />
participa da gestão de sua saúde.<br />
A desarticulação de redes: uma realidade<br />
cristalizada<br />
Após a apresentação e pactuação da<br />
proposta com as equipes de saúde, foi inicia<strong>do</strong><br />
o processo de construção de redes de apoio<br />
para a realização das rodas de conversas. A<br />
necessidade de buscar parcerias surgiu por vários<br />
motivos: O primeiro pela própria aposta da<br />
Estratégia de Saúde da Família em trabalhar no<br />
território, articulan<strong>do</strong> seus diversos dispositivos<br />
para a integralidade das ações. O território é<br />
aqui entendi<strong>do</strong> não apenas como um espaço<br />
físico, mas uma rede de relações e processos de<br />
subjetivações, nas quais a realidade e os sujeitos<br />
são forja<strong>do</strong>s e onde se operam as relações sociais<br />
e de cuida<strong>do</strong>.<br />
O segun<strong>do</strong> motivo deve-se ao precário<br />
vínculo estabeleci<strong>do</strong> entre as equipes de saúde e<br />
os a<strong>do</strong>lescentes de sua área adscrita. O vínculo<br />
é uma relação afetiva que permite a confiança<br />
entre profissional de saúde e usuário (CAMPOS,<br />
G. W. S., 2003). Ele se opera quan<strong>do</strong> o usuário<br />
credita ao profissional de saúde sua demanda de<br />
cuida<strong>do</strong>, e este reconhece no usuário a capacidade<br />
de gerir sua vida da melhor forma possível.<br />
Só a partir desse reconhecimento mútuo é<br />
possível estabelecer uma comunicação legítima<br />
entre os atores, que possibilite a cogestão <strong>do</strong><br />
cuida<strong>do</strong>. Entretanto, na experiência relatada, o<br />
profissional de saúde percebe os a<strong>do</strong>lescentes<br />
139
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
como irresponsáveis e inconsequentes, sen<strong>do</strong><br />
necessária sua tutela. Em contrapartida, os a<strong>do</strong>lescentes<br />
não confiam na equipe de saúde, por<br />
não desejarem sua tutela. Assim, os a<strong>do</strong>lescentes<br />
não atenderam ao convite da equipe de saúde<br />
para participar das rodas de conversas que eram<br />
propostas pelo presente projeto.<br />
As parcerias locais foram também importantes<br />
para o desenvolvimento <strong>do</strong>s grupos,<br />
pois em várias unidades de saúde não havia<br />
espaço físico adequa<strong>do</strong> para a realização <strong>do</strong>s<br />
encontros. Na realidade das cidades estudadas,<br />
as unidades de saúde encontravam-se em<br />
precárias condições, com esgoto a céu aberto,<br />
instalações sucateadas, inundações em época de<br />
chuva, não disponibilidade de banheiros para a<br />
população, sem salas para grupos, nem materiais<br />
e equipamentos necessários para a efetivação de<br />
ações de educação em saúde.<br />
Mesmo assim, foi observada certa<br />
resistência <strong>do</strong>s profissionais em sair <strong>do</strong> seu<br />
território institucional. Mesmo compreenden<strong>do</strong><br />
que a construção dessas redes sociais facilitaria<br />
o desenvolvimento das atividades e viabilizaria<br />
a formação <strong>do</strong> vínculo entre os a<strong>do</strong>lescentes e<br />
unidade, sen<strong>do</strong> uma ferramenta a mais nas atividades<br />
de promoção da saúde (VALLA, 2009), os<br />
profissionais acreditavam ser menos trabalhoso<br />
fazer as rodas sozinhos.<br />
Esta resistência se concretizava no desenvolvimento<br />
das ações de saúde desarticuladas<br />
das demais atividades existentes no território,<br />
sem conseguir implementar a intersetorialidade.<br />
Partin<strong>do</strong> da compreensão de que os problemas<br />
de saúde ultrapassam questões biológicas, e se<br />
constituem nos mo<strong>do</strong>s de vida das pessoas, o<br />
cuida<strong>do</strong> em saúde não é possível ocorrer limita<strong>do</strong><br />
ao seu setor. É preciso formar parcerias,<br />
no senti<strong>do</strong> de promover ações que articulem<br />
educação, lazer, cultura, religiosidade, assistência<br />
social, mobilização política etc; Portanto, para<br />
oferecer uma atenção de fato integral, é necessário<br />
que o serviço de saúde seja capaz de acionar<br />
os diversos dispositivos sociais da comunidade<br />
(CAMPOS, C. E. A., 2003).<br />
As redes de colaboração ampliam o escopo<br />
da ação, potencializan<strong>do</strong> os investimentos<br />
(físicos, financeiros, políticos, sociais, afetivos<br />
e relacionais) emprega<strong>do</strong>s (MARTINS, 2004).<br />
Por isso, frente às dificuldades de contatar os<br />
a<strong>do</strong>lescentes e de realizar atividades de grupo<br />
nas unidades, foi possível ir ao encontro <strong>do</strong>s<br />
possíveis parceiros. Mas no que se refere à afirmação<br />
de parcerias com os dispositivos sociais<br />
locais, é importante salientar que as ESF não<br />
mantinham nenhum tipo de comunicação com<br />
outros equipamentos sociais da comunidade<br />
(escola, igreja, liderança comunitária, CRAS, e<br />
outros), muitas vezes nem mesmo conhecen<strong>do</strong><br />
os profissionais que trabalham no seu território.<br />
Na verdade, a dificuldade em estabelecer redes<br />
de atenção não era exclusiva <strong>do</strong>s profissionais<br />
de saúde. As demais instituições sociais também<br />
atuavam de maneira isolada e restrita a sua área<br />
de intervenção.<br />
Assim, quan<strong>do</strong> convoca<strong>do</strong>s os representantes<br />
<strong>do</strong>s diversos equipamentos sociais das<br />
comunidades para a pactuação da proposta de<br />
trabalho, muitos não compareceram às reuniões<br />
ou se mostraram resistentes em executar ações<br />
em conjunto. Na maioria das vezes, os possíveis<br />
parceiros se mostraram interessa<strong>do</strong>s no projeto,<br />
mas esperavam que o mesmo fosse executa<strong>do</strong><br />
pelo serviço de saúde e pela universidade, sem<br />
querer se implicar no processo. Como resulta<strong>do</strong>,<br />
na maioria das escolas trabalhadas, houve<br />
apenas a concessão <strong>do</strong> espaço e <strong>do</strong> acesso aos<br />
a<strong>do</strong>lescentes, não haven<strong>do</strong> nenhum profissional<br />
<strong>do</strong> serviço interessan<strong>do</strong> em participar das rodas,<br />
nem mesmo através <strong>do</strong> desenvolvimento de alguma<br />
atividade escolar articulada com o projeto.<br />
No caso <strong>do</strong> CRAS, ficou ainda evidente<br />
o interesse <strong>do</strong>s coordena<strong>do</strong>res <strong>do</strong> serviço em<br />
permitir o desenvolvimento das rodas, pois assim<br />
ampliariam as atividades que precisam diariamente<br />
oferecer aos a<strong>do</strong>lescentes. Mesmo desta<br />
forma utilitária, foi possível estabelecer algum<br />
140<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 133-142, jul./dez. 2010. Editora UFPR
SAMPAIO, J. et al. Desafios para reorganização <strong>do</strong> processo de trabalho e articulação de redes na atenção à saúde...<br />
tipo de comunicação entre os profissionais de<br />
saúde e demais atores sociais que operam no<br />
território. O processo, apesar de árduo, permitiu<br />
que os ACS passassem a desenvolver atividades<br />
dentro de outras instituições (escolas e CRAS),<br />
sen<strong>do</strong> reconheci<strong>do</strong>s e legitima<strong>do</strong>s em seu trabalho.<br />
Assim, foi possível começar um processo de<br />
encontro entre as instituições e seus atores, com<br />
a proposição paulatina de novas modalidades<br />
de cuida<strong>do</strong> centradas em processos coletivos e<br />
dialógicos.<br />
diante de todas as dificuldades, as alunas se<br />
comprometeram a somar esforços para realizar<br />
as atividades programadas, concluí-las a tempo<br />
e com qualidade, possibilitan<strong>do</strong> o fortalecimento<br />
<strong>do</strong> vínculo entre a<strong>do</strong>lescentes e profissionais,<br />
bem como a manutenção das ações, mesmo<br />
após a finalização <strong>do</strong> projeto, dan<strong>do</strong> sustentabilidade<br />
ao mesmo.<br />
REFERÊNCIAS<br />
Conclusão<br />
É possível concluir que apesar das diversidades,<br />
foi possível obter a participação e/ou<br />
aceitação <strong>do</strong>s profissionais de saúde e a adesão<br />
<strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes da comunidade para o desenvolvimento<br />
das rodas de conversas. Isto para<br />
um projeto que objetiva qualificar as ações de<br />
saúde sexual da atenção básica é muito importante.<br />
Além disso, deu-se o primeiro passo para<br />
formação de redes colaborativas no território.<br />
Deste mo<strong>do</strong>, o presente estu<strong>do</strong>, ao<br />
problematizar a implantação dessas ações, põe<br />
em destaque diversos desafios para gestores<br />
e profissionais de saúde. Estes precisam ser<br />
postos em pauta para que saídas, construídas<br />
no cotidiano das práticas de saúde e de forma<br />
colegiada, possam ser encontradas de forma<br />
criativa e solidária.<br />
Por fim, a proposta meto<strong>do</strong>lógica da<br />
pesquisa-ação, que favorece o intercâmbio entre<br />
a extensão e a pesquisa, tem se mostra<strong>do</strong> uma<br />
importante ferramenta acadêmica no senti<strong>do</strong><br />
de produzir conhecimento a partir <strong>do</strong> desenvolvimento<br />
de práticas sociais politicamente<br />
comprometidas. Esta experiência permitiu o<br />
contato das extensionistas com a realidade sanitária<br />
<strong>do</strong> município, desenvolven<strong>do</strong> habilidades<br />
técnico–meto<strong>do</strong>lógicas no âmbito da articulação<br />
ensino-serviço, com compromisso social. Mesmo<br />
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22-setembro 2005. Disponível em:
Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A<br />
Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
Youth and Adult Literacy in Agrarian Reform – The Experience at the<br />
Brazilian state of Minas Gerais' Northwestern region<br />
La alfabetización de jóvenes y adultos en la Reforma Agraria – La<br />
experiencia en el Noroeste del Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais, Brasil<br />
Ana Lucia Ferreira Faria 1<br />
Etelvina Maria Valente <strong>do</strong>s Anjos Silva 2<br />
Elenice Rosa Costa 3<br />
RESUMO<br />
Em nosso país, existem milhares de adultos no campo que, por diversos motivos, não tiveram acesso à<br />
educação. Consideran<strong>do</strong> que a educação se constitui um direito social, muitos programas governamentais<br />
vêm surgin<strong>do</strong>, a exemplo, o PRONERA (Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária). No perío<strong>do</strong><br />
de 2006 a 2007 foi estabeleci<strong>do</strong> um convênio da UFV (<strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa) em parceria com<br />
o PRONERA/INCRA/FETAEMG, com o objetivo de alfabetizar 1.976 adultos assenta<strong>do</strong>s e acampa<strong>do</strong>s, na<br />
região Noroeste de Minas Gerais. Neste contexto, o presente trabalho teve por objetivo relatar a experiência<br />
da UFV, no que se refere ao desenvolvimento <strong>do</strong> Projeto: “A Educação em Movimento: Interagir e Aprender<br />
em Busca da Cidadania” Neste contexto o estu<strong>do</strong> em questão apoiou-se em pesquisa bibliográfica e<br />
análises de <strong>do</strong>cumentos. Ao final <strong>do</strong> Projeto além da UFV ter cumpri<strong>do</strong> com seu papel social, os universitários<br />
tiveram complementação em sua formação acadêmica, na área da Educação de Jovens e Adultos,<br />
aos jovens e adultos assenta<strong>do</strong>s da região Noroeste de Minas, foi oferecida a oportunidade e a garantia <strong>do</strong><br />
direito de alfabetizar-se.<br />
Palavras-chave: PRONERA; alfabetização de jovens e adultos; formação de educa<strong>do</strong>res de jovens e adultos.<br />
ABSTRACT<br />
In our country there are thousands of adults in the field that, for various reasons, had no access to education.<br />
Whereas education is a social right is, many government programs have emerged, like the PRONERA<br />
(Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária). In the period 2006 to 2007 was an agreement of<br />
UFV (<strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Viçosa) in partnership with PRONERA / INCRA / FETAEMG, with the goal<br />
of adult literacy 1976 settlers and camped in the northwest region of Minas Gerais. In this context, this<br />
paper aimed to report the experience of the UFV, regarding the development of the Project: “Education in<br />
Motion: Learning and Interacting in Search of Citizenship” In this context the study in question was based<br />
on literature search and analysis of <strong>do</strong>cuments. At the end of the project beyond the UFV has complied<br />
with its social role, the university had to supplement their academic training in the area of adult and youth<br />
education, young adults and settlers in the region northwest of Minas, was offered the opportunity and the<br />
assurance of right to literacy itself.<br />
Keywords: PRONERA; the Youth and Adult Literacy; training of educators of young people and adults.<br />
1 Graduada em Pedagogia/UFV, Endereço: Rua Jorge Ramos nº. 156, Bairro: Santo Antonio, Cidade: Viçosa, Esta<strong>do</strong>: MG, CEP:<br />
36570-000, Tel: (31) 87696640, E-mail: analucia@ufv.br<br />
2 Professora/UFV<br />
3 Graduada em Pedagogia/UFV<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
143
FARIA, A. L. F. et al. Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
RESUMEN<br />
En nuestro país hay miles de adultos en el<br />
campo que, por diversas razones, no tienen<br />
acceso a la educación. Consideran<strong>do</strong> que<br />
la educación es un derecho social, es decir,<br />
muchos programas de gobierno han surgi<strong>do</strong>,<br />
al igual que el PRONERA (Programa Nacional<br />
de Educação na Reforma Agrária). En el perío<strong>do</strong><br />
comprendi<strong>do</strong> entre 2006 y 2007 fue un<br />
acuer<strong>do</strong> de la UFV (<strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de<br />
Viçosa), en asociación con PRONERA/ INCRA<br />
/ FETAEMG, con el objetivo de la alfabetización<br />
de adultos y 1.976 colonos acamparon<br />
en la región noroeste de Minas Gerais. En este<br />
contexto, este <strong>do</strong>cumento de reflexión para<br />
que informe la experiencia de la UFV, en relación<br />
con el desarrollo del Proyecto: “Educación<br />
en Movimiento: Interacción y aprendizaje en<br />
busca de la ciudadanía” En este contexto, el<br />
estudio en cuestión se basó en la literatura de<br />
búsqueda y análisis de <strong>do</strong>cumentos. Al final<br />
del proyecto más allá de la UFV ha cumpli<strong>do</strong><br />
con su papel social, la universidad tuvo que<br />
completar su formación académica en el área<br />
de educación de adultos y la educación de<br />
los jóvenes, los adultos jóvenes y los colonos<br />
en la región noroeste de Minas, se le ofreció<br />
la oportunidad y la garantía de derecho a la<br />
alfabetización propiamente dicha.<br />
Palabras-clave: PRONERA; la Juventud y de<br />
alfabetización de adultos; la formación de<br />
educa<strong>do</strong>res de jóvenes y adultos.<br />
constatou a necessidade de um projeto de<br />
alfabetização, já que, nesse perío<strong>do</strong>, 30% <strong>do</strong>s<br />
funcionários da instituição eram analfabetos.<br />
Atualmente, a UFV conta com o Núcleo de Educação<br />
de Adultos (NEAd), que atende cerca de<br />
140 adultos ao ano, ten<strong>do</strong> como educa<strong>do</strong>res os<br />
estudantes <strong>do</strong>s cursos de licenciaturas da UFV,<br />
sob a coordenação de professores <strong>do</strong> Departamento<br />
de Educação.<br />
A partir de experiências nesta área, a<br />
UFV se tornou parceira de outros programas de<br />
Educação de Jovens e Adultos (EJA), tais como<br />
o Programa Alfabetização Solidária (ALFASOL),<br />
o Programa Brasil Alfabetiza<strong>do</strong> e o Programa<br />
Nacional de Educação na Reforma Agrária<br />
(PRONERA), ten<strong>do</strong> como objetivo a formação<br />
de educa<strong>do</strong>res para atuar no campo da EJA.<br />
Neste contexto, o presente trabalho<br />
tem por objetivo relatar a experiência da UFV<br />
ao desenvolver o Projeto “A Educação em<br />
Movimento: Interagir e Aprender em Busca da<br />
Cidadania”, desenvolvi<strong>do</strong> na região Noroeste de<br />
Minas Gerais, no perío<strong>do</strong> de 2006 a 2007, em<br />
parceria com o PRONERA/INCRA/FETAEMG/<br />
UFV. Especificamente, conhecer o processo de<br />
realização <strong>do</strong> Projeto em questão.<br />
Introdução e Objetivo<br />
Em nosso país existem milhares de<br />
adultos no campo, que por diversos motivos não<br />
tiveram acesso à educação. Levan<strong>do</strong>-se em consideração<br />
de que a educação se constitui em um<br />
direito social, muitos programas governamentais<br />
vêm surgin<strong>do</strong> com o intuito de diminuir esse quadro,<br />
como, por exemplo, o Programa Nacional<br />
de Educação na Reforma Agrária (PRONERA)<br />
que busca elevar o nível de escolaridade da<br />
população <strong>do</strong> campo com qualidade.<br />
A experiência da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong><br />
de Viçosa (UFV) na área de educação de adultos<br />
iniciou em 1987, por iniciativa da Associação<br />
<strong>do</strong>s Servi<strong>do</strong>res Administrativos – ASAV –, que<br />
144<br />
Meto<strong>do</strong>logia<br />
Por meio de uma pesquisa bibliográfica<br />
procurou-se conhecer algumas políticas públicas<br />
que surgiram voltadas para a EJA e o funcionamento<br />
<strong>do</strong> PRONERA, bem como sua história<br />
de criação. A realização da pesquisa diagnóstica<br />
foi com base em Cervo (2002), uma vez que,<br />
segun<strong>do</strong> ele há diversas formas de pesquisar,<br />
citan<strong>do</strong>, como exemplo, estu<strong>do</strong> de caso, pesquisa<br />
de opinião, de motivação e a <strong>do</strong>cumental. Em<br />
ambas as formas trabalha-se com da<strong>do</strong>s ou fatos<br />
colhi<strong>do</strong>s da própria realidade.<br />
Para tanto, utilizou-se da pesquisa<br />
descritiva <strong>do</strong>cumental, buscan<strong>do</strong> conhecer os<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR
FARIA, A. L. F. et al. Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
registros, analisá-los, correlacioná-los e descrever<br />
fatos sobre o desenvolvimento <strong>do</strong> Projeto,<br />
os quais se encontram nos arquivos <strong>do</strong> NEAd.<br />
O PRONERA como parte da história da<br />
EJA<br />
Segun<strong>do</strong> Cunha (1999, p. 9) 4 , a denominação<br />
“educação de jovens e adultos” é<br />
recente no país. No perío<strong>do</strong> Brasil Colônia, a<br />
educação para a população não infantil possuía<br />
um caráter mais religioso <strong>do</strong> que educacional.<br />
Nessa época, pode-se constatar uma fragilidade<br />
da educação, pois ela não era considerada a<br />
responsável pelo aumento da produtividade, o<br />
que acabava por acarretar descaso por parte <strong>do</strong>s<br />
dirigentes <strong>do</strong> país.<br />
No Brasil Império, algumas reformas<br />
educacionais reconheciam a necessidade de<br />
haver classes noturnas de ensino elementar para<br />
os adultos analfabetos. Em 1876, foi constata<strong>do</strong>,<br />
através de um relatório elabora<strong>do</strong> pelo então<br />
ministro José Bento da Cunha Figueire<strong>do</strong>, a difusão<br />
na época <strong>do</strong> ensino noturno para adultos,<br />
existin<strong>do</strong> 200 mil alunos frequenta<strong>do</strong>res de aulas<br />
noturnas. As escolas noturnas, portanto, durante<br />
muito tempo, foram a única forma de oferecimento<br />
de educação de adultos em nosso país.<br />
Cunha (1999, p. 10) ressalta que o<br />
desenvolvimento industrial brasileiro contribuiu<br />
para a valorização da educação de adultos sob<br />
pontos de vista diferentes, quais sejam: a valorização<br />
<strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio da língua falada e escrita,<br />
visan<strong>do</strong> o <strong>do</strong>mínio das técnicas de produção; a<br />
aquisição da leitura e da escrita como instrumento<br />
da ascensão social; a alfabetização de adultos<br />
vista como meio de progresso <strong>do</strong> país e como<br />
ampliação da base de votos. Após detectar os<br />
altos índices de analfabetismo, em 1940, o Go-<br />
4 CUNHA, Conceição Maria da. Introdução – discutin<strong>do</strong> conceitos<br />
básicos. In: SEED-MEC. Salto para o futuro – Educação de<br />
jovens e adultos. Brasília, 1999.<br />
verno criou um fun<strong>do</strong> destina<strong>do</strong> à alfabetização<br />
e à educação da população adulta analfabeta.<br />
Segun<strong>do</strong> Soares (1996, p. 29) 5 , a<br />
Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização<br />
das Nações Unidas para a Educação,<br />
Ciência e Cultura (UNESCO) solicitaram aos<br />
países integrantes, dentre eles o Brasil, que investissem<br />
em campanhas de massa para educar<br />
os adultos analfabetos. Sofren<strong>do</strong> forte pressão<br />
destas organizações internacionais, o Governo<br />
lançou, então, a Primeira Campanha Nacional<br />
de Educação de Adultos, em 1947, sen<strong>do</strong> esta<br />
a primeira iniciativa pública visan<strong>do</strong> o atendimento<br />
de adultos. Essa campanha criou 10 mil<br />
classes de ensino supletivo em to<strong>do</strong> o país.<br />
Nessa época, o analfabetismo era<br />
visto como causa <strong>do</strong> baixo desenvolvimento<br />
brasileiro e o adulto analfabeto era identifica<strong>do</strong><br />
como elemento incapaz e marginal, psicológica<br />
e socialmente, sen<strong>do</strong> submeti<strong>do</strong> à menoridade<br />
econômica, política e jurídica, não poden<strong>do</strong><br />
votar ou ser vota<strong>do</strong>.<br />
Para Soares (1996, p. 29), essa Primeira<br />
Campanha foi lançada por <strong>do</strong>is motivos:<br />
o primeiro era o momento pós-guerra, que fez<br />
com que a ONU fizesse uma série de recomendações<br />
aos países, entre as quais a de darem um<br />
olhar específico para a educação de adultos. O<br />
segun<strong>do</strong> motivo foi o fim <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Novo, que<br />
trazia um processo de redemocratização que gerava<br />
a necessidade de ampliação <strong>do</strong> contingente<br />
de eleitores no país. No momento em que se<br />
lançava a Primeira Campanha Nacional de Educação<br />
de Adultos, estava sen<strong>do</strong> organiza<strong>do</strong> pela<br />
Associação <strong>do</strong>s Professores <strong>do</strong> Ensino Noturno<br />
e pelo Departamento de Educação, o Primeiro<br />
Congresso Nacional de Educação de Adultos. O<br />
Ministério, então, convocou <strong>do</strong>is representantes<br />
de cada Esta<strong>do</strong> para participarem <strong>do</strong> Congresso.<br />
O Serviço de Educação de Adultos (SEA) <strong>do</strong> Ministério<br />
da Educação e Cultura (MEC) elaborou e<br />
5 SOARES, Leôncio José Gomes. A educação de jovens e<br />
adultos: momentos históricos e desafios atuais. Revista Presença<br />
Pedagógica, v. 2, n. 11, Dimensão, set./out. 1996.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
145
FARIA, A. L. F. et al. Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
enviou para discussões, aos SEAs estaduais, um<br />
conjunto de publicações sobre o tema.<br />
De acor<strong>do</strong> com Soares (1996, p. 30),<br />
as concepções presentes nessas publicações<br />
eram: o investimento na educação como solução<br />
para os problemas da sociedade; o alfabetiza<strong>do</strong>r<br />
identifica<strong>do</strong> como missionário; o analfabeto visto<br />
como causa da pobreza; o ensino de adultos<br />
como tarefa fácil; assim sen<strong>do</strong>, não existia a necessidade<br />
de formação específica e remuneração,<br />
ocorren<strong>do</strong> a valorização <strong>do</strong> “voluntaria<strong>do</strong>”. A<br />
partir daí, iniciou-se um processo de mobilização<br />
nacional no senti<strong>do</strong> de se discutir a educação de<br />
jovens e adultos no país.<br />
De certa forma, embora a Campanha<br />
não tenha alcança<strong>do</strong> grande sucesso, conseguiu<br />
alguns bons resulta<strong>do</strong>s no que se refere à visão<br />
preconceituosa, que foi sen<strong>do</strong> superada a partir<br />
das discussões que foram ocorren<strong>do</strong> sobre o<br />
processo de educação de adultos. Com o surgimento<br />
de diversas pesquisas desenvolvidas<br />
e algumas teorias mais recentes da psicologia,<br />
gradativamente foi sen<strong>do</strong> desmentida a ideia<br />
de incapacidade de aprendizagem <strong>do</strong> educan<strong>do</strong><br />
adulto.<br />
Diante <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s insatisfatórios da<br />
Campanha, o Ministério da Educação convocou,<br />
em 1958, o 2º Congresso Nacional de Educação<br />
de Adultos. Nesse evento, sobressaiu-se a figura<br />
<strong>do</strong> educa<strong>do</strong>r Paulo Freire, que propôs uma maior<br />
comunicação entre o educa<strong>do</strong>r e o educan<strong>do</strong> e<br />
uma adequação <strong>do</strong> méto<strong>do</strong> de alfabetização às<br />
características das classes populares.<br />
No final <strong>do</strong>s anos 50 e início <strong>do</strong>s<br />
anos 60, ocorreu uma intensa mobilização da<br />
sociedade civil em torno das reformas de base,<br />
contribuin<strong>do</strong> para a mudança nas iniciativas<br />
públicas de educação de adultos.<br />
Segun<strong>do</strong> Soares (1996, p. 31), em<br />
1963 o Ministério da Educação extinguiu a<br />
Campanha Nacional de Educação de Adultos<br />
e encarregou Paulo Freire de se empenhar na<br />
elaboração de um Programa Nacional de Alfabetização.<br />
Surgiu, então, uma nova visão sobre a<br />
alfabetização e o analfabetismo, antes aponta<strong>do</strong><br />
como causa da pobreza e da marginalização,<br />
passou a ser interpreta<strong>do</strong> como efeito da pobreza<br />
gerada por uma estrutura social não igualitária.<br />
Na percepção de Paulo Freire, educação<br />
e alfabetização estão muito próximas. A<br />
alfabetização é mais que o <strong>do</strong>mínio mecânico de<br />
técnicas para escrever e ler, é o <strong>do</strong>mínio dessas<br />
técnicas em termos conscientes, resultan<strong>do</strong> numa<br />
postura atuante <strong>do</strong> homem sobre o seu contexto.<br />
Em 1964, com o Golpe Militar, a conscientização<br />
proposta por Freire passou a ser vista<br />
como ameaça à ordem instalada e Freire foi<br />
exila<strong>do</strong>. De acor<strong>do</strong> com Cunha (1999, p. 12),<br />
o Governo passou, então, a permitir apenas a<br />
realização de programas de alfabetização de<br />
adultos de caráter assistencialista e conserva<strong>do</strong>r.<br />
Dentro desse contexto, em 1967, o<br />
Governo assumiu o controle da alfabetização<br />
de adultos, com a criação <strong>do</strong> Movimento Brasileiro<br />
de Alfabetização (MOBRAL), volta<strong>do</strong> para<br />
a população de 15 a 30 anos, objetivan<strong>do</strong> a<br />
alfabetização funcional, não desenvolven<strong>do</strong> uma<br />
alfabetização crítica. Com isso, as orientações<br />
meto<strong>do</strong>lógicas e os materiais didáticos esvaziaram-se<br />
de to<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> crítico e problematiza<strong>do</strong>r<br />
proposto anteriormente por Freire.<br />
Na década de 70, ocorreu a expansão<br />
<strong>do</strong> MOBRAL e, paralelamente, alguns grupos<br />
que atuavam na educação popular continuaram<br />
a alfabetização de adultos dentro de uma linha<br />
mais criativa.<br />
Através da Lei de Diretrizes e Bases da<br />
Educação, LDB 5692/71, implantou-se o Ensino<br />
Supletivo, sen<strong>do</strong> dedica<strong>do</strong> pela primeira vez na<br />
história das legislações educacionais um capítulo<br />
específico para a EJA. Esta lei limitou o dever<br />
<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> à faixa etária <strong>do</strong>s 7 aos 14 anos, mas<br />
reconheceu a educação de adultos como um<br />
direito de cidadania, o que pode ser considera<strong>do</strong><br />
um avanço para a área da EJA no país.<br />
Assim, segun<strong>do</strong> Soares (1996, p. 32),<br />
em 1974 o MEC implantou os Centros de Estu<strong>do</strong>s<br />
Supletivos (CES), considera<strong>do</strong>s a solução<br />
146<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR
FARIA, A. L. F. et al. Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
mais viável para a educação de jovens e adultos,<br />
de mo<strong>do</strong> a atender ao mesmo tempo ao trinômio<br />
tempo, custo e efetividade. A implantação<br />
<strong>do</strong>s CES nos esta<strong>do</strong>s ocorreu num perío<strong>do</strong> de<br />
intenso intercâmbio entre o MEC com a USAID<br />
e, devi<strong>do</strong> a isso, os cursos foram influencia<strong>do</strong>s<br />
pelo tecnicismo, a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong>-se os módulos instrucionais,<br />
visan<strong>do</strong> ao atendimento individualiza<strong>do</strong>,<br />
à autoinstrução e a arguição em duas etapas.<br />
Como consequências, ocorreram eleva<strong>do</strong>s índices<br />
de evasão, o individualismo, o pragmatismo<br />
e a certificação rápida e superficial.<br />
Em 1985, com a República, criou-se<br />
a Fundação EDUCAR, que veio substituir o<br />
MOBRAL. Esta Fundação se responsabilizou<br />
por apoiar financeiramente e tecnicamente as<br />
iniciativas <strong>do</strong> Governo, das entidades civis e<br />
das empresas a ela conveniada. A Constituição<br />
de 1988 ampliou o dever <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> com a educação<br />
de jovens e adultos, garantin<strong>do</strong> o ensino<br />
fundamental obrigatório e gratuito.<br />
Segun<strong>do</strong> Cunha (1999, p. 15), o desafio<br />
da EJA nos anos 90 foi o estabelecimento de<br />
uma política e de meto<strong>do</strong>logias criativas, para<br />
garantir o acesso à cultura letrada, possibilitan<strong>do</strong><br />
uma participação mais ativa no universo profissional,<br />
político e cultural.<br />
Internacionalmente, a UNESCO reconheceu<br />
a importância da EJA para o fortalecimento<br />
da cidadania, e passou a promover conferências<br />
internacionais, o que vem influencian<strong>do</strong><br />
positivamente as iniciativas desta modalidade<br />
no Brasil.<br />
A partir da V CONFINTEA (Conferência<br />
Internacional de Educação de Adultos), realizada<br />
em 1995, na Alemanha, encontro no qual<br />
estavam presentes 170 representantes de vários<br />
países, foi formulada a Agenda para o Futuro da<br />
Educação de Jovens e Adultos. A partir desse<br />
encontro, o Governo passou a criar programas<br />
visan<strong>do</strong> a Educação de Jovens e Adultos e dentre<br />
essas iniciativas surgiu o Programa Nacional de<br />
Educação na Reforma Agrária (PRONERA).<br />
O PRONERA surgiu em 1998, através<br />
da luta <strong>do</strong>s movimentos sociais e sindicais de<br />
trabalha<strong>do</strong>res rurais pelo direito à educação<br />
com qualidade. O programa é uma política <strong>do</strong><br />
Governo <strong>Federal</strong>, executada pelo Instituto Nacional<br />
de Colonização e Reforma Agrária (INCRA),<br />
no âmbito <strong>do</strong> Ministério <strong>do</strong> Desenvolvimento<br />
Agrário (MDA).<br />
De acor<strong>do</strong> com Haddad e Di Pierro<br />
(2000, p. 124), o PRONERA guarda a singularidade<br />
de ser um programa <strong>do</strong> Governo <strong>Federal</strong><br />
gesta<strong>do</strong> fora da arena governamental: uma<br />
articulação <strong>do</strong> Conselho de Reitores das <strong>Universidade</strong>s<br />
Brasileiras (CRUB) com o MST foi capaz<br />
de introduzir uma proposta de política pública<br />
de educação de jovens e adultos no meio rural<br />
no âmbito das ações governamentais da reforma<br />
agrária. Coordena<strong>do</strong> pelo INCRA, vincula<strong>do</strong> ao<br />
Ministério Extraordinário da Política Fundiária<br />
(MEPF), o Programa foi delinea<strong>do</strong> em 1997 e<br />
operacionaliza<strong>do</strong> a partir de 1998.<br />
Dentre as inovações introduzidas pelo<br />
PRONERA, pode-se destacar a parceria entre<br />
o Governo <strong>Federal</strong>, responsável pelo financiamento,<br />
as instituições de ensino superior,<br />
responsáveis pela formação <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res<br />
e os movimentos sociais e sindicais de trabalha<strong>do</strong>res<br />
rurais, responsáveis pela mobilização<br />
de educan<strong>do</strong>s e educa<strong>do</strong>res. Já as secretarias<br />
estaduais ou municipais de educação e também<br />
os movimentos sociais são responsáveis pela<br />
infraestrutura necessária ao bom funcionamento<br />
de to<strong>do</strong> o trabalho.<br />
O PRONERA tem como um de<br />
seus objetivos promover ações educativas<br />
nos assentamentos da reforma agrária, com<br />
meto<strong>do</strong>logias de ensino específicas à realidade<br />
sociocultural <strong>do</strong> campo, tornan<strong>do</strong>-se um<br />
instrumento de democratização <strong>do</strong> conhecimento<br />
<strong>do</strong> campo. De acor<strong>do</strong> com Andrade e Di Pierro<br />
(2004, p. 29.), as metas específicas <strong>do</strong> PRO-<br />
NERA são: reduzir as taxas de analfabetismo<br />
e elevar o nível de escolarização da população<br />
nos assentamentos, promoven<strong>do</strong> a habilitação<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
147
FARIA, A. L. F. et al. Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
de professores nos níveis médio e superior, bem<br />
como a formação técnico-profissional <strong>do</strong>s jovens<br />
e adultos, com foco nas áreas de produção<br />
agropecuária e administração rural. Também<br />
compõe o escopo <strong>do</strong> Programa a produção de<br />
materiais didático-pedagógicos subsidiários às<br />
ações educativas.<br />
O público alvo desta iniciativa educacional<br />
são jovens e adultos <strong>do</strong>s projetos de assentamentos<br />
cria<strong>do</strong>s pelo INCRA ou por órgãos<br />
estaduais de terras, desde que exista parceria<br />
formal entre o INCRA e esses órgãos. No caso<br />
da EJA, nas modalidades de alfabetização e escolaridade/ensino<br />
fundamental, também podem<br />
participar to<strong>do</strong>s os trabalha<strong>do</strong>res acampa<strong>do</strong>s e<br />
cadastra<strong>do</strong>s pelo INCRA.<br />
O Programa se desenvolve por meio<br />
de projetos específicos em to<strong>do</strong>s os níveis de<br />
ensino, ten<strong>do</strong> por base a diversidade cultural<br />
e socioterritorial, os processos de interação e<br />
transformação <strong>do</strong> campo, a gestão democrática<br />
e o avanço científico e tecnológico.<br />
A Inserção da UFV no Projeto “A Educação<br />
em Movimento: Interagir e Aprender<br />
em Busca da Cidadania”<br />
Em consonância com os objetivos<br />
<strong>do</strong> PRONERA, em parceria com o INCRA e a<br />
Federação <strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>res na Agricultura <strong>do</strong><br />
Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais (FETAEMG), a UFV,<br />
através <strong>do</strong> Departamento de Educação e <strong>do</strong><br />
NEAd, desenvolveu o projeto “A Educação em<br />
Movimento: Interagir e Aprender em Busca da<br />
Cidadania”. Este projeto teve como objetivo<br />
“fortalecer a educação de jovens e adultos nos<br />
Projetos de Assentamentos da Reforma Agrária,<br />
de forma a estimular, propor, criar, desenvolver<br />
e coordenar ações educacionais, que visa o<br />
aprimoramento de inclusão social <strong>do</strong> país” 6 . Es-<br />
6 Documento Elabora<strong>do</strong> pela Equipe Coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Projeto<br />
“Educação em Movimento: Interagir e Apreender em Busca da<br />
Cidadania”, junho 2005.<br />
148<br />
pecificamente, objetivou-se alfabetizar jovens e<br />
adultos, visan<strong>do</strong> estimulá-los a exercer de forma<br />
efetiva a sua cidadania, oferecen<strong>do</strong> cursos de alfabetização,<br />
de forma a atender as necessidades<br />
daqueles educan<strong>do</strong>s.<br />
Além disso, proporcionar a formação<br />
continuada para os educa<strong>do</strong>res e acompanhar o<br />
desenvolvimento da prática político-pedagógica,<br />
a partir <strong>do</strong>s princípios teóricos de uma pedagogia<br />
dialética, promoven<strong>do</strong>, assim, a formação integral<br />
<strong>do</strong>s cidadãos. Para tanto, foram produzi<strong>do</strong>s<br />
materiais didático-pedagógicos, em todas as<br />
áreas <strong>do</strong> conhecimento, a partir da realidade<br />
<strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s, de forma a atender às necessidades<br />
específicas de cada etapa <strong>do</strong> processo de<br />
alfabetização.<br />
A proposta de trabalho foi embasada<br />
nos pressupostos teórico-meto<strong>do</strong>lógicos de<br />
Piaget, Vigotsky e Paulo Freire. Os autores defendem<br />
uma relação dialógica entre educa<strong>do</strong>r e<br />
educan<strong>do</strong>, ação essencial para a interpretação e<br />
a inserção <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s na realidade sociocultural,<br />
in<strong>do</strong> ao encontro da essência <strong>do</strong> trabalho<br />
proposto pelo Projeto.<br />
Esse processo ocorreu por meio <strong>do</strong><br />
oferecimento de Oficinas Pedagógicas, Ciclos<br />
de Estu<strong>do</strong>s, proporcionan<strong>do</strong> assim a formação<br />
<strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res e a melhoria da qualidade <strong>do</strong><br />
ensino-aprendizagem.<br />
A meta era alcançar a alfabetização de<br />
1.976 adultos, distribuí<strong>do</strong>s em 17 municípios: Paracatu,<br />
Guarda Mor, Lagoa Grande, Presidente<br />
Olegário, Cabeceira Grande, Unaí, Riachinho,<br />
Natalândia, Brasilândia, Dom Bosco, Santa Fé<br />
de Minas, João Pinheiro, Arinos, Formoso, Bonfinópolis,<br />
Buritis e Urucuia, em 82 assentamentos,<br />
totalizan<strong>do</strong> 99 turmas.<br />
Consideran<strong>do</strong> as distâncias existentes<br />
entre os municípios e os assentamentos e acampamentos<br />
da região Noroeste de Minas, e para<br />
evitar o comprometimento <strong>do</strong> atendimento pedagógico<br />
ocorreu a divisão da Região Noroeste<br />
em três microrregiões, quais sejam: Bacia <strong>do</strong><br />
Paracatu, composta pelos seguintes municípios:<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR
FARIA, A. L. F. et al. Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
Paracatu, Guardar Mor, Lagoa Grande, Presidente<br />
Olegário, Cabeceira Grande e Unaí. A<br />
microrregião Serra da Mata era formada por<br />
Riachinho, Natalândia, Brasilândia, Dom Bosco,<br />
Santa Fé de Minas e João Pinheiro. Sen<strong>do</strong> a<br />
microrregião Grandes Sertões Veredas composta<br />
por Arinos, Formoso, Bonfinópolis, Buritis e Urucuia.<br />
A partir dessa divisão o Projeto envolveu a<br />
participação no trabalho de três coordena<strong>do</strong>res<br />
regionais, sen<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s professores <strong>do</strong> Departamento<br />
de Educação da UFV.<br />
A equipe executora <strong>do</strong> Projeto foi<br />
composta por um coordena<strong>do</strong>r geral, três coordena<strong>do</strong>res<br />
pedagógicos, 8 coordena<strong>do</strong>res locais,<br />
8 universitários licencian<strong>do</strong>s da UFV.<br />
Após a seleção <strong>do</strong>s universitários, estes<br />
realizaram um Estágio de Vivência, que tinha<br />
como objetivo fazer com que estes tivessem<br />
contato com a realidade onde iriam atuar. O<br />
estágio promoveu a integração entre educa<strong>do</strong>res,<br />
coordena<strong>do</strong>res locais, educan<strong>do</strong>s e familiares<br />
destes últimos, além de proporcionar aos universitários<br />
um diagnóstico das condições estruturais<br />
existentes e necessárias à execução <strong>do</strong> projeto.<br />
O acompanhamento pedagógico se<br />
constituiu de visitas periódicas <strong>do</strong>s universitários<br />
às salas de aulas, visan<strong>do</strong> levantar dúvidas e dificuldades<br />
enfrentadas pelos educa<strong>do</strong>res, o que<br />
subsidiava a programação <strong>do</strong>s Ciclos de Estu<strong>do</strong>s<br />
e Oficinas Pedagógicas.<br />
Os Resulta<strong>do</strong>s de um Trabalho Integra<strong>do</strong>:<br />
caminhos percorri<strong>do</strong>s<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
No decorrer <strong>do</strong> Projeto foram realiza<strong>do</strong>s<br />
na cidade de Paracatu 11 Ciclos de Estu<strong>do</strong>s,<br />
que cumpriram uma carga horária média de 60<br />
horas e foram ministra<strong>do</strong>s pelos universitários<br />
e pelos membros da equipe coordena<strong>do</strong>ra. A<br />
meto<strong>do</strong>logia implementada durante estes cursos<br />
foram embasadas nos princípios da meto<strong>do</strong>logia<br />
dialética de Paulo Freire, com o intuito de preparar<br />
os educa<strong>do</strong>res, para o exercício <strong>do</strong>cente,<br />
estabelecen<strong>do</strong> relações entre as várias áreas <strong>do</strong><br />
conhecimento e levan<strong>do</strong> em consideração a<br />
integração entre o ensino e as necessidades das<br />
comunidades.<br />
Nos Ciclos de Estu<strong>do</strong>s trabalharam-se<br />
as seguintes temáticas: A História da EJA no<br />
Brasil, A EJA no Campo, O educan<strong>do</strong> Adulto,<br />
A Auto Estima <strong>do</strong> Aluno Adulto, Fases da Escrita,<br />
A Vivência <strong>do</strong> Nome, O Erro Construtivo,<br />
Alfabetização Matemática, Planejamento de<br />
Ensino, Avaliação em EJA, Vida e Obra de Paulo<br />
Freire, Méto<strong>do</strong> Paulo Freire e Princípios Básicos,<br />
Etapas <strong>do</strong> Méto<strong>do</strong>, Tema Gera<strong>do</strong>r e Palavra<br />
Gera<strong>do</strong>ra, Jogos Educativos, Turmas Heterogêneas,<br />
Construção e Utilização das Fichas de<br />
Descoberta, Produção de Textos, Preparação<br />
de Aulas Simuladas, Memorial, Inclusão de<br />
Alunos Porta<strong>do</strong>res de Necessidades Especiais,<br />
Construção de Material Didático, Estu<strong>do</strong>s Sobre<br />
a Natureza, Estu<strong>do</strong>s Sobre a Sociedade, Oficina<br />
de Matemática, Oficina de Português, O Ensino<br />
da Ciência, Revisão de História, Planejamento<br />
<strong>do</strong> Momento Cultural, Avaliação de História,<br />
Revisão de Português, Revisão de Ciências e<br />
Revisão de Matemática.<br />
Na realização das oficinas de Jogos<br />
Educativos e Pedagógicos, percebeu-se que na<br />
formação <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res considerou-se importante<br />
alguns pressupostos, como, por exemplo,<br />
a não infantilização <strong>do</strong> educan<strong>do</strong> e <strong>do</strong> próprio<br />
jogo pedagógico; a (re)significação <strong>do</strong> jogo como<br />
facilita<strong>do</strong>r da aprendizagem.<br />
Os educa<strong>do</strong>res, através de atividades<br />
realizadas em grupos, vivenciaram na prática a<br />
oportunidade de criar vários recursos didáticos<br />
para serem utiliza<strong>do</strong>s em suas aulas, enriquecen<strong>do</strong>-as.<br />
Como exemplos, a confecção de cartazes,<br />
com todas as etapas <strong>do</strong> Méto<strong>do</strong> Paulo Freire e<br />
jogos volta<strong>do</strong>s para o ensino da Matemática e<br />
<strong>do</strong> Português para as diferentes fases de aprendizagem.<br />
As atividades <strong>do</strong>s Ciclos de Estu<strong>do</strong>s<br />
eram muito intensas, acontecen<strong>do</strong> nos perío-<br />
149
FARIA, A. L. F. et al. Alfabetização de Jovens e Adultos na Reforma Agrária – A Experiência no Noroeste de Minas Gerais<br />
<strong>do</strong>s da manhã, tarde e noite. Por esse motivo,<br />
com a finalidade de oferecer a oportunidade<br />
aos participantes de vivenciarem momentos de<br />
descontração e reflexão, eram desenvolvidas,<br />
no perío<strong>do</strong> da noite, a exibição de filmes, como<br />
“Quem Mexeu no Meu Queijo” e “Central <strong>do</strong><br />
Brasil”.<br />
No perío<strong>do</strong> da noite ocorria o Momento<br />
Cultural, no qual os educa<strong>do</strong>res apresentavam<br />
as particularidades de seus municípios e assentamentos<br />
através da dança, <strong>do</strong> teatro e <strong>do</strong>s relatos<br />
orais, entre outras formas. Esse momento era<br />
prepara<strong>do</strong> por cada universitário, juntamente<br />
com os educa<strong>do</strong>res e coordena<strong>do</strong>res locais.<br />
No que diz respeito ao material didático,<br />
foram elaboradas apostilas como apoio aos<br />
educa<strong>do</strong>res. Esse material foi confecciona<strong>do</strong><br />
para ser utiliza<strong>do</strong> no contexto <strong>do</strong> assentamento<br />
rural, sen<strong>do</strong> composto por textos, exercícios e<br />
meto<strong>do</strong>logias adequadas à realidade daqueles<br />
aos quais destinava o projeto. Estas apostilas<br />
se constituíram de conteú<strong>do</strong>s de Matemática,<br />
Língua Portuguesa, Estu<strong>do</strong>s sobre a Natureza,<br />
enfatizan<strong>do</strong> e valorizan<strong>do</strong> a realidade e a cultura<br />
<strong>do</strong> educan<strong>do</strong>.<br />
Diante disso, pode-se perceber que o<br />
Projeto foi para os universitários um campo rico<br />
de aprendizagem na área da EJA, complementan<strong>do</strong><br />
a formação acadêmica, possibilitan<strong>do</strong> a<br />
eles maior formação sobre o processo ensino-<br />
-aprendizagem e crescimento profissional e pessoal.<br />
Como impactos sociais, a região Noroeste<br />
ganhou muito, pois ofereceu aos adultos <strong>do</strong>s<br />
assentamentos da região a oportunidade e a<br />
garantia <strong>do</strong> direito de alfabetizar-se e de continuar<br />
seus estu<strong>do</strong>s em diferentes níveis de ensino.<br />
A partir de então, ao constatar os resulta<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong> trabalho pelos órgãos governamentais<br />
parceiros, gerou-se uma nova parceria, visan<strong>do</strong><br />
dar continuidade a esse processo educacional,<br />
de forma a proporcioná-los a oportunidade de<br />
dar sequência aos seus estu<strong>do</strong>s, nas séries iniciais<br />
<strong>do</strong> ensino fundamental.<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, foi elabora<strong>do</strong> novo<br />
projeto, intitula<strong>do</strong> “Educação para a Cidadania:<br />
Escolarização de Jovens e Adultos”, sob o convênio<br />
PRONERA/FETAEMG/FADEMA/UFV, agora<br />
sob a coordenação da Fundação de Apoio ao<br />
Desenvolvimento e Ensino de Macha<strong>do</strong> (FADE-<br />
MA), através da Instituição Agrotécnica <strong>Federal</strong><br />
de Macha<strong>do</strong>. Este se encontra em andamento,<br />
ten<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> de 2008 a 2009 para a sua<br />
conclusão, objetivan<strong>do</strong> a escolarização de cerca<br />
de 1.600 jovens e adultos assenta<strong>do</strong>s rurais da<br />
região Noroeste de Minas Gerais.<br />
REFERÊNCIAS<br />
ANDRADE, M. R.; DI PIERRO, M. C. Programa Nacional<br />
de Educação na Reforma Agrária em perspectiva: da<strong>do</strong>s<br />
básicos para uma avaliação. São Paulo: Ação Educativa,<br />
2004, 83 p.<br />
CERVO, Ama<strong>do</strong> Luiz. Meto<strong>do</strong>logia científica. 5. ed. São<br />
Paulo: Pearson Prentice Hall, 2002.<br />
CUNHA, Conceição Maria da. Introdução – discutin<strong>do</strong><br />
conceitos básicos. In: SEED-MEC. Salto para o futuro –<br />
Educação de jovens e adultos. Brasília, 1999.<br />
HADDAD, Sérgio; DI PIERRO, M. C. Escolarização de<br />
jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação, São<br />
Paulo, n. 14, p. 108-130, maio/ago. 2000 .<br />
SOARES, Leôncio José Gomes. A educação de jovens<br />
e adultos: momentos históricos e desafios atuais. Revista<br />
Presença Pedagógica, v. 2, n. 11, set./out. 1996.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 7 de agosto de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 14 de junho de 2010.<br />
150<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 143-150, jul./dez. 2010. Editora UFPR
As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de<br />
trabalho<br />
The possibilities of psychological duty in work place<br />
Las posibilidades del deber psicologico en la oficina<br />
Janaina Lucia Rodrigues 15<br />
Fernanda Candi<strong>do</strong> 26<br />
RESUMO<br />
Este artigo apresenta uma reflexão sobre as possibilidades <strong>do</strong> serviço de Plantão Psicológico (SPP). Para<br />
leitura teórica utilizamos a perspectiva teórica de Carl Rogers (1983, 1997) e sua Abordagem Centrada na<br />
Pessoa bem como com autores de estimável valor para temática: Dejours (1992, 1999), Co<strong>do</strong> (2006), May<br />
(1999), Mahfoud (1999), Rosemberg (1987). Enfatizamos a importância de um espaço de acolhimento e<br />
auxílio terapêutico em empresas e instituições, com a finalidade de proporcionar acolhimento e segurança<br />
aos trabalha<strong>do</strong>res e seus familiares. As análises apontam o quanto esse serviço pode contribuir para uma<br />
significativa melhora na qualidade de vida <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res e seus familiares, visto que possibilita um<br />
espaço de escuta e acolhimento em que os trabalha<strong>do</strong>res podem sentir aceitos para expressar seus sentimentos<br />
vivencia<strong>do</strong>s tanto dentro quanto fora <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> social <strong>do</strong> trabalho.<br />
Palavras-chave: Plantão Psicológico; Saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r; Saúde Mental; Qualidade de vida no Trabalho;<br />
Abordagem Centrada na Pessoa.<br />
ABSTRACT<br />
This article presents a reflection on the possibilities of Plantão Psychological Service (SPP). To use the<br />
theoretical reading perspective of Carl Rogers (1983, 1997) and the Person-Centered Approach as well<br />
as authors of estimable value for thematic as Dejours (1992, 1999), Co<strong>do</strong> (2006), May ( 1999), Mahfoud<br />
(1999), Rosemberg (1987). We emphasize the importance of an area of reception and therapeutic aid in<br />
enterprises and institutions with the aim of providing shelter and security for workers and their families. The<br />
analysis suggests how this service can contribute to a significant improvement in quality of life of workers<br />
and their families, because that allows a space of listening and reception where workers may feel allowed<br />
to express their feelings experienced both inside and outside world social work.<br />
Keywords: Psychological duty; Employee health; Mental Health; Quality of Life at Work; The Person-<br />
Centered Approach.<br />
RESUMEN<br />
Este artículo presenta una reflexión en las posibilidades del servicio de Plantão Psicológico (SPP). Para la<br />
lectura teórica utilizamos la perspectiva teórica de Carl Rogers (1983, 1997) y el su subir centra<strong>do</strong> en la<br />
persona así como con autores del valor estimable para temático como: Dejours (1992, 1999), Co<strong>do</strong> (2006),<br />
puede (1999), Mahfoud (1999), Rosemberg (1987). Acentuamos la importancia de un espacio del abrigo<br />
y de la ayuda terapéutica en compañías e instituciones, con el propósito de proporcionar al abrigo y a la<br />
1 Psicóloga. Especialista em Saúde Publica com ênfase em Saúde da Família. Endereço: Rua: G-1, Qd: 08, Casa: 09 Residencial Noise<br />
Curvo – Várzea Grande-MT. E-mail: janainapsicologia@hotmail.com Telefone (65) 8414-7162.<br />
2 Orienta<strong>do</strong>ra Professora Mestre em Educação pela <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Mato Grosso-MT<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
151
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
seguridad a los trabaja<strong>do</strong>res y sus familiares.<br />
El punto de los análisis cuánto este servicio<br />
puede contribuir para una mejora significativa<br />
en la calidad de la vida de los trabaja<strong>do</strong>res y<br />
sus familiares, puesto que hace posible un<br />
espacio y un abrigo que escuchan <strong>do</strong>nde los<br />
trabaja<strong>do</strong>res pueden sentirse acepta<strong>do</strong>s para<br />
expresar sus profundamente vividas sensaciones<br />
en tal interior de la manera cuánto está<br />
del mun<strong>do</strong> social del trabajo.<br />
Palabras-Clave: Plantão psicologico; Salud del<br />
trabaja<strong>do</strong>r; Salud mental; Calidad de la vida<br />
en el trabajo; El subir centra<strong>do</strong> en la persona.<br />
Introdução<br />
Quan<strong>do</strong> referimos a atendimentos<br />
em plantão nos remetemos a serviços em que<br />
o atendimento fique à disposição das pessoas<br />
que necessitam. Porém, o serviço de plantão em<br />
psicologia ainda é uma modalidade a ser incorporada<br />
e aprofundada, como uma possibilidade<br />
da prática <strong>do</strong> psicólogo.<br />
O Plantão Psicológico consiste<br />
em oferecer um serviço em que o profissional<br />
fique disponível para oferecer atendimento, em<br />
dias e horários determina<strong>do</strong>s.<br />
O interesse em desenvolver esse trabalho<br />
sobre Plantão Psicológico e relatar a efetividade<br />
desse serviço, se deu em virtude das vivências<br />
nessa de modalidade de atendimento, obtida<br />
através <strong>do</strong>s estágios curriculares proporciona<strong>do</strong>s<br />
pelo curso de psicologia <strong>do</strong> UNIVAG – Centro<br />
Universitário. Enquanto estagiária, o trabalho de<br />
plantão psicológico se efetivou na Policlínica Dr.<br />
Lucilo Mace<strong>do</strong> de Freitas, e também na Empresa<br />
Brasileira de Correios e Telégrafos, Diretoria<br />
Regional de Mato Grosso. Os estágios e as intervenções<br />
realiza<strong>do</strong>s na clínica escola <strong>do</strong> Univag,<br />
obtiveram sustentação teórica na Abordagem<br />
Centrada na Pessoa (ACP).<br />
Segun<strong>do</strong> o Ministério da Saúde,<br />
estima-se que 15% da população mundial (975<br />
milhões) precisem de atendimento em saúde<br />
mental. No Brasil, 28,3 milhões de pessoas<br />
sofrem de algum transtorno mental, sen<strong>do</strong> que<br />
dessas mais de 5 milhões de pessoas sofrem<br />
de transtornos mentais severos, que requerem<br />
atendimento constante. Cerca de 18 milhões são<br />
acometi<strong>do</strong>s por transtornos causa<strong>do</strong>s pelo uso<br />
de álcool e drogas. As <strong>do</strong>enças mentais estão<br />
entre as três primeiras causas de incapacitação<br />
para o trabalho no país. As pesquisas indicam,<br />
ainda, que 26% das pessoas apresentam ou<br />
apresentarão um transtorno mental em alguma<br />
fase de sua vida.<br />
A alta prevalência desses transtornos, o<br />
seu crescimento em to<strong>do</strong>s os países e segmentos<br />
sociais, além da interface estreita com as drogas<br />
e violência, tornam a questão uma das prioridades<br />
para a saúde pública. Porém, o acesso ao<br />
tratamento ainda não está garanti<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s,<br />
especialmente nos países em que o desenvolvimento<br />
ainda é precário. Essa constatação levou a<br />
Organização Mundial de Saúde (OMS) a propor<br />
em 2008 o debate sobre o tema “Saúde mental<br />
como prioridade: melhoria <strong>do</strong>s serviços com<br />
participação social e cidadania”, com o objetivo<br />
de estimular reflexão sobre a melhoria <strong>do</strong> acesso<br />
ao tratamento e redução das iniquidades.<br />
Apesar desse quadro, apenas pouco<br />
mais de 2% <strong>do</strong> orçamento público são destina<strong>do</strong>s<br />
à saúde mental, conforme da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Governo<br />
<strong>Federal</strong> no portal da saúde.<br />
Esses da<strong>do</strong>s apontam para a necessidade<br />
de se criar políticas de saúde, que garanta a toda<br />
a população acesso aos tratamentos necessários.<br />
Acreditamos, dessa forma, que em um país como o<br />
Brasil, com ampla dimensão territorial, que engloba<br />
diversidades culturais e socioeconômicas, a responsabilidade<br />
por ações políticas que contribuam para<br />
o desenvolvimento pleno e saudável <strong>do</strong>s cidadãos<br />
e eliminem os fatores de risco e as ameaças mais<br />
imediatas à saúde (geral e mental) da população<br />
seja de responsabilidade tanto das políticas de<br />
saúde como da sociedade e das instituições.<br />
Sen<strong>do</strong> assim, para que a saúde mental<br />
deixe de ser um fator implica<strong>do</strong>r no impedimento<br />
de uma sociedade saudável e produtiva,<br />
152<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
não cabe apenas ao governo criar ações que<br />
favoreçam o desenvolvimento pleno <strong>do</strong>s cidadãos,<br />
mas o comprometimento das instituições<br />
e empresas com o bem estar psicosocial de seus<br />
colabora<strong>do</strong>res e funcionários.<br />
Moscovici (1995, p. 31) diz que “As empresas<br />
parecem não ter desperta<strong>do</strong> inteiramente<br />
para o fato repetidamente constata<strong>do</strong>: para trabalhar<br />
bem e produzir em grupo, as pessoas precisam<br />
possuir mais <strong>do</strong> que competência técnica para as<br />
funções”. Esclarece ainda que as pessoas precisam<br />
sentir que as diferenças nesse ambiente são aceitas<br />
e tratadas em aberto, para que a comunicação<br />
possa fluir com facilidade, em dupla direção.<br />
A autora afirma que quan<strong>do</strong> as pessoas<br />
podem falar o que pensam e sentem, e tem<br />
a possibilidade de dar e receber feedback, isso<br />
contribui para o autoconhecimento, que precisa<br />
ser elabora<strong>do</strong> para a autoaceitação. Sen<strong>do</strong><br />
que dar e receber feedback auxilia para que o<br />
indivíduo possa ter percepção mais acurada de<br />
si e da relação interpessoal, e se constitui como<br />
primeiro passo para se construir relacionamentos<br />
autênticos.<br />
Assim, o Plantão Psicológico no contexto<br />
empresarial se apresenta como uma possibilidade<br />
de oferecer às pessoas um Serviço de<br />
Pronto Atendimento Psicológico. Para Schmidt<br />
(2004), esse serviço é pensa<strong>do</strong> e pratica<strong>do</strong>, basicamente,<br />
como um mo<strong>do</strong> de acolher e responder<br />
a demandas por ajuda psicológica. O profissional<br />
se coloca à disposição das pessoas que procuram<br />
um tempo e um espaço de escuta aberto à<br />
diversidade e à pluralidade das demandas.<br />
Para tal, o estu<strong>do</strong> constitui-se em uma pesquisa<br />
de caráter bibliográfico a partir <strong>do</strong> campo da<br />
psicologia, ten<strong>do</strong> como contribuições autores como:<br />
Dejours (1992), Co<strong>do</strong> (2006), May (1999), Mahfoud<br />
(1999), Rosemberg (1987) e Rogers (1983, 1997).<br />
O plantão psicológico e a proposta de<br />
Carl Rogers<br />
Para dialogar sobre o Plantão Psicológico<br />
é importante o conhecimento <strong>do</strong> processo<br />
histórico dessa modalidade de atendimento.<br />
Segun<strong>do</strong> Mahfoud (1999), esse serviço<br />
chama<strong>do</strong> de Plantão Psicológico foi implanta<strong>do</strong><br />
no Brasil inspira<strong>do</strong> nas experiências <strong>do</strong> modelo<br />
de walk-in clinics, <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, para<br />
prestar atendimento imediato à comunidade nas<br />
décadas de 70 e 80, e visava um atendimento<br />
emergencial no momento em que havia procura.<br />
Rosemberg (1987) relata a trajetória<br />
<strong>do</strong> primeiro serviço de Plantão Psicológico de<br />
que se tem registro no Brasil, cuja implantação<br />
ocorreu no Instituto de Psicologia da <strong>Universidade</strong><br />
de São Paulo (IPUSP), em 1969, no setor<br />
de aconselhamento psicológico.<br />
De acor<strong>do</strong> com Forghieri (2007),<br />
Rogers foi o responsável pelo movimento que<br />
visava o reconhecimento <strong>do</strong> aconselhamento<br />
psicológico pela comunidade científica, comenta<br />
ainda que este teórico denominou seus atendimentos<br />
de aconselhamento psicológico, para não<br />
ser impedi<strong>do</strong> de atuar como terapeuta na época,<br />
mas, depois <strong>do</strong> reconhecimento pela comunidade<br />
científica desta modalidade de atendimento<br />
terapêutico, passou a denominar sua teoria de<br />
Centrada no Cliente e posteriormente de Abordagem<br />
Centrada na Pessoa<br />
Dessa forma, a base teórica <strong>do</strong> Plantão<br />
Psicológico foi fundamentalmente humanista,<br />
que considera o homem um ser de possibilidades,<br />
e valoriza a própria essência da natureza<br />
humana. Assim, ao nos referirmos ao Plantão<br />
Psicológico, nos remetemos à Abordagem Centrada<br />
na Pessoa.<br />
Os pilares que fundamentam essa<br />
abordagem estão caracteriza<strong>do</strong>s no clima em<br />
que o encontro entre terapeuta e cliente ocorre,<br />
de aceitação positiva incondicional, compreensão<br />
empática, congruência ou autenticidade na<br />
relação, denominadas de atitudes psicológicas<br />
facilita<strong>do</strong>ras. Rogers (1983) coloca que os indivíduos<br />
possuem dentro de si vastos recursos<br />
para autocompreensão e modificação de seus<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
153
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
autoconceitos, acredita ainda na tendência ao<br />
crescimento e na autorrealização diante das<br />
escolhas.<br />
Para Rogers (1983), o clima de atitudes<br />
psicológicas facilita<strong>do</strong>ras ocorre quan<strong>do</strong> o terapeuta<br />
consegue ser ele mesmo na relação com<br />
o outro e tem atitudes de congruência, aceitação<br />
incondicional, compreensão empática na relação.<br />
Coloca ainda que essas atitudes estimulam<br />
o cliente a se autocompreender. Para o autor<br />
essas posturas são assim descritas:<br />
Ser congruente ou transparente é ser<br />
sincero e buscar compreender efetivamente o<br />
outro, e poder falar sobre essa vivência na relação<br />
que se estabelece entre terapeuta e cliente.<br />
De forma que essa relação autêntica possibilite<br />
ao cliente expressar seus sentimentos livremente.<br />
A aceitação incondicional é uma atitude<br />
positiva e aceita<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> terapeuta, em relação<br />
ao que o cliente é naquele momento, permite-se<br />
dessa forma que o cliente possa ser ele mesmo.<br />
Assim, essa atitude <strong>do</strong> terapeuta estimula o cliente<br />
a ser autêntico na relação e conseguir dessa<br />
forma se conhecer.<br />
A compreensão empática é o terapeuta<br />
poder mergulhar na busca de conhecer o que<br />
ocorre com o cliente, como se fosse ele mesmo,<br />
e expressar o seu olhar a ele para ajudá-lo a<br />
se compreender. É se aventurar em busca de<br />
compreender o outro e falar dessa leitura para o<br />
cliente, para possibilitar ao cliente compreender<br />
a si mesmo e seus conflitos.<br />
Romero (2001, p.66) entende que<br />
compreensão empática é: “[...] colocar-se no<br />
lugar <strong>do</strong> outro para assim captar o senti<strong>do</strong> de<br />
sua vivência, compartilhan<strong>do</strong> dessa maneira seu<br />
sentir”. Aponta ainda que é muito diferente de<br />
qualquer compreensão meramente intelectual,<br />
por ter um caráter afetivo e um movimento de<br />
aproximação <strong>do</strong> outro.<br />
Mediante o exposto, o terapeuta na<br />
ACP precisa ser sensível às relações humanas<br />
para poder compreender o cliente, tanto nas suas<br />
limitações emocionais, quanto na suas potencialidades.<br />
Sen<strong>do</strong> que cada sessão é única, porque<br />
é o cliente quem vai trazer o que o angustia e<br />
que precisa ser fala<strong>do</strong>. Rogers (1997) afirma que<br />
mesmo em um curto espaço de tempo é possível<br />
oferecer um tipo muito precioso de ajuda, de<br />
esclarecimento, quan<strong>do</strong> permite que o cliente<br />
exprima seus problemas e sentimentos de forma<br />
livre, e tenha reconhecimento das questões que<br />
enfrenta.<br />
É a partir dessa visão de um ser livre,<br />
em busca de crescimento e realização que os humanistas<br />
apresentam a proposta de atendimento<br />
de Plantão Psicológico, que busca possibilitar a<br />
esse homem sentir-se aceito para falar das suas<br />
angústias, ressignificar o que o faz sofrer para que<br />
possa fazer suas escolhas e se responsabilizar por<br />
elas, de forma autêntica.<br />
Dessa forma, compreendemos que a<br />
demanda por atendimento terapêutico é um<br />
pedi<strong>do</strong> de ajuda, para que um outro auxilie a<br />
compreender o que está incomodan<strong>do</strong>, o que<br />
está acontecen<strong>do</strong> com a pessoa. Quan<strong>do</strong> uma<br />
pessoa está angustiada, pode tentar resolver seus<br />
problemas sozinha, mas também pode buscar<br />
por auxílio, se desejar. Hegenberg (2004, p. 12)<br />
pondera que no mun<strong>do</strong> atual, fazer várias Psicoterapias<br />
Breves, nos vários momentos diferentes<br />
de uma pessoa, parece fazer mais senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> que<br />
uma análise única, por um longo perío<strong>do</strong> de tempo,<br />
afirma ainda que: “É urgente que possamos<br />
contar com práticas clínicas de qualidade e que<br />
tenham si<strong>do</strong> desenvolvidas em meio ao rigor<br />
demanda<strong>do</strong> pela comunidade científica, para<br />
que possam ser inseridas em políticas públicas<br />
de saúde mental”.<br />
O Plantão Psicológico é uma possibilidade<br />
de atender a essa demanda, no momento<br />
em que busca oferecer um Pronto Atendimento,<br />
para que a pessoa, ao buscar ajuda, possa ser<br />
acolhida, e experiencie seus sentimentos naquele<br />
momento.<br />
É preciso considerar que para o ser<br />
humano o passa<strong>do</strong> pode se fazer presente a cada<br />
instante, bem como remeter-se ao futuro a to<strong>do</strong> o<br />
154<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
momento Assim, quan<strong>do</strong> o homem busca ajuda<br />
no momento de sua necessidade ele está trazen<strong>do</strong><br />
para esse momento os reflexos de toda sua<br />
vida, sem que haja divisão da linha <strong>do</strong> tempo.<br />
E nesse aspecto Romero (2001, p.69)<br />
afirma que:<br />
Embora seja uma história já vivida,<br />
para a maioria das pessoas o passa<strong>do</strong><br />
permanece, em medida considerável,<br />
estranho e mal-assimila<strong>do</strong>. Existe ai<br />
também uma notória alienação <strong>do</strong> ser<br />
mais próprio. Não é insólito que alguns<br />
até se recusem a fazer um exame atento<br />
dessa história, alegan<strong>do</strong> que “tu<strong>do</strong> aquilo<br />
já passou” ou que quase tu<strong>do</strong> está<br />
encoberto pela poeira <strong>do</strong> tempo. É verdade,<br />
por definição o passa<strong>do</strong> “já passou”,<br />
mas ele existe; continua existin<strong>do</strong><br />
de diversas formas em nós.<br />
Dessa maneira, quan<strong>do</strong> o homem busca<br />
ajuda para enfrentar a realidade presente, ele<br />
está em busca de mudanças em seu futuro. Mas<br />
nem sempre este enfrentamento é uma tarefa<br />
fácil, por conduzir o homem a examinar seu<br />
passa<strong>do</strong>, e se defrontar com reflexos deste no<br />
seu presente, e ao homem cabe a difícil liberdade<br />
de escolher entre ser ou não autêntico consigo<br />
mesmo, e fazer suas escolhas consciente de sua<br />
responsabilidade.<br />
Para May (1999, p.222), a melhor maneira<br />
para o homem garantir o futuro é enfrentar<br />
o presente de forma autêntica com coragem e<br />
proveito, mas alerta que: “Enfrentar a realidade<br />
presente provoca às vezes ansiedade. [...] esta<br />
ansiedade é uma espécie de vaga sensação de<br />
estar , ou de encontrar-se diante de<br />
uma realidade da qual não se pode fugir, recuar<br />
ou esconder-se”.<br />
Apoiar o homem nesse enfrentamento<br />
faz parte da proposta <strong>do</strong> atendimento da psicologia<br />
e, em especial, <strong>do</strong> Plantão Psicológico,<br />
que cria um espaço em que se pode buscar por<br />
ajuda quan<strong>do</strong> precisar.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
Ao terapeuta cabe acolher esse homem<br />
e acreditar que o seu trabalho não termina com<br />
o fim <strong>do</strong> encontro, mas se estende ao longo <strong>do</strong><br />
tempo, e confiar que seu cliente pode continuar a<br />
aprender sozinho e lidar com os acontecimentos<br />
inespera<strong>do</strong>s da vida, a partir <strong>do</strong> que foi inicia<strong>do</strong><br />
durante o atendimento.<br />
Forma de atuação <strong>do</strong> psicólogo<br />
O profissional que atua em Plantão<br />
Psicológico tem que se colocar disponível para<br />
estar ali e lidar com o inespera<strong>do</strong>, pois este é um<br />
espaço em que a pessoa terá para buscar ajuda<br />
quan<strong>do</strong> necessitar falar <strong>do</strong>s seus sentimentos e<br />
<strong>do</strong> que se passa com ela. A escuta é o principal<br />
instrumento utiliza<strong>do</strong> pelo profissional, que nos<br />
atendimentos busca ouvir o outro e estar disponível<br />
para receber a vivência que o cliente trouxer<br />
de maneira a facilitar que a pessoa examine sua<br />
experiência.<br />
Facilitar ao ser humano essa compreensão<br />
de si é um <strong>do</strong>s objetivos <strong>do</strong> profissional que<br />
atua em Plantão Psicológico, assim como acolher<br />
e oferecer atenção à experiência <strong>do</strong> cliente no<br />
momento em que este procura ajuda. Isto inclui,<br />
não apenas o que convencionalmente se entende<br />
por queixa, mas o mo<strong>do</strong> como o cliente vivencia<br />
o seu sofrimento, bem como as expectativas e<br />
perspectivas que se apresentam a partir dessa<br />
busca de auxílio.<br />
Cada encontro entre terapeuta e<br />
cliente é único, pois é o cliente quem vai trazer<br />
para o atendimento o que precisa ser fala<strong>do</strong>,<br />
os seus conflitos naquele momento. Podemos<br />
pensar dessa forma que até mesmo um único<br />
atendimento pode possibilitar a pessoa ter um<br />
encontro consigo mesma e se colocar diante<br />
<strong>do</strong>s acontecimentos da vida mais consciente de<br />
suas escolhas.<br />
Essa forma de atuação em Plantão<br />
Psicológico permite ao cliente a liberdade de po-<br />
155
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
der escolher se deseja ou não dar continuidade<br />
aos atendimentos em processo terapêutico, até<br />
porque se acredita que a pessoa tem dentro de<br />
si os recursos necessários para autorrealização,<br />
que podem ser ativa<strong>do</strong>s até mesmo em um único<br />
encontro com o terapeuta.<br />
Acreditamos que quan<strong>do</strong> a pessoa<br />
tem clareza das questões que enfrenta, faz escolhas<br />
conscientes, é autêntica com ela mesma<br />
e consegue realizar-se nas escolhas que faz. Ao<br />
profissional de psicologia nessa modalidade de<br />
atendimento cabe iluminar o caminho para que<br />
a pessoa conheça as possibilidades que tem e<br />
possa fazer as escolhas de forma verdadeira<br />
consigo mesma.<br />
Plantão psicológico e a empresa<br />
Trata-se de um serviço de emergência,<br />
em que o psicólogo se defronta a to<strong>do</strong> instante<br />
com o não planeja<strong>do</strong>, e tem no pronto acolhimento<br />
a principal ferramenta a ser utilizada. Ao<br />
profissional em psicologia cabe ter sensibilidade<br />
para acolher, compreender e responder às demandas,<br />
sem perder de vista a singularidade <strong>do</strong><br />
indivíduo .<br />
Desta forma, compreendemos que<br />
acolher é oferecer atenção ao sofrimento, e estabelecer<br />
uma relação de confiança e aceitação,<br />
pensan<strong>do</strong> no bem estar e na qualidade de vida<br />
<strong>do</strong>s profissionais que buscam o atendimento de<br />
Plantão Psicológico no qual se oferece às pessoas<br />
um serviço de pronto atendimento àqueles que<br />
procuram auxílio psicológico.<br />
Essa modalidade de atendimento é<br />
analisada à luz da teoria de Carl Rogers (1997),<br />
conforme já menciona<strong>do</strong>, que afirma que<br />
quan<strong>do</strong> o terapeuta tem uma atitude positiva<br />
aceita<strong>do</strong>ra, em relação ao que quer que o cliente<br />
seja naquele momento, a probabilidade de<br />
ocorrer um movimento terapêutico ou mudança<br />
aumenta.<br />
156<br />
É a partir desse conceito que<br />
pensamos nesse serviço de Plantão Psicológico<br />
no ambiente de trabalho, que está direcionada<br />
ao cuida<strong>do</strong> com a saúde, já que a escuta <strong>do</strong><br />
psicólogo visa possibilitar que a pessoa tenha<br />
maior clareza da sua realidade e das questões<br />
que enfrenta.<br />
Esse serviço dentro da empresa estabelece<br />
um espaço em que se possa ter aceitação<br />
e acolhimento no momento em que à pessoa<br />
sentir necessidade. Cautella (1999) afirma que<br />
se faz necessário, em algum momento da história<br />
de uma instituição, instaurar um espaço de<br />
acolhimento e segurança para seus funcionários.<br />
Acreditamos que ter um espaço para falar das<br />
sensações e sentimentos varia<strong>do</strong>s já existentes,<br />
ou gera<strong>do</strong>s pela própria convivência e atividades<br />
em grupo, contribuirá para o crescimento e<br />
amadurecimento pessoal que terá seus reflexos<br />
na produtividade e satisfação fora e dentro <strong>do</strong><br />
ambiente de trabalho.<br />
De acor<strong>do</strong> com Palmieri e Cury (2007,<br />
p.473), “A estrutura <strong>do</strong> Plantão Psicológico responde<br />
a essa demanda institucional na qual o<br />
funcionário tem um espaço para expressar suas<br />
angústias, seus anseios e estruturar-se melhor<br />
para dar conta das exigências internas e externas<br />
<strong>do</strong> seu cotidiano nesse contexto de trabalho”.<br />
Consideran<strong>do</strong> que a possibilidade<br />
desse serviço no ambiente de trabalho oferecerá<br />
um espaço de acolhimento, segurança e auxílio<br />
terapêutico aos funcionários.<br />
Para Dejours (1999), o trabalho não é<br />
somente a execução de atividades produtivas,<br />
mas, também, é o espaço de convivência, e<br />
aponta ainda para a importância de uma preocupação<br />
não apenas com a eficácia técnica, mas<br />
também com o mun<strong>do</strong> social <strong>do</strong> trabalho, de<br />
proteção e realização <strong>do</strong> ego, portanto relativos<br />
à saúde e ao mun<strong>do</strong> subjetivo. É justamente<br />
nesse espaço de convivência <strong>do</strong> trabalho que<br />
pensamos em um espaço em que esse homem<br />
possa buscar ajuda quan<strong>do</strong> sentir necessidade.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
Assim, pode-se considerar que o campo<br />
de saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r se mostra como um<br />
campo promissor para o exercício <strong>do</strong> profissional<br />
de psicologia, e a proposta <strong>do</strong> Serviço de Plantão<br />
Psicológico em Empresa é uma dessas possibilidades<br />
de atuação que tem um enfoque e se constitui<br />
como tentativa de acolher e compreender o<br />
homem e suas relações entre condições de vida<br />
e trabalho. Conforme Co<strong>do</strong> (2006, p.186): "O<br />
trabalho é o mo<strong>do</strong> de ser <strong>do</strong> homem, e como tal<br />
permeia to<strong>do</strong>s os níveis de sua atividade, seus<br />
afetos, sua consciência, o que permite que os<br />
sintomas se escondam em to<strong>do</strong>s os lugares [...]".<br />
Entendemos dessa forma, que para<br />
o homem o mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho e o priva<strong>do</strong> se<br />
misturam de forma que os sentimentos vivencia<strong>do</strong>s<br />
pela pessoa refletem nas suas atitudes independentes<br />
<strong>do</strong> lugar. Com isso, acreditamos ser<br />
importante acolher o homem em seu sofrimento<br />
e atender a algumas dificuldades específicas <strong>do</strong><br />
ambiente de trabalho; uma vez que consideramos<br />
que estas dificuldades refletem também no<br />
convívio familiar <strong>do</strong> homem.<br />
Palmieri e Cury (2007) afirmam que é<br />
necessário cuidar <strong>do</strong>s profissionais, para benefícios<br />
destes e para melhor qualidade <strong>do</strong> trabalho<br />
ofereci<strong>do</strong>, em função de algumas dificuldades<br />
específicas desse ambiente, como insatisfação<br />
no trabalho, baixa utilização das potencialidades<br />
entre outros. Apontam ainda que estes<br />
fatores podem conduzir a consequências como:<br />
absenteísmos, baixo rendimento, aumento nas<br />
reclamações, causan<strong>do</strong> sérias consequências à<br />
saúde física e mental <strong>do</strong>s funcionários.<br />
Ao pensar no serviço de Plantão Psicológico<br />
inseri<strong>do</strong> no ambiente de trabalho, nos<br />
remetemos a refletir sobre qualidade de vida no<br />
trabalho.<br />
Silva e Marchi (1997), afirmam que a<br />
relação entre saúde e qualidade de vida parece<br />
óbvia, consideran<strong>do</strong> que o próprio senso comum<br />
diz que ter saúde é a primeira e essencial condição<br />
para que alguém possa considerar sua vida<br />
como de boa qualidade. Mas o que parece óbvio<br />
e claro nem sempre o é, na realidade. Tanto a<br />
concepção de saúde, como a de qualidade de<br />
vida comportam discussões e interpretações<br />
diversas.<br />
Os referi<strong>do</strong>s autores compreendem ainda<br />
que os valores de saúde e <strong>do</strong>ença são construí<strong>do</strong>s,<br />
na empresa, sob o foco da produtividade,<br />
sob os princípios que se a<strong>do</strong>ta de responsabilidade<br />
social e o valor que se dá à preservação das<br />
pessoas, das histórias de acidentes de trabalho<br />
e da própria cultura da organização. A pressão<br />
organizacional leva o indivíduo a esta<strong>do</strong>s de<br />
stress, o que afeta diretamente a qualidade de<br />
vida <strong>do</strong> trabalho.<br />
Possibilitar ao homem falar <strong>do</strong>s seus<br />
sentimentos de forma livre para que possa<br />
ressignificar suas vivências, faz parte da proposta<br />
<strong>do</strong> Serviço de Plantão Psicológico que atua na<br />
forma de prevenção, de agravamento <strong>do</strong>s conflitos<br />
psíquicos.<br />
Fernandes (1996, p. 46) aponta que<br />
“[...] pouco resolve atentar-se apenas para<br />
fatores físicos, pois aspectos sociológicos e psicológicos<br />
interferem igualmente na satisfação<br />
<strong>do</strong> indivíduo em situação de trabalho; [...] com<br />
reflexos na produtividade e na satisfação <strong>do</strong>s<br />
emprega<strong>do</strong>s”.<br />
Desta forma, pensamos que à implantação<br />
de política de saúde mental que, de fato,<br />
promova mudanças, é responsabilidade de<br />
vários agentes, instituições, sistema de saúde<br />
e sociedade. Quan<strong>do</strong> a instituição também se<br />
sente responsabilizada por gerar mudanças no<br />
âmbito da saúde mental <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r, ela<br />
busca medidas que permitem e contribuem para<br />
melhoria da qualidade de vida desse trabalha<strong>do</strong>r.<br />
Vieira (1996, p.107) compreende a<br />
Qualidade de Vida no Trabalho como: “[...] um<br />
conjunto de fatores (ou indica<strong>do</strong>res) que se fazen<strong>do</strong><br />
presente nas organizações, proporcionam<br />
aos trabalha<strong>do</strong>res bem estar físico, mental, econômico<br />
e social, permitin<strong>do</strong> que cada indivíduo<br />
resgate sua condição de cidadão”.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
157
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
Esse resgate <strong>do</strong> homem da condição<br />
de cidadão faz parte da proposta da psicologia,<br />
inclusive no mun<strong>do</strong> social <strong>do</strong> trabalho. No que<br />
se refere a esta estreita relação entre o homem<br />
e o trabalho, Dejours (1992, p.164) afirma que:<br />
De qualquer maneira, o trabalho não<br />
é nunca neutro em relação à saúde, e<br />
favorece seja a <strong>do</strong>ença seja a saúde. De<br />
mo<strong>do</strong> que o trabalho deveria aparecer<br />
na própria definição <strong>do</strong> conceito de<br />
saúde, e particularmente no que concerne<br />
à definição <strong>do</strong> “bem estar social”,<br />
figuran<strong>do</strong> na Organização Mundial da<br />
Saúde. Por outro la<strong>do</strong> é importante<br />
ressaltar que a relação de saúde e trabalho<br />
não diz respeito apenas a pessoas<br />
diretamente engajadas no processo<br />
de trabalho, isto é, aos trabalha<strong>do</strong>res.<br />
Com efeito, na divisão entre espaço de<br />
trabalho e espaço priva<strong>do</strong> só eventualmente<br />
pertinente na análise econômica,<br />
mas torna-se totalmente inconsistente a<br />
partir <strong>do</strong> momento em que se trata das<br />
relações sociais e das questões de saúde.<br />
Isso nos leva a pensar no sujeito como<br />
um to<strong>do</strong>, que mesmo no trabalho carrega<br />
consigo suas questões pessoais, pois não há<br />
como deixar em casas seus conflitos, pois esses<br />
o acompanham e independente de onde este<br />
sujeito esteja e que o trabalho afeta tanto o trabalha<strong>do</strong>r<br />
quanto seus familiares. Foi a partir dessas<br />
reflexões e estimuladas pela proposta <strong>do</strong> Plantão<br />
Psicológico que consideramos esta modalidade<br />
de atendimento como uma possibilidade de<br />
atuação <strong>do</strong> psicólogo tanto com o trabalha<strong>do</strong>r<br />
quanto com seus familiares, pois compreendemos<br />
que ambos podem se beneficiar com esses<br />
atendimentos em que o psicólogo atua como<br />
facilita<strong>do</strong>r de um desenvolvimento pleno efetivo<br />
da sociedade e mais diretamente <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r<br />
e seus familiares.<br />
Considerações finais<br />
Como relatamos, o interesse por discutir<br />
teoricamente sobre Plantão Psicológico e<br />
Trabalho iniciou-se durante os estágios curriculares<br />
proporciona<strong>do</strong>s pelo curso de Psicologia<br />
<strong>do</strong> UNIVAG – Centro Universitário, bem como<br />
a identificação pela Abordagem Centrada na<br />
Pessoa, conforme ênfase dada para a análise e<br />
reflexões <strong>do</strong> tema proposto neste artigo.<br />
Como vimos, cuidar da saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r<br />
é um desafio a se alcançar e que há<br />
muito ainda por avançar. Consideramos que a<br />
busca pela qualidade de vida no trabalho se estende<br />
para fora <strong>do</strong>s muros das instituições, uma<br />
vez que compreendemos como inconsistente a<br />
divisão entre o mun<strong>do</strong> social <strong>do</strong> trabalho e o<br />
priva<strong>do</strong>, de tal forma que os conflitos vivencia<strong>do</strong>s<br />
estão presentes na vida da pessoa independente<br />
<strong>do</strong> ambiente em que ela se encontre.<br />
Buscamos compreender esse homem<br />
trabalha<strong>do</strong>r e suas vivências à luz da teoria<br />
<strong>do</strong> psicólogo Carl Rogers, que nos afirma que<br />
mesmo em um curto espaço de tempo é possível<br />
oferecer uma importante ajuda ao cliente, de<br />
acolhê-lo e fornecer esclarecimentos das questões<br />
que ele enfrenta, pois o terapeuta oferece<br />
uma escuta centrada e confiante na tendência à<br />
realização que cada ser possui.<br />
Acreditamos, dessa forma, que a teoria<br />
de Rogers oferece embasamento para o atendimento<br />
em Plantão Psicológico realiza<strong>do</strong> em<br />
empresa, uma vez que consideramos importante<br />
cuidar da saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r.<br />
Para Silva e Marchi (1997), a a<strong>do</strong>ção<br />
de programas que visem à qualidade de vida e<br />
a promoção de saúde proporciona ao indivíduo<br />
maior resistência ao stress, maior estabilidade<br />
emocional, maior motivação, eficiência no<br />
trabalho, além de melhorar a autoimagem e os<br />
relacionamentos dentro e fora <strong>do</strong> ambiente de<br />
trabalho.<br />
158<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR
RODRIGUES, J. L.; CANDIDO, F. As possibilidades <strong>do</strong> plantão psicológico no ambiente de trabalho<br />
Assim, quan<strong>do</strong> as empresas investem<br />
em programas de qualidade de vida no trabalho,<br />
são beneficiadas com trabalha<strong>do</strong>res mais saudáveis,<br />
isto automaticamente contribui não só<br />
como bem estar das pessoas, mas também para<br />
a redução <strong>do</strong> absenteísmo e rotatividade, menor<br />
número de acidentes, maior produtividade e<br />
melhor imagem, o que contribui para a melhora<br />
no ambiente de trabalho.<br />
Com isso, entendemos que o mun<strong>do</strong><br />
social <strong>do</strong> trabalho também favorece a construção<br />
subjetiva <strong>do</strong> homem, e influencia no esta<strong>do</strong> de<br />
saúde e <strong>do</strong>ença de forma que se torna compreensível<br />
à necessidade de um espaço de acolhimento<br />
e ajuda terapêutica nesse contexto social.<br />
E foi justamente a partir dessas reflexões<br />
que pensamos e desenvolvemos o projeto<br />
de Plantão Psicológico em Empresa, na Empresa<br />
Brasileira de Correios e Telégrafos da Diretoria<br />
Regional de Mato Grosso, cujas vivências influenciaram<br />
a busca por olhar e compreender o homem<br />
e o seu sofrimento, muitas vezes sufoca<strong>do</strong>s<br />
frente às exigências <strong>do</strong> cotidiano de seu trabalho.<br />
Os pontos discuti<strong>do</strong>s neste artigo<br />
apontam algumas das questões da realidade <strong>do</strong><br />
ambiente de trabalho e traz como desafio para<br />
a prática da psicologia no âmbito da saúde <strong>do</strong><br />
trabalha<strong>do</strong>r, e também a possibilidade de continuar<br />
a ampliar o leque de reflexões e de repensar<br />
sobre o já pensa<strong>do</strong> e pratica<strong>do</strong>.<br />
O impacto <strong>do</strong>s conflitos <strong>do</strong> ambiente de<br />
trabalho no mun<strong>do</strong> subjetivo <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res<br />
e seus familiares é um <strong>do</strong>s desafios da psicologia<br />
no âmbito da saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r. A angústia<br />
presente em suas vidas, sejam em decorrência<br />
<strong>do</strong> que acontece dentro ou fora <strong>do</strong> ambiente<br />
de trabalho, pode ser ressignificada através da<br />
escuta terapêutica disponível nessa modalidade<br />
de atendimento dentro <strong>do</strong> próprio ambiente de<br />
trabalho. Acreditamos que acolher o trabalha<strong>do</strong>r<br />
e oferecer auxílio psicológico, contribui com a<br />
prevenção de comprometimentos maiores na<br />
saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r e para melhor qualidade<br />
de vida.<br />
Enfim, destacamos a importância da<br />
nossa busca, profissionais da psicologia, por<br />
abertura de espaços que permitam aos trabalha<strong>do</strong>res<br />
e seus familiares se sentirem aceitos e acolhi<strong>do</strong>s<br />
para falar <strong>do</strong>s sentimentos vivencia<strong>do</strong>s, e<br />
apresentamos a proposta <strong>do</strong> serviço de Plantão<br />
Psicológico como uma possibilidade de ajuda<br />
psicológica àqueles que necessitarem.<br />
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Texto recebi<strong>do</strong> em 16 de julho de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 23 de setembro de 2009.<br />
160<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 151-160, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e<br />
Do Campo na década da educação (1997 – 2007)<br />
Guidelines from Unesco to the formation of teachers in and from the<br />
countryside areas in the decade of education (1997 – 2007)<br />
Directrices de la Unesco para la formación de maestros en y del<br />
campo en la década de la educación (1997 – 2007)<br />
Kethlen Leite de Moura 1<br />
Irizelda Martins de Souza e Silva 2<br />
RESUMO<br />
A partir de 1990, no âmbito das Nações Unidas, foram realiza<strong>do</strong>s eventos cuja tônica foi a Educação e a<br />
Formação de Professores. Derivaram de cada um <strong>do</strong>s eventos <strong>do</strong>cumentos que estabeleceram políticas que<br />
tratavam da Formação de Professores. Pareceu-nos significativo captar e analisar, nos <strong>do</strong>cumentos gera<strong>do</strong>s<br />
pela UNESCO, conteú<strong>do</strong>s que apontaram para políticas de governo que corporificaram, nos seus discursos,<br />
elementos para a Formação de Professores. Nesse senti<strong>do</strong>, apreender as influências da organização<br />
vinculada à ONU, denominada UNESCO, sobre as propostas de Formação de Professores no e <strong>do</strong> Campo<br />
foi o desafio que empreendemos. Nessa perspectiva, a pesquisa vinculada ao Projeto: Em Busca de Uma<br />
Política de Formação de professores no Brasil – orientações da UNESCO 1990, examinou as políticas de<br />
Formação de Professores para a Educação no e <strong>do</strong> Campo contidas nas orientações da UNESCO para o<br />
Brasil, na década da educação (1997 – 2007). A relevância <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> da problemática desvelou que, na<br />
Formação de Professores para a Educação no e <strong>do</strong> Campo, houve ruptura entre os objetivos declara<strong>do</strong>s<br />
e a prática realizada. A educação no e <strong>do</strong> campo é timidamente tratada, muitas vezes apresentada como<br />
“rural” ou “de zonas mais afastadas” e ainda “lugares de difícil acesso”, incidin<strong>do</strong> nas políticas de Formação<br />
de Professores no Brasil.<br />
Palavras-chave: Formação de Professores; Educação no e <strong>do</strong> Campo; UNESCO.<br />
ABSTRACT<br />
Since 1990, in the United Nations environment, events focused on Education and the Formation of Educators<br />
have been set up. Through them, <strong>do</strong>cuments which established policies which ensured the Formation of<br />
Teachers were created. It seemed important to capture and analyze the <strong>do</strong>cuments generated by UNESCO<br />
content that pointed to government policies that integrate in their speeches, elements for Teacher Education<br />
Developing conscience and unveiling the real basis, the propositions of the Formation of Teachers in<br />
1 Mestranda <strong>do</strong> Programa de Pós-Graduação em Educação da <strong>Universidade</strong> Estadual de Maringá – PPE/UEM. Pesquisa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />
Grupo de Estu<strong>do</strong>s e Pesquisa em Políticas e Gestão Educacional – GEPPGE/CNPq. Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de<br />
Pessoal de Nível Superior – CAPES. <strong>Universidade</strong> Estadual de Maringá (UEM). E-MAIL: ketty1985@gmail.com. Rua Tietê, nº 375,<br />
Bloco A, Apto 03, CEP 87020-210. Maringá – PR, Brasil.<br />
2 Professora Doutora Associada A <strong>do</strong> Departamento de Teoria e Prática da Educação, da <strong>Universidade</strong> Estadual de Maringá. Pertence<br />
ao Programa de Pós-Graduação em Educação: Mestra<strong>do</strong>. Atua na área de Educação, com ênfase em Políticas Públicas e Gestão<br />
Educacional atuan<strong>do</strong>, principalmente nos seguintes temas: Educação no e <strong>do</strong> Campo, Formação de Professores, Políticas Educacionais<br />
e Esta<strong>do</strong>. Também é pesquisa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Grupo de Estu<strong>do</strong>s e Pesquisas em Políticas e Gestão Educacional – GEPPGE/CNPq e <strong>do</strong> Grupo<br />
de Estu<strong>do</strong>s e Pesquisa em Políticas Públicas e Gestão da Educação na América Latina e Caribe - PGEALC. E-MAIL: irizmss@yahoo.<br />
com.br.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
161
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
and of the Countryside Areas, and realizing the<br />
influences of the organization linked to the UN,<br />
called UNESCO was the challenge that we developed.<br />
Through this perspective, the research<br />
linked to the Project: Searching for a Policy of<br />
Formation of Teachers in Brazil – oriented by<br />
the UNESCO 1990, analyzed the policies of<br />
Formation of Teachers for the Education in and<br />
of the Countryside Areas based on the orientations<br />
of the UNESCO for Brazil, in the decade<br />
of education (1997 - 2007). The relevance of<br />
studying the problem that were revealed in Formation<br />
of Teachers in and of the Countryside<br />
Areas, was a rift between the stated objectives<br />
and practice held. The Education in and of<br />
the Countryside Areas is maidenlike treated,<br />
often presented as “remote location” and also<br />
“places of difficult access”, focusing on policies<br />
for Teacher Education in Brazil.<br />
Keywords: Formation of Teachers; Education<br />
in and of the Countryside Areas; UNESCO.<br />
RESUMEN<br />
Nos pareció significativo captar y analizar, em<br />
los <strong>do</strong>cumentos genera<strong>do</strong>s por la UNESCO<br />
conteni<strong>do</strong>s que apuntarón para políticas de<br />
gobierno que introducirón en sus discursos, elementos<br />
para la Capacitación de Educa<strong>do</strong>res.<br />
En ese senti<strong>do</strong>, incautar las influencias de la<br />
organización vinculada a la ONU, denominada<br />
UNESCO, sobre lãs propuestas de Capacitación<br />
de Educa<strong>do</strong>res en el y Del Campo<br />
fue nuestro desafío. En esa oportunidad, la<br />
investigación al Proyecto: En Búsqueda de<br />
Uma Política de Capacitación de Educa<strong>do</strong>res<br />
em Brasil – orientaciones de la UNESCO<br />
1990, examino las políticas de Capacitación<br />
de Educa<strong>do</strong>res para la Educación en el y del<br />
Campo contenidas em las orientaciones de<br />
la UNESCO para Brasil, en lo decenio de la<br />
educación (1997-2007). La pertinencia del<br />
estúdio de la cuestionable desvelo que, em<br />
la Capacitación de Educa<strong>do</strong>res para la Educación<br />
en el y del Campo, tenen la suspensión<br />
entre los objectivos declara<strong>do</strong>s y la práctica<br />
consumada. La educación en el y del campo<br />
es tímidamente tratada, muchas veces presentada<br />
como “rural” o “de zonas más alejadas”<br />
y aún “lugares de difícil acceso”, incidin<strong>do</strong> en<br />
las políticas de Capacitación de Educa<strong>do</strong>res<br />
en Brasil.<br />
Palabras-clave: Formación del personal <strong>do</strong>cente;<br />
Educación en el campo; La UNESCO.<br />
Introdução<br />
A pesquisa sobre Formação de Professores<br />
para a Educação no e <strong>do</strong> Campo é<br />
complexa e propõe questões para reflexões e<br />
implicações nos <strong>do</strong>cumentos oficiais. Deriva de<br />
políticas educacionais que, a cada momento,<br />
vão conduzin<strong>do</strong> a educação e a formação de<br />
professores como desafios a se enfrentar. A tentativa<br />
de apreender em que medida as políticas<br />
e os projetos da Organização das Nações Unidas<br />
para a Educação, Ciência e Cultura – UNESCO<br />
– podem influenciar a Educação brasileira nos<br />
levou à proposta de examinar <strong>do</strong>cumentos desta<br />
agência na década da Educação (1997-2007).<br />
As Organizações das Nações Unidas – ONU – e<br />
a UNESCO, em destaque, têm revela<strong>do</strong> questões<br />
no mínimo controvertidas, pois as Políticas Públicas<br />
para a Educação, que são vinculadas ao meio<br />
acadêmico, levam-nos a observar que os traços<br />
que marcam a Educação estão estreitamente<br />
vincula<strong>do</strong>s ao espaço urbano. Desse mo<strong>do</strong>,<br />
a Educação <strong>do</strong> Campo tem que “se adaptar”<br />
muitas vezes para atender às reais necessidades<br />
<strong>do</strong>s indivíduos campesinos. Entendemos que<br />
a Educação no e <strong>do</strong> Campo se fazem “para” e<br />
“com” esses indivíduos 3 , envolven<strong>do</strong> a cultura, a<br />
Educação, os meios de produção, enfim, todas as<br />
suas especificidades, buscan<strong>do</strong> a construção de<br />
um homem capaz de questionar e refletir sobre<br />
sua condição humana.<br />
Por toda a década de 1980, inevitavelmente<br />
nos anos de 1990, deparamo-nos com a<br />
depreciação, pelos agentes nacionais e internacionais,<br />
de tu<strong>do</strong> aquilo que fosse público. Ligada<br />
ao esquema de privatização e às leis de merca<strong>do</strong>,<br />
aos “olhos <strong>do</strong>s outros”, vai se estabelecen<strong>do</strong><br />
uma ação sanea<strong>do</strong>ra, via desmobilização, entre<br />
o público e o priva<strong>do</strong>. Qualifica-se, por meio de<br />
órgãos internacionais e agências multilaterais<br />
(UNESCO, Fun<strong>do</strong> Monetário Internacional –<br />
3 Que englobam: assalaria<strong>do</strong>s temporários, posseiros, meeiros,<br />
arrendatários, trabalha<strong>do</strong>res rurais, acampa<strong>do</strong>s, assenta<strong>do</strong>s,<br />
atingi<strong>do</strong>s por barragens, povos da floresta, indígenas, ilhéus,<br />
quilombolas, pesca<strong>do</strong>res e ribeirinhos.<br />
162<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
FMI, Banco Internacional de Reconstrução e<br />
Desenvolvimento – BIRD, Banco Interamericano<br />
– BID), o ensino de boa qualidade, o priva<strong>do</strong>.<br />
Paulatinamente, a Educação Pública, com seus<br />
atores de frente, os professores, vão forçosamente<br />
se conforman<strong>do</strong> com as leis da livre concorrência,<br />
desvian<strong>do</strong> as energias <strong>do</strong> coletivo e da<br />
interação, assumin<strong>do</strong> algumas responsabilidades<br />
e exigências que estão acima <strong>do</strong> “ser professor”.<br />
A formação de professores está ligada<br />
às reformas sociais mais amplas, nas quais os<br />
professores, muitas vezes, são ti<strong>do</strong>s como “incompetentes”<br />
e não são incluí<strong>do</strong>s nas definições<br />
das reformas educacionais necessárias. A maioria<br />
das propostas educacionais limita-se ao espaço<br />
mínimo de “reciclagem”, em que a prática <strong>do</strong><br />
professor é dispensada. Teorizam-se, na maioria<br />
das vezes, os modismos e as recomendações <strong>do</strong>s<br />
especialistas.<br />
A Formação de Professores para a<br />
Educação no e <strong>do</strong> Campo constitui espaço ainda<br />
pouco pesquisa<strong>do</strong>, necessitan<strong>do</strong> de aprofundamento,<br />
no meio acadêmico, nos cursos de Licenciatura.<br />
Tais questões refletem a relevância desta<br />
pesquisa, proposta no âmbito da UNESCO e sua<br />
relação com a Educação no Brasil. Destacamos<br />
como principais metas: identificar e analisar, nos<br />
<strong>do</strong>cumentos da UNESCO, a partir <strong>do</strong> início da<br />
Década da Educação (1997 a 2007), quais são<br />
as recomendações para o Brasil no que tange<br />
à Formação de Professores para a Educação<br />
no e <strong>do</strong> Campo. A pesquisa foi <strong>do</strong>cumental em<br />
fontes primárias, que são acessíveis e disponibilizadas<br />
via relatórios da UNESCO, publica<strong>do</strong>s no<br />
Brasil, tornan<strong>do</strong>-se material importante para a<br />
apreensão das orientações das agendas políticas<br />
<strong>do</strong>s governos locais. Utilizamo-nos, ainda, de<br />
bibliografias e autores que discutiram a temática<br />
proposta. Foi fundamental o referencial teórico<br />
meto<strong>do</strong>lógico de cunho histórico-crítico que<br />
orientou a leitura <strong>do</strong> diálogo entre as fontes.<br />
Esses <strong>do</strong>cumentos e agências internacionais<br />
influenciaram e influenciam as políticas<br />
públicas brasileiras e mundiais, organizaram as<br />
formas de elaboração de projetos educacionais,<br />
cobran<strong>do</strong> e ordenan<strong>do</strong> meios de avaliação e de<br />
divulgação desses resulta<strong>do</strong>s para que os países<br />
pudessem melhorar a qualidade <strong>do</strong> ensino e da<br />
Educação, baixan<strong>do</strong> os níveis de analfabetismo,<br />
evasão escolar e repetência e conceden<strong>do</strong> melhoria<br />
à situação <strong>do</strong>cente.<br />
Podemos destacar da pesquisa os seguintes<br />
<strong>do</strong>cumentos:<br />
• Conferência Mundial de Educação para<br />
To<strong>do</strong>s – “Declaração de Jomtien” (1990) – que<br />
apontou a taxa de analfabetismo e destacou os<br />
nove países com índice mais alto dessa taxa,<br />
dentre eles, o Brasil, que fez algumas tentativas<br />
de elaboração de políticas para a necessidade<br />
da Educação Básica – NEBAS 4 ;<br />
• Comissão Internacional sobre Educação para<br />
o Século XXI (1993-1996). Como resulta<strong>do</strong> dessa<br />
Comissão, temos o <strong>do</strong>cumento: Um Tesouro<br />
a Descobrir – “Relatório Delors” (1996), que<br />
enfatiza as dimensões que a Educação deveria<br />
atingir, no século XXI, para amenizar problemas<br />
de pobreza, desemprego e a exclusão social,<br />
dan<strong>do</strong> grande ênfase ao “papel <strong>do</strong> professor”.<br />
Desenvolvimento<br />
A Organização das Nações Unidas para<br />
a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO),<br />
fundada em meio a resquícios da II Guerra<br />
Mundial, em 16 de novembro de 1945, apreende<br />
como principal meta a construção da paz<br />
na mente <strong>do</strong>s homens e atua em diversas áreas<br />
como Educação, Ciências Naturais, Ciências<br />
Humanas e Sociais, Cultura, Comunicação e<br />
Informação.<br />
4 Plano de Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas de<br />
Aprendizagem (NEBAS), foi aprova<strong>do</strong> pela Conferência Mundial<br />
sobre Educação para To<strong>do</strong>s. Jomtien, Tailância, 5 a 9 de março<br />
de 1990.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
163
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
No Brasil, a UNESCO (Organização<br />
das Nações Unidas da Educação, Ciência e<br />
Cultura) representou-se com sua sede apenas<br />
em 1966, em determina<strong>do</strong> momento em que a<br />
Organização deixava de agir sozinha e passava<br />
a atuar em conjunto com as demais agências<br />
que já atuavam no Brasil desde 1964. Vejamos<br />
o que estava ocorren<strong>do</strong> no Brasil nesse perío<strong>do</strong><br />
com relação à Educação <strong>do</strong> Campo:<br />
164<br />
Na década de 60, a fim de atender aos<br />
interesses da elite brasileira, então preocupada<br />
com o crescimento <strong>do</strong> número<br />
de favela<strong>do</strong>s nas periferias <strong>do</strong>s grandes<br />
centros urbanos, a educação rural foi<br />
a<strong>do</strong>tada pelo Esta<strong>do</strong> como estratégia de<br />
contenção <strong>do</strong> fluxo migratório <strong>do</strong> campo<br />
para a cidade. A Lei de Diretrizes e Bases<br />
da Educação Nacional de 1961, em seu<br />
art. 105, estabeleceu que “os poderes<br />
públicos instituirão e ampararão serviços<br />
e entidades que mantenham na zona<br />
rural escolas capazes de favorecer a adaptação<br />
<strong>do</strong> homem ao meio e o estímulo<br />
de vocações profissionais” (BRASIL,<br />
2007, p.11).<br />
O que queremos dizer é que as atividades<br />
capitalistas, avançan<strong>do</strong> nos territórios<br />
nacionais, fizeram com que o Esta<strong>do</strong> assumisse a<br />
educação rural, bem como escolas agrícolas cujo<br />
conteú<strong>do</strong> tratava de ações práticas de plantio e colheita.<br />
Assinalamos ainda que a educação teria a<br />
tarefa de realizar uma mudança no campo, tiran<strong>do</strong><br />
o homem <strong>do</strong> atraso e da ignorância, impedin<strong>do</strong>,<br />
assim, a migração dessa população para a cidade.<br />
A partir de 1966, a UNESCO tem apresenta<strong>do</strong><br />
diversos programas de melhoria em suas<br />
áreas de abrangência, mas estes geralmente não<br />
são específicos para um determina<strong>do</strong> país. Deste<br />
mo<strong>do</strong>, tais programas têm que ser adapta<strong>do</strong>s ao<br />
contexto vivi<strong>do</strong> na sociedade brasileira ou nos<br />
países em que forem implanta<strong>do</strong>s. Para que o<br />
Brasil possa avançar, deve superar o analfabetismo,<br />
a miséria, a falta de emprego, entre outros.<br />
Essas metas devem ser alcançadas por meio de<br />
estratégias que possam minimizar qualquer dificuldade<br />
encontrada para a realização <strong>do</strong>s projetos<br />
a serem implementa<strong>do</strong>s nos próximos anos. Os<br />
<strong>do</strong>cumentos dessa agência multilateral – UNES-<br />
CO, que trazem diagnósticos atuais sobre países<br />
em desenvolvimento como o Brasil, são temáticas<br />
importantes que pretendem obter respostas positivas<br />
aos encargos deste país.<br />
Para tanto, a UNESCO amplia seu<br />
campo de atuação, sen<strong>do</strong> capaz de mobilizar<br />
representantes de to<strong>do</strong>s os continentes para cumprir<br />
suas competências. E no Brasil não é muito<br />
diferente, há sedes e agências que se prontificam<br />
em atender a to<strong>do</strong>s os países da América Latina,<br />
porém, muitos projetos não se adequam às necessidades<br />
<strong>do</strong> País, pois muitos contam com a ajuda<br />
<strong>do</strong> Governo, que, em muitos casos, dá prioridade<br />
a outros setores.<br />
Na apresentação <strong>do</strong> <strong>do</strong>cumento Dos<br />
Valores Proclama<strong>do</strong>s aos Valores Vivi<strong>do</strong>s (2001,<br />
p.7), analisamos e parafraseamos as normas<br />
e orientações da UNESCO sobre a educação.<br />
Podemos ler que a UNESCO tem a função de<br />
estimular a eficiência <strong>do</strong>s países e seus governos<br />
para que os projetos propostos sejam cumpri<strong>do</strong>s.<br />
Em vista disso, ela também é responsável por<br />
oferecer caminhos que auxiliam na experiência<br />
nacional com a educação. A UNESCO tem<br />
função intermediária frente aos diversos grupos<br />
existentes no país, especificamente para aqueles<br />
que são excluí<strong>do</strong>s da sociedade civil. A UNESCO<br />
têm a função de estimular a eficiência <strong>do</strong>s países<br />
e seus governos e para que os projetos propostos<br />
sejam cumpri<strong>do</strong>s à vista disso, ela também é<br />
responsável por oferecer caminhos que auxiliam<br />
na experiência nacional. Então, a UNESCO tem<br />
a função intermediária frente aos diversos grupos<br />
existentes no país, especificamente àqueles que<br />
são excluí<strong>do</strong>s da sociedade civil.<br />
Erradicar o analfabetismo é uma perspectiva<br />
ainda em foco no Brasil, sen<strong>do</strong> preciso<br />
combater as desigualdades na educação, as<br />
metas estabelecidas por essa agência internacional<br />
aparentemente é uma das opções para tais<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
problemas, porém, executar nem sempre é tão<br />
fácil, ainda existem grupos específicos na sociedade<br />
brasileira como: a população campesina, a<br />
população indígena, quilombolas, entre outros,<br />
que são totalmente esqueci<strong>do</strong>s no momento de<br />
se instruir políticas públicas que deveriam ser<br />
coordenadas pelo governo mas que acabam nas<br />
mãos da iniciativa privada e de ONGs. Vejamos<br />
os da<strong>do</strong>s abaixo (INEP/MEC, 2007, p.15):<br />
[...] Segun<strong>do</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> PNDA 2004,<br />
29,8% da população adulta (de 15 anos<br />
ou mais) da zona rural é analfabeta,<br />
enquanto na zona urbana essa taxa é<br />
de 8,7%. É importante ressaltar que a<br />
taxa de analfabetismo aqui considerada<br />
não inclui os analfabetos funcionais, ou,<br />
seja, aquela população com menos que<br />
as quatro séries <strong>do</strong> ensino fundamental.<br />
De acor<strong>do</strong> com o Ministério da Educação<br />
e Cultura – MEC, o Brasil, no ano de 2004,<br />
alcançou metas bastante significativas com relação<br />
à educação de povos indígenas, no entanto, ainda<br />
se faz necessário o oferecimento de uma educação<br />
mais condizente às suas reais necessidades<br />
e prioridades e isso só será possível com vasto<br />
investimento na formação inicial e continuada<br />
de professores.<br />
No ano de 2000, início <strong>do</strong> século XXI,<br />
a ONU estabeleceu a Declaração <strong>do</strong> Milênio das<br />
Nações Unidas, como resulta<strong>do</strong> da Cúpula <strong>do</strong><br />
Milênio, e definiu uma lista <strong>do</strong>s principais componentes<br />
da agenda global <strong>do</strong> Século XXI: 1.<br />
Erradicar a extrema pobreza e a fome; 2. Atingir o<br />
ensino básico universal; 3. Promover a igualdade<br />
entre os sexos e a autonomia das mulheres; 4. Reduzir<br />
a mortalidade infantil; 5. Melhorar a saúde<br />
materna; 6. Combater o HIV/AIDS, a malária e<br />
outras <strong>do</strong>enças; 7. Garantir a sustentabilidade<br />
ambiental; e 8. Estabelecer uma parceria mundial<br />
para o desenvolvimento. A UNESCO está envolvida<br />
em seis <strong>do</strong>s oito objetivos.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
Essa agência, vinculada à ONU (Organização<br />
das Nações Unidas),exerce com precisão e regularidade<br />
o papel de edifica<strong>do</strong>ra de ideais, firman<strong>do</strong><br />
acor<strong>do</strong> entre países com a intenção de disseminar e<br />
compartilhar informações e conhecimentos, visan<strong>do</strong><br />
ao trabalho em comum nas áreas da educação,<br />
ciência e cultura. O acervo <strong>do</strong>s princípios e normas<br />
e orientações sobre a educação tem se constituí<strong>do</strong><br />
em constante desafio às mudanças da realidade, não<br />
bastan<strong>do</strong> apenas construir salas de aulas, em países<br />
subdesenvolvi<strong>do</strong>s, ou até mesmo divulgar pesquisas<br />
cientificas, seu maior intento é estabelecer quatro<br />
critérios: educação, ciência sociais e naturais, cultura<br />
e comunicação, que poderão atingir um único alvo<br />
que é a edificação da paz entre os homens. Para<br />
alguns pesquisa<strong>do</strong>res, tais princípios não deixam<br />
de ser, muitas vezes, apenas “bonitas palavras”<br />
acumuladas sobre papéis desde o pós-guerra; têm<br />
a inegável força moral que, mesmo em situações<br />
de despotismo, desnudam a tensão entre o ser e o<br />
dever ser ou querer ser menos. Vamos tratar a seguir<br />
<strong>do</strong> nosso percurso na apreensão <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos<br />
gera<strong>do</strong>s na Conferência e Relatório propostos para<br />
educação pela UNESCO.<br />
Conferência Mundial De Educação Para<br />
To<strong>do</strong>s – Declaração de Jomtien<br />
A Conferência Mundial de Educação<br />
para To<strong>do</strong>s foi realizada em Jomtien, na Tailândia,<br />
no perío<strong>do</strong> de 5 a 9 de março de 1990 e teve<br />
como órgãos financia<strong>do</strong>res: a UNESCO; o Fun<strong>do</strong><br />
das Nações Unidas para a Infância – UNICEF; o<br />
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento<br />
– PNUD; e o Banco Mundial – BM. O<br />
principal compromisso foi impulsionar políticas<br />
educacionais que objetivassem (e objetivem)<br />
reduzir as taxas de analfabetismo e fortalecer a<br />
Educação Básica 5 . Outro aspecto que se deve<br />
5 A educação básica refere-se à educação que objetiva satisfazer<br />
as necessidades básicas de aprendizagem; inclui a instrução<br />
primária ou fundamental, em que a aprendizagem subsequente<br />
deve ser baseada; compreende a educação infantil e primária (ou<br />
165
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
observar é o início da transferência de responsabilidade,<br />
por parte <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e das autoridades,<br />
para a comunidade, organismos governamentais<br />
e não governamentais (ONGs) e grupos religiosos.<br />
A Declaração de Jomtien relata, em<br />
seu Documento, que “toda pessoa tem direito à<br />
Educação”, passan<strong>do</strong> a ser conhecida como a<br />
Declaração Mundial de Educação para To<strong>do</strong>s.<br />
Sua grande precursora, a UNESCO, propôs tal<br />
Documento cujo principal objetivo é “Satisfazer<br />
as Necessidades Básicas de Aprendizagem” de<br />
todas as crianças, jovens e adultos. O esforço de<br />
longo prazo para a consecução desse objetivo<br />
pode ser sustenta<strong>do</strong> de forma mais eficaz, uma<br />
vez estabeleci<strong>do</strong> e medi<strong>do</strong>s os objetivos intermediários<br />
através <strong>do</strong>s progressos realiza<strong>do</strong>s.<br />
Os países que participam desse acor<strong>do</strong><br />
são estimula<strong>do</strong>s a preparar gradualmente Planos<br />
Decenais, mostran<strong>do</strong> quais são as diretrizes e<br />
metas <strong>do</strong> Plano de Ação da Conferência que podem<br />
ser observadas atentamente. Diante de tais<br />
propostas, no Brasil, o Ministério da Educação e<br />
Cultura divulgou o Plano Decenal de Educação<br />
para To<strong>do</strong>s no perío<strong>do</strong> de 1993 a 2003, seguin<strong>do</strong><br />
o propósito da Conferência Mundial de Educação<br />
para To<strong>do</strong>s e suas resoluções.<br />
O Plano de Ação conclama a sociedade<br />
a promover a Educação para To<strong>do</strong>s, mobilizan<strong>do</strong><br />
os recursos financeiros, humanos, públicos,<br />
priva<strong>do</strong>s ou voluntários.<br />
To<strong>do</strong>s os membros da sociedade têm<br />
uma contribuição a dar, lembran<strong>do</strong><br />
sempre que o tempo, a energia e os<br />
recursos dirigi<strong>do</strong>s à educação básica<br />
constituem, certamente, o investimento<br />
mais importante que se pode fazer no<br />
elementar), bem como a alfabetização, cultura geral e habilidades<br />
essenciais na capacitação de jovens e adultos; em alguns lugares<br />
inclui também o ensino médio. As necessidades básicas de aprendizagem,<br />
segun<strong>do</strong> a mesma fonte, referem-se “ao conhecimento,<br />
habilidades, atitudes e valores necessários para as pessoas sobreviverem,<br />
desenvolverem a qualidade de suas vidas e continuarem<br />
aprenden<strong>do</strong>”. (Disponível em: .<br />
Acesso em: 20 fev. 2009.<br />
povo e no futuro de um país. (Artigo 9,<br />
UNESCO, 1990).<br />
Este Documento aponta, ainda, para<br />
a urgente necessidade de melhoria da situação<br />
<strong>do</strong>cente. Podemos observar no Plano de Ação<br />
(UNESCO, 1990), no item 33, que:<br />
O proeminente papel <strong>do</strong> professor e demais<br />
profissionais da educação no provimento<br />
de educação básica de qualidade<br />
deverá ser reconheci<strong>do</strong> e desenvolvi<strong>do</strong>,<br />
de forma a otimizar sua contribuição.<br />
Isso irá implicar a a<strong>do</strong>ção de medidas<br />
para garantir o respeito aos seus direitos<br />
sindicais e liberdade profissional, e<br />
melhorar suas condições e status de<br />
trabalho, principalmente em relação a<br />
sua contramão, formação inicial, capacitação<br />
em serviço, remuneração e<br />
possibilidades de desenvolvimento na<br />
carreira <strong>do</strong>cente, bem como permitir<br />
ao pessoal <strong>do</strong>cente a plena satisfação<br />
de suas aspirações e o cumprimento<br />
satisfatório de suas obrigações sociais e<br />
responsabilidades éticas.<br />
Cabe lembrar que, desde que se realizou<br />
a Conferência Mundial de Educação para<br />
To<strong>do</strong>s (1990), muitos países assumiram o compromisso<br />
de garantir ao menos uma Educação<br />
Básica e com qualidade para crianças, jovens e<br />
adultos, pois a realidade <strong>do</strong>s países participantes<br />
demonstrava que:<br />
Mais de 100 milhões de crianças das<br />
quais pelo menos 60 milhões são<br />
meninas não têm acesso ao ensino<br />
primário. Mais de 960 milhões de adultos<br />
– <strong>do</strong>is terços <strong>do</strong>s quais mulheres<br />
- são analfabetos, e o analfabetismo<br />
funcional é um problema significativo<br />
em to<strong>do</strong>s os países industrializa<strong>do</strong>s ou<br />
em desenvolvimento; mais de um terço<br />
<strong>do</strong>s adultos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> não tem acesso<br />
ao conhecimento impresso, às novas<br />
habilidades e tecnologias, que poderiam<br />
166<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
melhorar a qualidade de vida e ajudá-los<br />
a perceber e a adaptar-se às mudanças<br />
sociais e culturais. E mais de 100 milhões<br />
de crianças e incontáveis adultos<br />
não conseguem concluir o ciclo básico,<br />
e outros milhões, apesar de concluí-lo,<br />
não conseguem adquirir conhecimentos<br />
e habilidades essenciais 6 .<br />
Um <strong>do</strong>s primordiais <strong>do</strong>cumentos mundiais<br />
sobre Educação é a Declaração de Jomtien,<br />
pois ela caminha com os Direitos da Criança<br />
(1988) e com a Declaração de Salamanca<br />
(1994). Portanto, há asserção explícita que cada<br />
pessoa – criança, jovem e adulto – deve estar<br />
em condições de aproveitar as oportunidades<br />
educativas, voltadas para satisfazer tanto suas<br />
necessidades básicas de aprendizagem (como<br />
leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo,<br />
a solução de problemas), quanto os conteú<strong>do</strong>s<br />
básicos de aprendizagem (como conhecimentos,<br />
habilidades, valores e atitudes), necessários<br />
para que os seres humanos possam sobreviver,<br />
desenvolver-se plenamente, melhorar a qualidade<br />
de vida, tomar decisões fundamentadas,<br />
continuan<strong>do</strong> a aprender.<br />
No Brasil, de acor<strong>do</strong> com Shiroma,<br />
Moraes e Evangelista (2004), empresários e<br />
renoma<strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res atuaram como arautos<br />
das reformas educacionais no final <strong>do</strong> século XX.<br />
Como resulta<strong>do</strong> da Conferência Mundial sobre<br />
Educação para To<strong>do</strong>s (Jomtien, 1990), foi formulada<br />
a Declaração Mundial sobre Educação<br />
para To<strong>do</strong>s: Satisfação das Necessidades Básicas<br />
de Aprendizagem (NEBA’s). Aprova<strong>do</strong>, o Plano<br />
de Ação para atender a essas Necessidades Básicas<br />
de Aprendizagem seria de responsabilidade<br />
de ‘To<strong>do</strong>s’. Sedutoras preocupações políticas que<br />
sensibilizaram muitos políticos e educa<strong>do</strong>res bem<br />
intenciona<strong>do</strong>s, mas também abriram brechas<br />
para ações oportunistas (SILVA JÚNIOR, 2002).<br />
A tarefa <strong>do</strong>s países signatários seria<br />
ajustar o Plano de Ação para satisfazer as ne-<br />
6 Disponível em: . Acesso em: 17 jul. 2008.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
cessidades básicas de aprendizagem, enfatizadas<br />
na Declaração Mundial sobre Educação para<br />
To<strong>do</strong>s (1990). No artigo 3, item 4, “Universalizar<br />
o acesso à Educação e Promover a Equidade”,<br />
podemos observar:<br />
Um compromisso efetivo para superar<br />
as disparidades educacionais deve ser<br />
assumi<strong>do</strong>. Os grupos excluí<strong>do</strong>s – os<br />
pobres, os meninos e meninas de rua<br />
ou trabalha<strong>do</strong>res; as populações das<br />
periferias urbanas e zonas rurais;<br />
os nômades e os trabalha<strong>do</strong>res migrantes;<br />
os povos indígenas; as minorias<br />
étnicas, as raciais e lingüísticas;<br />
os refugia<strong>do</strong>s, os desloca<strong>do</strong>s<br />
pela guerra; e os povos submeti<strong>do</strong>s a<br />
um regime de ocupação – não devem<br />
sofrer qualquer tipo de discriminação no<br />
acesso às oportunidades educacionais<br />
(grifo nosso).<br />
Este item focaliza os desvali<strong>do</strong>s sociais,<br />
não pon<strong>do</strong> em pauta as condições e razões da<br />
realidade desses sujeitos. Não declara suas condições<br />
nem os meios para ajudá-los a perceber<br />
e adaptar-se às mudanças sociais e culturais em<br />
trânsito em to<strong>do</strong> o país.<br />
A enunciação dessa Conferência<br />
Mundial de Educação para To<strong>do</strong>s proporciona<br />
algumas definições e novos conceitos sobre a<br />
satisfação das necessidades básicas de aprendizagem,<br />
tentan<strong>do</strong> instituir compromissos a serem<br />
firma<strong>do</strong>s mundialmente, pretenden<strong>do</strong> garantir<br />
ao menos conhecimentos básicos e necessários<br />
para uma vida digna das populações viventes<br />
neste Planeta, almejan<strong>do</strong>, assim, uma sociedade<br />
mais humana e mais justa.<br />
A Carta de Jomtien não destaca apenas<br />
a Educação Básica escolar, mas sim as necessidades<br />
básicas de aprendizagem (NEBA’s), referin<strong>do</strong>-se<br />
àqueles conhecimentos teóricos e práticos,<br />
a capacidades e valores. Surge, em meio a essas<br />
mudanças, a expressão ‘Para To<strong>do</strong>s’ que, no<br />
Documento cita<strong>do</strong>, coloca a universalização da<br />
167
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
Educação Básica. Aqui no Brasil, compreendeu-<br />
-se tal termo desde a Educação Básica ao Ensino<br />
Médio, algo que a Conferência não pretendia.<br />
A educação brasileira tem uma <strong>do</strong>utrina que<br />
admite a coexistência de <strong>do</strong>is princípios: atender<br />
às necessidades das camadas mais empobrecidas<br />
e conferir urgência à necessidade de mudanças<br />
educacionais, atitudes indispensáveis para que<br />
o sujeito enfrente suas necessidades básicas,<br />
conforme Shiroma, Moraes e Evangelista (2004,<br />
p. 58):<br />
1) sobrevivência; 2) desenvolvimento<br />
pleno de suas capacidades; 3) uma<br />
vida e um trabalho dignos; 4) uma<br />
participação plena no desenvolvimento;<br />
5) a melhoria na qualidade de vida; 6)<br />
a tomada de decisões informadas; 7)<br />
possibilidade de continuar aprenden<strong>do</strong>.<br />
Faz-se necessário, ainda, dar um novo<br />
senti<strong>do</strong> ao papel <strong>do</strong> professor, consideran<strong>do</strong><br />
fatores que, pelo Esta<strong>do</strong>, são deixa<strong>do</strong>s de la<strong>do</strong>,<br />
como a formação inicial até a continuada, pois<br />
não se considera que o professor tenha suas reais<br />
necessidades básicas de aprendizagem. Guiomar<br />
Namo de Mello (2003, p. 2-4) diz a respeito:<br />
Como essas necessidades básicas de<br />
aprendizagem se expressariam no contexto<br />
da formação e exercício profissional<br />
<strong>do</strong> professor<br />
1. Aprender a conhecer: saber os conteú<strong>do</strong>s<br />
a serem ensina<strong>do</strong>s e os conteú<strong>do</strong>s<br />
que fundamentam o ensino;<br />
2. aprender a fazer: saber gerenciar<br />
o ensino e a aprendizagem em sala de<br />
aula;<br />
3. aprender a conviver: saber estabelecer<br />
relações de autonomia e respeito<br />
com o meio social, institucional e profissional<br />
em que vive e com os alunos;<br />
4. aprender a ser professor: construir<br />
a própria identidade.<br />
Cabe lembrar, com alguns estudiosos<br />
como Shiroma, Moraes e Evangelista (2004) e<br />
Arelaro (2000), que a Conferência Mundial de<br />
Educação para To<strong>do</strong>s foi uma mobiliza<strong>do</strong>ra de<br />
ações e marco na esfera da convocação e definição<br />
das políticas da UNESCO nos anos que se<br />
seguiram. Ela apontou agendas e princípios fundamentais<br />
nos quais as políticas nacionais para<br />
a educação e formação de educa<strong>do</strong>res foram<br />
fundamentais. Como agência especializada em<br />
Educação, desde a sua criação tem trabalha<strong>do</strong><br />
para o aprimoramento da Educação mundial,<br />
ten<strong>do</strong>, como principal diretriz, a partir <strong>do</strong>s anos<br />
1990, a Educação para To<strong>do</strong>s.<br />
Todavia, nesse movimento, as camadas<br />
populares aprendem a desconfiar da retórica<br />
oficial da Educação para To<strong>do</strong>s, das propostas<br />
de democratização da educação escolar, identifican<strong>do</strong><br />
contradições nos discursos competentes.<br />
Após dez anos <strong>do</strong> compromisso firma<strong>do</strong> em<br />
Jomtien, houve uma avaliação em Dacar, Senegal,<br />
retoman<strong>do</strong>, assim, conteú<strong>do</strong>s discuti<strong>do</strong>s<br />
(EVANGELISTA, 2003):<br />
Esta assumiu, entre outros, os desafios<br />
no senti<strong>do</strong> de melhorar a cobertura da<br />
educação inicial; de assegurar educação<br />
de qualidade, enfatizan<strong>do</strong> os grupos<br />
vulneráveis; de dar maior prioridade à<br />
alfabetização e à educação de jovens e<br />
adultos, incorporan<strong>do</strong>-as aos sistemas<br />
educacionais nacionais; e de formular<br />
políticas educacionais inclusivas. Entre<br />
os compromissos firma<strong>do</strong>s, estão os<br />
de priorizar políticas e estratégias que<br />
tendam a diminuir a repetência e a<br />
deserção; atribuir lugar central à escola<br />
para que seja acolhe<strong>do</strong>ra para as crianças<br />
em seu ambiente físico e social, favorecen<strong>do</strong>,<br />
inclusive, o exercício precoce<br />
da cidadania e a vida em democracia,<br />
com experiências de participação nas<br />
decisões da vida escolar na aprendizagem;<br />
desenvolver estratégias para<br />
a focalização na destinação <strong>do</strong> gasto<br />
para diminuir a iniqüidade e favorecer<br />
a população em situação de vulnerabilidade;<br />
e definir estruturas administrativas<br />
168<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
que tenham a escola como uma unidade<br />
básica e tendam à sua autonomia. Em<br />
outros termos, além <strong>do</strong>s compromissos<br />
financeiros e da gestão, refletin<strong>do</strong> a situação<br />
<strong>do</strong> continente latino – americano,<br />
foram enfatiza<strong>do</strong>s a atenção à educação<br />
infantil e o acesso e o sucesso no ensino<br />
fundamental (GOMES, 2001, p. 25).<br />
Embora a citação acima seja extensa,<br />
é imprescindível para o entendimento <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong><br />
da proposta e <strong>do</strong> acor<strong>do</strong> entre o governo<br />
brasileiro, signatário de tal compromisso, e a<br />
agência da UNESCO.<br />
Educação, Um Tesouro A Descobrir –<br />
Relatório Para A UNESCO Da Comissão<br />
Internacional Sobre Educação Para<br />
O Século XXI (1993-1996) – Relatório<br />
Delors (1996)<br />
A UNESCO convocou especialistas<br />
<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> to<strong>do</strong> para compor a Comissão Internacional<br />
sobre a Educação no século XXI<br />
que, entre os anos 1993 e 1996, sob árduos<br />
estu<strong>do</strong>s e discussões e presidência <strong>do</strong> francês<br />
Jacques Delors, objetivou responder à seguinte<br />
pergunta: “que tipo de educação se necessita<br />
no futuro e para que tipo de sociedade”. Visto<br />
que a UNESCO tem vasta publicação 7 no que<br />
se refere à Educação, o Relatório veio solidificar<br />
no campo educacional as ideias <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos<br />
e relatórios anteriores e, concomitantemente,<br />
“reafirmar as ações individuais como parte para<br />
a resolução <strong>do</strong>s problemas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>” (RIZO,<br />
2005, p. 16).<br />
Este Documento serviu de base para<br />
se rever a política educacional de vários países,<br />
aproximan<strong>do</strong>-se melhor da realidade de alguns<br />
deles. Apontou que mesmo os países mais ricos<br />
apresentavam problemas socioculturais, o que<br />
trouxe desilusão em grande parte da população<br />
mundial. Revelaram da<strong>do</strong>s sobre a miséria,<br />
o desemprego e a exclusão social. Conforme<br />
pudemos observar na leitura <strong>do</strong> Relatório, a<br />
solidariedade, a tolerância e o respeito mútuo<br />
são valores que a Educação deve priorizar para<br />
a coesão social. Cabe lembrar que o Relatório<br />
reforçou a noção de educação permanente, ou<br />
seja, ao longo da vida.<br />
O Relatório propõe quatro tipos de<br />
aprendizagem que, no Brasil, são aponta<strong>do</strong>s<br />
como os quatro pilares da Educação: aprender<br />
a conhecer; aprender a fazer; aprender a ser e<br />
aprender a viver juntos.<br />
[...] Aprendemos o conhecer-nos (e a<br />
respeitarmo-nos mau gra<strong>do</strong> as vigorosas<br />
diferenças de pontos de vista)como<br />
ponto de partida para a aprendizagem<br />
comum de fazer uma proposta de futuro.<br />
Ao mesmo tempo provamos que<br />
podíamos aprender a viver juntos e que<br />
o aprender a ser só tem significa<strong>do</strong> na<br />
relação com o outro diferente e na sua<br />
inesgotável riqueza pessoal (UNESCO,<br />
1996, p.10).<br />
7 Recomendação Concernente à Condição <strong>do</strong> Pessoal Docente<br />
(UNESCO e OIT, 1996) e Declaração da Conferência Internacional<br />
de Educação (1996) – Condição da Pessoa Docente; Declaração<br />
de Salamanca (1994) – Necessidades Educativas Especiais;<br />
Declaração de Hamburgo sobre a educação de Adultos (1997)<br />
– Educação de Adultos; Declaração Mundial sobre a Educação<br />
Superior no Século XXI – Educação Superior; Convenção sobre<br />
Educação Técnica e Vocacional (1989) e Ensino e Formação Técnica<br />
Profissional (1999) – Educação Profissional; Programa de Ação<br />
da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento<br />
(1994) – Educação em Matéria de População e Desenvolvimento;<br />
A UNESCO e a Sociedade da Informação para To<strong>do</strong>s (1996) –<br />
Educação e Sociedade da Informação; Entre outras publicações<br />
que tratam da Educação Ambiental, a Educação Física e o Desporto<br />
e Educação para o Lazer.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
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MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
Não se pode falar da formação <strong>do</strong><br />
professor, que foi o foco de nossa pesquisa, sem<br />
antes apreender algumas características sobre o<br />
ensino apresenta<strong>do</strong> no Relatório Delors. Só assim<br />
poderíamos compreender por que o Relatório<br />
destaca o professor como o principal agente,<br />
responsável pelas mudanças apontadas pelo<br />
novo ideário de Educação para o século XXI.<br />
Face aos múltiplos desafios <strong>do</strong> futuro,<br />
a educação surge como um trunfo indispensável<br />
à humanidade na sua construção<br />
<strong>do</strong>s ideais de paz, da liberdade<br />
e da justiça social. Ao terminar os seus<br />
trabalhos, a Comissão faz, pois, questão<br />
de afirmar a sua fé no papel essencial da<br />
educação no desenvolvimento contínuo,<br />
tanto das pessoas como das sociedades<br />
[...] (UNESCO, 1996, p. 11).<br />
Porém, as responsabilidades que são<br />
colocadas aos professores vão muito além da<br />
competência e <strong>do</strong> profissionalismo. Estão relacionadas<br />
à sua maneira de ensinar, como ensinar,<br />
o que ensinar, acarretan<strong>do</strong>, em muitos países, a<br />
falta de profissionais capacita<strong>do</strong>s e a superlotação<br />
de salas, pois espera-se <strong>do</strong> professor muito<br />
além de suas responsabilidades de sala de aula.<br />
O trabalho <strong>do</strong> professor não consiste<br />
simplesmente em transmitir informações<br />
ou conhecimentos, mas em apresentálos<br />
sobre a forma de problemas a resolver,<br />
contextualizan<strong>do</strong>-os e perspectivan<strong>do</strong>-os<br />
de tal mo<strong>do</strong> que o aluno possa<br />
estabelecer a ligação entre a sua solução<br />
e as outras interrogações mais abrangentes.<br />
A relação pedagógica visa ao pleno<br />
desenvolvimento da personalidade <strong>do</strong><br />
aluno no respeito pela sua autonomia<br />
e, deste ponto de vista, a autoridade de<br />
que os professores estão revesti<strong>do</strong>s tem<br />
sempre um caráter para<strong>do</strong>xal, uma vez<br />
que não se baseia numa afirmação de<br />
poder, mas no livre reconhecimento da<br />
legitimidade <strong>do</strong> saber (UNESCO, 1996,<br />
p.135).<br />
A Educação é colocada como meio<br />
para a promoção tanto individual como da própria<br />
sociedade. Destaca-se que a promoção da<br />
Educação Básica deve ser o ponto de partida,<br />
“é um indispensável passaporte para a vida,<br />
faz com que os que dela se beneficiam possam<br />
escolher o que pretendem fazer, a educação<br />
básica é essencial se queremos lutar com êxito”<br />
(UNESCO, 1996, p.106). E o professor é o principal<br />
agente responsável pelas mudanças que<br />
devem ocorrer, tanto nos indivíduos como no<br />
seio da sociedade, de acor<strong>do</strong> com o Relatório:<br />
Os professores têm um papel determinante<br />
na formação de atitudes – positivas<br />
ou negativas – perante o estu<strong>do</strong>.<br />
Devem despertar a curiosidade, desenvolver<br />
a autonomia, estimular o rigor intelectual<br />
e criar as condições necessárias<br />
para o sucesso da educação formal e<br />
da educação permanente (UNESCO,<br />
1996, p.131).<br />
Embora se reconheça que os problemas<br />
como a pobreza e violência sejam responsabilidade<br />
da sociedade como um to<strong>do</strong>, e poden<strong>do</strong>-<br />
-se dizer que são problemas crônicos, não só<br />
no Brasil, mas em outras partes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, e<br />
que as crianças não deixam a porta da escola,<br />
espera-se que<br />
[...] os professores sejam capazes, não<br />
só de enfrentar esses problemas e esclarecer<br />
os alunos sobre um conjunto de<br />
questões sociais, [...] mas também que<br />
obtêm suces so em áreas em que pais,<br />
instituições religiosas e poderes públicos<br />
falharam muitas vezes (UNESCO, 1996,<br />
p.131).<br />
Conforme o Relatório, a qualidade de<br />
formação <strong>do</strong>s professores é indispensável para<br />
a qualidade <strong>do</strong> ensino e, deste mo<strong>do</strong>, apresenta<br />
algumas medidas que devem ser observadas:<br />
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Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
recrutamento; formação inicial; formação contínua;<br />
professores com formação pedagógica;<br />
controle; gestão; participação de agentes exteriores<br />
à escola; melhores condições de trabalho;<br />
meios de ensino.<br />
Salientamos que, com a leitura <strong>do</strong> Relatório<br />
Delors, foi possível observar forte viés de<br />
cunho moralista em relação à formação e atuação<br />
<strong>do</strong>s professores, não só para os que atuam<br />
na zona urbana, mas envolven<strong>do</strong>, também, os<br />
que atuam no campo, objeto de nossa pesquisa.<br />
A leitura <strong>do</strong> Documento nos possibilitou observar<br />
que, ao mesmo tempo em que põe a responsabilidade<br />
no professor, ele não apresenta soluções<br />
para os problemas já existentes, no caso <strong>do</strong> Brasil,<br />
a defasagem salarial e a falta de condições<br />
mínimas de trabalho, observadas principalmente<br />
nos esta<strong>do</strong>s nordestinos, e outros, que acarretam<br />
a má formação <strong>do</strong> professor, resultan<strong>do</strong> na qualidade<br />
da Educação. E ainda:<br />
O Relatório recomenda que o professor<br />
exerça outras profissões além da sua,<br />
a de ser professor. Ainda existe a indicação<br />
de que os professores deveriam<br />
envolver-se com a pesquisa, esta em<br />
perío<strong>do</strong>s de licença. Politicamente existe<br />
a desconfiança e o reconhecimento da<br />
capacidade de organização da categoria.<br />
Aconselha às instituições “dialogarem<br />
com os sindicatos, buscan<strong>do</strong> ultrapassar<br />
as questões salariais e as condições<br />
de trabalho” (SHIROMA; MORAES;<br />
EVANGELISTA, 2004, p.70).<br />
O Relatório adverte, contu<strong>do</strong>, que as<br />
organizações de professores podem contribuir de<br />
forma determinante para instaurar na profissão<br />
um clima de confiança e uma atitude positiva em<br />
face das inovações educativas. Considera que a<br />
concepção e aplicação das reformas deveriam<br />
ser ocasiões de busca de consensos de finalidades<br />
e meios. Nenhuma reforma da Educação<br />
teve êxito contra ou sem os professores.<br />
Algumas Considerações<br />
Os relatórios pesquisa<strong>do</strong>s e os objetivos<br />
por eles determina<strong>do</strong>s, no que diz respeito à<br />
formação de professores para a Educação no e<br />
<strong>do</strong> Campo, são pensa<strong>do</strong>s na esfera mais ampla<br />
da sociedade e procuram apreender a relação<br />
entre o universal e o singular. Constatamos que<br />
a discussão sobre a formação de professores<br />
segue os ditames <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos produzi<strong>do</strong>s<br />
internacionalmente a partir <strong>do</strong>s anos de 1990,<br />
os quais foram foco de nossas investigações.<br />
Tais <strong>do</strong>cumentos pautam o ensino<br />
como o principal responsável pelas mudanças<br />
econômicas e sociais que devem ocorrer ao<br />
longo <strong>do</strong> século XXI e colocam o professor como<br />
agente indispensável para essa promoção.<br />
Há produção intensa e diversificada de<br />
propostas que são veiculadas em nome da Educação,<br />
no que tange à formação de professores<br />
urbanos. No entanto, não podemos considerar<br />
que tratam da educação <strong>do</strong> e no campo, muitas<br />
vezes apresentadas como “rural” ou “de zonas<br />
mais afastadas” e ainda “lugares de difícil acesso”.<br />
A UNESCO exerce com regularidade<br />
o seu papel de edifica<strong>do</strong>ra de ideias, firman<strong>do</strong><br />
acor<strong>do</strong> entre os países com a intenção de disseminar<br />
e compartilhar informações e conhecimentos,<br />
visan<strong>do</strong> ao trabalho em comum nas<br />
áreas da Educação, Ciência e Cultura. O acervo<br />
de princípios e normas e as orientações sobre a<br />
Educação têm constituí<strong>do</strong> desafios às mudanças<br />
da realidade, não bastan<strong>do</strong> apenas construir salas<br />
de aulas, em países subdesenvolvi<strong>do</strong>s, ou até<br />
mesmo divulgar pesquisas científicas, seu maior<br />
intento é estabelecer critérios para se estabelecer<br />
a paz entre os homens.<br />
Em meio à complexa expressão que<br />
é a Educação, os órgãos internacionais têm firma<strong>do</strong><br />
diversos <strong>do</strong>cumentos que focalizam áreas<br />
específicas como a Formação de Professores.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
171
MOURA, K. L.; SILVA, I. M. S. Orientações da Unesco para a Formação de Professores No e Do Campo...<br />
Essas recomendações abrangem timidamente<br />
aqueles educa<strong>do</strong>res que atuam na área campesina.<br />
As políticas educacionais voltam-se, na sua<br />
quase totalidade, para a zona urbana, omitin<strong>do</strong><br />
que os países em desenvolvimento têm outras<br />
necessidades. É preciso compreender o campo<br />
como parte integrante desses acor<strong>do</strong>s e medidas<br />
educacionais a serem toma<strong>do</strong>s nas necessidades<br />
de cada região <strong>do</strong> País.<br />
Os maiores desafios são construir um<br />
elo entre a Educação urbana e a Educação no<br />
e <strong>do</strong> Campo, sem, contu<strong>do</strong> dicotomizar campo<br />
e cidade, e avançar na elaboração de conceitos<br />
que tragam clareza, construin<strong>do</strong>, consolidan<strong>do</strong> e<br />
disseminan<strong>do</strong> novas visões sobre o rural e o urbano,<br />
diante de uma realidade que se constituiu<br />
pela relação entre campo e educação.<br />
Social ) – <strong>Universidade</strong> Estadual <strong>do</strong> Rio de Janeiro, Rio<br />
de Janeiro, 2005.<br />
SHIROMA, Eneida Oto; MORAES, Maria Célia Marcondes;<br />
EVANGELISTA, Olinda. Política Educacional.<br />
3.ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.<br />
SILVA JÚNIOR, João <strong>do</strong>s Reis. Reforma <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e da<br />
Educação no Brasil de FHC. São Paulo: Xamã, 2002.<br />
UNESCO. Educação um tesouro a descobrir. Relatório<br />
para a UNESCO da Comissão Internacional sobre a<br />
Educação para o Século XXI, Jacques Delors. Lisboa:<br />
ASA, 1996.<br />
UNESCO. Legislação, normativas, <strong>do</strong>cumentos e declarações.<br />
Declaração Mundial sobre Educação para<br />
To<strong>do</strong>s (Conferência de Jomtien, 1990). Plano de Ação<br />
de Satisfazer as Necessidades Básicas de Aprendizagem.<br />
Aprovada pela Conferência Mundial sobre Educação<br />
para To<strong>do</strong>s. Jomtien, Tailândia, 5 a 9 de março de 1990.<br />
Texto recebi<strong>do</strong> em 8 de julho de 2009.<br />
Texto aprova<strong>do</strong> em 20 de outubro de 2010.<br />
REFERÊNCIAS<br />
ARELARO, Lisete Regina Gomes. Resistência e submissão:<br />
a reforma educacional na década de 1990. In: KRAW-<br />
CZYCK, Nora; CAMPOS, Maria Malta; Hadad, Sérgio<br />
(Org.). O cenário educacional latino-americano no limiar<br />
<strong>do</strong> século XXI: reformas em debate. Campinas: Autores<br />
Associa<strong>do</strong>s, 2000. p. 95-116.<br />
BRASIL. Educação <strong>do</strong> Campo: diferenças mudan<strong>do</strong><br />
paradigmas. Brasília, DF: Cadernos SECAD 2, INEP/<br />
MEC, 2007.<br />
EVANGELISTA, Olinda. Formação de professores:<br />
perspectivas educacionais e curriculares. Porto: Porto<br />
Editora, 2003.<br />
GOMES, Cândi<strong>do</strong> Alberto. Dos Valores Proclama<strong>do</strong>s aos<br />
Valores Vivi<strong>do</strong>s: traduzin<strong>do</strong> em atos os princípios das<br />
Nações Unidas e da UNESCO para projetos escolares<br />
e políticas educacionais. Brasília, DF: UNESCO, 2001.<br />
Cadernos UNESCO Brasil. Série Educação, 7.<br />
MELLO, Guiomar Namo de. As necessidades básicas de<br />
aprendizagem <strong>do</strong>s professores: um enfoque útil à formulação<br />
de política. 2003. Disponível em: .<br />
Acesso em: 8/4/2009.<br />
RIZO, Gabriela. Aprender a Ser Aprender a Reinventar:<br />
caminhos da UNESCO para a era Global – o Relatório<br />
Delors, o Planejamento Estratégico Situacional e o Processo<br />
Civiliza<strong>do</strong>r. 225f. Tese (Doutora<strong>do</strong> em Psicologia<br />
172<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 161-172, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Resenha
Energia, meio ambiente e comunicação social<br />
Energy, environment and social communication<br />
Energía, medio ambiente y comunicación social<br />
Evanise Rodrigues Gomes 1<br />
MEDINA, Cremilda; MEDINA, Sinval (Orgs.). Energia, meio ambiente e comunicação<br />
social. São Paulo: Mega Brasil, 2009 (Coleção Novo Pacto da Ciência, n. 10).<br />
A produção de energia e seus impactos<br />
no meio ambiente é um <strong>do</strong>s temas mais presentes<br />
na agenda política e econômica <strong>do</strong> mun<strong>do</strong><br />
contemporâneo. Soma-se a essa questão o<br />
papel <strong>do</strong>s meios de comunicação e teremos um<br />
enorme desafio para superar modelos positivistas<br />
que ainda estão cristaliza<strong>do</strong>s nas coberturas<br />
da mídia sobre os temas. Buscar diagnósticos<br />
abrangentes e estratégias integradas para lidar<br />
com essas questões da produção de energia e<br />
de seus impactos no meio ambiente foi a principal<br />
preocupação <strong>do</strong> I Fórum Internacional de<br />
Energia, Meio Ambiente e Comunicação Social,<br />
realizada em São Paulo entre 20 e 23 de outubro<br />
de 2008 e apresenta<strong>do</strong> em livro em 2009. Os trabalhos<br />
ofereceram uma visão mais ampla para o<br />
profissional da comunicação social desempenhar<br />
sua importante função de mediação simbólica<br />
na sociedade contemporânea.<br />
Cremilda Medina e Sinval Medina,<br />
organiza<strong>do</strong>res <strong>do</strong> livro, perseguem a ideia de<br />
discutir a crise <strong>do</strong>s paradigmas e a proposta de<br />
um “novo pacto da Ciência”, desde 1990. Esse<br />
é o décimo livro da série e nasceu a partir de<br />
uma inquietação: que contribuição a academia,<br />
principalmente os <strong>do</strong>centes e pesquisa<strong>do</strong>res em<br />
Comunicação Social, podem dar para aproximar<br />
os jovens educan<strong>do</strong>s dessa complexa agenda<br />
que envolve meio ambiente, geração de energia<br />
e a comunicação social<br />
O pensamento majoritário entre os<br />
diversos textos que compõem o livro mostra que<br />
é necessário superar o modelo positivista, uma<br />
vez que ele não possibilita uma apreensão ampla<br />
e a compreensão da realidade complexa com<br />
que lidam a ciência em geral e o profissional de<br />
comunicação social em particular.<br />
A obra é apresentada a partir de grandes<br />
temas começan<strong>do</strong> pelos painéis científicos<br />
(a primeira parte!), o seminário pedagógico de<br />
comunicação social (segunda parte) e o balanço<br />
e perspectivas <strong>do</strong> evento (terceira parte). Entre<br />
os especialistas que escrevem na primeira parte<br />
estão Manuel Lemos de Souza, João Marcelo<br />
1 Graduada em Jornalismo e instrutora de Educomunicação.<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 175-176, jul./dez. 2010. Editora UFPR<br />
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GOMES, E. R. Energia, meio ambiente e comunicação social<br />
Ketzer, José Goldemberg, Laércio Giampani,<br />
entre outros.<br />
O evento foi organiza<strong>do</strong> pela Faculdade<br />
Cásper Líbero e pela <strong>Universidade</strong> Fernan<strong>do</strong><br />
Pessoa, da cidade <strong>do</strong> Porto, Portugal. Os painéis<br />
técnico-científicos, seminários pedagógicos,<br />
workshops e discussões realiza<strong>do</strong>s durante o<br />
Fórum trouxeram exemplos contundentes da<br />
insuficiência <strong>do</strong> paradigma positivista para a<br />
compreensão da realidade complexa com que<br />
lida o profissional da comunicação social em<br />
geral e, em particular, o jornalista.<br />
Nos textos são apresenta<strong>do</strong>s aspectos<br />
multidimensionais relaciona<strong>do</strong>s à produção de<br />
energia, ao meio ambiente e ao desenvolvimento<br />
sustentável. Evidenciou-se nos debates que, de<br />
mo<strong>do</strong> geral, a cobertura jornalística sobre pautas<br />
ambientais apresenta características típicas <strong>do</strong><br />
modelo positivista: fragmentação da informação;<br />
discurso autoritário e opinitivo das fontes que<br />
controlam, editam e difundem o fluxo de informações<br />
destinadas à sociedade; identificação de<br />
fenômenos causais e seus efeitos; classificação<br />
de condutas “certas” ou “erradas” <strong>do</strong>s diferentes<br />
atores sociais envolvi<strong>do</strong>s nos temas energéticos,<br />
ambientais e desenvolvimentistas. Poucas coberturas<br />
jornalísticas escapam <strong>do</strong>s vieses positivistas.<br />
Por esses motivos o fórum apontou a<br />
necessidade urgente de a<strong>do</strong>ção de outros paradigmas,<br />
mais complexos, de mediação simbólica<br />
para captar os aspectos multidimensionais, polifônicos,<br />
polissêmicos e intertextuais inerentes à<br />
vida social contemporânea.<br />
Se o sujeito observa<strong>do</strong>r se colocar,<br />
também, como sujeito observa<strong>do</strong> no contexto<br />
<strong>do</strong> fenômeno que examina, poderá apreender<br />
e compreender mais amplamente as múltiplas<br />
dimensões, vozes e senti<strong>do</strong>s que emergem da<br />
sociedade. É a polifonia.<br />
A parceria <strong>do</strong>s autores, Cremilda e<br />
Sinval, é resulta<strong>do</strong>, também, de um convívio<br />
de muitos anos! Ela, jornalista, pesquisa<strong>do</strong>ra<br />
e professora, ele escritor premia<strong>do</strong> e jornalista<br />
sintoniza<strong>do</strong> com as pautas não consagradas e<br />
que apontam para ampliações. Isso significa<br />
que o saber plural também quer dizer ternura,<br />
afeto e respeito.<br />
Com a aproximação entre o debate<br />
sobre meio ambiente e a prática da comunicação<br />
social, em especial o jornalismo, percebe-se<br />
mais claramente a necessidade de uma maior e<br />
melhor formação profissional. Houve, ainda, o<br />
desejo de ampliar as contribuições <strong>do</strong>s acadêmicos,<br />
principalmente professores e pesquisa<strong>do</strong>res,<br />
da área de Comunicação Social com os alunos<br />
de graduação.<br />
A perspectiva apontada é a de que<br />
há necessidade de aproximar aqueles que logo<br />
estarão trabalhan<strong>do</strong> como media<strong>do</strong>res sociais<br />
de senti<strong>do</strong> com as complexidades da agenda de<br />
meio ambiente <strong>do</strong> Brasil e <strong>do</strong> Mun<strong>do</strong>. Afinal, há<br />
um entendimento coletivo de que a informação<br />
é a grande alavanca para construir alternativas<br />
para a situação caótica que vivemos hoje na<br />
área ambiental.<br />
As atividades foram planejadas com<br />
seis meses de antecedência. E a ideia de “discutir<br />
ainda mais as ações que apontem para a<br />
construção de um futuro menos sombrio para<br />
o planeta terra e todas as formas de vida que<br />
a povoam” (MEDINA, C.; MEDINA, S. 2009,<br />
p. 13) sempre estiveram presentes nos debates.<br />
Esse livro é um grande painel de pesquisa<strong>do</strong>res<br />
e profissionais, representan<strong>do</strong> uma<br />
excelente discussão. Os anais <strong>do</strong> evento I Fórum<br />
de Energia, Meio Ambiente e Comunicação<br />
Social transcritos na obra, podem fazer com que<br />
os estudantes (de Graduação ou Pós) de várias<br />
áreas <strong>do</strong> conhecimento tenham material significativo<br />
para trabalhar em suas vidas profissionais.<br />
176<br />
Extensão em Foco, Curitiba, n. 6, p. 175-176, jul./dez. 2010. Editora UFPR
Critérios de publicação<br />
Extensão em Foco aceita trabalhos que tratem de temas relaciona<strong>do</strong>s à extensão com as seguintes<br />
especificações:<br />
Artigos inéditos, em português ou espanhol, sob a forma de demanda contínua, temática<br />
<strong>do</strong> <strong>do</strong>ssiê, relatos de experiência e resenha.<br />
Seções:<br />
Apresentação<br />
Editorial<br />
Dossiê Temático: os temas que forem sen<strong>do</strong> defini<strong>do</strong>s terão anúncio com antecedência.<br />
Artigos: Textos analíticos resultantes de estu<strong>do</strong>s e revisões sobre temas relaciona<strong>do</strong>s à extensão<br />
universitária.<br />
Relatos de Experiência: Textos descritivos de experiências desenvolvidas nas áreas temáticas<br />
estabelecidas para a extensão universitária: 1. Comunicação; 2. Cultura; 3. Direitos Humanos e<br />
Justiça; 4. Educação; 5. Meio Ambiente; 6. Saúde; 7. Tecnologia e Produção e 8. Trabalho. Os<br />
relatos deverão ter no máximo 15 (quinze) páginas, incluin<strong>do</strong> os anexos e referências.<br />
Resenhas: As resenhas poderão ter, no máximo, 3 (três) laudas e o título será a referência bibliográfica<br />
completa da obra resenhada em áreas desenvolvidas conforme as áreas afins da extensão,<br />
de obra publicada nos últimos <strong>do</strong>is anos. Palavras-chave e resumo não são necessários. Ex.: VIDAL,<br />
D. G. O exercício disciplina<strong>do</strong> <strong>do</strong> olhar: livros, leituras e práticas de formação <strong>do</strong>cente no Instituto<br />
de Educação <strong>do</strong> Distrito <strong>Federal</strong> (1932-1937). Bragança Paulista: EDUSF, 2001.<br />
Apresentação <strong>do</strong>s Artigos:<br />
Cada artigo deverá ter no máximo, 15 (quinze) páginas, incluin<strong>do</strong> referências bibliográficas,<br />
ilustrações, gráficos, mapas e tabelas.<br />
Título e Resumo, na língua <strong>do</strong> artigo, em inglês e em espanhol (resumo de no máximo 230<br />
– duzentas e trinta palavras) logo abaixo <strong>do</strong>(s) nome(s) <strong>do</strong>(s) autor(es).<br />
Até cinco palavras-chave na língua <strong>do</strong> artigo, em inglês e em espanhol.<br />
Os textos devem ser digita<strong>do</strong>s utilizan<strong>do</strong>-se Microsoft Word versão 6.0 ou posterior, seguin<strong>do</strong><br />
os parâmetros abaixo:<br />
1. Fonte: Arial, tamanho 12, espaçamento 1,5 da entrelinha;<br />
2. Configurações das margens em 2,5 cm para direita, esquerda, superior e inferior<br />
em papel A4.
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e em inglês) - em caso de financiamento da pesquisa, a instituição financia<strong>do</strong>ra deverá ser mencionada<br />
em nota de rodapé. Nome(s) <strong>do</strong>(s) autor(es) – titulação máxima, afiliação institucional à<br />
qual se vincula, endereço completo de pelo menos um <strong>do</strong>s autores incluin<strong>do</strong> telefone e e-mail, em<br />
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o ano da publicação da obra e, quan<strong>do</strong> for o caso, com a(s) página(s) citada(s). Ex.: (CALKINS,<br />
1950, p. 161).<br />
Conferências seguirão as mesmas normas <strong>do</strong>s artigos.<br />
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além de uma autorização sobre direitos autorais para textos não originais.<br />
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JANSON). Na parte inferior esquerda, a fonte (ex.: FONTE: COLEÇÃO MARC LE COEUR) e<br />
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em preto e branco (figura, ilustração, tabelas, gráficos).<br />
As referências seguem o sistema alfabético e devem ser reunidas no final <strong>do</strong> texto, exemplos:<br />
Livro<br />
AMADO, Jorge. Capitães de areia. Rio de Janeiro: Record, 1991. 233 p.<br />
Obs: autoria múltipla: <strong>do</strong>is ou três autores, nomes separa<strong>do</strong>s por ponto e vírgula; mais de três autores,<br />
utilizar apenas o primeiro e et. al. Ex.: BABIN, Pierre; KOULOUMDJIAN, Marie-France. Os<br />
novos mo<strong>do</strong>s de compreender: a geração <strong>do</strong> audiovisual e <strong>do</strong> computa<strong>do</strong>r. São Paulo: Paulinas,<br />
1989. 236 p.<br />
Capítulo de livro<br />
BORSOI, Isabel Cristina Ferreira. A saúde da mulher trabalha<strong>do</strong>ra. In: CODO, Wanderley; SAM-<br />
PAIO, José Jacson Coelho (Org.). Sofrimento psíquico nas organizações. Rio de Janeiro: Vozes,<br />
1995. p. 115-126.<br />
Artigo<br />
PAZ, M.E. da. A educação sócio-econômica <strong>do</strong> Reino Uni<strong>do</strong>. Educação & Realidade, Porto Alegre,<br />
v. 20, n. 1, p. 191-202, jan./jun. 1995.<br />
BRITO, Gláucia da Silva. O professor e o computa<strong>do</strong>r. O Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Paraná, Curitiba, 3 mar. 1996.<br />
Obs.: os títulos de periódicos não devem ser abrevia<strong>do</strong>s e as primeiras letras devem ser maiúsculas<br />
(exceto artigos e preposições que não iniciem o título)<br />
Página na WEB ( home page)<br />
FALZETTA, R. Navegar é preciso. Nova Escola, n. 131, abr. 2000. Disponível em: . Acesso em: 27/05/2000.
JORGE, Maria Tereza Soler Será o ensino escolar supérfluo no mun<strong>do</strong> das novas tecnologias Disponível<br />
em . Acesso em: 22/09/2002.<br />
Lista de discussão<br />
BIOLINE Discussion List. List maintained by the Bases de Da<strong>do</strong>s Tropical, BDT in Brazil. Disponível<br />
em: . Acesso em: 14/01/2003.<br />
Correio eletrônico<br />
PINTO, Moreira Artur. Envio de artigo. Mensagem recebida por geral<strong>do</strong>@yahoo.cpm.br em 13<br />
mar. 2007.<br />
SILVA, G. Publicação eletrônica. [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por marthaa34@uol.<br />
com.br em 26 de ago. 2007.<br />
Tese ou Dissertação. Trabalho de conclusão de curso. Relatório<br />
GOUVÊA, F. C. F. Um percurso com os boletins da CAPES: a contribuição de Anísio Teixeira para<br />
a institucionalização da Pós-Graduação no Brasil. Dissertação (Mestra<strong>do</strong> em Educação) – Departamento<br />
de Educação, Pontifícia <strong>Universidade</strong> Católica <strong>do</strong> Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2001.<br />
SCHIMIGUEL Kelli; SKIBA, Luciana. Relações Públicas em Instituições Educacionais. 2006. Trabalho<br />
de conclusão de curso (Graduação) – <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> <strong>do</strong> Paraná, Curitiba.<br />
CAMPOS, M. H. R. A universidade não será mais a mesma. 1984. (Relatório) Belo Horizonte:<br />
Conselho de Extensão da <strong>Universidade</strong> <strong>Federal</strong> de Minas Gerais.<br />
Legislação<br />
BRASIL. Lei n. 5.517 – 23 out.1968. Dispõe sobre o exercício da profissão de médico-veterinário e<br />
cria os Conselhos <strong>Federal</strong> e Regional de Medicina Veterinária. Belo Horizonte: Conselho Regional<br />
de Medicina Veterinária, 1968, 48p.<br />
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa <strong>do</strong> Brasil. Brasília, DF: Sena<strong>do</strong><br />
<strong>Federal</strong>, 1990. 210 p.<br />
Anais<br />
RIBEIRO, A. M.; CASA, M. E. Construção de uma plataforma multiagentes para o ambiente de<br />
aprendizagem ILENA. In: WORKSHOP DE AMBIENTES DE APRENDIZAGEM BASEADOS EM<br />
AGENTES, 3, 22 nov. 2001, Vitória. Anais... Vitória , 2001, p. 7-21<br />
CD-ROM<br />
Acrescentar ao final da referência: (CD-ROM)<br />
Ex.: SILVA, R. N.; OLIVEIRA, R.. M. Os limites pedagógicos <strong>do</strong> paradigma da qualidade total na<br />
educação. In: CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UFPe, 4, 1996, Recife. Anais...<br />
Recife: UFPe, 1996. (CD-ROM)<br />
Os textos podem ser envia<strong>do</strong>s para Extensão em Foco na seguinte forma:<br />
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