ACTAS DAS I JORNADAS as vias do Algarve da ... - Calçadinha
ACTAS DAS I JORNADAS as vias do Algarve da ... - Calçadinha
ACTAS DAS I JORNADAS as vias do Algarve da ... - Calçadinha
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<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong><br />
<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
<strong>da</strong> Época Romana à Actuali<strong>da</strong>de<br />
São Brás de Alportel - 2006
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> - AS VIAS DO ALGARVE<br />
Edição<br />
Câmara Municipal de São Brás de Alportel / CCDR <strong>Algarve</strong><br />
Coordenação Editorial<br />
Angelina Pereira<br />
Apresentação<br />
Presidente <strong>da</strong> Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
- António Eusébio<br />
Mensagem<br />
Vice-Presidente <strong>da</strong> Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
- Vitor Guerreiro<br />
Mensagem de Abertura<br />
Representante <strong>da</strong> Direcção <strong>do</strong> IPA - Pedro Barros<br />
ficha técnica<br />
I JORNA<strong>DAS</strong> – AS VIAS DO ALGARVE<br />
Organização<br />
Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
Gabinete de Arqueologia <strong>da</strong> Câmara Municipal<br />
de São Brás de Alportel<br />
Comissão Organiza<strong>do</strong>ra<br />
Angelina Pereira<br />
Pedro Barros<br />
Secretaria<strong>do</strong><br />
Claudia Guerreiro<br />
Elsa Narciso<br />
Fátima Guerreiro<br />
Audiovisuais<br />
Cristovão Vieg<strong>as</strong><br />
José Manuel Cristino<br />
O conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s artigos é <strong>da</strong> exclusiva<br />
responsabili<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s seus autores.<br />
Autores<br />
João Pedro Bernardes<br />
Sandra Rodrigues<br />
Francisco Gómez Toscano<br />
Ab<strong>da</strong>llah Khawli, Maria Alice Fernandes e Luís Fraga <strong>da</strong> Silva<br />
Luís Filipe Oliveira<br />
Manuel Maia<br />
Virgílio Lopes<br />
José d’Encarnação<br />
Angelina Pereira<br />
Fernan<strong>do</strong> Di<strong>as</strong> e Manuela Teixeira<br />
Bruno Silva, Susana Borges e José António Pereira<br />
Maria José Gonçalves<br />
Financiamento<br />
Comissão de Coordenação e Desenvolvimento <strong>da</strong><br />
Região <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
Pro<strong>Algarve</strong><br />
Fun<strong>do</strong> Europeu de Desenvolvimento Regional<br />
Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
Design e Produção<br />
Idei<strong>as</strong> em Baú, Comunicação Marketing, L<strong>da</strong>.<br />
Impressão<br />
<br />
Tiragem<br />
1 000 exemplares<br />
Depósito legal<br />
251029/06<br />
Data<br />
Abril 2006
índice<br />
Agradecimentos<br />
Nota Introdutória - Técnica Superior de Arqueologia<br />
– Angelina Pereira<br />
Apresentação - Presidente <strong>da</strong> Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
– António Paulo Jacinto Eusébio<br />
Mensagem - Vice-Presidente <strong>da</strong> Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
– Vitor Manuel Martins Guerreiro<br />
Mensagem de Abertura - Representante <strong>da</strong> Direcção <strong>do</strong> IPA<br />
– Pedro Barros<br />
1º Painel<br />
.I João Pedro Bernardes<br />
Existem Pontes Roman<strong>as</strong> no <strong>Algarve</strong><br />
.II Sandra Rodrigues<br />
A Rede Viária Romana <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> Central<br />
.III Francisco Gómez Toscano<br />
Desde la desembocadura del río Guadiana.<br />
La continui<strong>da</strong>d del Itinerario hacia Oriente<br />
2º Painel<br />
.IV Ab<strong>da</strong>llah Khawli, Maria Alice Fernandes e Luís Fraga <strong>da</strong> Silva<br />
A Viagem de Ibn Ammar de São Brás a Silves<br />
.V Luís Filipe Oliveira<br />
Caminhos <strong>da</strong> terra e <strong>do</strong> mar no <strong>Algarve</strong> Medieval<br />
3º Painel<br />
.VI Manuel Maia<br />
De Baesuris a Pax Ivlia por Arannis<br />
.VII Virgílio Lopes<br />
O Território de Mértola e <strong>as</strong> Vi<strong>as</strong> de Comunicação no perío<strong>do</strong> romano<br />
.VIII José d'Encarnação<br />
Caminhos Antigos, Percursos Modernos<br />
4º Painel<br />
.IX Angelina Pereira<br />
A “Calçadinha” de São Brás de Alportel – Resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s Trabalhos<br />
Arqueológicos de Valorização de 2003-2005<br />
Posters<br />
.X Fernan<strong>do</strong> Di<strong>as</strong> e Manuela Teixeira<br />
Os Caminhos, <strong>as</strong> Ver<strong>da</strong>des e o Povoamento Antigo - <strong>do</strong> romano ao<br />
islâmico, os <strong>da</strong><strong>do</strong>s revela<strong>do</strong>s pela arqueologia <strong>do</strong> concelho de Alcoutim<br />
.XI Bruno Silva, Susana Borges e José António Pereira<br />
Ligação de São Brás de Alportel por Estói e Conceição à ETAR n<strong>as</strong>cente<br />
de Faro - trabalhos arqueológic<strong>as</strong> no âmbito <strong>do</strong> Sistema Multimunicipal<br />
de Saneamento <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
.XII Maria José Gonçalves<br />
Vi<strong>as</strong> Urban<strong>as</strong> de Silves: Mutações e Pervivênci<strong>as</strong><br />
5<br />
7<br />
8<br />
10<br />
11<br />
14<br />
20<br />
23<br />
31<br />
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62<br />
70<br />
75<br />
80
agradecimentos<br />
Ao longo <strong>do</strong>s últimos quatro anos e meio, nos quais<br />
se desenvolveram os Projectos <strong>do</strong> Centro Explicativo<br />
e de Acolhimento <strong>da</strong> “Calçadinha” de São<br />
Brás de Alportel e de Estu<strong>do</strong> e Valorização <strong>da</strong><br />
“Calçadinha”, realizaram-se trabalhos arqueológicos<br />
de valorização e sua subsequente investigação,<br />
que resultaram em vári<strong>as</strong> publicações; foram<br />
muitos e imprescindíveis os apoios que nos foram<br />
concedi<strong>do</strong>s por divers<strong>as</strong> instituições, enti<strong>da</strong>des e<br />
pesso<strong>as</strong> que, de diferentes form<strong>as</strong> e por diferentes<br />
meios, nos acompanharam, no desbravar <strong>do</strong> terreno,<br />
na descoberta e valorização <strong>do</strong> Património<br />
histórico-arqueológico de São Brás de Alportel.<br />
Desejamos expressar os nossos sinceros<br />
agradecimentos:<br />
» À Comissão de Coordenação de Desenvolvimento<br />
Regional <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, pelo imprescindível apoio,<br />
na concretização e desenvolvimento <strong>do</strong>s trabalhos<br />
<strong>do</strong> Projecto <strong>do</strong> Centro Explicativo e de Acolhimento<br />
<strong>da</strong> “Calçadinha” de São Brás de Alportel; e por<br />
tornar possível a publicação dest<strong>as</strong> Act<strong>as</strong>;<br />
» Ao Instituto Português de Arqueologia; ao Instituto<br />
Português <strong>do</strong> Património Arquitectónico (Direcção<br />
Regional de Faro) e ao Instituto Português de Museus,<br />
pela disponibili<strong>da</strong>de e valiosa aju<strong>da</strong>, para a realização<br />
<strong>do</strong> Projecto <strong>do</strong> Centro Explicativo e de Acolhimento<br />
<strong>da</strong> “Calçadinha” de São Brás de Alportel;<br />
» À Biblioteca Municipal de São Brás de Alportel<br />
Dr. Manuel Francisco <strong>do</strong> Estanco Louro, pela<br />
incondicional disponibili<strong>da</strong>de e cedência <strong>do</strong><br />
espaço, onde ao longo deste anos foram realizad<strong>as</strong><br />
divers<strong>as</strong> exposições temátic<strong>as</strong>, sobre o património<br />
histórico-arqueológico de São Brás de Alportel;<br />
» Ao Pedro Barros, companheiro de muit<strong>as</strong> “jornad<strong>as</strong>”,<br />
pel<strong>as</strong> muit<strong>as</strong> hor<strong>as</strong> dispendid<strong>as</strong> e pel<strong>as</strong><br />
profícu<strong>as</strong> discussões sobre <strong>as</strong> vári<strong>as</strong> temátic<strong>as</strong><br />
desenvolvid<strong>as</strong> ao longo <strong>do</strong> Projecto, pelo apoio<br />
incondicional, ao longo de to<strong>do</strong>s estes anos e pelo<br />
incentivo à edição dest<strong>as</strong> Act<strong>as</strong>;<br />
» A to<strong>do</strong>s os colabora<strong>do</strong>res, que se aliaram a este<br />
Projecto, ao participarem nos trabalhos arqueológicos<br />
de valorização, efectua<strong>do</strong>s na “Calçadinha” de<br />
São Brás de Alportel, entre 2002 e 2005: Alexander<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 5
Chilik; Adriana Afonso de Oliveira Pinto e Barata<br />
Marques; Bruno Miguel Lopes Graça; Christophe<br />
Horta Guerreiro; Cláudia Cristina Ramos Barros;<br />
Cristina Isabel Soares Tomé; Dinis Ribeiro Sancho<br />
Cruz; Filipa Alexandra Oliveira <strong>da</strong> Conceição; Filipe<br />
José Neves Martins; Hélio Mendes Graça Correia;<br />
James Carrusca McCowan; J<strong>as</strong>on Gago; Joana<br />
Barata Marques Silva Chaves; Joana Filipa <strong>da</strong> Conceição<br />
Carrusca; João Filipe Ramos Sancho; João<br />
Miguel Vieg<strong>as</strong> Gonçalves; Mag<strong>da</strong> <strong>da</strong> Cruz Barrote;<br />
Tino Reil e Vânia Cristina Rosa Martins;<br />
» Ao Paulo Sérgio G. Pires, pela amável colaboração<br />
presta<strong>da</strong> a este Projecto; muito em especial por<br />
haver cedi<strong>do</strong> ao futuro Centro diversos materiais<br />
arqueológicos e faculta<strong>do</strong> informações vári<strong>as</strong>, recolhid<strong>as</strong><br />
n<strong>as</strong> su<strong>as</strong> pesquis<strong>as</strong>, <strong>as</strong> quais permitiram<br />
enriquecer o conhecimento histórico-arqueológico<br />
<strong>do</strong> p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong> de São Brás de Alportel;<br />
» Ao Director <strong>do</strong> Museu <strong>do</strong> Trajo de S. Brás de Alportel,<br />
Emanuel Andrade C. Sancho, ao Filipe Palma, ao José<br />
Pessoa (Instituto Português de Museus) e à Susana<br />
Estrela, pela amável disponibili<strong>da</strong>de, na cedência de<br />
<br />
<strong>as</strong> vári<strong>as</strong> publicações editad<strong>as</strong> ao longo <strong>do</strong> Projecto;<br />
» À Lígia Rafael (Campo Arqueológico de Mértola),<br />
pela gentil colaboração no tratamento <strong>da</strong> placa-<br />
-amuleto de época islâmica, importante elemento<br />
<strong>do</strong> património de São Brás de Alportel, e pela<br />
<br />
» À Maria Eugénia Narra, pela importante colaboração<br />
na tradução <strong>do</strong>s textos d<strong>as</strong> plac<strong>as</strong> informativ<strong>as</strong>,<br />
colocad<strong>as</strong> no início <strong>do</strong> troço A e ao longo <strong>do</strong><br />
troço B <strong>da</strong> “Calçadinha” de São Brás de Alportel;<br />
» À Angelina Lima e à Susana Valério, pelo incansável<br />
apoio, pela perseverança e pelo exemplar<br />
<br />
d<strong>as</strong> presentes Act<strong>as</strong>;<br />
» A to<strong>do</strong>s os coleg<strong>as</strong> e amigos <strong>da</strong> Câmara Municipal<br />
de São Brás de Alportel, pelo apoio, compreensão<br />
e incentivo, no desenvolvimento deste Projecto;<br />
muito especialmente à Fátima Guerreiro e ao Nelson<br />
Assunção, pel<strong>as</strong> inúmer<strong>as</strong> hor<strong>as</strong> dispendid<strong>as</strong> no<br />
tratamento de imagens e na concepção de material<br />
informativo e de divulgação, e à Marlene Guerreiro,<br />
pela árdua tarefa de rever os vários textos elabora<strong>do</strong>s<br />
ao longo <strong>do</strong> Projecto;<br />
» A to<strong>do</strong>s os investiga<strong>do</strong>res, que participaram<br />
como ora<strong>do</strong>res nest<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> sobre “As Vi<strong>as</strong><br />
<strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> – <strong>da</strong> época romana à actuali<strong>da</strong>de”:<br />
João Pedro Bernardes, Sandra Rodrigues, Francisco<br />
Gómez Toscano, Ab<strong>da</strong>llah Khawli, Alice Fernandes,<br />
Luís Fraga <strong>da</strong> Silva, Luís Filipe Oliveira, Manuel Maia,<br />
Virgílio Lopes, José d’Encarnação; Fernan<strong>do</strong> Di<strong>as</strong> e<br />
Manuela Teixeira (Câmara Municipal de Alcoutim);<br />
Bruno Silva, Susana Borges e José António Pereira<br />
(Novarqueologia) e Maria José Gonçalves (Câmara<br />
Municipal de Silves); cujo contributo foi fun<strong>da</strong>mental<br />
para o enriquecimento desta iniciativa;<br />
» O trabalho de investigação realiza<strong>do</strong> sobre a<br />
“Calçadinha” de São Brás de Alportel tem si<strong>do</strong>, de certa<br />
forma, um trabalho colectivo, no qual muitos autores<br />
têm participa<strong>do</strong>, aos quais desejamos aqui agradecer,<br />
muito em particular ao João Pedro Bernardes, ao Luís<br />
Filipe Oliveira, ao Ab<strong>da</strong>llah Khawli, à Sandra Rodrigues e<br />
ao Luís Fraga <strong>da</strong> Silva, pela imprescindível contribuição,<br />
para a investigação desenvolvi<strong>da</strong> e para a edição de<br />
publicações e material informativo;<br />
» Antes de concluir, não poderia deixar de agradecer,<br />
muito em especial, e com eleva<strong>da</strong> consideração aos<br />
Ex.mos Srs. Presidente <strong>da</strong> Câmara Municipal de São<br />
Brás de Alportel, Eng.º António Eusébio, e Vice-<br />
-Presidente, com funções n<strong>as</strong> áre<strong>as</strong> <strong>do</strong> Património,<br />
<strong>da</strong> Cultura e Ciência, Vitor Guerreiro, por to<strong>do</strong><br />
o empenho, na preservação e valorização <strong>do</strong><br />
Património <strong>do</strong> concelho; pela aposta neste Projecto<br />
de Valorização <strong>da</strong> Calçadinha e por to<strong>do</strong> o apoio<br />
<br />
de concretização <strong>do</strong> Projecto, vital para ultrap<strong>as</strong>sar<br />
<br />
concretização <strong>do</strong>s trabalhos arqueológicos e sua<br />
subsequente investigação.<br />
Esperamos <strong>as</strong>sim que os resulta<strong>do</strong>s alcança<strong>do</strong>s<br />
esteja em conformi<strong>da</strong>de com <strong>as</strong> expectativ<strong>as</strong><br />
criad<strong>as</strong> com o Projecto <strong>do</strong> Centro Explicativo e<br />
de Acolhimento <strong>da</strong> “Calçadinha” de São Brás de<br />
Alportel e que esta seja uma contribuição váli<strong>da</strong><br />
<br />
A to<strong>do</strong>s, os meus sinceros agradecimentos.<br />
Angelina Pereira<br />
6<br />
AS VIAS DO ALGARVE
nota introdutória<br />
Os textos que ora se publicam neste volume<br />
correspondem às intervenções apresentad<strong>as</strong>,<br />
pelos vários investiga<strong>do</strong>res, n<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> “As<br />
Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> – <strong>da</strong> época romana à actuali<strong>da</strong>de”,<br />
realizad<strong>as</strong> nos di<strong>as</strong> 21 e 22 de Abril de 2006, no<br />
Cine-Teatro São Brás, por oc<strong>as</strong>ião <strong>do</strong> Dia Mundial<br />
<strong>do</strong> Património (18 de Abril).<br />
Esta iniciativa, promovi<strong>da</strong> pelo Município de São Brás<br />
de Alportel, surgiu no âmbito <strong>do</strong> desenvolvimento<br />
<strong>do</strong> Projecto <strong>do</strong> Centro Explicativo e de Acolhimento<br />
<strong>da</strong> “Calçadinha de São Brás de Alportel.<br />
A realização dest<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> teve como principal<br />
objectivo a criação de um espaço de debate sobre <strong>as</strong><br />
vi<strong>as</strong> de comunicação, sua evolução e importância,<br />
ao longo <strong>do</strong>s tempos; através <strong>do</strong> confronto de idei<strong>as</strong><br />
e de abor<strong>da</strong>gens de investigação, enquadrad<strong>as</strong> pela<br />
apresentação de diferentes técnicos especialist<strong>as</strong><br />
nesta área, que estu<strong>da</strong>m <strong>as</strong> vi<strong>as</strong> de comunicação<br />
<strong>da</strong> região. A realização deste encontro constituiu-se<br />
como o primeiro evento desta natureza, realiza<strong>do</strong><br />
<br />
de tão importante lega<strong>do</strong> <strong>do</strong> património cultural,<br />
de eleva<strong>do</strong> interesse histórico e turístico.<br />
Neste senti<strong>do</strong>, a Câmara Municipal de São Brás de<br />
Alportel tem vin<strong>do</strong> a <strong>da</strong>r continui<strong>da</strong>de a uma política<br />
de incentivo ao turismo cultural, perspectiva<strong>da</strong> na<br />
gestão, valorização e divulgação <strong>do</strong> património<br />
<strong>do</strong> concelho, com especial enfoque no património<br />
arqueológico.<br />
seu manto de terr<strong>as</strong> que a cobriam, pacientemente<br />
retirad<strong>as</strong>, em morosos trabalhos de limpeza e de<br />
valorização, revela uma história bem mais alarga<strong>da</strong><br />
no tempo.<br />
A memória <strong>do</strong>s nossos antep<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>s (romanos<br />
e islâmicos), tem vin<strong>do</strong> a desven<strong>da</strong>r-se pouco a<br />
pouco, fruto <strong>do</strong> empenha<strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong> Gabinete<br />
de Arqueologia <strong>da</strong> Câmara Municipal de São Brás<br />
de Alportel, ao qual se deve a coordenação e<br />
a direcção <strong>do</strong>s trabalhos arqueológicos de<br />
valorização deste arqueo-sítio – a “Calçadinha” – e<br />
<br />
suporte e acompanhamento, que permitirão, num<br />
futuro próximo, a musealização de um conjunto<br />
de valiosos vestígios arqueológicos, a colocar de<br />
novo, à luz <strong>do</strong> dia, no futuro Centro Explicativo<br />
e de Acolhimento <strong>da</strong> Calçadinha de São Brás de<br />
Alportel.<br />
Neste senti<strong>do</strong>, a Câmara Municipal de São Brás<br />
de Alportel congratula-se por ter viabiliza<strong>do</strong> a<br />
apresentação pública d<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> sobre “As<br />
Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> – <strong>da</strong> época romana à actuali<strong>da</strong>de”<br />
e a concretização dest<strong>as</strong> Act<strong>as</strong>.<br />
Angelina Pereira<br />
Técnica Superior de Arqueologia<br />
Desta forma, foram criad<strong>as</strong> <strong>as</strong> necessári<strong>as</strong><br />
condições de trabalho, cujo labor resultou já num<br />
<strong>as</strong>sinalável leque de resulta<strong>do</strong>s, cuja valia tem<br />
si<strong>do</strong> devi<strong>da</strong>mente reconheci<strong>da</strong> e <strong>as</strong>sinala<strong>da</strong>. São<br />
disso exemplos iniciativ<strong>as</strong> como “O Dia Mundial <strong>do</strong><br />
Património”, “As Jornad<strong>as</strong> Europei<strong>as</strong> <strong>do</strong> Património”,<br />
“O Atelier de Arqueologia”, entre outr<strong>as</strong> activi<strong>da</strong>des<br />
de divulgação.<br />
A “calçadinha” São Brás de Alportel foi referencia<strong>da</strong><br />
pela primeira vez numa obra de arqueologia<br />
romana <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, por Maria Luísa E. <strong>da</strong> Veiga <strong>do</strong>s<br />
Santos (1971-1972). Hoje, depois de liberta<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 7
apresentação<br />
As vi<strong>as</strong> de comunicação constituem elementos<br />
fun<strong>da</strong>mentais, no percurso de desenvolvimento<br />
d<strong>as</strong> civilizações, são pontes entre cultur<strong>as</strong>, rios<br />
em constante movimento de pesso<strong>as</strong>, gerações,<br />
idei<strong>as</strong> e saberes. A história <strong>do</strong>s caminhos é pois a<br />
história <strong>do</strong>s povos, História viva, esculpi<strong>da</strong> pel<strong>as</strong><br />
civilizações que se sucederam no tempo.<br />
Acolher em São Brás de Alportel, a 1ª edição d<strong>as</strong><br />
Jornad<strong>as</strong> “As Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> – <strong>da</strong> época romana<br />
<br />
vi<strong>as</strong> de comunicação, realiza<strong>do</strong> na região, dedica<strong>do</strong><br />
<br />
lega<strong>do</strong> cultural, constituiu um momento de enorme<br />
<br />
sua história nos caminhos que a atravessam.<br />
As vi<strong>as</strong> desempenham um papel de importância fulcral<br />
em São Brás de Alportel, sobre el<strong>as</strong> se escreveu muito<br />
<strong>da</strong> nossa história, e sobre el<strong>as</strong> continuamos hoje a<br />
escrever o futuro, por novos caminhos, de que agora<br />
resultam est<strong>as</strong> Act<strong>as</strong>.<br />
Falar sobre <strong>as</strong> Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, desde a longínqua<br />
presença romana até aos alvores <strong>do</strong> séc. XXI, por<br />
onde já vamos caminhan<strong>do</strong>, foi e será sempre um<br />
convite f<strong>as</strong>cinante a um p<strong>as</strong>seio de séculos, que nos<br />
transporta por tempos imemoriais, calcorrea<strong>do</strong>s<br />
pelos nossos antep<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>s.<br />
Nest<strong>as</strong> terr<strong>as</strong> <strong>do</strong> Sul, <strong>as</strong> redes viári<strong>as</strong> milenári<strong>as</strong><br />
<strong>as</strong>sistiram, desde tempos imemoriais, a um constante<br />
movimento de sobreposição, que deixou n<strong>as</strong><br />
margens <strong>da</strong> evolução alguns vestígios sobreviventes<br />
<strong>do</strong> seu uso mais antigo. Vestígios que contribuem,<br />
de forma decisiva, para o conhecimento <strong>do</strong> decurso<br />
<strong>da</strong> história.<br />
Em 2002, ao prefaciar o livro de João Pedro Bernardes<br />
e Luís Filipe Oliveira “A Calçadinha de São Brás de<br />
Alportel e Antiga Rede Viária <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> Central”,<br />
deixava expresso o desejo de que a “Calçadinha de<br />
São Brás de Alportel” nos lev<strong>as</strong>se a novos caminhos<br />
de valorização <strong>do</strong> património e nos abrisse a porta<br />
ao estu<strong>do</strong> d<strong>as</strong> raízes de São Brás de Alportel.<br />
Desde então, um longo caminho tem si<strong>do</strong> percorri<strong>do</strong>,<br />
em prol <strong>do</strong> conhecimento e <strong>da</strong> valorização <strong>do</strong><br />
património <strong>do</strong> concelho, num trabalho longo<br />
e meticuloso, coordena<strong>do</strong> pelo Gabinete de<br />
Arqueologia <strong>da</strong> Câmara Municipal.<br />
O ambicioso projecto de valorização <strong>do</strong> património
– para a criação <strong>do</strong> Centro Explicativo e de<br />
Acolhimento <strong>da</strong> “Calçadinha de S. Brás de Alportel”,<br />
que esperamos ser em breve uma reali<strong>da</strong>de,<br />
começa a <strong>da</strong>r os seus frutos. Hoje encontram-se<br />
a descoberto cerca de 700 m desta antiga via,<br />
em 2 bonitos troços; e estamos mais certos <strong>da</strong><br />
origem deste ver<strong>da</strong>deiro tesouro arqueológico <strong>do</strong><br />
concelho, que diversos <strong>as</strong>pectos visíveis apontam<br />
para uma cronologia de época romana.<br />
A Calçadinha constitui o centro desta política<br />
de valorização <strong>do</strong> património, que se <strong>as</strong>sume<br />
prioritária na acção <strong>do</strong> município, num equilíbrio<br />
que se pretende constante entre o progresso e a<br />
preservação <strong>do</strong> p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>.<br />
<br />
<strong>da</strong> vila; a recuperação <strong>do</strong>s velhos caminhos; a<br />
valorização <strong>do</strong>s poços e d<strong>as</strong> fontes, que dão voz<br />
eterna à palavra <strong>do</strong>s poet<strong>as</strong>; a recuperação <strong>do</strong>s<br />
Moinhos, que voltam a girar para contar como<br />
outrora se moía o trigo, para fazer o pão de ca<strong>da</strong><br />
dia; constituem vectores deste trabalho, que<br />
procura defender a identi<strong>da</strong>de cultural de São Brás<br />
de Alportel e promover o desenvolvimento de um<br />
turismo diferente. Com história, tradição, natureza,<br />
<strong>as</strong>sente na defesa <strong>da</strong> nossa Identi<strong>da</strong>de Cultural.<br />
Fruto <strong>do</strong> trabalho <strong>da</strong> Câmara Municipal, ao que se<br />
junta uma intervenção activa de uma comuni<strong>da</strong>de<br />
ca<strong>da</strong> vez mais participativa e atenta à importância<br />
destes valores, hoje São Brás de Alportel é, sem<br />
dúvi<strong>da</strong> um município mais rico, porque conhece<br />
melhor a sua história. E é neste terreno fértil de<br />
cultura e conhecimento, que certamente queremos<br />
colher um futuro melhor.<br />
Em nome <strong>do</strong> Município de São Brás de Alportel,<br />
quero deixar expresso o meu agradecimento a<br />
to<strong>do</strong>s os participantes nest<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> “As Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong>”, muito especialmente a to<strong>do</strong>s os ora<strong>do</strong>res,<br />
pela amabili<strong>da</strong>de que tiveram em aceitar o nosso<br />
convite para partilhar <strong>do</strong> seu saber e experiência.<br />
Quero ain<strong>da</strong> agradecer à Comissão de Coordenação<br />
e Desenvolvimento Regional <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, por to<strong>do</strong><br />
o apoio que tem si<strong>do</strong> presta<strong>do</strong> a este projecto de<br />
valorização <strong>da</strong> “Calçadinha de São Brás de Alportel”,<br />
à Extensão de Silves <strong>da</strong> Delegação Regional <strong>do</strong><br />
Instituto Português de Arqueologia, pelo empenho,<br />
no conhecimento desta via e às demais enti<strong>da</strong>des,<br />
<strong>as</strong>sociações e particulares, que têm colabora<strong>do</strong><br />
com este projecto.<br />
Por último, não posso deixar de expressar o meu<br />
reconhecimento à Dr.ª Angelina Pereira, que tem<br />
si<strong>do</strong> responsável pela coordenação <strong>do</strong> Gabinete de<br />
Arqueologia <strong>da</strong> Autarquia <strong>da</strong> Câmara Municipal, por<br />
to<strong>do</strong> o seu trabalho e dedicação a este projecto e por<br />
to<strong>da</strong> sua luta na defesa <strong>do</strong> património <strong>do</strong> concelho.<br />
O P<strong>as</strong>sa<strong>do</strong> é uma Herança Comum que<br />
partilhamos e que apen<strong>as</strong> Juntos poderemos<br />
defender e legar ao Futuro.<br />
O Presidente <strong>da</strong> Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
António Paulo Jacinto Eusébio<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 9
mensagem<br />
Conhecer a história <strong>do</strong>s caminhos, para entender os<br />
<br />
lançar no Dia Mundial <strong>do</strong> Património 2006, ao<br />
realizar em São Brás de Alportel, a primeira edição<br />
d<strong>as</strong> Jornad<strong>as</strong> “As Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> – <strong>da</strong> época<br />
romana à actuali<strong>da</strong>de”. Um evento pioneiro, a Sul<br />
<strong>do</strong> Pais, dedica<strong>do</strong> a uma d<strong>as</strong> mais f<strong>as</strong>cinantes<br />
fontes de investigação histórica, que nos conduzem<br />
na descoberta <strong>do</strong> p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>.<br />
Este momento importante, para a região e para o<br />
município, no estu<strong>do</strong> d<strong>as</strong> Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, marcou<br />
também um ponto de chega<strong>da</strong> (ou talvez uma<br />
estação de mu<strong>da</strong>, ao uso romano), num longo<br />
caminho vimos percorren<strong>do</strong>, de investigação e<br />
valorização <strong>da</strong> antiga via que constitui o núcleo<br />
de to<strong>do</strong> o trabalho de defesa <strong>do</strong> Património <strong>do</strong><br />
concelho – a “Calçadinha” de São Brás de Alportel.<br />
A existência de um conjunto importante de acha<strong>do</strong>s<br />
arqueológicos no concelho tornaram possível<br />
estu<strong>da</strong>r e conhecer melhor o perío<strong>do</strong> romano em<br />
São Brás de Alportel, um valioso lega<strong>do</strong> <strong>do</strong> p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong><br />
que nos conduz ao conhecimento d<strong>as</strong> raízes <strong>da</strong><br />
nossa terra.<br />
Actualmente, encontra-se percorri<strong>da</strong> uma importante<br />
etapa <strong>do</strong> Projecto <strong>do</strong> Centro Explicativo e<br />
de Acolhimento <strong>da</strong> “Calçadinha” de S. Brás de<br />
Alportel, que nos conduziu já a novos resulta<strong>do</strong>s<br />
<br />
viária antiga <strong>do</strong> concelho, onde os caminhos são<br />
elementos fun<strong>da</strong>mentais, no decurso <strong>da</strong> História.<br />
A concretização deste projecto implicou a sua<br />
divisão em 2 f<strong>as</strong>es distint<strong>as</strong>: numa 1ª f<strong>as</strong>e, já<br />
concluí<strong>da</strong>, realizaram-se essencialmente trabalhos<br />
arqueológicos e de investigação <strong>do</strong> património<br />
arqueológico. Prossegue neste momento uma 2ª<br />
f<strong>as</strong>e, que inclui a implementação <strong>do</strong> novo Centro<br />
Explicativo e de Acolhimento <strong>da</strong> “Calçadinha”,<br />
espaço de reencontro com a história local, que será<br />
o culminar de to<strong>do</strong> este projecto e que constitui<br />
uma importante aposta na promoção <strong>do</strong> turismo<br />
cultural <strong>do</strong> concelho.<br />
Preservar a memória histórica d<strong>as</strong> populações, que<br />
ao longo <strong>do</strong>s séculos habitaram este território,<br />
compreender a importância de São Brás de Alportel<br />
no contexto <strong>da</strong> região e <strong>do</strong> país e potenciar o<br />
desenvolvimento de um turismo cultural no concelho<br />
são os principais objectivos deste projecto. O futuro<br />
centro será o ponto de parti<strong>da</strong> para <strong>as</strong> visit<strong>as</strong><br />
à “Calçadinha” e concentrará um conjunto de<br />
informações sobre o património <strong>do</strong> concelho.<br />
Esperamos <strong>as</strong>sim que, n<strong>as</strong> próxim<strong>as</strong> Jornad<strong>as</strong>,<br />
ten<strong>do</strong> alcança<strong>do</strong> a última etapa, tão deseja<strong>da</strong>, deste<br />
projecto, possamos marcar encontro no Centro<br />
Explicativo e de Acolhimento <strong>da</strong> Calçadinha.<br />
O Vice-Presidente <strong>da</strong> Câmara Municipal,<br />
Com funções de gestão n<strong>as</strong> áre<strong>as</strong> <strong>da</strong> cultura e <strong>do</strong> património<br />
Vítor Manuel Martins Guerreiro<br />
10 AS VIAS DO ALGARVE
mensagem de abertura<br />
Antes de mais, gostaria de agradecer o convite<br />
<strong>da</strong> câmara municipal de São Brás de Alportel<br />
endereça<strong>do</strong> ao Instituto Português de Arqueologia<br />
a estar presente nest<strong>as</strong> Jornad<strong>as</strong> sobre <strong>as</strong> Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong> – <strong>da</strong> época romana à actuali<strong>da</strong>de.<br />
Agradecimentos extensíveis à CCDR <strong>Algarve</strong> pelo<br />
apoio <strong>da</strong><strong>do</strong> aos primeiros p<strong>as</strong>sos, <strong>do</strong> que se espera<br />
ser uma longa caminha<strong>da</strong>, para a consoli<strong>da</strong>ção<br />
<strong>do</strong> estu<strong>do</strong>, conhecimento e valorização d<strong>as</strong> Vi<strong>as</strong> e<br />
Pontes <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>.<br />
As vi<strong>as</strong> e <strong>as</strong> pontes devem ain<strong>da</strong> ser entendid<strong>as</strong><br />
nos di<strong>as</strong> de hoje com a mesma funcionali<strong>da</strong>de de<br />
outrora, ou seja, serem elementos estruturantes<br />
na união e proximi<strong>da</strong>de de uma região e seus<br />
habitantes, m<strong>as</strong> agora numa óptica destina<strong>da</strong><br />
à criação de roteiros e à consoli<strong>da</strong>ção de uma<br />
rede regional <strong>do</strong> património cultural histórico e<br />
arqueológico valoriza<strong>do</strong>. Saliente-se que este elo<br />
de união regional também só fará senti<strong>do</strong> ser<br />
for implementa<strong>do</strong> de forma continua<strong>da</strong>, ou seja<br />
pensa<strong>do</strong> em parceria com o Baixo Alentejo e a<br />
An<strong>da</strong>luzia.<br />
Numa semana triste para a arqueologia gostaríamos<br />
de aqui deixar um profun<strong>do</strong> pesar pelo falecimento<br />
<strong>da</strong> Prof. Teresa Gamito. Recor<strong>da</strong>mos que além<br />
de ter si<strong>do</strong> fun<strong>da</strong>mental no desenvolvimento <strong>da</strong><br />
Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, sobretu<strong>do</strong> na criação<br />
de condições para a existência de investigação<br />
e formação sobre o património cultural histórico-<br />
-arqueológico algarvio, foi percursora nalguns<br />
<strong>as</strong>pectos <strong>da</strong> gestão <strong>do</strong> ordenamento <strong>do</strong> território<br />
<strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>. Destaque-se que na déca<strong>da</strong> de<br />
80 realizou uma caracterização de elementos<br />
patrimoniais para o Plano de Urbanização <strong>da</strong> Vila<br />
de São Brás de Alportel onde referia a Calçadinha.<br />
<br />
apresentava para este sítio está a ser implementa<strong>do</strong>:<br />
a necessi<strong>da</strong>de desta ser devi<strong>da</strong>mente estu<strong>da</strong><strong>da</strong> e<br />
valoriza<strong>da</strong>, a sua integração no desenvolvimento<br />
urbano, o seu evidente interesse didáctico para a<br />
<br />
Ten<strong>do</strong> em consideração que a salvaguar<strong>da</strong><br />
de qualquer sítio arqueológico deve ser uma<br />
priori<strong>da</strong>de d<strong>as</strong> instituições centrais e regionais<br />
devi<strong>do</strong> à sua natureza irrepetível, congratulamos<br />
a autarquia pela realização deste evento, não só<br />
ten<strong>do</strong> em consideração que est<strong>as</strong> Jornad<strong>as</strong> se<br />
encontram integrad<strong>as</strong> num projecto de valorização<br />
<strong>do</strong> património cultural arqueológico, como também<br />
pela inserção <strong>da</strong> “Calçadinha”numa lógica mais<br />
ampla que promove to<strong>do</strong> o património arqueológico<br />
concelhio.<br />
<br />
integração <strong>do</strong> património cultural arqueológico<br />
num desenvolvimento sustenta<strong>do</strong> <strong>da</strong> vila e <strong>do</strong><br />
concelho: não só como um elemento de um turismo<br />
complementar, m<strong>as</strong> também como estímulo<br />
na criação de um elo de identi<strong>da</strong>de entre os<br />
Sambr<strong>as</strong>enses e o seu Património através <strong>da</strong> sua<br />
valorização, conhecimento, divulgação e usufruto.<br />
É <strong>as</strong>sim com naturali<strong>da</strong>de que os resulta<strong>do</strong>s deste<br />
Projecto integrem a planea<strong>da</strong> Rede de Património<br />
<strong>do</strong> futuro PROTAL numa lógica cooperante entre<br />
centros de interpretação de sítios arqueológicos,<br />
roteiros temáticos, museus complementares e<br />
centros históricos.<br />
Deseja-se que a “Calçadinha” continue a conseguir<br />
<strong>as</strong>sociar <strong>as</strong>pectos liga<strong>do</strong>s ao Património e ao<br />
Ambiente bem como mantenha a sua funcionali<strong>da</strong>de<br />
diacrónica de aproximar cert<strong>as</strong> reali<strong>da</strong>des: entre<br />
outr<strong>as</strong> cois<strong>as</strong>, ser uma via de ligação entre o<br />
interior e o litoral como espaço lúdico familiar,<br />
como lugar de interpretação ambiental e como sítio<br />
de promoção patrimonial.<br />
<br />
to<strong>do</strong>s um bom trabalho.”<br />
Discurso proferi<strong>do</strong> na apresentação d<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> “As Vi<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong> – <strong>da</strong> época romana à actuali<strong>da</strong>de”, pelo Técnico <strong>da</strong><br />
Extensão de Silves <strong>do</strong> Instituto Português de Arqueologia, em<br />
representação <strong>da</strong> sua Direcção.<br />
Pedro Barros<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 11
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 13
.I<br />
EXISTEM PONTES ROMANAS NO ALGARVE<br />
JOÃO PEDRO BERNARDES<br />
Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
Aresumo<br />
A atribuição aos Romanos de antig<strong>as</strong> infra-<br />
-estrutur<strong>as</strong> viári<strong>as</strong>, como pontes ou calçad<strong>as</strong>, é<br />
<strong>as</strong>saz frequente na tradição popular europeia e parte<br />
integrante <strong>do</strong> imaginário e <strong>da</strong> memória colectiva.<br />
Se é certo que a construção romana era, em regra,<br />
sóli<strong>da</strong> e robusta, os mitos que se criaram em seu<br />
torno, sobretu<strong>do</strong> durante o perío<strong>do</strong> ren<strong>as</strong>centista e<br />
neo-clássico, exageraram a durabili<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s eixos<br />
viários <strong>da</strong> Antigui<strong>da</strong>de, que se <strong>as</strong>sumiam, <strong>as</strong>sim,<br />
como obra humana resistente e inabalável ao<br />
p<strong>as</strong>sar <strong>do</strong>s tempos. A construção de vi<strong>as</strong>, pontes e<br />
outr<strong>as</strong> estrutur<strong>as</strong> viári<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> são, porém, bem<br />
human<strong>as</strong> e, como tal, a esmaga<strong>do</strong>ra maioria não<br />
resistiu ao peso de <strong>do</strong>is milénios, às vicissitudes <strong>da</strong><br />
história ou aos caprichos <strong>da</strong> natureza. A insistência<br />
em atribuir ao p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s primeiros quatro<br />
séculos <strong>da</strong> nossa Era tais estrutur<strong>as</strong>, acabam por<br />
ofuscar o mérito e engenho <strong>do</strong>s construtores <strong>do</strong>s<br />
quinze ou dez<strong>as</strong>seis séculos seguintes. De forma<br />
breve e concisa, e enquanto se procura responder<br />
à questão em epígrafe, abor<strong>da</strong>m-se alguns desses<br />
ícones de obr<strong>as</strong> de arte viári<strong>as</strong> antig<strong>as</strong>, como <strong>as</strong><br />
“pontes roman<strong>as</strong>” de Tavira, Silves ou Aljezur, que<br />
<br />
<br />
mais ou menos especializa<strong>da</strong> têm considera<strong>do</strong><br />
<strong>da</strong> época romana muit<strong>as</strong> d<strong>as</strong> pontes históric<strong>as</strong><br />
<strong>da</strong> região algarvia 1 . Esta atribuição cronológica<br />
às pontes históric<strong>as</strong> é, aliás, recorrente no país<br />
e mesmo no estrangeiro, decorren<strong>do</strong> <strong>da</strong> fama de<br />
grandes construtores de estrutur<strong>as</strong> viári<strong>as</strong> com que<br />
<br />
sem que, qu<strong>as</strong>e nunca, se discutam os fun<strong>da</strong>mentos<br />
<strong>da</strong> atribuição de tal origem. Se é certo que a<br />
robustez e elegância de muit<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> de arte viári<strong>as</strong><br />
<br />
epítote de grandes construtores com que o povo<br />
<br />
construção de tais obr<strong>as</strong> eram car<strong>as</strong> e degradáveis,<br />
razão pela qual estes monumentos milenares são<br />
muito mais raros <strong>do</strong> que uma primeira análise<br />
pode fazer crer 2 . Com efeito, não se construíram<br />
tant<strong>as</strong> pontes em pedra na época romana como a<br />
<br />
a p<strong>as</strong>sagem d<strong>as</strong> linh<strong>as</strong> de água feit<strong>as</strong> em pontes<br />
de madeira, barc<strong>as</strong> ou jangad<strong>as</strong> que não deixaram<br />
vestígios ou, simplesmente, a vau 3 . Recorde-se que<br />
<strong>as</strong> pontes de alvenaria eram tão car<strong>as</strong> e complex<strong>as</strong><br />
que era frequente reunir o contributo de vários<br />
povos ou grupos étnicos de determina<strong>da</strong> região<br />
para se fazerem tais obr<strong>as</strong>, como aconteceu,<br />
<br />
Alcântara (Valência de Alcântara, Espanha) 4 ou de<br />
Aquae Flaviae (Chaves) que contou com o esforço<br />
1<br />
Entre <strong>as</strong> muit<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> que abor<strong>da</strong>ram, ain<strong>da</strong> que de forma lacónica, o tema, veja-se, a título meramente exemplificativo, Santos, 1971/1972 e Marques, 1992.<br />
2<br />
M. Durán Fuentes (2004), analisan<strong>do</strong> com critérios bem defini<strong>do</strong>s o panorama geral d<strong>as</strong> pontes <strong>da</strong> Península Ibérica atribuíd<strong>as</strong> à época romana, conclui que<br />
apen<strong>as</strong> 35 del<strong>as</strong> poderão ser cl<strong>as</strong>sificad<strong>as</strong> como roman<strong>as</strong>. Ain<strong>da</strong> que se possa considerar que este número peca por defeito, não deixa de ser eluci<strong>da</strong>tivo<br />
quanto ao exageradíssimo número de pontes atribuíd<strong>as</strong> à época clássica cuja cl<strong>as</strong>sificação cronológica não resiste a uma análise séria e rigorosa.<br />
3<br />
As pontes de madeira ou de barc<strong>as</strong>, com carácter provisório ou permanente, eram frequentes mesmo sobre os grandes rios europeus como o Reno, Danúbio<br />
ou Tamisa (O’Connor, 1995). As pontes em alvenaria resumiam-se praticamente aos grandes eixos viários ou de importância estratégica para determinad<strong>as</strong><br />
regiões, sen<strong>do</strong> boa parte d<strong>as</strong> vezes a sua construção patrocina<strong>da</strong> pelos governos central ou provinciais, em virtude <strong>do</strong>s eleva<strong>do</strong>s custos e complexi<strong>da</strong>de.<br />
4<br />
Dos muitos estu<strong>do</strong>s em torno <strong>da</strong> ponte de Alcântara veja-se, por exemplo, Jorge de Alarcão, 2005.<br />
14 AS VIAS DO ALGARVE
de dez civitates para além <strong>da</strong> legião VII Gemina 5 .<br />
Por outro la<strong>do</strong>, boa parte d<strong>as</strong> pontes roman<strong>as</strong> foram<br />
sucessivamente remodelad<strong>as</strong> ou reconstruíd<strong>as</strong> ao<br />
longo <strong>do</strong>s tempos, o que leva a que hoje em dia<br />
muit<strong>as</strong> del<strong>as</strong> não apresentem característic<strong>as</strong> que<br />
permitam atribuir-lhes uma origem romana. Além<br />
<strong>do</strong> mais, construíram-se pontes ao longo de tod<strong>as</strong><br />
<strong>as</strong> époc<strong>as</strong> e o facto de hoje se denominar como<br />
romana uma ponte, tal não pode ser toma<strong>do</strong> como<br />
um indica<strong>do</strong>r <strong>da</strong> sua origem cronológica m<strong>as</strong> tão<br />
só um referente a um monumento <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de carga<br />
simbólica relevante decorrente <strong>da</strong> sua importância<br />
histórica, independentemente <strong>da</strong> época em que foi<br />
construí<strong>do</strong> 6 <br />
roman<strong>as</strong> prende-se ain<strong>da</strong> com a continui<strong>da</strong>de d<strong>as</strong><br />
técnic<strong>as</strong> de construção ou o retomar de muitos<br />
ensinamentos <strong>do</strong>s arquitectos <strong>da</strong> Antigui<strong>da</strong>de,<br />
como os difundi<strong>do</strong>s pelos dez livros de Arquitectura<br />
de Vitrúvio. Se é certo que estes ensinamentos<br />
e cânones <strong>da</strong> técnica construtiva romana foram<br />
frequentemente segui<strong>do</strong>s pelos obreiros d<strong>as</strong><br />
<br />
local e regional aplicaram-se técnic<strong>as</strong> e materiais<br />
locais em construções a cargo de construtores<br />
mais ou menos especializa<strong>do</strong>s. Isto permite que<br />
a técnica construtiva que se aplicou em muit<strong>as</strong><br />
<br />
replicad<strong>as</strong> praticamente até ao século XIX, tornan<strong>do</strong><br />
<br />
est<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> de característic<strong>as</strong> qu<strong>as</strong>e intemporais<br />
no quadro histórico <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is últimos milénios.<br />
Tu<strong>do</strong> isto tem leva<strong>do</strong> a uma confusão qu<strong>as</strong>e<br />
generaliza<strong>da</strong> <strong>do</strong> que é ou não ponte romana o<br />
<br />
<strong>da</strong> investigação peninsular neste campo, como,<br />
de resto, já tem si<strong>do</strong> sublinha<strong>do</strong> 7 . Assim, qualquer<br />
exercício de estu<strong>do</strong> d<strong>as</strong> pontes históric<strong>as</strong> tendente<br />
<br />
com uma análise atenta e rigorosa <strong>as</strong>sente em<br />
<br />
<br />
característic<strong>as</strong> técnic<strong>as</strong>, formais e até estétic<strong>as</strong> e<br />
ain<strong>da</strong> por intervenções arqueológic<strong>as</strong> pontuais, por<br />
forma a cruzar um conjunto de informações de<br />
onde decorrerá a avaliação <strong>da</strong> época construtiva.<br />
Em rigor, não há, pois, um único critério que permita<br />
<br />
destes monumentos m<strong>as</strong> antes uma multiplici<strong>da</strong>de<br />
com vista a vislumbrar um conjunto de factores<br />
e característic<strong>as</strong> que concorrem cumulativamente<br />
para essa atribuição cronológica. Entre esses<br />
factores e característic<strong>as</strong> que se podem <strong>as</strong>sumir,<br />
a priori, como distintiv<strong>as</strong> d<strong>as</strong> pontes de fábrica<br />
romana poderemos apontar <strong>as</strong> seguintes:<br />
1) Integrar-se num percurso viário reconheci<strong>do</strong><br />
inequivocamente como romano.<br />
2) Grandes silhares, frequentemente almofa<strong>da</strong><strong>do</strong>s,<br />
bem esquadrilha<strong>do</strong>s e com junt<strong>as</strong> cui<strong>da</strong><strong>do</strong>samente<br />
recortad<strong>as</strong> por forma a permitir um ajuste perfeito<br />
entre si. Mesmo em pontes construíd<strong>as</strong> em tijolo é<br />
frequente a b<strong>as</strong>e ser constituí<strong>da</strong> por esses grandes<br />
blocos de pedra.<br />
3) Buracos de forceps ou perfurações (normalmente<br />
triangulares) que permitiam o encaixe d<strong>as</strong><br />
extremi<strong>da</strong>des de grandes tesour<strong>as</strong> metálic<strong>as</strong> (ferrei<br />
) integrad<strong>as</strong> em sistem<strong>as</strong> de elevação que<br />
permitiam transportar e elevar os blocos.<br />
4) Ausência de marc<strong>as</strong> de canteiro, sobretu<strong>do</strong><br />
nos blocos <strong>da</strong> b<strong>as</strong>e, bem como de vestígios bem<br />
expressivos deixa<strong>do</strong>s pel<strong>as</strong> ferrament<strong>as</strong> de canteiro<br />
(a erosão de qu<strong>as</strong>e <strong>do</strong>is milénios apagou ou tende a<br />
apagar estes testemunhos <strong>do</strong> trabalho <strong>da</strong> pedra).<br />
5) Robustez e uniformi<strong>da</strong>de (de tamanhos e<br />
espessur<strong>as</strong>) de arcos e aduel<strong>as</strong>, que se repetem n<strong>as</strong><br />
pontes de grande extensão de forma bem ritma<strong>da</strong>.<br />
6) Arcos de volta perfeita que prolongam <strong>as</strong> linh<strong>as</strong> <strong>do</strong>s<br />
<br />
de poderem apresentaram frisos ou cornij<strong>as</strong>.<br />
7) Arcos de descarga para aliviar a pressão d<strong>as</strong><br />
águ<strong>as</strong> sobre os pegões e espaço inter-vãos, que<br />
conferem à ponte um efeito estético mais elegante.<br />
8) Pegões protegi<strong>do</strong>s com talhamares, que podem<br />
5<br />
Veja-se, por exemplo, Colmenero 1997.<br />
6<br />
Sobre o desenvolvimento desta reflexão veja-se Durán Fuentes, 2004 e Acero Pérez & Vázquez Paredes.<br />
7<br />
Veja-se a este propósito o artigo de Durán Fuentes (2003) que apresenta um conjunto de nove critérios que realçam singulari<strong>da</strong>des d<strong>as</strong> pontes roman<strong>as</strong><br />
na Hispania.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 15
<strong>as</strong>sumir diferentes formatos (triangulares, re<strong>do</strong>n<strong>do</strong>s<br />
ou quadrangulares) constituí<strong>do</strong>s em grandes blocos.<br />
9) Presença de opus caementitium sobretu<strong>do</strong> no<br />
intra-<strong>do</strong>rso <strong>do</strong>s arcos.<br />
10) Cornija no arranque <strong>do</strong>s arcos ou na parte<br />
externa <strong>do</strong> tabuleiro como que a marcar o arranque<br />
d<strong>as</strong> guard<strong>as</strong> <strong>do</strong> mesmo.<br />
11) Tabuleiro espesso e, a maior parte d<strong>as</strong> vezes,<br />
rectilíneo e plano, conferin<strong>do</strong> ao monumento um<br />
<strong>as</strong>pecto geral de grande solidez e robustez.<br />
Claro que qualquer um destes critérios por si só<br />
não é indica<strong>do</strong>r de se estar em presença de uma<br />
construção <strong>da</strong> época romana, até porque qualquer<br />
um deles pode estar presente em obr<strong>as</strong> de outr<strong>as</strong><br />
époc<strong>as</strong>. Assim, só quan<strong>do</strong> se encontram reunid<strong>as</strong><br />
vári<strong>as</strong> dest<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> é que poderemos com<br />
legitimi<strong>da</strong>de suspeitar <strong>da</strong> sua origem romana. Mais<br />
uma vez lembramos que para além de algum<strong>as</strong><br />
prátic<strong>as</strong> construtiv<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> terem si<strong>do</strong> utilizad<strong>as</strong><br />
em diferentes époc<strong>as</strong>, muitos monumentos dess<strong>as</strong><br />
mesm<strong>as</strong> époc<strong>as</strong> reutilizaram materiais romanos<br />
que podem ou não estar relacionad<strong>as</strong> com uma<br />
pré-existência no local onde se encontra a ponte<br />
histórica em análise.<br />
Face ao exposto compreende-se que muit<strong>as</strong> pontes<br />
históric<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> considerad<strong>as</strong> tradicionalmente<br />
<br />
outr<strong>as</strong> époc<strong>as</strong> bem mais recentes 8 . Vejamos o c<strong>as</strong>o de<br />
três pontes históric<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> que, sistematicamente,<br />
têm si<strong>do</strong> conotad<strong>as</strong> com a época romana.<br />
nomea<strong>da</strong>mente a famosa crónica <strong>da</strong> conquista <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong>, <strong>as</strong>segura-nos que em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XIII<br />
a ponte já existiria. Em 1600, diz-se que na “ponte há<br />
c<strong>as</strong><strong>as</strong>, em que vivem mora<strong>do</strong>res” 10 . O monumento<br />
encontrava-se parcialmente destruí<strong>do</strong> pouco depois,<br />
provavelmente em consequência de mais alguma<br />
violenta cheia, de tal forma que, de acor<strong>do</strong> com uma<br />
inscrição que se encontra sobre o portal <strong>da</strong> fortaleza<br />
de Caban<strong>as</strong>, o então Governa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> e conde<br />
Val de Reis “man<strong>do</strong>u fazer”, a par <strong>da</strong>quela Fortaleza, a<br />
ponte de Tavira, em 1656 11 . Ora, a expressão “man<strong>do</strong>u<br />
<br />
Na ponte actual é bem visível a parte que “man<strong>do</strong>u<br />
Figura 1<br />
A ponte de Tavira nos finais <strong>do</strong> Século XVII (Panorama. Jornal Literário<br />
e Instrutivo, 2ª série, vol. II, nº 80, Julho, 8, 1843).<br />
A ponte velha de Tavira é, de acor<strong>do</strong> com a tradição,<br />
obra romana. Porém, <strong>as</strong> su<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> formais e<br />
técnic<strong>as</strong>, os <strong>da</strong><strong>do</strong>s arqueológicos e a <strong>do</strong>cumentação<br />
histórica contradizem essa ideia. Obr<strong>as</strong> concluíd<strong>as</strong> em<br />
1992 9 com vista a reforçar a ponte, depois de uma<br />
grande cheia a ter seriamente debilita<strong>do</strong>, permitiram<br />
<br />
que aparece <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> aos seus alicerces não vai<br />
além <strong>da</strong> época medieval. A <strong>do</strong>cumentação histórica,<br />
Figura 2<br />
A ponte de Tavira por volta de 1800 em desenho de Sande de V<strong>as</strong>concelos.<br />
8<br />
O equacionamento deste problema já foi feito por Sandra Rodrigues (2004), que p<strong>as</strong>sa em revista de forma crítica a cl<strong>as</strong>sificação cronológica de boa<br />
parte d<strong>as</strong> pontes algarvi<strong>as</strong> tradicionalmente identificad<strong>as</strong> com a época romana.<br />
9<br />
Sobre os trabalhos de reabilitação <strong>do</strong> monumento veja-se Appleton & Silva, 2002.<br />
10<br />
A informação é de Henrique Fernandes Sarrão na sua “História <strong>do</strong> reino <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>”.<br />
11<br />
O traço <strong>da</strong> obra esteve a cargo de Mateus <strong>do</strong> Couto e de Pedro de Santa Colomba (cf. Mant<strong>as</strong>, 1997, p.316).<br />
16 AS VIAS DO ALGARVE
fazer” e que corresponde aos quatro arcos <strong>do</strong> la<strong>do</strong><br />
poente com os respectivos talhamares encima<strong>do</strong>s<br />
por balcões tão ao gosto d<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> <strong>do</strong> género <strong>do</strong>s<br />
séculos XVII e XVIII, como por exemplo acontece com<br />
a reconstrução <strong>da</strong> ponte velha de Silves nos inícios <strong>do</strong><br />
século XVIII. Os restantes três arcos, <strong>do</strong>s sete que a<br />
ponte tem, são inquestionavelmente mais antigos, m<strong>as</strong>,<br />
com to<strong>da</strong> a probabili<strong>da</strong>de, devem ser posteriores à tal<br />
ponte de mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XIII de que fala a crónica<br />
<strong>da</strong> conquista <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>. A traça, a reduzi<strong>da</strong> erosão<br />
<strong>do</strong>s silhares, mesmo <strong>da</strong>queles que são fustiga<strong>do</strong>s<br />
pel<strong>as</strong> águ<strong>as</strong>, a largura <strong>do</strong> tabuleiro, são apen<strong>as</strong> alguns<br />
indícios que apontam para que esta parte <strong>da</strong> ponte,<br />
sen<strong>do</strong> mais antiga <strong>do</strong> que os mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XVII,<br />
deverá ser posterior aos mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> XIII.<br />
Figura 3<br />
A ponte de Silves nos finais <strong>do</strong> Século XVII (Panorama. Jornal Literário<br />
e Instrutivo, 2ª série, vol. II, nº 27, Julho, 1, 1842).<br />
A ponte velha de Silves também tem si<strong>do</strong><br />
recorrentemente atribuí<strong>da</strong> á época romana.<br />
Conforme recentemente demonstrámos, ela é<br />
obra medieval e moderna. O talhe <strong>do</strong>s blocos,<br />
mais pequenos e com marc<strong>as</strong> de canteiros, <strong>as</strong><br />
característic<strong>as</strong> d<strong>as</strong> aduel<strong>as</strong>, o grande vão <strong>do</strong>s seus<br />
arcos, tabuleiro pouco espesso e em cavalete e,<br />
<br />
robusto <strong>do</strong> que <strong>as</strong> pontes roman<strong>as</strong>, resultante em<br />
grande parte d<strong>as</strong> du<strong>as</strong> últim<strong>as</strong> característic<strong>as</strong>,<br />
aproximam-na claramente d<strong>as</strong> tipologi<strong>as</strong> d<strong>as</strong><br />
pontes medievais. Por outro la<strong>do</strong>, a ausência de<br />
característic<strong>as</strong> típic<strong>as</strong> d<strong>as</strong> pontes de fábrica romana<br />
já enunciad<strong>as</strong> reforçam desde logo essa convicção<br />
que é, de resto, comprova<strong>da</strong> pela <strong>do</strong>cumentação<br />
histórica. Referi<strong>da</strong> pela primeira vez em 1439, a<br />
ponte, construí<strong>da</strong> no século anterior, tinha caí<strong>do</strong><br />
em virtude de uma grande cheia. Em 1473, está de<br />
novo de pé m<strong>as</strong>, por volta de 1600, estão caí<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is<br />
arcos e o rio é p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong> a vau. Em 1621, a travessia<br />
já se faz de novo pela ponte m<strong>as</strong>, ou porque a<br />
reconstrução <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is arcos não tivesse si<strong>do</strong> bem<br />
<br />
de novo estragos, em inícios <strong>do</strong> século seguinte o<br />
monumento necessita de profund<strong>as</strong> reparações e<br />
obr<strong>as</strong> de reconstrução, sen<strong>do</strong> construí<strong>do</strong>s de novo<br />
os tais <strong>do</strong>is arcos <strong>do</strong> la<strong>do</strong> <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de. Em 2 de Março<br />
Figura 4<br />
A ponte de Silves em 1844 (Relação <strong>da</strong> Derrota Naval, Façanh<strong>as</strong> e<br />
Sucessos <strong>do</strong>s Cruza<strong>do</strong>s que Partirão <strong>do</strong> Escal<strong>da</strong> para a Terra Santa<br />
no Anno de 1189. Escrita em Latim por um <strong>do</strong>s Cruza<strong>do</strong>s, tradução e<br />
anotações de João Baptista <strong>da</strong> Silva Lopes, Lisboa, 1844).<br />
de 1716, é <strong>as</strong>sina<strong>do</strong> com Inácio Mendes o contrato<br />
de obr<strong>as</strong> que conferirá à ponte o <strong>as</strong>pecto actual.<br />
Dos cinco arcos <strong>do</strong> monumento, <strong>do</strong>is – os mais<br />
próximos <strong>da</strong> margem esquer<strong>da</strong> - serão com to<strong>da</strong> a<br />
<br />
sen<strong>do</strong> o que se lhes segue <strong>do</strong> século XV. Os <strong>do</strong>is<br />
restantes, os <strong>do</strong> la<strong>do</strong> <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, já são resulta<strong>do</strong><br />
d<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> <strong>do</strong> século XVIII 12. Como vemos, a ponte<br />
velha de Silves terá cerca de 600 anos, ain<strong>da</strong> que<br />
muitos <strong>do</strong>s elementos que hoje a compõem sejam<br />
bem mais recentes.<br />
Da antiga ponte de Aljezur, destruí<strong>da</strong> por forte<br />
<br />
12<br />
Para conhecer o desenvolvimento dest<strong>as</strong> diferentes f<strong>as</strong>es de reconstrução <strong>da</strong> velha ponte ver Bernardes e Gonçalves, 2005.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 17
Figura 5<br />
Ponte antiga (“romana”) de Aljezur em foto de 1938<br />
localiza<strong>da</strong> a alguns metros para montante, pouco<br />
sabemos, a não ser que a tradição local lhe atribui<br />
<br />
amavelmente faculta<strong>da</strong> pelo Senhor José Manuel<br />
Marreiros, presidente <strong>da</strong> direcção <strong>da</strong> Associação<br />
de Defesa <strong>do</strong> Património Histórico e Arqueológico<br />
de Aljezur, detectam-se claramente du<strong>as</strong> f<strong>as</strong>es:<br />
uma primeira que deverá corresponder à época<br />
medieval denuncia<strong>da</strong> por uma estrutura em cavalete,<br />
que se percebe claramente <strong>do</strong> la<strong>do</strong> n<strong>as</strong>cente <strong>do</strong><br />
rio, e de que ain<strong>da</strong> subsistia um pequeno arco não<br />
visível na referi<strong>da</strong> foto; a segun<strong>da</strong>, com <strong>do</strong>is arcos<br />
de vãos desiguais, corresponderia, certamente, a<br />
uma reconstrução <strong>da</strong>quela estrutura medieval, feita<br />
provavelmente em perío<strong>do</strong> não anterior aos séculos<br />
XVII / XVIII, quan<strong>do</strong>, devi<strong>do</strong> aos fortes cau<strong>da</strong>is de<br />
qualquer torrente ou cheia invernal ou a qualquer<br />
cataclismo natural a ponte medieval ruiu. O talhamar<br />
no pilar central, cujo topo remata numa espécie de<br />
“esplana<strong>da</strong>” é, como vimos, característico de pontes<br />
<strong>da</strong>quela época.Também a restante estrutura <strong>da</strong> ponte,<br />
como os vãos constituí<strong>do</strong>s por arcos abati<strong>do</strong>s, se<br />
coaduna com aquela cronologia. Da antiga estrutura<br />
medieval manteve-se o arranque e o arco <strong>da</strong> margem<br />
direita <strong>do</strong> rio que se integrou na ponte reconstruí<strong>da</strong>.<br />
Salvaguar<strong>da</strong><strong>do</strong> o facto desta análise ser feita a partir<br />
de uma foto, na<strong>da</strong> no monumento aponta para que<br />
tenha uma origem romana.<br />
Como vimos, a pretensa cronologia romana d<strong>as</strong><br />
três pontes históric<strong>as</strong> analisad<strong>as</strong> não resiste a<br />
<br />
demonstrar que são antes construções de époc<strong>as</strong><br />
recentes. Poderíamos estender este tipo de análise<br />
a outros monumentos algarvios, como a ponte<br />
velha de Quelfes ou de Tôr e chegaríamos à mesma<br />
conclusão. Com efeito, é pouco provável que existam<br />
hoje pontes roman<strong>as</strong> conservad<strong>as</strong> no <strong>Algarve</strong>, o que<br />
se prende com uma série de razões, a saber:<br />
Em primeiro lugar o <strong>Algarve</strong> foi durante a época<br />
romana uma região periférica que só marginalmente<br />
<br />
protagoniza<strong>do</strong>s pelos governo central de Roma<br />
ou provincial de Méri<strong>da</strong>. Note-se que a grande via<br />
18 AS VIAS DO ALGARVE
imperial que partia de Roma em direcção ao su<strong>do</strong>este<br />
peninsular morria em Cádiz; o <strong>Algarve</strong> contava, pois,<br />
apen<strong>as</strong> com vi<strong>as</strong> secundári<strong>as</strong> à escala imperial<br />
ain<strong>da</strong> que regionalmente se possa considerar<br />
que algum<strong>as</strong> tivessem importância relevante, ao<br />
ponto de serem mencionad<strong>as</strong> em algum<strong>as</strong> fontes<br />
literári<strong>as</strong> antig<strong>as</strong> 13 . To<strong>da</strong>via, a grande via de ligação<br />
regional e inter-regional era, indubitavelmente, o<br />
mar. Face a isto, pode-se dizer que a região algarvia<br />
nunca <strong>as</strong>sumiu um papel estratégico na rede viária<br />
imperial ou mesmo provincial, razão b<strong>as</strong>tante para<br />
não ter recebi<strong>do</strong> grandes investimentos viários,<br />
nomea<strong>da</strong>mente em pontes. Não queremos, porém,<br />
negar a existência de pontes roman<strong>as</strong> no <strong>Algarve</strong>. É<br />
<br />
ou outra em pedra, nomea<strong>da</strong>mente nos percursos<br />
principais que ligavam <strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des de Ossonoba a<br />
Balsa e est<strong>as</strong> às urbes <strong>do</strong> Alentejo, m<strong>as</strong>, de acor<strong>do</strong><br />
com o quadro regional e a sua inserção no espaço<br />
<strong>do</strong> Império e <strong>da</strong> província, podemos suspeitar<br />
que boa parte d<strong>as</strong> pontes existentes seriam de<br />
madeira ou que a travessia <strong>do</strong>s principais cursos<br />
de água se faria com recurso a barc<strong>as</strong> e jangad<strong>as</strong>.<br />
Obviamente que <strong>as</strong> pontes de madeira, decorri<strong>do</strong>s<br />
qu<strong>as</strong>e <strong>do</strong>is mil anos, não deixaram vestígios. M<strong>as</strong>,<br />
mesmo admitin<strong>do</strong> a existência de pontes de pedra,<br />
<br />
enxurrad<strong>as</strong> e torrentes invernais que, como vimos,<br />
sistematicamente destruíram <strong>as</strong> pontes medievais e<br />
modern<strong>as</strong>. É que só pontes como <strong>as</strong> de Alcântara<br />
ou de Chaves seriam, eventualmente, capazes de<br />
aguentar tais ímpetos d<strong>as</strong> águ<strong>as</strong> ao longo de <strong>do</strong>is<br />
milénios; m<strong>as</strong>, certamente, estrutur<strong>as</strong> monumentais<br />
<br />
BIBLIOGRAFIA<br />
ACERO Pérez, Jesús & VÁZQUEZ Paredes, Sara (no prelo)<br />
<br />
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SARRÃO, Henrique Fernandes - “História <strong>do</strong> Reino <strong>do</strong><br />
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Século XVI (Apresentação, leitura, not<strong>as</strong> e glossário de<br />
Manuel Vieg<strong>as</strong> Guerreiro e Joaquim Romero de Magalhães)<br />
Cadernos <strong>da</strong> Revista de História Económica e Social,<br />
3, Lisboa: Sá <strong>da</strong> Costa Editora, 1983, p. 166.<br />
13<br />
Sobre <strong>as</strong> fontes literári<strong>as</strong> antig<strong>as</strong> que referem itinerários no <strong>Algarve</strong><br />
veja-se Rodrigues, 2004.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 19
.II<br />
A REDE VIÁRIA ROMANA DO ALGARVE CENTRAL<br />
SANDRA RODRIGUES<br />
Mestre em Arqueologia Clássica (Facul<strong>da</strong>de de Letr<strong>as</strong> de Lisboa)<br />
Cresumo<br />
Com b<strong>as</strong>e no estu<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong> sobre As Vi<strong>as</strong> Roman<strong>as</strong><br />
<strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> (RODRIGUES, 2004), concluímos que<br />
havia du<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> de ligação ao Norte, pelo centro,<br />
que cruzavam o Barrocal e a Serra Algarvia, partin<strong>do</strong><br />
d<strong>as</strong> imediações <strong>da</strong> Civit<strong>as</strong> Ossonobensis (Faro).<br />
Assim, pretende-se com esta comunicação,<br />
traçar o quadro viário romano <strong>da</strong>quela área,<br />
destaca<strong>da</strong>mente <strong>as</strong> du<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> supra referid<strong>as</strong>,<br />
sen<strong>do</strong> que de uma d<strong>as</strong> quais restam vestígios no<br />
concelho de São Brás de Alportel – A “Calçadinha”<br />
de São Brás de Alportel.<br />
<br />
dúbia hierarquização viária, tu<strong>do</strong> leva a crer que a<br />
“Calçadinha” correspon<strong>da</strong> a um diverticulum <strong>da</strong><br />
via principal que, por Loulé, ligaria a Olisipo (Lisboa)<br />
e Pax Iulia (Beja).<br />
20 AS VIAS DO ALGARVE
Uma d<strong>as</strong> principais questões suscitad<strong>as</strong> pela<br />
investigação de redes viári<strong>as</strong> antig<strong>as</strong> é, além<br />
<strong>da</strong> cronologia, a hierarquização <strong>do</strong>s eixos de<br />
circulação, nomea<strong>da</strong>mente na região algarvia. Esta<br />
problemática decorre essencialmente <strong>da</strong> esc<strong>as</strong>sez<br />
de vestígios viários e d<strong>as</strong> parc<strong>as</strong> referênci<strong>as</strong><br />
<br />
Porém, é conheci<strong>da</strong> uma alusão literária à existência<br />
de um eixo de ligação de Ossonoba a norte, pela<br />
serra <strong>do</strong> Caldeirão. Tal referência é faculta<strong>da</strong> pelo<br />
Itinerário de Antonino [418, 6], onde se diz que a<br />
estra<strong>da</strong> que ligava Baesuris a Ossonoba, por Balsa,<br />
Olisipo, por Salacia<br />
[Itin., 416, 4-417]. Com b<strong>as</strong>e nesta indicação, muitos<br />
autores fazem p<strong>as</strong>sar a via de ligação a norte por<br />
S. Brás de Alportel (vide Rodrigues, 2004: 67-68).<br />
No entanto, são inúmeros os <strong>da</strong><strong>do</strong>s que nos impelem<br />
a discor<strong>da</strong>r <strong>da</strong>quel<strong>as</strong> posições, pese embora a já<br />
<br />
viária. Importa pois considerar que se a ligação<br />
terrestre longitudinal de Baesuris a Ossonoba<br />
continu<strong>as</strong>se para ocidente, para Lacobriga, por<br />
<br />
um traça<strong>do</strong> que a levaria para norte, de acor<strong>do</strong><br />
com o Itinerário de Antonino. Com efeito, este<br />
traça<strong>do</strong> parece fazer mais senti<strong>do</strong>, <strong>da</strong><strong>do</strong> que se<br />
trata de um percurso cuja directriz é mais linear (cf.<br />
Mapa viário, in Rodrigues, 2004: 64).<br />
Consideran<strong>do</strong> o valor cumulativo <strong>do</strong>s eixos<br />
de circulação e reportan<strong>do</strong>-nos ao século XVI,<br />
<br />
Salir e <strong>da</strong>í ao Alentejo, era a mais importante <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong> central. Atente-se no topónimo “rua de<br />
Portugal”, em Loulé, já existente no século XVI<br />
(Magalhães, 1970: 186). Tratan<strong>do</strong>-se, contu<strong>do</strong>,<br />
de uma via terrena, como se pode inferir num<br />
<strong>do</strong>cumento de 1538 que diz que um vizinho de<br />
“Ator” (Tôr), Loulé, “lavrou a estra<strong>da</strong> que desta<br />
” (Arq. C.M.L., vereações<br />
<br />
Assim, a estra<strong>da</strong> deixaria o caminho de Lacobriga,<br />
por altur<strong>as</strong> de Almansil, que constituiria um ponto<br />
de cruzamento de vi<strong>as</strong>. Atenden<strong>do</strong> ao topónimo<br />
<br />
que ali tenha existi<strong>do</strong> uma mansio, com funções<br />
de estação de mu<strong>da</strong> (mutatio). Este facto pode<br />
<br />
continuação <strong>da</strong> via <strong>da</strong>li para norte.<br />
De Loulé, a via sairia pela actual rua de Portugal,<br />
que parte <strong>do</strong> c<strong>as</strong>telo <strong>da</strong> vila. N<strong>as</strong> cercani<strong>as</strong> desta<br />
rua foi encontra<strong>do</strong> um cemitério islâmico anterior<br />
à Reconquista (Luzia,1999-2000: 129-185), o que<br />
sugere que esta seria uma d<strong>as</strong> principais saíd<strong>as</strong> <strong>da</strong><br />
vila. Há ain<strong>da</strong> notícia de diversos acha<strong>do</strong>s romanos<br />
e islâmicos (Santos, 1972: 151-3; Alarcão, 1988:<br />
288; Marques, 1992: 245).<br />
Dali o percurso continuaria até Salir, vencen<strong>do</strong> a<br />
ribeira <strong>do</strong> Algibre na zona de Tôr, sensivelmente<br />
numa área próxima d<strong>as</strong> du<strong>as</strong> pontes que ali<br />
se encontram (a antiga e a actual), em cuj<strong>as</strong><br />
<br />
calça<strong>da</strong> (a cerca de 2 km <strong>da</strong> aldeia), corren<strong>do</strong><br />
mais ou menos paralelo à estra<strong>da</strong> actual. Este<br />
caminho é conheci<strong>do</strong>, segun<strong>do</strong> os locais, como<br />
“estra<strong>da</strong> de Portugal”, facto que, alia<strong>do</strong> à boa<br />
orientação que toma, pelo vale, atesta em favor <strong>da</strong><br />
sua antigui<strong>da</strong>de.<br />
A partir de Salir, a estra<strong>da</strong> parece mu<strong>da</strong>r<br />
<br />
<br />
locali<strong>da</strong>de, o que é vulgar no curso d<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong> (Mant<strong>as</strong>, 1996: 65). Assim, o caminho<br />
<br />
por Barranco <strong>do</strong> Velho, tocan<strong>do</strong> Cortiçad<strong>as</strong> e,<br />
seguin<strong>do</strong> um percurso semelhante ao <strong>do</strong> actual<br />
I.C. 2, dirigin<strong>do</strong>-se para Almodôvar e <strong>da</strong>í para norte<br />
, até Lisboa (cf. Rodrigues, 2004: 65-67).<br />
As informações facultad<strong>as</strong> pela <strong>do</strong>cumentação<br />
antiga, a par <strong>da</strong> densi<strong>da</strong>de de vestígios romanos<br />
e medievais que acompanham o itinerário acima<br />
sugeri<strong>do</strong>, conduzem-nos a apontar aquele<br />
trajecto como sen<strong>do</strong> a proposta mais viável para<br />
a travessia principal <strong>da</strong> serra <strong>do</strong> Caldeirão. Ao<br />
propormos aquele traça<strong>do</strong>, partimos pois de uma<br />
hierarquização viária e, por conseguinte, relegamos<br />
para um plano secundário a via que partia de<br />
Ossonoba para norte, por S. Brás de Alportel.<br />
Assim, encaramos este trajecto como um diverticulum<br />
que serviria <strong>as</strong> villae a norte de Faro, acaban<strong>do</strong> por<br />
se ligar à via principal, por altur<strong>as</strong> de Salir.<br />
A saí<strong>da</strong> <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Faro far-se-ia pela actual rua<br />
de Portugal, p<strong>as</strong>san<strong>do</strong> pela área <strong>do</strong> Lethes, onde<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 21
Viana, 1951), coincidin<strong>do</strong> neste nó com a estra<strong>da</strong><br />
de Balsa. A partir deste ponto e praticamente em<br />
linha recta, p<strong>as</strong>sava pela actual rua de S. Luís, pela<br />
estra<strong>da</strong> <strong>da</strong> Penha, até Vale carneiros (Bernardes e<br />
Oliveira, 2002), onde apareceram vestígios romanos<br />
de uma possível villa suburbana de Ossonoba<br />
(Santos, 1972: 171-2; Alarcão, 1988: 321).<br />
De Vale Carneiros, a estra<strong>da</strong> rumava pela<br />
Conceição, p<strong>as</strong>san<strong>do</strong> por Estoí, fazen<strong>do</strong>, deste<br />
mo<strong>do</strong>, a ligação à famosa villa romana de Milreu.<br />
Daí prosseguiria pela margem esquer<strong>da</strong> <strong>do</strong> rio<br />
Seco, alcança<strong>do</strong> Cancela e Macha<strong>do</strong>s, fazen<strong>do</strong> a<br />
travessia <strong>do</strong> rio Seco por altur<strong>as</strong> de Porto Velho,<br />
que se situa n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des <strong>do</strong> sítio <strong>do</strong> Vale<br />
<strong>do</strong> Joio, onde surgiu uma grande densi<strong>da</strong>de de<br />
vestígios romanos e árabes, numa área que se<br />
estende por cerca de 20.000 metros quadra<strong>do</strong>s<br />
e que pode corresponder a uma villa <strong>da</strong> época<br />
romana (Bernardes e Oliveira, 2002).<br />
Após a travessia <strong>do</strong> rio Seco, o percurso viário seria<br />
análogo ao <strong>da</strong> E.N. 2 até S. Brás, provavelmente<br />
por uma via terrena, pelo menos até ao sítio de<br />
Hort<strong>as</strong> e Moinhos, onde existem <strong>do</strong>is troços de<br />
calça<strong>da</strong> cuj<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> impelem à atribuição<br />
de uma cronologia romana, a pelo menos um deles<br />
(Rodrigues, 2004: 69-73).<br />
<br />
à principal estra<strong>da</strong> de ligação a norte.<br />
<br />
de que a via Ossonoba – Loulé – Salir, e <strong>da</strong>í para<br />
norte, terá <strong>as</strong>sumi<strong>do</strong> a primazia, que aliás manteve<br />
ao longo <strong>do</strong>s séculos, inclusivamente até ao século<br />
XIX (Rodrigues, 2004: 72).<br />
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22 AS VIAS DO ALGARVE
.III<br />
DESDE LA DESEMBOCADURA DEL RÍO GUADIANA.<br />
LA CONTINUIDAD DEL ITINERARIO HACIA ORIENTE<br />
FRANCISCO GÓMEZ TOSCANO<br />
Universi<strong>da</strong>d de Huelva<br />
resumen<br />
D<br />
Durante mucho tiempo, en el estudio de la conexión<br />
viaria entre l<strong>as</strong> provinci<strong>as</strong> Baetica<br />
y Lusitania,<br />
<br />
algunos de sus tramos. En esta contribución, fruto<br />
de trabajos arqueológicos de campo, se muestra el<br />
traza<strong>do</strong> comprendi<strong>do</strong> entre la desembocadura del<br />
río Guadiana y Onoba en la ría de Huelva, <strong>as</strong>í como<br />
la localización de l<strong>as</strong> mansiones intermedi<strong>as</strong> para<br />
<br />
el extremo occidental<br />
de la provincia Baetica<br />
y su relación con<br />
la comunicación<br />
terrestre<br />
Ante el fenómeno de la romanización, el extremo<br />
más occidental de la futura Provincia Bética, <strong>do</strong>nde<br />
existió desde la Protohistoria una importante<br />
vinculación con el fenómeno urbano (CAMPOS y<br />
GÓMEZ, 1995; GÓMEZ y CAMPOS, e.p.; GÓMEZ,<br />
e.p.), y en cuya expresión física han busca<strong>do</strong> los<br />
investiga<strong>do</strong>res relaciones prerroman<strong>as</strong> con Siria-<br />
-Palestina, el Mun<strong>do</strong> Egeo o el Mediterráneo<br />
Central (GÓMEZ, 2004), fue sien<strong>do</strong> a<strong>da</strong>pta<strong>do</strong> con el<br />
tiempo a l<strong>as</strong> necesi<strong>da</strong>des que imponían l<strong>as</strong> nuev<strong>as</strong><br />
estrategi<strong>as</strong> de explotación comercial y <strong>do</strong>minio<br />
político de la Urbs por excelencia.<br />
Los primeros textos que describen a l<strong>as</strong> gentes que<br />
habitaban l<strong>as</strong> cost<strong>as</strong> occidentales de la Península<br />
Ibérica y en nuestro c<strong>as</strong>o del Golfo de Cádiz se<br />
menciona que fueron reputa<strong>do</strong>s como los más<br />
cultos de los iberos y, no en vano, ciu<strong>da</strong>des como<br />
Tucci, Ilipla y Onuba, aunque debieron a<strong>da</strong>ptar<br />
su urbanística previa a un<strong>as</strong> form<strong>as</strong> que ya serían<br />
comunes en el conjunto del mun<strong>do</strong> mediterráneo,<br />
llevaban una existencia de siglos cuan<strong>do</strong> fueron<br />
incorporad<strong>as</strong> por Roma.<br />
H<strong>as</strong>ta muy recientemente, debi<strong>do</strong> a una<br />
investigación no adecua<strong>da</strong>, es<strong>as</strong> ciu<strong>da</strong>des<br />
roman<strong>as</strong> situad<strong>as</strong> en el extremo más occidental<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 23
de la Baetica eran conocid<strong>as</strong> únicamente a través<br />
de los textos que l<strong>as</strong> nombraban en relación con<br />
determinad<strong>as</strong> circunstanci<strong>as</strong>, o forman<strong>do</strong> parte<br />
del grupo de mansiones por <strong>do</strong>nde discurrían<br />
l<strong>as</strong> principales ví<strong>as</strong> de comunicación construid<strong>as</strong><br />
para facilitar los movimientos de hombres, equipo<br />
y mercancí<strong>as</strong>. De hecho, en ese mismo orden,<br />
después de Hispalis se nombra a Tusci, Hilpula<br />
y Onoba en el Anónimo de Ravena antes de que<br />
el traza<strong>do</strong> de ese camino tome dirección hacia<br />
l<strong>as</strong> min<strong>as</strong> situad<strong>as</strong> más al norte (RUIZ ACEVEDO,<br />
1998: 35).<br />
En el Itinerario de Antonino, el más importante texto<br />
para conocer la estructura de l<strong>as</strong> comunicaciones<br />
del Imperio, l<strong>as</strong> ciu<strong>da</strong>des de Onoba, Ilipla y Tucci<br />
son mansiones <strong>do</strong>nde culminan cort<strong>as</strong> etap<strong>as</strong><br />
de unos miles de p<strong>as</strong>os, que muestran la ruta a<br />
seguir entre la desembocadura del río An<strong>as</strong> y<br />
Emerita Augusta a través de Italica (ROLDÁN,<br />
1975). No obstante, sólo h<strong>as</strong>ta muy recientemente<br />
(BENDALA, GÓMEZ y CAMPOS, 1999), precisamente<br />
la localización del tramo más occidental de la ruta<br />
Ostium Anae-Onuba, el que unía la desembocadura<br />
del río con la ciu<strong>da</strong>d portuaria situa<strong>da</strong> en la ría de<br />
Huelva, había si<strong>do</strong> objeto de controversia, to<strong>da</strong> vez<br />
que al no haberse investiga<strong>do</strong> con meto<strong>do</strong>logía<br />
arqueológica de campo, y por ello no se contaba<br />
con prueb<strong>as</strong> contr<strong>as</strong>tables, no existía unanimi<strong>da</strong>d<br />
entre los investiga<strong>do</strong>res a la hora de situar la ruta<br />
por <strong>do</strong>nde discurrió ese tramo ni l<strong>as</strong> mansiones en<br />
él mencionad<strong>as</strong>. En el c<strong>as</strong>o de Praesidium, situa<strong>do</strong><br />
a XXIIII m.p. de la desembocadura del río, éste<br />
había si<strong>do</strong> localiza<strong>do</strong> tanto en diferentes puntos<br />
del Andévalo occidental (CARO, 1634; MILLER, 1916;<br />
THOUVENOT, 1973; MUÑIZ, 1990; BENDALA, 1987),<br />
como en un hipotético camino cercano a la costa<br />
(BLÁZQUEZ, 1921; HERNÁNDEZ, 1958; ROLDÁN,<br />
1975; LUZÓN, 1975; SILLIÈRES, 1990). De la misma<br />
forma, Rubrae, la siguiente mansión situa<strong>da</strong> en este<br />
c<strong>as</strong>o a XXVIII m.p. de la anterior, fue <strong>as</strong>imismo<br />
situa<strong>da</strong> en varios puntos bien del camino norte o<br />
bien del camino costero, pero siempre cercana al<br />
curso del río Odiel para, una vez cruza<strong>do</strong> éste por<br />
la p<strong>as</strong>a<strong>da</strong> existente en Gibraleón, llegar a la ciu<strong>da</strong>d<br />
de Onoba.<br />
Del mismo mo<strong>do</strong> que en el conocimiento del traza<strong>do</strong><br />
de los caminos, la más reciente investigación<br />
realiza<strong>da</strong> por el Área de Arqueología de la<br />
Universi<strong>da</strong>d de Huelva nos acerca a una noción<br />
de la expresión física de sus principales ciu<strong>da</strong>des<br />
en época romana. Tanto la extensión de Ilipla,<br />
b<strong>as</strong>tante más pequeña en reali<strong>da</strong>d que el espacio<br />
ocupa<strong>do</strong> por el traza<strong>do</strong> almohade que se ha<br />
conserva<strong>do</strong> h<strong>as</strong>ta la actuali<strong>da</strong>d tal como se había<br />
interpreta<strong>do</strong>, como la localización de sus murall<strong>as</strong><br />
de sillares y en ell<strong>as</strong> una puerta monumental con<br />
<br />
<strong>do</strong>nde <strong>as</strong>entar la explicación física de la ciu<strong>da</strong>d,<br />
claramente favoreci<strong>da</strong> por su situación en la<br />
margen derecha del río Tinto, franqueable por<br />
el inmenso puente desde época romana (PÉREZ,<br />
CAMPOS y GÓMEZ, 2000).<br />
El c<strong>as</strong>o de Huelva es paradójico, to<strong>da</strong> vez que h<strong>as</strong>ta<br />
hace poco no existía cualquier <strong>da</strong>to arqueológico<br />
de relevancia que no se hubiese relaciona<strong>do</strong> con la<br />
ciu<strong>da</strong>d tartésica, el perío<strong>do</strong> fenicio o la presencia<br />
griega arcaica. El acueducto reitera<strong>da</strong>mente<br />
menciona<strong>do</strong> por los historia<strong>do</strong>res y sus moned<strong>as</strong>,<br />
<strong>as</strong>í como algunos restos de factorí<strong>as</strong> de salazones<br />
publica<strong>do</strong>s en la déca<strong>da</strong> de los setenta y poco<br />
más, eran los <strong>da</strong>tos romanos conoci<strong>do</strong>s h<strong>as</strong>ta su<br />
inscripción como Zona Arqueológica en el Catálogo<br />
General de Patrimonio Histórico de la Comuni<strong>da</strong>d<br />
An<strong>da</strong>luza. Sin embargo, l<strong>as</strong> excavaciones de<br />
salvamento más recientes están mostran<strong>do</strong><br />
<br />
delimitar fehacientemente el traza<strong>do</strong> ocupa<strong>do</strong><br />
por la pequeña ciu<strong>da</strong>d de Onoba, incluso con<br />
algunos ejemplos de arquitectura monumental,<br />
sus principales necrópolis y la ocupación periférica<br />
con villae rusticae (GÓMEZ y CAMPOS, 2000).<br />
Sin embargo, su estratégica localización en la ría<br />
de Huelva, conecta<strong>da</strong> con el resto del territorio<br />
por cómo<strong>do</strong>s caminos, hicieron de ella el lugar<br />
idóneo desde <strong>do</strong>nde controlar l<strong>as</strong> explotaciones<br />
miner<strong>as</strong> tal como debe deducirse del hallazgo del<br />
pecio de Planier, <strong>do</strong>nde aparece el nombre de sus<br />
magistra<strong>do</strong>s en unos lingotes de cobre, uni<strong>do</strong> con<br />
l<strong>as</strong> posibili<strong>da</strong>des de explotación de los recursos<br />
pesqueros, <strong>as</strong>í como del entorno de la ciu<strong>da</strong>d y<br />
24 AS VIAS DO ALGARVE
sus marism<strong>as</strong>, con fértiles tierr<strong>as</strong> para el mejor<br />
<br />
cumplien<strong>do</strong> con el papel de centro hegemónico y<br />
territorial que ya venía desempeñan<strong>do</strong> durante de<br />
to<strong>do</strong> el I Milenio a.C. (GOMEZ, e.p.).<br />
A pesar de to<strong>do</strong>, el papel de la vía 23 del<br />
Itinerario de Antonino, para la mayor parte de<br />
los investiga<strong>do</strong>res, siempre ha representa<strong>do</strong> un<br />
<strong>as</strong>pecto secun<strong>da</strong>rio, to<strong>da</strong> vez que el principal eje<br />
de comunicaciones que unía a Roma con Occidente<br />
era la Via Augusta que terminaba en Gades, por lo<br />
<br />
destaca<strong>do</strong> a pesar de ser la conjunción terrestre<br />
entre Baetica y Lusitania. En reali<strong>da</strong>d, a ambos<br />
la<strong>do</strong>s del Guadiana, l<strong>as</strong> ví<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> serían los<br />
principales medios para acercar los metales<br />
obteni<strong>do</strong>s en la Franja Piritífera Ibérica a los<br />
puertos atlánticos.<br />
el tramo de la vía<br />
ostium Anae-<br />
-praesidium-<br />
-rubrae-onuba<br />
El traza<strong>do</strong> de este tramo en su conjunto no ha si<strong>do</strong><br />
recorri<strong>do</strong> por nosotros en su totali<strong>da</strong>d, aunque se<br />
hayan hecho diferentes comprobaciones a lo largo<br />
de su ruta para estimar que no existen lagun<strong>as</strong><br />
importantes y que a nivel planimétrico el itinerario<br />
propuesto deba ser prácticamente el original. No<br />
obstante, especialmente en el entorno de Sanlúcar de<br />
Guadiana, amplios tramos que to<strong>da</strong>vía conservan su<br />
empedra<strong>do</strong> han permiti<strong>do</strong> establecer característic<strong>as</strong><br />
Figura 1<br />
Traza<strong>do</strong> de la vía entre Ayamonte y Huelva.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 25
generales y, <strong>as</strong>í mismo, una vez localiza<strong>da</strong> la primera<br />
mansio en un lugar exacto, estimar el rumbo de su<br />
continui<strong>da</strong>d hacia otr<strong>as</strong> zon<strong>as</strong>.<br />
Durante los trabajos de campo pudieron<br />
<strong>do</strong>cumentarse tramos empedra<strong>do</strong>s to<strong>da</strong>vía<br />
conserva<strong>do</strong>s que conforman un traza<strong>do</strong> continuo<br />
h<strong>as</strong>ta la población de El Grana<strong>do</strong>, los cuales fueron<br />
Global Positioning<br />
) e integra<strong>do</strong>s en planimetría del Mapa<br />
<br />
De la misma forma, la conexión hacia el sur está<br />
garantiza<strong>da</strong> h<strong>as</strong>ta San Silvestre de Guzmán y, desde<br />
allí, con un tramo que corresponde a la carretera<br />
actual h<strong>as</strong>ta Villablanca, continuar h<strong>as</strong>ta el entorno<br />
de Ayamonte. Una vez analizad<strong>as</strong> l<strong>as</strong> característic<strong>as</strong><br />
del traza<strong>do</strong> en la zona, puede concluirse, claramente<br />
<br />
constructivo, que estos tramos son el resulta<strong>do</strong> de<br />
<br />
uniforme, los ingenieros imperiales a<strong>da</strong>ptaron tanto<br />
a l<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> del paisaje <strong>do</strong>nde se construye<br />
como a un<strong>as</strong> necesi<strong>da</strong>des previst<strong>as</strong>. La continui<strong>da</strong>d<br />
desde El Grana<strong>do</strong> h<strong>as</strong>ta la zona minera de Tharsis-<br />
Alosno está <strong>do</strong>cumenta<strong>da</strong> en diversos tramos que<br />
conforman prácticamente una línea recta (RUIZ,<br />
1998). En la mayoría de los c<strong>as</strong>os el traza<strong>do</strong> puede<br />
seguirse a través de fotografía aérea en pares<br />
estereoscópicos <strong>da</strong><strong>do</strong> la buena conservación de<br />
la obra, <strong>as</strong>í como los topónimos perpetua<strong>do</strong>s en<br />
relación con el término plata (BENDALA, 1987).<br />
Un tramo perfectamente conserva<strong>do</strong> inmediatamente<br />
al sur de Sanlúcar (Lámina I), además de estimar su<br />
continui<strong>da</strong>d hacia el norte siguien<strong>do</strong> el curso del río<br />
Guadiana, permite observar cómo la vía empedra<strong>da</strong><br />
se ajusta perfectamente a la topografía de parti<strong>da</strong><br />
y, sólo en oc<strong>as</strong>iones, se realizaron trabajos de<br />
adecuación importantes. Hacia el Norte, y también<br />
desde San Silvestre de Guzmán más al Sur, el traza<strong>do</strong><br />
va amoldán<strong>do</strong>se a la topografía que corresponde<br />
al paisaje accidenta<strong>do</strong> de esta zona del Andévalo<br />
Occidental tan cercana a la margen derecha del<br />
río Guadiana. Da<strong>do</strong> que el sustrato del Paleozoico,<br />
forma<strong>do</strong> fun<strong>da</strong>mentalmente por pizarr<strong>as</strong> y<br />
<br />
actual, sólo se realizaron l<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> necesari<strong>as</strong> para<br />
que el camino perdur<strong>as</strong>e en el tiempo, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> giros<br />
apreciables para evitar la construcción de grandes<br />
obr<strong>as</strong> de infraestructura cuan<strong>do</strong> era necesario salvar<br />
importantes pendientes, con muros de contención<br />
y terraplenes, o el curso de un buen número de<br />
serpenteantes barrancos estacionales con puentes<br />
o badenes que vierten sus agu<strong>as</strong> al gran colector<br />
del Guadiana. En cualquier c<strong>as</strong>o, desde nuestra<br />
perspectiva actual, algun<strong>as</strong> subid<strong>as</strong> y bajad<strong>as</strong><br />
pueden parecer incómod<strong>as</strong> pero, sin du<strong>da</strong>, eran l<strong>as</strong><br />
únic<strong>as</strong> posibles en consonancia con el relieve, pues<br />
Lámina I<br />
Tramo empedra<strong>do</strong> de la vía al sur de Sanlúcar de Guadiana.<br />
Figura 2<br />
Sección de la vía en el camino Sanlúcar-Huerta Torres.<br />
26 AS VIAS DO ALGARVE
los ingenieros imperiales siempre apostaron por<br />
los trayectos más cortos entre <strong>do</strong>s puntos, a pesar<br />
de que algunos tramos no fuesen tan llanos como<br />
hubiese si<strong>do</strong> necesario.<br />
Según hemos mostra<strong>do</strong> en trabajos anteriores<br />
(BENDALA, GÓMEZ y CAMPOS, 1999), los tramos<br />
empedra<strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumenta<strong>do</strong>s en el término municipal<br />
de Sanlúcar de Guadiana son similares estructural<br />
y técnicamente a los también conoci<strong>do</strong>s en el<br />
término municipal de San Silvestre de Guzmán,<br />
que debieron continuar al menos h<strong>as</strong>ta Villablanca,<br />
estan<strong>do</strong> éstos cubiertos hoy por la carretera que<br />
une ambos núcleos urbanos; el diseño del traza<strong>do</strong><br />
rectilíneo y el rebaje del sustrato pizarroso en<br />
algun<strong>as</strong> zon<strong>as</strong> elevad<strong>as</strong> por erosión diferencial son<br />
característicos de una obra romana de la enti<strong>da</strong>d<br />
de la Vía 23.<br />
Por ello, en su conjunto, est<strong>as</strong> estructur<strong>as</strong> viari<strong>as</strong><br />
conforman parte del tramo menciona<strong>do</strong> en<br />
el Itinerarium Antoninum, en lo que abun<strong>da</strong> su<br />
concor<strong>da</strong>ncia con l<strong>as</strong> veinticuatro mill<strong>as</strong> roman<strong>as</strong><br />
consignad<strong>as</strong> para la distancia entre Ayamonte en<br />
la desembocadura del Guadiana y Praesidium,<br />
equivalente a 35’5 kilómetros. Ante esta evidencia,<br />
ahora también es posible interpretar que el traza<strong>do</strong><br />
continúa, con l<strong>as</strong> mism<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> de una<br />
via silice strata, más al norte de la población<br />
de Sanlúcar h<strong>as</strong>ta Huerta Torres, alcanzan<strong>do</strong> la<br />
población de El Grana<strong>do</strong> desde <strong>do</strong>nde continúa<br />
hacia el Norte y Este.<br />
no se han realiza<strong>do</strong> sondeos comprobatorios, en<br />
algun<strong>as</strong> zon<strong>as</strong> destruid<strong>as</strong> ha si<strong>do</strong> posible detectar<br />
que, entre el margen corta<strong>do</strong> en el sustrato y<br />
el muro de cierre en el la<strong>do</strong> del río, primero se<br />
depositaba un nivel de piedra local de pequeñ<strong>as</strong><br />
dimensiones y arena que cumplía la función de<br />
rudus<br />
se aprecia está abomba<strong>da</strong> por su parte central para<br />
hacer desaguar hacia los márgenes, se dispuso un<br />
piso de bloques de tamaño variable construi<strong>do</strong><br />
con piedra caliza gris, grauvac<strong>as</strong> y los de pizarra<br />
de mejor cali<strong>da</strong>d, ya que ésta se exfolia y destruye<br />
rápi<strong>da</strong>mente. L<strong>as</strong> dimensiones de los bloques<br />
utiliza<strong>do</strong>s para conformar el piso son variables,<br />
desde medid<strong>as</strong> centimétric<strong>as</strong> a l<strong>as</strong> decimétric<strong>as</strong>,<br />
aunque en algunos c<strong>as</strong>os se han <strong>do</strong>cumenta<strong>do</strong><br />
los<strong>as</strong> cercan<strong>as</strong> a los setenta centímetros. Nuestra<br />
impresión es que la mayor parte de los bloques, por<br />
su apariencia y el hecho de no presentar huell<strong>as</strong> de<br />
En to<strong>do</strong> el conjunto, la construcción de la vía se<br />
realiza a<strong>da</strong>ptan<strong>do</strong> en ca<strong>da</strong> c<strong>as</strong>o el traza<strong>do</strong> a la<br />
morfología local. Especialmente al norte de Sanlúcar<br />
de Guadiana, el traza<strong>do</strong> se ha a<strong>da</strong>pta<strong>do</strong> al talud del<br />
curso del río cortan<strong>do</strong> en ángulo recto dicho talud<br />
para alojar la vía (Figura 2). Da<strong>do</strong> que el sustrato<br />
<br />
constitución muy deleznable, incluso únicamente por<br />
<br />
el tránsito, puesto que la circulación de animales<br />
y carg<strong>as</strong> pesad<strong>as</strong> la podía deteriorar rápi<strong>da</strong>mente,<br />
especialmente con el uso de carros. Por contra,<br />
la roca local se utiliza en el muro de retención<br />
que cumple la función de uno de los margines,<br />
construi<strong>do</strong> con laj<strong>as</strong> de pizarra extraí<strong>da</strong>. Aunque<br />
Lámina II<br />
Zona maltrata<strong>da</strong> de la vía al norte de Sanlúcar de Guadiana.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 27
cantería, se obtuvieron en cualquiera de los arroyos<br />
cercanos, o en el río Guadiana. De cualquier forma<br />
no se trata de los<strong>as</strong> cortad<strong>as</strong> siguien<strong>do</strong> un módulo<br />
más o menos homogéneo o saxum quadratum<br />
típico en algun<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> conocid<strong>as</strong>, sino<br />
que se han utiliza<strong>do</strong> piedr<strong>as</strong> naturales con l<strong>as</strong><br />
<br />
l<strong>as</strong> que no se observa ningún tipo de retoque para<br />
<br />
transitable, excepto algunos ejemplos que pudieron<br />
ser reutiliza<strong>do</strong>s de otr<strong>as</strong> zon<strong>as</strong>.<br />
En general, en cuanto a la obra del arrecife por<br />
<strong>do</strong>nde circulaba la vía, su tamaño no parece<br />
uniforme, puesto que varía entre medid<strong>as</strong> cercan<strong>as</strong><br />
a los tres metros y otr<strong>as</strong> b<strong>as</strong>tante más modest<strong>as</strong>. En<br />
el c<strong>as</strong>o de l<strong>as</strong> últim<strong>as</strong>, observad<strong>as</strong> en tramos muy<br />
tortura<strong>do</strong>s actualmente por diferentes motivos, es<br />
posible que l<strong>as</strong> dimensiones inferiores a los <strong>do</strong>s<br />
metros que se aprecian ahora sea el resulta<strong>do</strong><br />
<br />
construi<strong>da</strong>, habién<strong>do</strong>se acumula<strong>do</strong> piedr<strong>as</strong> de<br />
diferente tamaño en el fon<strong>do</strong> de la trinchera, se ha<br />
perdi<strong>do</strong> parte del muro de cierre original, o se hayan<br />
busca<strong>do</strong> soluciones improvisad<strong>as</strong> en momentos<br />
muy recientes para su uso como sen<strong>da</strong> transitable<br />
sólo por caballerí<strong>as</strong> o person<strong>as</strong> a pie (Lámina II).<br />
Demostra<strong>da</strong> su existencia claramente y su vinculación<br />
con lo descrito en el Itinerario de Antonino, en relación<br />
a la principal función de la vía, una vez localiza<strong>da</strong><br />
la situación del <strong>as</strong>entamiento romano de Huerta<br />
Torres (Lámina III), al cual hemos relaciona<strong>do</strong> con<br />
Praesidium de acuer<strong>do</strong> con el registro arqueológico<br />
<strong>do</strong>cumenta<strong>do</strong>, la mansión que aparece descrita<br />
entre el río Guadiana y la Rubrae relaciona<strong>da</strong> l<strong>as</strong><br />
Min<strong>as</strong> de Tharsis por el color (BENDALA, GÓMEZ y<br />
Lámina III<br />
Situación de Praesidium en la margen izquier<strong>da</strong> del río Guadiana.<br />
28 AS VIAS DO ALGARVE
CAMPOS, 1999), Ruiz Aceve<strong>do</strong> (1998) ha propuesto<br />
que, en ver<strong>da</strong>d, la descripción literaria de la vía<br />
que conforma el tramo río Guadiana-Praesidium-<br />
Rubrae-Onuba como una reali<strong>da</strong>d continua<br />
corresponde a <strong>do</strong>s caminos diferentes, realiza<strong>do</strong>s<br />
tal vez en <strong>do</strong>s momentos, para que tuviesen <strong>do</strong>s<br />
funciones claramente diferenciad<strong>as</strong>. El primero,<br />
con rumbo suroeste, desde el área minera de<br />
Praesidium-,<br />
mientr<strong>as</strong> que el segun<strong>do</strong>, en este c<strong>as</strong>o dirección<br />
sureste opuesta, que conducía hacia la ría de<br />
Huelva -Onoba-, no sólo <strong>do</strong>nde existía como se ha<br />
dicho un puerto marítimo muy importante desde<br />
la Antigüe<strong>da</strong>d, sino desde <strong>do</strong>nde se podía acceder<br />
al bajo Gua<strong>da</strong>lquivir cruzan<strong>do</strong> la Tierra Llana de<br />
Huelva. Ésta sería también la forma más fácil de<br />
comunicarse, a través de Onuba, con l<strong>as</strong> min<strong>as</strong><br />
del Andévalo occidental desde Hispalis, la capital<br />
del conventus iuridicus, entre otros <strong>as</strong>pectos para<br />
ejercer el control administrativo de la zona, o ante<br />
cualquier otra contingencia de tipo económico o<br />
estratégico.<br />
Así, la ruta ostium Anae-Onuba, dividi<strong>da</strong> en ostium<br />
Anae-Praesidium-Rubrae por un la<strong>do</strong> y Onuba-<br />
-Rubrae por otro, cumplía de hecho <strong>do</strong>s funciones<br />
diferentes aunque fueron unid<strong>as</strong> en la descripción<br />
literaria del Itinerario e integrad<strong>as</strong> en un único<br />
traza<strong>do</strong>, la Vía 23 de Itinerario. El primer tramo unía<br />
el entorno de l<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de Tharsis con Praesidium<br />
en el río Guadiana, mientr<strong>as</strong> que el segun<strong>do</strong> lo hacía<br />
con Onuba en la ría de Huelva desde <strong>do</strong>nde se<br />
podía partir hacia Hispalis a través de Ilipla-Tucci,<br />
una ruta que había cumpli<strong>do</strong> funciones parecid<strong>as</strong><br />
desde la Antigüe<strong>da</strong>d, tales como acceder al Andévalo<br />
oriental desde el Puerto de Huelva y del mismo mo<strong>do</strong><br />
conectar con el bajo Gua<strong>da</strong>lquivir (GÓMEZ, 1998).<br />
En este senti<strong>do</strong>, parece posible <strong>as</strong>egurar que la<br />
<br />
y utilizan por primera vez estos caminos es que<br />
los topónimos utiliza<strong>do</strong>s en la descripción de su<br />
recorri<strong>do</strong> - <br />
Rubrae- son de origen netamente latino y<br />
<br />
la vía: la desembocadura del río An<strong>as</strong> -ostium-, una<br />
mansio que también incluía una posible guarnición<br />
-Praesidium- y otra que recibe el nombre de una<br />
característica cromática más representativa<br />
-Rubrae- observa<strong>da</strong> en la misma o en su entorno,<br />
muy diferentes a los siguientes -Onuba, Ilipla,<br />
Tusci-, que además de ser ciu<strong>da</strong>des de gran<br />
tradición en la región no tienen cualquier<br />
<br />
du<strong>da</strong> de origen prerromano como ell<strong>as</strong> mism<strong>as</strong>.<br />
el tramo oriental, ¿una<br />
vía alternativa al río<br />
Guadiana<br />
H<strong>as</strong>ta muy recientemente, al no haberse<br />
contr<strong>as</strong>ta<strong>do</strong> la reali<strong>da</strong>d arqueológica con trabajos<br />
de campo, la localización de <br />
entre la desembocadura del Guadiana (ostium<br />
) y la ría de Huelva (Onoba) han<br />
<br />
Sanlúcar de Guadiana la primera, y en el entorno<br />
de l<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de Tharsis la segun<strong>da</strong>, lugares que se<br />
ajustan precisamente con l<strong>as</strong> distanci<strong>as</strong> de XXIIII y<br />
XXVIIII milia p<strong>as</strong>su marcad<strong>as</strong> respectivamente para<br />
ambos tramos.<br />
Si el traza<strong>do</strong> oriental a partir de Onoba debía<br />
perpetuar caminos anteriores, claramente<br />
manifesta<strong>do</strong> en el nombre prerromano de l<strong>as</strong><br />
mansiones Onoba, Ilipla, Tusci como hemos visto,<br />
el nombre latino de los tres lugares menciona<strong>do</strong>s<br />
en el tramo occidental -Rubrae-Praesidio-ostium<br />
- debieron estar relaciona<strong>do</strong>s con la<br />
principal función de ese tramo, el cual fue construi<strong>do</strong><br />
por los ingenieros romanos para embarcar en el<br />
Guadiana el metal obteni<strong>do</strong> en l<strong>as</strong> explotaciones<br />
roman<strong>as</strong> de l<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de Tharsis, que debió salir<br />
exclusivamente a través de la ría de Huelva antes<br />
de los trabajos de explotación y adecuación de la<br />
necesaria infraestructura romana que se iniciaron<br />
en época de Augusto.<br />
A partir de Praesidium, no está plenamente<br />
comproba<strong>da</strong> la continui<strong>da</strong>d del camino hacia el<br />
norte después de cruzar el Chanza pero siguien<strong>do</strong><br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 29
BIBLIOGRAFIA<br />
la margen izquier<strong>da</strong> del río Guadiana, lo cual no<br />
<br />
segun<strong>da</strong> función del tramo en relación a conectar la<br />
desembocadura del río con Mirtilis<br />
<br />
de ser navegable y que hizo de ese <strong>as</strong>entamiento<br />
<br />
terrestres.<br />
Tal como se ha manifesta<strong>do</strong> cumpli<strong>da</strong>mente<br />
en est<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> de Sâo Brás de Alportel, el<br />
hecho de la navegabili<strong>da</strong>d del río h<strong>as</strong>ta la actual<br />
Mértola hacía innecesaria desde un punto de<br />
vista económico la existencia de ví<strong>as</strong> terrestres<br />
paralel<strong>as</strong> a sus orill<strong>as</strong> pero, por ello mismo, desde<br />
un punto de vista estratégico ajeno a los poderes<br />
locales, ante cualquier eventuali<strong>da</strong>d de tipo bélico,<br />
cualquier movimiento rápi<strong>do</strong> hubiese si<strong>do</strong> imposible<br />
sin contar con el <strong>do</strong>minio militar de la corriente<br />
<br />
ví<strong>as</strong> perpendiculares al río para conectarlo con<br />
l<strong>as</strong> diferentes zon<strong>as</strong> miner<strong>as</strong>, el hecho de la<br />
existencia de un tramo h<strong>as</strong>ta Praesidium desde<br />
la desembocadura por su orilla oriental, su<br />
continui<strong>da</strong>d hacia el norte al menos h<strong>as</strong>ta l<strong>as</strong><br />
cercaní<strong>as</strong> del Chanza, podría sustentar la hipótesis<br />
de la construcción de un tramo que conectara con<br />
la vía existente en Mértola, além rio, que aquí nos<br />
ha mostra<strong>do</strong> nuestro colega Virgílio López.<br />
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30 AS VIAS DO ALGARVE
.IV A VIAGEM DE IBN AMMÂR DE SÃO BRÁS A SILVES<br />
ABDALLAH KHAWLI | MARIA ALICE FERNANDES | LUÍS FRAGA DA SILVA<br />
Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> | Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> | Campo Arqueológico de Tavira<br />
Oresumo<br />
O poeta, cortesão e político Ibn Ammâr iniciou a<br />
sua vi<strong>da</strong> pública muito jovem, por uma viagem entre<br />
a sua terra natal, Xanbr<strong>as</strong>, e a capital regional, Xilb.<br />
<br />
chega<strong>da</strong> à ci<strong>da</strong>de, história digna d<strong>as</strong> Mil e Uma<br />
Noites e de acor<strong>do</strong> com a dimensão trágica e maior-<br />
-que-a-vi<strong>da</strong> deste extraordinário personagem, por<br />
muitos considera<strong>do</strong> o maior poeta <strong>do</strong> al-An<strong>da</strong>lus.<br />
Aproveitan<strong>do</strong> a realização deste evento relativo<br />
ao estu<strong>do</strong> d<strong>as</strong> antig<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong>, organiza<strong>do</strong> na<br />
terra natal de Ibn Ammâr, resolvemos evocar essa<br />
sua viagem reunin<strong>do</strong> três abor<strong>da</strong>gens de estu<strong>do</strong><br />
distint<strong>as</strong> sobre o cenário em que ela terá ocorri<strong>do</strong>:<br />
<br />
e a toponímia.<br />
É uma combinação pouco frequente m<strong>as</strong> cuja<br />
oportuni<strong>da</strong>de não quisemos deixar p<strong>as</strong>sar, como<br />
homenagem a Ibn Ammâr e como perspectiva de<br />
futuros trabalhos conjuntos.<br />
NOTA:<br />
Da<strong>da</strong> a extensão <strong>da</strong> comunicação a Câmara Municipal de São Brás<br />
de Alportel e os Autores optaram pela sua publicação oportuna, sob<br />
a forma de separata.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 31
.V CAMINHOS DA TERRA E DO MAR NO ALGARVE MEDIEVAL<br />
LUÍS FILIPE OLIVEIRA<br />
Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
resumo<br />
A<br />
Através <strong>do</strong> recurso às informações disponíveis,<br />
sejam el<strong>as</strong> de natureza histórica, arqueológica, ou<br />
toponímica, procurou-se traçar um panorama <strong>do</strong>s<br />
principais eixos de comunicação que serviam a<br />
região durante a época medieval. Ain<strong>da</strong> que os <strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />
conheci<strong>do</strong>s e aproveitáveis não sejam muitos, nem<br />
<br />
de carácter inter-regional, em direcção às terr<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
norte, e conhecer, também, aquel<strong>as</strong> que serviam os<br />
núcleos urbanos <strong>do</strong> litoral.<br />
<br />
de mau piso e de trânsito difícil durante o Inverno,<br />
levou a que se valoriz<strong>as</strong>sem, num segun<strong>do</strong> momento,<br />
<strong>as</strong> deslocações feit<strong>as</strong> por mar, por rio, ou através<br />
<strong>do</strong>s canais <strong>da</strong> ria. Diversos testemunhos sugerem,<br />
de facto, a importância d<strong>as</strong> ligações marítim<strong>as</strong>,<br />
<strong>as</strong> quais contavam, aliás, com a protecção de um<br />
santo <strong>da</strong><strong>do</strong> às lides <strong>do</strong> mar e há muito <strong>as</strong>socia<strong>do</strong><br />
a um <strong>do</strong>s promontórios <strong>da</strong> região.<br />
A reconstituição <strong>da</strong> rede de estrad<strong>as</strong> e de caminhos<br />
que serviam a região durante a I<strong>da</strong>de Média não<br />
é uma tarefa fácil. Situa<strong>do</strong> numa d<strong>as</strong> estrem<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
1 , o <strong>Algarve</strong><br />
não era uma zona de p<strong>as</strong>sagem, sobretu<strong>do</strong> desde<br />
que foi anexa<strong>do</strong> pelos reis de Portugal e perdeu <strong>as</strong><br />
antig<strong>as</strong> ligações com a An<strong>da</strong>luzia e com o norte<br />
de África. Não era, também, um destino muito<br />
<br />
<br />
poucos foram os monarc<strong>as</strong> que se demoraram pela<br />
região 2 . Por isso, os itinerários régios não rendem<br />
a cópia de detalhes que oferecem para os espaços<br />
percorri<strong>do</strong>s pela Corte com maior <strong>as</strong>sidui<strong>da</strong>de, e<br />
só a espaços servem de guia para conhecer os<br />
eixos viários <strong>da</strong> região 3 . Por outro la<strong>do</strong>, essa lacuna<br />
<br />
inventário d<strong>as</strong> menções dispers<strong>as</strong> pel<strong>as</strong> fontes, pois<br />
isso exige, em regra, uma grande m<strong>as</strong>sa <strong>do</strong>cumental,<br />
que infelizmente não existe, devi<strong>do</strong> à ausência de<br />
grandes fun<strong>do</strong>s monásticos e episcopais. Antes<br />
d<strong>as</strong> notíci<strong>as</strong> <strong>do</strong>cumentais <strong>do</strong> século XVI, mais ric<strong>as</strong><br />
e mais abun<strong>da</strong>ntes 4 , os itinerários usa<strong>do</strong>s pelos<br />
cavaleiros <strong>da</strong> reconquista são, talvez, aqueles que<br />
proporcionam <strong>da</strong><strong>do</strong>s mais completos sobre os<br />
caminhos existentes no território algarvio.<br />
Para conhecer o traça<strong>do</strong> d<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> medievais há<br />
que convocar, por isso, outros contributos, desde<br />
1<br />
Para a análise <strong>da</strong> marginali<strong>da</strong>de que caracterizou o <strong>Algarve</strong> durante a I<strong>da</strong>de Média, veja-se A. H. de Oliveira Marques, “Para a História <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> Medieval”,<br />
Act<strong>as</strong> d<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> de História Medieval <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> e <strong>da</strong> An<strong>da</strong>luzia, Loulé, 1987, pp. 55-60; José Mattoso, “O <strong>Algarve</strong> na História Regional Portuguesa<br />
<strong>da</strong> I<strong>da</strong>de Média”, in O <strong>Algarve</strong> na perspectiva <strong>da</strong> Antropologia Ecológica, Lisboa, 1989, pp. 13-21; Luís Filipe Oliveira e José Mattoso, O <strong>Algarve</strong>, in José<br />
Mattoso, Suzanne Daveau e Duarte Belo, Portugal – O Sabor <strong>da</strong> Terra, Lisboa, 1997, sobretu<strong>do</strong> <strong>as</strong> pp. 5-13.<br />
2<br />
Cf. A. H. de Oliveira Marques, “Para a História…”, p. 56; Rita Costa Gomes, A Corte <strong>do</strong>s Reis de Portugal no Final <strong>da</strong> I<strong>da</strong>de Média, Lisboa, 1995, pp. 247-248.<br />
3<br />
Na reconstituição <strong>da</strong> rede viária medieval feita a partir <strong>do</strong>s itinerários régios (cf. Júlia Galego, João Carlos Garcia e Mª Fernan<strong>da</strong> Alegria, Os Itinerários<br />
de D. Dinis, D. Pedro e D. Fernan<strong>do</strong>. Interpretação Gráfica, Lisboa, 1988, p. 50 ), é bem significativa a ausência de caminhos algarvios. Num trabalho mais<br />
recente sobre o povoamento <strong>do</strong> Sul (cf. Stéphane Boissellier, Le peuplemente Médiéval <strong>da</strong>ns le Sud du Portugal, Paris, 2003, pp. 243-254 e map<strong>as</strong> 23 e<br />
24), pouco mais se adiantou.<br />
4<br />
Além d<strong>as</strong> descrições geográfic<strong>as</strong> de Fr. João de S. José e de Henrique Sarrão (cf. Du<strong>as</strong> Descrições <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> <strong>do</strong> Século XVI, apresentação, leitura e not<strong>as</strong><br />
de Manuel Vieg<strong>as</strong> Guerreiro e de Joaquim Romero de Magalhães, Lisboa, 1983), tenham-se em conta os <strong>da</strong><strong>do</strong>s proporciona<strong>do</strong>s pelos livros de Visitação. Entre<br />
outros, veja-se Visitação <strong>da</strong> Ordem de Santiago ao <strong>Algarve</strong> 1517-1518, transcrição de Fernan<strong>do</strong> Calapêz e de António Vieg<strong>as</strong>, Loulé, 1996.<br />
32 AS VIAS DO ALGARVE
<strong>as</strong> fontes arqueológic<strong>as</strong> aos <strong>da</strong><strong>do</strong>s <strong>da</strong> toponímia<br />
e ao inventário <strong>do</strong>s pontos de p<strong>as</strong>sagem —<br />
pontes, portos, vaus, barc<strong>as</strong>, portel<strong>as</strong>, estalagens,<br />
hospitais e albergari<strong>as</strong> 5 . Uma vez arrola<strong>do</strong>s os<br />
<br />
nem fecha<strong>do</strong>. Num segun<strong>do</strong> momento, importará<br />
<strong>da</strong>tar, com o máximo cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, os testemunhos<br />
recensea<strong>do</strong>s, para evitar que se atribua a uma<br />
época aquilo que pertence a outra, como é habitual<br />
acontecer com vári<strong>as</strong> pontes e calçad<strong>as</strong> 6 . De mo<strong>do</strong><br />
idêntico, convirá hierarquizar <strong>as</strong> vi<strong>as</strong> recensead<strong>as</strong>,<br />
pois nem tod<strong>as</strong> tinham a mesma importância e<br />
nem tod<strong>as</strong> eram objecto <strong>do</strong>s mesmos cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />
de conservação. A atenção à antigui<strong>da</strong>de e à<br />
<br />
merca<strong>do</strong>s, pode jogar aqui um papel decisivo, pois<br />
<br />
de certos eixos, ou o tráfego de homens e de<br />
merca<strong>do</strong>ri<strong>as</strong> que circulava por alguns outros. O<br />
mesmo se diga, de resto, <strong>do</strong>s c<strong>as</strong>telos e d<strong>as</strong> torres<br />
medievais, pois a sua localização não era alheia<br />
à p<strong>as</strong>sagem de estrad<strong>as</strong>, ou à existência de bo<strong>as</strong><br />
entrad<strong>as</strong> marítim<strong>as</strong> 7 .<br />
<br />
<strong>as</strong> pouc<strong>as</strong> linh<strong>as</strong> que se seguem não procuram<br />
colmatar aquela lacuna, pois isso deman<strong>da</strong>ria<br />
uma investigação orienta<strong>da</strong>, que está por fazer.<br />
Destinam-se apen<strong>as</strong> a esboçar um panorama breve<br />
<strong>do</strong>s principais eixos de comunicação, aproveitan<strong>do</strong><br />
<br />
e pel<strong>as</strong> fontes publicad<strong>as</strong>. No fun<strong>do</strong>, devem ser<br />
<br />
e, sobretu<strong>do</strong>, como um convite à realização de<br />
trabalhos futuros.<br />
De um mo<strong>do</strong> geral, são <strong>as</strong> ligações inter-regionais<br />
aquel<strong>as</strong> que estão melhor <strong>do</strong>cumentad<strong>as</strong>. Por via<br />
<strong>do</strong>s itinerários <strong>da</strong> Reconquista, conhecem-se, pelo<br />
menos, du<strong>as</strong> ligações ao Alentejo: a que vinha<br />
de Aljustrel em direcção ao c<strong>as</strong>telo de Paderne,<br />
p<strong>as</strong>san<strong>do</strong> a serra por Ourique, e a que saía de<br />
Beja para Faro, com trânsito por Almodôvar, Salir e<br />
Loulé 8 . A última era, por certo, a mais importante,<br />
pois é provável que correspon<strong>da</strong> a uma antiga via<br />
<br />
medieval 9 . Foi essa, de resto, a p<strong>as</strong>sagem escolhi<strong>da</strong><br />
por Afonso III para levar a hoste régia até Faro 10 ,<br />
m<strong>as</strong> também, talvez, pelos reis Dinis e Afonso IV,<br />
n<strong>as</strong> únic<strong>as</strong> oc<strong>as</strong>iões em que visitaram aquela vila 11 .<br />
Pelo menos, a esta<strong>da</strong> posterior <strong>do</strong> último destes<br />
<br />
Mais para Ocidente, uma outra via ligava Silves a<br />
Beja, segun<strong>do</strong> o itinerário segui<strong>do</strong> pelo séquito <strong>do</strong> rei<br />
Dinis na outra vez que esteve em terr<strong>as</strong> algarvi<strong>as</strong> 12 .<br />
Graç<strong>as</strong> à deslocação de Pedro I ao <strong>Algarve</strong>, em<br />
1359 13 , sabe-se que essa estra<strong>da</strong> continuava até<br />
Lagos, e a <strong>do</strong>cumentação posterior não só atesta<br />
5<br />
As observações meto<strong>do</strong>lógic<strong>as</strong> de C. A. Ferreira de Almei<strong>da</strong> (Vi<strong>as</strong> Medievais. Entre Douro e Minho, diss. de licenciatura em História apresenta<strong>da</strong> à F. L.<br />
<strong>do</strong> Porto, 1968, pp. 45-96) são ain<strong>da</strong> muito úteis, apesar de terem qu<strong>as</strong>e quarenta anos.<br />
6<br />
Para a discussão de alguns c<strong>as</strong>os, veja-se João Pedro Bernardes e Luís Filipe Oliveira, A “Calçadinha” de S. Brás de Alportel e a Antiga Rede Viária <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong> Central, S. Brás de Alportel, 2002, pp. 19-25, 28-29; Sandra Rodrigues, As vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, Faro, 2004, pp. 38-51, 68-72, 75-77, 86 e<br />
ss.; João Pedro Bernardes e Maria José Gonçalves, “A ponte velha”, Monumentos, nº 23, 2005, pp. 62-67.<br />
7<br />
Para a relação entre vi<strong>as</strong>, entrad<strong>as</strong> marítim<strong>as</strong> e c<strong>as</strong>telos, veja-se C. A. Ferreira de Almei<strong>da</strong>, C<strong>as</strong>telologia Medieval de Entre Douro e Minho, diss.<br />
complementar de <strong>do</strong>utoramento apresenta<strong>da</strong> à F. Letr<strong>as</strong> <strong>do</strong> Porto, 1978; A. Bazzana, P. Cressier, P. Guichard, Les Châteaux Ruraux D’Al-An<strong>da</strong>lus. Histoire<br />
et Archéologie des Husun du Sud Est de L’Espagne, Madrid, 1988, sobretu<strong>do</strong> <strong>as</strong> pp. 110-111, 122-124. A localização d<strong>as</strong> du<strong>as</strong> torres medievais<br />
<strong>do</strong>cumentad<strong>as</strong> no <strong>Algarve</strong>, a de Marim e a de Santo António <strong>do</strong> Alto, uma de finais <strong>do</strong> XIII, a outra <strong>do</strong> século XIV (cf. C. Nogueira e Silva, “As torres de vigia<br />
no antigo concelho de Faro”, Anais <strong>do</strong> Município de Faro, vols. XVII-XVIII, 1997-1998, pp. 126-127), não era estranha às entrad<strong>as</strong> e aos canais <strong>da</strong> ria.<br />
8<br />
Cf. Fr. Joaquim de S. Agostinho, “Sobre huma Chronica inedita <strong>da</strong> Conquista <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>”, Memori<strong>as</strong> de Litteratura Portugueza, tomo I, 1792, pp. 85, 94-95.<br />
Lê-se o mesmo relato na Crónica <strong>do</strong> Reino. Veja-se, Crónica de Portugal de 1419, edição crítica com introdução e not<strong>as</strong> de Adelino de Almei<strong>da</strong> Cala<strong>do</strong>,<br />
Aveiro, 1998, pp. 147, 156-157.<br />
9<br />
Cf. João Pedro Bernardes e Luís Filipe Oliveira, A Calçadinha…, pp. 51-55. Numa inquirição feita em Almodôvar na segun<strong>da</strong> metade <strong>do</strong> século XIV (cf.<br />
Inquirição sobre bens régios nos concelhos de C<strong>as</strong>tro Verde, Almodôvar e Padrões (1375-1376), introdução, edição e not<strong>as</strong> de Valentino Vieg<strong>as</strong>, Lisboa,<br />
1998, pp. 129, 138), há du<strong>as</strong> alusões ao caminho <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>. Noutro diploma de Fevereiro de 1421 (IAN/TT, Chancelaria de D. João I, Lv. 4, fl. 29 e v;<br />
Odiana, Lv. 1, fl. 58 e v.), a vila de Almodôvar foi caracteriza<strong>da</strong> como um local de muito trânsito, “per aazo <strong>do</strong>s mujtos camjnhantes que per elle hiam e<br />
vinham”.<br />
10<br />
f. Fr. Joaquim de S. Agostinho, “Sobre huma Chronica…”, p. 94; Crónica de Portugal de 1419, p. 156. Para a sua presença em Faro, veja-se João Alves<br />
Di<strong>as</strong>, “Itinerários de D. Afonso III (1245-1279)”, Arquivos <strong>do</strong> Centro Cultural Português, vol. XV, 1980, pp. 453-519.<br />
11<br />
Cf. Virgínia Rau et al, Itinerários Régios Medievais. I, Itinerário de D. Dinis, Lisboa, 1962, mapa anexo; Júlia Galego, João Carlos Garcia e M.ª Fernan<strong>da</strong><br />
Alegria, Os Itinerários. …, p. 13 e figs 3 e 4.<br />
12<br />
Cf. Virgínia Rau et al., Itinerários Régios…, p. 5 e mapa anexo.<br />
13<br />
Cf. Maria Teresa Campos Rodrigues, “O Itinerário de D. Pedro I (1357-1367)”, Ocidente, nova série, vol. LXXXII, 1972, p. 159; J. T. Montalvão Macha<strong>do</strong>,<br />
Itinerários de El-Rei D. Pedro I (1357-1367), Lisboa, 1978, pp. 23, 67-69.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 33
a existência desse troço, como comprova a ligação<br />
entre Beja e Lagos 14 . No percurso a partir de Silves,<br />
talvez na zona <strong>do</strong> actual Porto de Lagos, saía dela<br />
um caminho para Monchique, seguin<strong>do</strong> depois, por<br />
certo, em direcção a Garvão e Alcácer <strong>do</strong> Sal 15 .<br />
Como já foi sugeri<strong>do</strong>, é possível que se trate de uma<br />
antiga via islâmica 16 .<br />
Para o <strong>Algarve</strong> Oriental, <strong>as</strong> notíci<strong>as</strong> conhecid<strong>as</strong> são<br />
mais esc<strong>as</strong>s<strong>as</strong> e tardi<strong>as</strong>. Ain<strong>da</strong> <strong>as</strong>sim, há notícia <strong>do</strong><br />
século XV a uma ligação entre Tavira e Beja 17 . Ignora-<br />
-se, porém, qual fosse o traça<strong>do</strong> desse caminho.<br />
Alicerça<strong>do</strong> na referência a Martim Longo que aí se<br />
encontra, Baquero Moreno fê-lo subir ao longo <strong>do</strong><br />
<br />
<br />
percurso pela margem <strong>do</strong> rio, pois a navegação<br />
<br />
mais cómo<strong>da</strong> e barata 18 . Um outro <strong>do</strong>cumento<br />
<br />
menção à p<strong>as</strong>sagem de uma estra<strong>da</strong> de Portugal<br />
pelo lugar de Corte Pequena 19 , parece sugerir um<br />
itinerário alternativo pela serra de Tavira, talvez<br />
com rumo a Martim Longo. Seja como for, tu<strong>do</strong><br />
indica que foi esta a via escolhi<strong>da</strong> por João I para<br />
fazer o percurso entre Tavira e a ci<strong>da</strong>de de Évora,<br />
em Setembro de 1415, depois de regressar ao reino<br />
após a conquista de Ceuta 20 . Talvez tenha si<strong>do</strong><br />
usa<strong>da</strong>, também, por Pedro I para o trajecto entre<br />
Tavira e Beja, no termo <strong>da</strong> viagem que fez pelo<br />
21 .<br />
À excepção <strong>da</strong> estra<strong>da</strong> entre Faro e Beja, que mereceu<br />
a construção de du<strong>as</strong> pontes, uma em Ator, a outra<br />
perto de Almodôvar, amb<strong>as</strong> por certo no século<br />
XV 22 , n<strong>as</strong> restantes vi<strong>as</strong> <strong>as</strong> ribeir<strong>as</strong> p<strong>as</strong>savam-se a<br />
<br />
transitáveis, portanto, durante os meses de inverno.<br />
<br />
impraticável devi<strong>do</strong> à lama, pois os troços calceta<strong>do</strong>s<br />
eram raros, e, quan<strong>do</strong> existiam, não estavam longe<br />
<strong>do</strong>s núcleos habita<strong>do</strong>s. Qu<strong>as</strong>e tod<strong>as</strong> eram estreit<strong>as</strong><br />
e sinuos<strong>as</strong>, e, por vezes, mal se distinguiam <strong>do</strong>s<br />
<br />
Loulé para Portugal, que foi lavra<strong>da</strong> por um vizinho de<br />
Ator, segun<strong>do</strong> notícia de 1538 23 .<br />
Não devia ser, pois, muito intenso o tráfego<br />
que suportavam. Quem metia pés ao caminho,<br />
fazia-o certo <strong>da</strong> incomodi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> jorna<strong>da</strong> antes<br />
de encontrar uma estalagem para pernoitar.<br />
Quem arriscava a viagem, fazia-o geralmente<br />
acompanha<strong>do</strong>, que era a melhor forma de evitar<br />
qualquer surpresa e de pôr a vi<strong>da</strong> e os haveres<br />
a recato, em c<strong>as</strong>o de necessi<strong>da</strong>de. Aqueles que<br />
faziam <strong>da</strong> estra<strong>da</strong> um mo<strong>do</strong> de vi<strong>da</strong>, como os<br />
almocreves e os merca<strong>do</strong>res, não viajavam sem <strong>as</strong><br />
arm<strong>as</strong> respectiv<strong>as</strong>. Alguns deles deviam manejá-l<strong>as</strong><br />
tão bem como <strong>as</strong> moed<strong>as</strong>, como sugere o exemplo<br />
<strong>da</strong>quele merca<strong>do</strong>r cristão de mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século<br />
XIII, que se dispôs a aju<strong>da</strong>r os freires de Santiago<br />
cerca<strong>do</strong>s pelos muçulmanos junto a Tavira 24 . Tal<br />
como eles, acabaria por falecer em combate, sen<strong>do</strong><br />
14<br />
Cf. Luís Filipe Oliveira, “Uma fortificação islâmica <strong>do</strong> termo de Silves: O C<strong>as</strong>telo Belinho”, Arqueologia Medieval, n.º 6, 1999, pp. 41-42; H. Baquero<br />
Moreno, “Alguns <strong>do</strong>cumentos para o estu<strong>do</strong> d<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> medievais portugues<strong>as</strong>”, Sep. <strong>da</strong> Revista d<strong>as</strong> Ciênci<strong>as</strong> <strong>do</strong> Homem, Lourenço Marques, vol. V, sér.<br />
A, 1972, <strong>do</strong>c. n.º 6 <strong>do</strong> apêndice. Este último Autor, ao desenhar em mapa o traça<strong>do</strong> desta via, não a fez p<strong>as</strong>sar por Silves, m<strong>as</strong> por Bensafrim, sem que<br />
tenha justifica<strong>do</strong> tal opção.<br />
15<br />
Cf. Luís Filipe Oliveira, “Uma fortificação islâmica…”, p. 41. Transpunha a ribeira de Odelouca por meio de uma ponte, já <strong>do</strong>cumenta<strong>da</strong> em finais <strong>do</strong><br />
século XIV.<br />
16<br />
Cf. J. Garcia Domingues, “O Garb Extremo <strong>do</strong> An<strong>da</strong>luz e «Bortuqal» nos Historia<strong>do</strong>res e Geógrafos Árabes”, Boletim <strong>da</strong> Socie<strong>da</strong>de de Geografia de<br />
Lisboa, Julho-Dezembro de 1960, p. 353 e mapa à p. 355.<br />
17<br />
Cf. H. Baquero Moreno, “Alguns <strong>do</strong>cumentos….”, <strong>do</strong>c. n.º 6 <strong>do</strong> apêndice.<br />
18<br />
A navegação entre Mértola e a Foz <strong>do</strong> Guadiana era um fenómeno antigo, estan<strong>do</strong> atesta<strong>da</strong> por um diploma de Janeiro de 1272 (José Marques. “Os<br />
c<strong>as</strong>telos algarvios <strong>da</strong> Ordem de Santiago no Reina<strong>do</strong> de D. Afonso III”, Act<strong>as</strong> d<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> de História Medieval <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> e An<strong>da</strong>luzia, Loulé, 1987, <strong>do</strong>c.<br />
nº 6 <strong>do</strong> apêndice <strong>do</strong>cumental), no qual se menciona o pão e o vinho “que per mare portantur ad Mertolam per focem d’Udiana a moratoribus de Mertola”.<br />
Em inícios <strong>do</strong> século XVI, foi seguramente de barco que Duarte de Arm<strong>as</strong> fez a viagem de C<strong>as</strong>tro Marim a Mértola, pois limitou-se a anotar os afluentes<br />
<strong>do</strong> Guadiana e a existência de caminhos fragosos. Veja-se Duarte de Arm<strong>as</strong>, Livro d<strong>as</strong> Fortalez<strong>as</strong>, introdução de Manuel <strong>da</strong> Silva C<strong>as</strong>telo Branco, 2ª ed.,<br />
Lisboa, 1997, fl. 134.<br />
19<br />
Cf. Luís Filipe Oliveira, “Os C<strong>as</strong>telos <strong>do</strong> Leitejo: Um alcácer islâmico na serra de Tavira”, Act<strong>as</strong> <strong>do</strong> II Encontro de Arqueologia <strong>do</strong> Su<strong>do</strong>este Peninsular<br />
(Faro, 7 e 8 Novembro de 1996), Faro, 2004, p. 259.<br />
20<br />
Cf. H. Baquero Moreno, Os Itinerários de El-Rei Dom João I (1384-1433), Lisboa, 1988, pp. 143, 146, 340.<br />
21<br />
Cf. Maria Teresa Campos Rodrigues, “O Itinerário …”, p. 159; J. T. Montalvão Macha<strong>do</strong>, Itinerários …, pp. 23, 68.<br />
22<br />
Cf. João Pedro Bernardes e Luís Filipe Oliveira, A Calçadinha…, pp. 53-54. Para a ponte de Almodôvar, veja-se http: www.ippar.pt/patrimonio/itinerarios/<br />
pontes_alentejo<br />
23<br />
Cf. Joaquim Romero de Magalhães, Para o Estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> Económico durante o século XVI, Lisboa, 1979, p. 187.<br />
24<br />
Cf. Fr. Joaquim de S. Agostinho, “Sobre huma Chronica…”, p. 90; Crónica de Portugal de 1419, p. 152.<br />
34 AS VIAS DO ALGARVE
incluí<strong>do</strong> entre os sete mártires sepulta<strong>do</strong>s na igreja<br />
de Santa Maria <strong>da</strong>quela vila 25 .<br />
Os p<strong>as</strong>tores e os seus animais deviam ser, de resto,<br />
os principais utiliza<strong>do</strong>res desses caminhos. Em busca<br />
d<strong>as</strong> p<strong>as</strong>tagens que faltavam nos campos <strong>do</strong> litoral,<br />
ou mesmo em trânsito para a feira de Ourique 26 ,<br />
ou para <strong>as</strong> mest<strong>as</strong> de C<strong>as</strong>tro Verde. A reunião <strong>do</strong><br />
ga<strong>do</strong> <strong>do</strong> vento, quer dizer, sem <strong>do</strong>no, que to<strong>do</strong>s<br />
os anos se fazia naquela vila, de acor<strong>do</strong> com uma<br />
inquirição de 1376 27 , era certamente oc<strong>as</strong>ião de bons<br />
negócios. O volume de transacções devia ser muito<br />
<br />
cambista régio em Almodôvar 28 —, sen<strong>do</strong> provável<br />
que atraísse, portanto, muitos <strong>do</strong>s p<strong>as</strong>tores e <strong>do</strong>s<br />
cria<strong>do</strong>res algarvios. Segun<strong>do</strong> a cita<strong>da</strong> inquirição de<br />
1376 29 , não eram raros os mora<strong>do</strong>res de Faro e de<br />
Loulé que tinham proprie<strong>da</strong>des em Almodôvar.<br />
Infelizmente, conhecem-se pior <strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> de<br />
âmbito regional, que uniam <strong>as</strong> divers<strong>as</strong> vil<strong>as</strong> e portos<br />
<strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>. Diversos indícios sugerem, contu<strong>do</strong>, a<br />
importância <strong>da</strong> via longitudinal de Lagos a C<strong>as</strong>tro<br />
Marim, que deve corresponder a uma antiga estra<strong>da</strong><br />
romana, como foi recentemente <strong>as</strong>sinala<strong>do</strong> 30 . Na<br />
Primavera de 1359, troços dessa estra<strong>da</strong> foram<br />
certamente usa<strong>do</strong>s por Pedro I na sua deslocação<br />
entre Lagos e Tavira 31 , embora nesse trajecto o<br />
monarca tenha visita<strong>do</strong> Silves e Loulé, antes de<br />
rumar a Faro. O percurso dessa via estava, aliás,<br />
devi<strong>da</strong>mente <strong>as</strong>sinala<strong>do</strong> pela distribuição d<strong>as</strong><br />
estalagens privilegiad<strong>as</strong> existentes na região, embora<br />
algum<strong>as</strong> del<strong>as</strong> se destin<strong>as</strong>sem a acolher, também,<br />
quem viajava por mar. D<strong>as</strong> oito que se conhecem,<br />
havia du<strong>as</strong> em Lagos e três em Tavira, enquanto<br />
Faro, Loulé e Albufeira tinham uma ca<strong>da</strong> 32 .<br />
Entre Silves e Loulé, é possível que Pedro I tivesse<br />
circula<strong>do</strong> pela via interior que unia aquela ci<strong>da</strong>de a<br />
Tavira, com p<strong>as</strong>sagem por Messines e pelo c<strong>as</strong>telo<br />
de Salir. Na<strong>da</strong> o testemunha, embora esse fosse um<br />
itinerário antigo, em uso durante a época medieval 33 .<br />
Mais af<strong>as</strong>ta<strong>do</strong> <strong>do</strong> litoral e <strong>do</strong>s principais núcleos<br />
urbanos, <strong>da</strong>va lugar a deslocações mais discret<strong>as</strong>, ou<br />
menos vigiad<strong>as</strong>. Isso explica, aliás, que os cavaleiros<br />
de Santiago o tenham usa<strong>do</strong> como um eixo de<br />
penetração n<strong>as</strong> terr<strong>as</strong> <strong>do</strong> interior, mesmo para lá de<br />
Loulé, durante <strong>as</strong> expedições lançad<strong>as</strong> a partir de<br />
Cacela 34 . Ao longo dessa via, no sítio <strong>do</strong> Desbarato e<br />
junto à ribeira <strong>do</strong> Almargem, tiveram lugar alguns <strong>do</strong>s<br />
encontros militares mais importantes entre os freires<br />
de Santiago e os mouros de Faro e de Tavira. Um<br />
diploma posterior atesta, de resto, a manutenção<br />
de um caminho público entre a ribeira <strong>da</strong> Asseca e<br />
35 .<br />
Destes vários eixos, partiam outros caminhos de<br />
interesse local, — em direcção às hort<strong>as</strong>, às vinh<strong>as</strong> e<br />
<br />
mais densos junto à costa e rarean<strong>do</strong> para o interior.<br />
São eles os que aparecem com menor frequência na<br />
<strong>do</strong>cumentação conheci<strong>da</strong>, apesar de um<strong>as</strong> quant<strong>as</strong><br />
menções dispers<strong>as</strong> pel<strong>as</strong> fontes. Devi<strong>do</strong> ao aumento<br />
<br />
— por mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XVI, Faro tem sete nov<strong>as</strong><br />
freguesi<strong>as</strong> rurais e Loulé cinco 36 —, é provável que a<br />
25<br />
Ain<strong>da</strong> que ambos os textos, cita<strong>do</strong>s na nota anterior, mencionem a sepultura na igreja, a existência de um culto organiza<strong>do</strong> <strong>do</strong>cumenta-se apen<strong>as</strong> na<br />
crónica de 1419 (ibidem, p. 257), ao referir-se a protecção que estes conferiram à vila por oc<strong>as</strong>ião <strong>do</strong> cerco de Afonso XI de C<strong>as</strong>tela. O mesmo episódio<br />
foi cita<strong>do</strong> por Fr. João de S. José. Veja-se Du<strong>as</strong> Descrições <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> …, pp. 73-74.<br />
26<br />
Cf. Virgínia Rau, Feir<strong>as</strong> Medievais Portugues<strong>as</strong>. Subsídios para o seu estu<strong>do</strong>, Lisboa, 1982, pp. 113-114. A carta de feira <strong>da</strong>ta de 14 de Junho de<br />
1288. Sobre o papel <strong>da</strong> serra na criação de ga<strong>do</strong>, veja-se Joaquim Romero de Magalhães, “Ga<strong>do</strong> e paisagem: o <strong>Algarve</strong> nos séculos XV a XVIII, Livro de<br />
Homenagem a Orlan<strong>do</strong> Ribeiro, Lisboa, 1988, 2º vol., pp. 83-92<br />
27<br />
Cf. Inquirição sobre bens régios nos concelhos …, pp. 179, 185, 193-194<br />
28<br />
Cf. Filipe Themu<strong>do</strong> Barata, “Negócios e crédito: complexi<strong>da</strong>de e flexibili<strong>da</strong>de d<strong>as</strong> prátic<strong>as</strong> creditíci<strong>as</strong> (século XV)”, Análise Social, vol. XXXI, 1996, p.<br />
691 e nt. 24.<br />
29<br />
Cf. Inquirição sobre bens régios nos concelhos …, pp. 54, 138, 142, 149, 236.<br />
30<br />
Cf. Sandra Rodrigues, As vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> …, pp. 38-51.<br />
31<br />
Cf. Maria Teresa Campos Rodrigues, “O Itinerário …”, p. 159; J. T. Montalvão Macha<strong>do</strong>, Itinerários …, pp. 23, 67-68.<br />
32<br />
Cf. Iria Gonçalves, “Privilégios de Estalajadeiros Portugueses”, Imagens <strong>do</strong> Mun<strong>do</strong> Medieval, Lisboa, 1988, pp. 150-151.<br />
33<br />
Cf. João Pedro Bernardes e Luís Filipe Oliveira, A Calçadinha…, pp. 39-40, 53; Sandra Rodrigues, As vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> …, pp. 77-79.<br />
34<br />
Cf. Fr. Joaquim de S. Agostinho, “Sobre huma Chronica…”, pp. 86-88; Crónica de Portugal de 1419, pp. 148-150. Para a geografia dess<strong>as</strong> an<strong>da</strong>nç<strong>as</strong>,<br />
veja-se Joaquim Romero de Magalhães, “Uma Interpretação <strong>da</strong> Crónica <strong>da</strong> Conquista <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>”, Act<strong>as</strong> d<strong>as</strong> II Jornad<strong>as</strong> Luso- Espanhol<strong>as</strong> de História<br />
Medieval, Porto, 1987, vol. I, pp. 123-133.<br />
35<br />
Cf. João Pedro Bernardes e Luís Filipe Oliveira, A Calçadinha…, p. 50.<br />
36<br />
Cf. João Luís Inglês Fontes, “Entre Faro e Loulé: a terra <strong>da</strong> «Senhora Santa Bárbara» (séculos XIII-XVI)”, in João Pedro Bernardes e Luís Filipe Oliveira<br />
(coords.), A Terra de Santa Bárbara. A História, a Igreja e a Memória d<strong>as</strong> gentes de Nexe, Santa Bárbara, 2006 (no prelo), Quadro IV. Sobre a evolução<br />
demográfica <strong>da</strong> região nessa época, veja-se Joaquim Romero de Magalhães, Para o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>…, pp. 17-18, 34-38.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 35
densi<strong>da</strong>de de tais ligações secundári<strong>as</strong> conhecesse<br />
<br />
<strong>da</strong> época moderna mostram já, com efeito, uma<br />
profusão de estrad<strong>as</strong> e de caminhos irradian<strong>do</strong> a<br />
partir <strong>do</strong>s principais núcleos urbanos e rurais 37 .<br />
Na rede de comunicações algarvi<strong>as</strong> o mar tinha,<br />
no entanto, uma importância decisiva. Quer na<br />
facha<strong>da</strong> atlântica, quer na mediterrânea, a<br />
navegação costeira contava com diversos portos<br />
de estuário e com vári<strong>as</strong> ensead<strong>as</strong> naturais. Os<br />
canais <strong>da</strong> ria ofereciam, também, outros portos de<br />
abrigo, além de permitirem deslocações segur<strong>as</strong><br />
a embarcações de menor cala<strong>do</strong>, entre Cacela<br />
e o porto <strong>do</strong> Lu<strong>do</strong>. São poucos os testemunhos<br />
desta navegação costeira, m<strong>as</strong> uma disposição de<br />
João I, infelizmente sem <strong>da</strong>ta, que se conserva<br />
n<strong>as</strong> Ordenações Afonsin<strong>as</strong>, atesta a circulação<br />
de barc<strong>as</strong> entre os vários portos <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, a<br />
sol<strong>do</strong> <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>res que carregavam vinhos <strong>da</strong><br />
região 38 . As facili<strong>da</strong>des de comunicação por mar<br />
tinham, aliás, condiciona<strong>do</strong> algum<strong>as</strong> operações de<br />
reconquista, pois exigiram a presença de forç<strong>as</strong><br />
navais de bloqueio. Foi o que sucedeu na primeira<br />
conquista de Silves, tal como meio século depois<br />
na de Faro, m<strong>as</strong> também, por certo, quan<strong>do</strong> se<br />
tomaram os c<strong>as</strong>telos de Cacela e de Ayamonte 39 .<br />
Com a anexação <strong>do</strong> território pela Coroa portuguesa,<br />
em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XIII, o <strong>Algarve</strong> tornou-se uma<br />
região de fronteira, m<strong>as</strong> a activi<strong>da</strong>de marítima <strong>do</strong>s<br />
seus portos não desapareceu por completo. Entre<br />
os locais cita<strong>do</strong>s pela lei com que Afonso III queria<br />
<br />
encontravam-se qu<strong>as</strong>e to<strong>do</strong>s os portos <strong>da</strong> região,<br />
desde Aljezur a Ayamonte, p<strong>as</strong>san<strong>do</strong> por Lagos,<br />
Silves, Porches, Faro, Tavira e Cacela 40 . Sabe-se<br />
pouco <strong>do</strong> movimento desses portos, sobretu<strong>do</strong><br />
durante a segun<strong>da</strong> metade <strong>do</strong> século XIII, m<strong>as</strong> os<br />
privilégios <strong>do</strong>s homens <strong>do</strong> mar em alguns forais —<br />
Silves (1266) e C<strong>as</strong>tro Marim (1277) 41 , entre outros<br />
—, sugerem certo dinamismo. O “lucro Sarracenico”<br />
menciona<strong>do</strong> na <strong>do</strong>ação <strong>do</strong> c<strong>as</strong>telo de Albufeira à<br />
ordem de Avis, em Março de 1250, tinha aí, por<br />
certo, um grande peso, e, na oc<strong>as</strong>ião, o monarca<br />
não deixou de promover a iniciativa <strong>da</strong> milícia e<br />
<strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res <strong>da</strong> vila, <strong>do</strong>an<strong>do</strong>-lhes o quinto d<strong>as</strong><br />
pres<strong>as</strong> ganh<strong>as</strong> com os navios que arm<strong>as</strong>sem contra<br />
os mouros 42 . N<strong>as</strong> águ<strong>as</strong> <strong>do</strong> estreito, o corso e<br />
os ataques às povoações <strong>do</strong> litoral eram, como<br />
se sabe, muito frequentes, não deven<strong>do</strong> ser raros<br />
os barcos e <strong>as</strong> tripulações algarvi<strong>as</strong> envolvid<strong>as</strong><br />
ness<strong>as</strong> acções, em regra muito lucrativ<strong>as</strong>. Graç<strong>as</strong><br />
a um diploma de Agosto de 1332 43 , conhece-se a<br />
identi<strong>da</strong>de de um corsário régio em Tavira, m<strong>as</strong><br />
outr<strong>as</strong> notíci<strong>as</strong> posteriores, <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> metade<br />
<br />
importância <strong>do</strong> corso que se desenvolvia a partir<br />
<strong>do</strong>s portos de Faro e de Tavira 44 .<br />
N<strong>as</strong> margens <strong>do</strong> corso, praticava-se o comércio, e o<br />
corsário no mar era, por vezes, o merca<strong>do</strong>r em terra 45 .<br />
A <strong>do</strong>ação de Albufeira à ordem de Avis já mencionava<br />
37<br />
Cf. Du<strong>as</strong> Descrições <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> …, pp. 21 e ss. O mo<strong>do</strong> como Henrique Sarrão descreveu o território foi analisa<strong>do</strong> por João Carlos Garcia, “A percepção <strong>do</strong><br />
espaço numa corografia setecentista <strong>do</strong> reino <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>”, II Jornad<strong>as</strong> de História sobre An<strong>da</strong>lucia y el Algarbe (siglos XII-XVIII). Act<strong>as</strong>, Sevilha, 1990, pp. 97-116.<br />
38<br />
Ordenações Afonsin<strong>as</strong>, fac-simile <strong>da</strong> edição de 1792, Lisboa, 1984, Lv. II, tit. LVII, pp. 334-335.<br />
39<br />
Cf. António C<strong>as</strong>tro Henriques, Conquista <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> (1189-1249). O Segun<strong>do</strong> Reino, Lisboa, 2003, pp. 32, 57-58, 80-81.<br />
40<br />
Cf. Portugaliae Monumenta Historica. Leges et Consuetudines, Lisboa, 1856, vol. I, pp. 253-254. Para a inserção desta lei no contexto <strong>da</strong> disputa com<br />
C<strong>as</strong>tela sobre o reino <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, veja-se Mário Sousa Cunha, A Ordem Militar de Santiago (D<strong>as</strong> origens a 1327), diss. de mestra<strong>do</strong> apresenta<strong>da</strong> à Fac.<br />
de Letr<strong>as</strong> <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> Porto, 1991, pp. 86-88; Carlos Ayala Martínez, “L<strong>as</strong> órdenes militares y los processos de afirmación monárquica en C<strong>as</strong>tilla<br />
y Portugal (1250-1350), Revista <strong>da</strong> Facul<strong>da</strong>de de Letr<strong>as</strong> – História, 2ª série, vol. XV, 1998, pp. 1290-1291.<br />
41<br />
Cf. Luís Miguel Duarte, “A Marinha de Guerra Portuguesa”, in Manuel Themu<strong>do</strong> Barata e Nuno Severiano Teixeira (dirs.), Nova História Militar de<br />
Portugal, Lisboa, 2003, vol. I, pp. 296, 299. O foral de Silves foi objecto de uma tradução recente (cf. Forais de Silves, ed. de M.ª Filomena Andrade, estu<strong>do</strong><br />
introdutório de Manuela Santos Silva, Silves, 1993, pp. 23-25). Para o de C<strong>as</strong>tro Marim, veja-se Portugaliae Monumenta Historica. Leges …, vol II, pp. 734-<br />
736. Para os outros forais algarvios, veja-se ibidem, vol. I, pp. 706 e ss.<br />
42<br />
Cf. Monarquia Lusitana, fac-simile <strong>da</strong> edição de 1632, com introdução de A. <strong>da</strong> Silva Rego e not<strong>as</strong> de A. Di<strong>as</strong> Farinha, Lisboa, 1974, vol. IV, <strong>do</strong>c. n.º XXVI.<br />
O diploma existe no fun<strong>do</strong> <strong>da</strong> ordem de Avis (IAN/TT, M.C.O., Ordem de Avis / C. S. Bento, Cx. 2, Mç. 2, n.º 71), em tresla<strong>do</strong> de 5 de Novembro de 1271.<br />
43<br />
Cf. Descobrimentos Portugueses — <strong>do</strong>cumentos para a sua história, ed. de J. M. <strong>da</strong> Silva Marques, Lisboa, 1944 , vol. I, n.º 55. O diploma foi de novo publica<strong>do</strong><br />
pelos editores <strong>da</strong> chancelaria de Afonso IV (Chancelari<strong>as</strong> Portugues<strong>as</strong>. D. Afonso IV, ed. de A. H. de Oliveira Marques e Teresa F. Rodrigues, Lisboa, 1990, vol.<br />
I, n.º 305), onde se encontram outr<strong>as</strong> referênci<strong>as</strong> a corsários (ibidem, vol. II, n.º 99 e vol. III, n.º 340 e 415), embora sem ligação ao <strong>Algarve</strong>.<br />
44<br />
Cf. Luís Adão <strong>da</strong> Fonseca e José Augusto Pizarro, “Algum<strong>as</strong> considerações sobre o comércio externo algarvio na época medieval”, Act<strong>as</strong> d<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong><br />
de História Medieval <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> e <strong>da</strong> An<strong>da</strong>luzia, Loulé, 1987, pp. 74-75; Filipe Themu<strong>do</strong> Barata, Navegação, Comércio e Relações Polític<strong>as</strong>: Os Portugueses<br />
no Mediterrâneo Ocidental (1385-1466), Lisboa, 1998, pp. 227, 306, 317, 321 e <strong>do</strong>cs. n.º 1, 49 e 200 <strong>do</strong> apêndice IV.<br />
45<br />
Cf. Luís Miguel Duarte, “A Marinha de Guerra…, p. 300; Filipe Themu<strong>do</strong> Barata, Navegação, Comércio …, pp. 295-296. Nos contratos de frete, previa-se<br />
muit<strong>as</strong> vezes a hipótese de os navios se dedicarem ao corso durante a viagem, como notou o último destes Autores.<br />
36 AS VIAS DO ALGARVE
a presença nesse porto de navios com merca<strong>do</strong>ri<strong>as</strong><br />
vind<strong>as</strong> de França e <strong>do</strong>utros lugares, e a <strong>do</strong>cumentação<br />
<br />
com a An<strong>da</strong>luzia e com o norte <strong>da</strong> Europa, desde<br />
46 . Ao que tu<strong>do</strong> indica, <strong>as</strong> ligações<br />
mais intens<strong>as</strong> faziam-se com <strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des costeir<strong>as</strong> <strong>da</strong><br />
An<strong>da</strong>luzia, pois o comércio algarvio era em grande<br />
medi<strong>da</strong> coman<strong>da</strong><strong>do</strong> pela carência de cereais. Para aí<br />
seguia o vinho e a fruta <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, embora o peixe<br />
<strong>da</strong> região também cheg<strong>as</strong>se ao merca<strong>do</strong> de Sevilha<br />
segun<strong>do</strong> notícia de 1302 47 , e aquel<strong>as</strong> merca<strong>do</strong>ri<strong>as</strong> se<br />
export<strong>as</strong>sem para outros portos <strong>da</strong> Europa. A antiga<br />
ligação à An<strong>da</strong>luzia mantinha-se, <strong>as</strong>sim, com novos<br />
contactos, facto que talvez possa explicar a presença<br />
de vários algarvios — vin<strong>do</strong>s de Porches, de Loulé, de<br />
Faro e de Tavira — entre os povoa<strong>do</strong>res de Jerez de<br />
la Frontera, em 1264 48 .<br />
Com a participação <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> n<strong>as</strong> rot<strong>as</strong><br />
<br />
sobretu<strong>do</strong>, com <strong>as</strong> conquist<strong>as</strong> em África e <strong>as</strong><br />
navegações atlântic<strong>as</strong>, tornou-se mais visível a<br />
importância d<strong>as</strong> ligações marítim<strong>as</strong> na economia<br />
<strong>da</strong> região. Os testemunhos anteriores são, contu<strong>do</strong>,<br />
dem<strong>as</strong>ia<strong>do</strong> eloquentes para se esquecer o papel<br />
<strong>do</strong> mar nos contactos entre os vários núcleos<br />
urbanos <strong>do</strong> litoral, ou destes com <strong>as</strong> outr<strong>as</strong> regiões<br />
<strong>do</strong> reino e <strong>da</strong> Europa. O interesse crescente <strong>do</strong>s<br />
monarc<strong>as</strong> pelo culto a S. Vicente, em particular de<br />
Afonso III e de Afonso IV, ou, depois, <strong>do</strong>s reis <strong>da</strong><br />
din<strong>as</strong>tia de Avis, também os levara a olhar pelo seu<br />
santuário em terr<strong>as</strong> algarvi<strong>as</strong> 49 , como se o santo<br />
fosse convoca<strong>do</strong> a proteger <strong>as</strong> an<strong>da</strong>nç<strong>as</strong> pelo mar<br />
<strong>do</strong>s homens <strong>da</strong> terra.<br />
46<br />
Cf. Luís Adão <strong>da</strong> Fonseca e José Augusto Pizarro, “Algum<strong>as</strong><br />
considerações sobre o comércio…”, pp. 62-66; Luís Adão <strong>da</strong> Fonseca, “As<br />
Relações Comerciais entre Portugal e os Reinos Peninsulares nos Séculos<br />
XIV e XV”, Act<strong>as</strong> d<strong>as</strong> II Jornad<strong>as</strong> Luso- Espanhol<strong>as</strong> de História Medieval,<br />
Porto, 1987, vol. II, pp. 547-550,553-559.<br />
47<br />
Cf. Manuel Gonzalez-Jimenez, “La Pesca en An<strong>da</strong>lucia (siglos XIII-XV)”,<br />
Cadernos Históricos, Lagos, vol. VI, 1995, p. 47.<br />
48<br />
Cf. Henrique David, “Os Portugueses nos Livros de «Repartimiento»<br />
<strong>da</strong> An<strong>da</strong>luzia (Século XIII), Act<strong>as</strong> d<strong>as</strong> I Jornad<strong>as</strong> de História Medieval <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong> e <strong>da</strong> An<strong>da</strong>luzia, Loulé, 1987, pp. 283-285.<br />
49<br />
Cf. Maria Isabel Di<strong>as</strong>, Culto e Memória Textual de S. Vicente, diss. de<br />
<strong>do</strong>utoramento em Literatura apresenta<strong>da</strong> à Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, Faro,<br />
2003, pp. 47 e ss. Sobre a <strong>as</strong>sociação <strong>do</strong>s monarc<strong>as</strong> às insígni<strong>as</strong> <strong>do</strong> santo<br />
e a relação <strong>do</strong> seu culto com o mar, veja-se Luís Krus, “O Mar”, in XVII<br />
Exposição Europeia de Arte, Ciência e Cultura. Madre de Deus, Lisboa,<br />
1983, pp. 269-271; Idem, “S. Vicente e o Mar: D<strong>as</strong> Relíqui<strong>as</strong> às Moed<strong>as</strong>”,<br />
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38 AS VIAS DO ALGARVE
.VI<br />
DE BAESURIS A PAX IVLIA POR ARANNIS<br />
MANUEL MAIA<br />
Campo Arqueológico de Tavira<br />
resumo<br />
H<br />
Há anos que persigo esta estranha via que sain<strong>do</strong><br />
de C<strong>as</strong>tro Marim para Beja, p<strong>as</strong>sa por Balsa,<br />
Ossonoba, Arannis e Salatia() antes de chegar<br />
à capital <strong>do</strong> Conventus. É certo que não tenho<br />
dedica<strong>do</strong> cem por cento <strong>do</strong> meu tempo ao seu<br />
estu<strong>do</strong>, no entanto, tem se <strong>da</strong><strong>do</strong> a circunstância<br />
de ao longo <strong>do</strong>s últimos 35 anos to<strong>da</strong> a minha<br />
investigação no campo <strong>da</strong> Arqueologia e <strong>da</strong> História<br />
Antiga se desenrolar ao longo <strong>do</strong> seu percurso.<br />
<br />
de Arannis, reconheci, nos municípios de Almodôvar<br />
e de Mértola uma parte <strong>do</strong> seu traça<strong>do</strong> e venho a<br />
descobrir que o seu traça<strong>do</strong>, através <strong>da</strong> Serra <strong>do</strong><br />
Caldeirão, depois de cruzar esc<strong>as</strong>sos quilómetros<br />
<strong>do</strong> concelho de Alcoutim, percorre <strong>as</strong> freguesi<strong>as</strong> de<br />
Cachopo e Santa Catarina <strong>da</strong> Fonte <strong>do</strong> Bispo onde<br />
<br />
desta via.<br />
É <strong>da</strong> maior justiça salientar que os estu<strong>do</strong>s que<br />
nos últimos anos tenho vin<strong>do</strong> a realizar sobre<br />
este sistema viário só têm si<strong>do</strong> possíveis graç<strong>as</strong> à<br />
colaboração <strong>do</strong> nosso colega e amigo Luís Fraga<br />
<br />
alguns percursos e para distinguir quan<strong>do</strong> é que a<br />
via romana era aberta de novo ou em que pontos<br />
seguia trajectos pré existentes.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 39
Tomei contacto com este itinerário quan<strong>do</strong> aluno<br />
<strong>do</strong> curso de História, era-nos apresenta<strong>da</strong> como<br />
prova de que o Itinerário de Antonino não é um<br />
guia de estrad<strong>as</strong> nem, muito menos, uma lista de<br />
trajectos directos, trata-se na, reali<strong>da</strong>de, de um<br />
listagem de itineraria.<br />
Durante anos a minha investigação p<strong>as</strong>sou ao<br />
la<strong>do</strong> deste itinerário, ain<strong>da</strong> que os meus trabalhos<br />
de arqueologia, quer no Baixo Alentejo quer no<br />
<strong>Algarve</strong>, se tenham desenrola<strong>do</strong> sempre ao longo<br />
<strong>do</strong> seu percurso.<br />
Antes de p<strong>as</strong>sar ao estu<strong>do</strong> deste conjunto de<br />
<br />
prévios que se relacionam com pressupostos<br />
completamente erra<strong>do</strong>s e que têm prejudica<strong>do</strong> o<br />
estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> rede viária romana em Portugal. Ain<strong>da</strong><br />
que este tema tenha si<strong>do</strong> trata<strong>do</strong>, e bem, por V<strong>as</strong>co<br />
Mant<strong>as</strong> (Mant<strong>as</strong> 1996: 67) parece-me útil relembrar<br />
alguns desses pressupostos.<br />
A saber:<br />
1º - Uma via romana tem sempre um traça<strong>do</strong><br />
rectilíneo e vence os obstáculos que se lhe<br />
atravessam, com to<strong>da</strong> a violência, crian<strong>do</strong> diques e<br />
taludes, pontes e portos para atravessar linh<strong>as</strong> de<br />
água. Era necessário seguir a direito.<br />
2º - Via romana é sinónimo de calça<strong>da</strong>. Se há<br />
calça<strong>da</strong> há via romana, se não esta não existe.<br />
3º - Numa via romana encontram-se sempre pontes.<br />
4º - Com o Itinerário de Antonino e o auxílio <strong>do</strong><br />
ravenate podemos reconstituir o traça<strong>do</strong> de uma via.<br />
Tem se esqueci<strong>do</strong> que já no perío<strong>do</strong> romano<br />
o dinheiro era caro. Para quê ir a direito se a<br />
transposição <strong>do</strong> obstáculo pela construção de<br />
obr<strong>as</strong> de arte pode sair mais cara <strong>do</strong> que um<br />
desvio para evitar uma zona estuarina ou de sapal.<br />
Se existe um rio, ain<strong>da</strong> que pequeno que termine<br />
num largo sapal, não construíam uma ponte dique<br />
sobre os lo<strong>do</strong>s quan<strong>do</strong> com um desvio de um ou<br />
<strong>do</strong>is quilómetros podiam localizar um ponto onde<br />
o curso de água se podia transpor a vau Ou,<br />
então, num ponto onde o sapal fosse muito mais<br />
estreito, construir um dique eleva<strong>do</strong> sobre os lo<strong>do</strong>s<br />
e depois uma pequena ponte para transpor o curso<br />
de água.<br />
Porque razão construir pontes para ultrap<strong>as</strong>sar<br />
pequen<strong>as</strong> linh<strong>as</strong> de água torrenciais como no c<strong>as</strong>o<br />
de qu<strong>as</strong>e to<strong>do</strong> o Sul de Portugal ou o Norte de<br />
África Em c<strong>as</strong>o de grande enxurra<strong>da</strong> aguar<strong>da</strong>vam<br />
um ou <strong>do</strong>is di<strong>as</strong> até poderem p<strong>as</strong>sar. M<strong>as</strong> est<strong>as</strong><br />
são rar<strong>as</strong>.<br />
Em zona montanhosa, como a nossa serra <strong>do</strong><br />
Caldeirão para quê fazer estrad<strong>as</strong> subin<strong>do</strong> e<br />
descen<strong>do</strong> encost<strong>as</strong> a direito quan<strong>do</strong> durante a<br />
maior parte <strong>do</strong> ano se pode transitar, a pé enxuto,<br />
pelo leito <strong>da</strong> maior parte <strong>do</strong>s cursos de água ou<br />
a meia encosta se <strong>as</strong> ribeir<strong>as</strong> vão chei<strong>as</strong> E já<br />
pensaram, os que conhecem a Serra <strong>do</strong> Caldeirão,<br />
em quais os animais que teriam força para subir<br />
ess<strong>as</strong> encost<strong>as</strong>, para mais carrega<strong>do</strong>s. E como<br />
poderiam manter o equilíbrio sem se despenhar<br />
por el<strong>as</strong> abaixo. Convém não esquecer que há<br />
muit<strong>as</strong> encost<strong>as</strong> nesta Serra com mais de 45º de<br />
inclinação.<br />
Seria pura perca de tempo e de dinheiro construir<br />
calçad<strong>as</strong> sobre terrenos esqueléticos, como são<br />
a maioria <strong>do</strong>s existentes no Sul <strong>do</strong> nosso País,<br />
pelo que <strong>as</strong> calçad<strong>as</strong> seriam desnecessári<strong>as</strong>.<br />
Imaginem o que seria de eixos e rod<strong>as</strong> partid<strong>as</strong><br />
se houvesse necessi<strong>da</strong>de de fazer transitar uma<br />
biga, a galope, por uma longa calça<strong>da</strong> romana.<br />
Apen<strong>as</strong> pesa<strong>do</strong>s carros de bois poderiam transitar<br />
por estrad<strong>as</strong> completamente empedrad<strong>as</strong>. É certo<br />
que <strong>as</strong> calçad<strong>as</strong> tinham que ser tapad<strong>as</strong> com terra<br />
<br />
o que acontece a uma estra<strong>da</strong> feita na actuali<strong>da</strong>de<br />
depois de um perío<strong>do</strong> de chuva intensa. Lembremo-<br />
-nos de que <strong>as</strong> calçad<strong>as</strong> eram apen<strong>as</strong> cobert<strong>as</strong><br />
com terra que, por muito calca<strong>da</strong> que fosse, teria<br />
tendência para ser arr<strong>as</strong>ta<strong>da</strong> pela água deixan<strong>do</strong><br />
<strong>as</strong> lajes à vista.<br />
Visto estes primeiros pressupostos há ain<strong>da</strong> mais<br />
alguns pontos que necessitam ser esclareci<strong>do</strong>s<br />
como sejam:<br />
O que interessa numa via romana Apen<strong>as</strong> o<br />
seu traça<strong>do</strong> estu<strong>da</strong><strong>do</strong> na perspectiva <strong>da</strong> obra<br />
de engenharia Conhecer tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> estações por<br />
onde p<strong>as</strong>sa Ou analisar to<strong>da</strong> a sua envolvente, ou<br />
<br />
servia<br />
Qualquer dest<strong>as</strong> hipóteses é váli<strong>da</strong> e, por uma<br />
questão de méto<strong>do</strong>, como é evidente, convém<br />
começar pela primeira.<br />
40 AS VIAS DO ALGARVE
Em 1984, a Câmara Municipal de C<strong>as</strong>tro Verde ao<br />
proceder a obr<strong>as</strong> de ampliação <strong>do</strong> cemitério de<br />
uma d<strong>as</strong> freguesi<strong>as</strong> <strong>do</strong> concelho, Santa Bárbara<br />
de Padrões, pôs a descoberto algum<strong>as</strong> estrutur<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong>. O autarca pediu-nos para aí fazermos<br />
uma intervenção e tivemos oportuni<strong>da</strong>de de, no<br />
topo <strong>da</strong> colina, por trás <strong>da</strong> Igreja, descobrir, parte<br />
de uma b<strong>as</strong>ílica paleocristã <strong>da</strong>tável <strong>do</strong> século IV-<br />
-V. Dez anos mais tarde em nova ampliação <strong>do</strong><br />
<br />
votivo secundário de lucern<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> (Maia e<br />
Maia 1998).<br />
Aquan<strong>do</strong> <strong>da</strong> descoberta <strong>da</strong> b<strong>as</strong>ílica pudemos<br />
observar que esta tinha si<strong>do</strong> construí<strong>da</strong> sobre<br />
e aproveitan<strong>do</strong> parte de uma estrutura balnear<br />
romana.<br />
<br />
a igreja, estava junca<strong>da</strong> de materiais romanos.<br />
Nos muros d<strong>as</strong> hort<strong>as</strong> <strong>da</strong> aldeia, eram visíveis<br />
grandes plac<strong>as</strong> de opus signinum niti<strong>da</strong>mente<br />
reaproveita<strong>do</strong>s como material de construção.<br />
A área abrangi<strong>da</strong> pelos vestígios romanos era tão<br />
v<strong>as</strong>ta que não podíamos estar na presença de uma<br />
vila rústica, por muito grande que fosse.<br />
<br />
uma pequena notícia de Leite de V<strong>as</strong>concellos<br />
(Leite de V<strong>as</strong>concellos: 1931) que, numa excursão<br />
ao Baixo Alentejo, esteve em Santa Bárbara de<br />
<br />
v<strong>as</strong>tidão d<strong>as</strong> ruín<strong>as</strong> e ten<strong>do</strong> observa<strong>do</strong> a existência<br />
de um troço de grossa muralha, hoje já totalmente<br />
<br />
arqueológica como uma ci<strong>da</strong>de romana. O grande<br />
mestre, porém, não adiantou o topónimo <strong>da</strong> civit<strong>as</strong>.<br />
<br />
nos podia adiantar porque nem em Santa Bárbara,<br />
nem num raio de mais de 10 km tinha si<strong>do</strong> recolhi<strong>da</strong><br />
qualquer epígrafe romana. Em Plínio (NH IV-118), para<br />
uma região b<strong>as</strong>tante v<strong>as</strong>ta em que se inclui esta aldeia<br />
<strong>do</strong> Baixo Alentejo, vêm menciona<strong>do</strong>s os aranditani e<br />
no Itinerário dito de Antonino, a 60 mp de Ossonoba é<br />
coloca<strong>da</strong> Arannis. Santa Bárbara de Padrões localiza-<br />
-se exactamente a 60 mp ou seja a 89 Km de Faro.<br />
<br />
Arannis com Garvão, o que não<br />
faz qualquer senti<strong>do</strong>: Primeiro porque a distância<br />
a Ossonoba é muito superior, segun<strong>do</strong> porque<br />
<br />
proto-histórico, foi aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong> no perío<strong>do</strong> de<br />
Augusto e não voltou a ter ocupação romana,<br />
pelo que seria um fenómeno estranho que um<br />
Itinerário <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> <strong>do</strong>s Antoninos mencion<strong>as</strong>se<br />
como ponto referenciavel um local despovoa<strong>do</strong> há<br />
já três séculos.<br />
Em Garvão p<strong>as</strong>sa uma estra<strong>da</strong> romana, vin<strong>da</strong> de<br />
Monchique, por Sabóia, onde existe uma ponte<br />
romana, m<strong>as</strong> nunca foi Arannis.<br />
Não tenho, portanto, qualquer dúvi<strong>da</strong> de que Santa<br />
Arannis.<br />
<br />
estra<strong>da</strong> há que reconstituir o seu traça<strong>do</strong>.<br />
<br />
percurso de uma via romana: Percorren<strong>do</strong>-o. No<br />
entanto há que ter em atenção que ao longo de<br />
qu<strong>as</strong>e 2000 anos esse traça<strong>do</strong> se alterou quer por<br />
acção humana quer <strong>do</strong>s elementos. Quant<strong>as</strong> vezes<br />
ao percorrer uma estra<strong>da</strong> romana não a perdemos<br />
Mesmo uma <strong>da</strong>quel<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> imperiais com tod<strong>as</strong><br />
<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> <strong>do</strong>s manuais.<br />
M<strong>as</strong> percorrer uma via romana é tarefa dura. Na<br />
maior parte <strong>do</strong>s c<strong>as</strong>os nem com veículos to<strong>do</strong> o<br />
terreno é possível fazer esses percursos. Há que a<br />
seguir de mochila às cost<strong>as</strong> calcorrean<strong>do</strong> montes<br />
e vales quant<strong>as</strong> vezes por sítios onde o mato já<br />
ocupou o traça<strong>do</strong> <strong>da</strong> estra<strong>da</strong>.<br />
<br />
a carta militar, é um auxiliar precioso. M<strong>as</strong> por<br />
vezes mesmo na carta a via desaparece e aí temos<br />
que estu<strong>da</strong>r a toponímia e principalmente, a micro<br />
toponímia para conseguirmos deslin<strong>da</strong>r este<br />
problema quan<strong>do</strong> ele é resolúvel.<br />
Como nunca apreciei grandes caminhad<strong>as</strong> há mais<br />
de vinte anos que estu<strong>do</strong> este itinerário.<br />
Tenho vin<strong>do</strong> a utilizar outro sistema. Como nos<br />
últimos vinte e nove ou trinta anos, tenho dirigi<strong>do</strong><br />
a minha investigação para o Baixo Alentejo e<br />
para Zon<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> que ladeiam esta “Via”, é<br />
fácil tropeçar aqui ou ali no seu traça<strong>do</strong>, tomar<br />
<br />
<strong>as</strong> narrativ<strong>as</strong> <strong>da</strong>queles que, ten<strong>do</strong> n<strong>as</strong>ci<strong>do</strong> e<br />
viven<strong>do</strong> na Serra, até há poucos anos utilizavam<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 41
o seu traça<strong>do</strong> para se deslocarem ao litoral, o<br />
<strong>Algarve</strong>, ou ás grandes feir<strong>as</strong> <strong>do</strong> Baixo Alentejo,<br />
C<strong>as</strong>tro Verde e Garvão.<br />
Antes de me debruçar sobre o trajecto deste<br />
itinerário, convém esclarecer que de Baesuris a Pax<br />
Ivlia por Arannis e Salatia não existe uma via m<strong>as</strong><br />
sim um conjunto de pelo menos quatro estrad<strong>as</strong> ou<br />
troços de estra<strong>da</strong> que formam este Iter.<br />
A Estra<strong>da</strong> ou, melhor, este sistema viário, iniciava-<br />
-se a Norte de C<strong>as</strong>tro Marim. Baesuris era então<br />
uma ilha, e a via partia de sítio seco. Muito<br />
possivelmente iniciava-se onde começava a que<br />
se dirigia a Pax Iulia per compendium. Ou seja<br />
aquela que seguia em grande parte pela margem<br />
<strong>do</strong> Guadiana ou n<strong>as</strong> su<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des, p<strong>as</strong>sava<br />
por Mértola e seguia até Beja.<br />
Desse ponto a via contornava o sapal que então<br />
chegava até Altura, sapal e conjunto de esteiros que<br />
ain<strong>da</strong> hoje atinge S. Bartolomeu de C<strong>as</strong>tro Marim e<br />
de que a Alagoa é o último vestígio. P<strong>as</strong>sava pela<br />
Lota, dirigia-se às imediações de Cacela e seguia<br />
até à Conceição. Depois desta povoação havia que<br />
ultrap<strong>as</strong>sar um obstáculo de certa envergadura, o<br />
largo sapal <strong>da</strong> foz <strong>do</strong> Almargem. Há quem preten<strong>da</strong><br />
que a via atravessava esta zona alagadiça a<br />
direito, pelo local onde hoje se encontra a ponte<br />
de caminho de ferro 1 <br />
no mínimo, de desconhecimento <strong>da</strong> toponímia.<br />
Sain<strong>do</strong> <strong>do</strong> local onde hoje se localiza a povoação<br />
<strong>da</strong> Conceição, a via ia vencer o sapal um pouco a<br />
montante <strong>da</strong> actual EN 125. Na encosta que bordeja<br />
a margem esquer<strong>da</strong> <strong>do</strong> Almargem, existe um antigo<br />
caminho conheci<strong>do</strong> localmente por Calçadinha,<br />
topónimo regista<strong>do</strong> na folha 608 <strong>da</strong> Carta Militar,<br />
e que se dirige, sobre um pequeno talude/dique<br />
para a ponte, em cavalete, que franqueia aquele<br />
curso de água.<br />
Ao contrário de V<strong>as</strong>co Mant<strong>as</strong> (Mant<strong>as</strong> 1997:316)<br />
e de Sandra Rodrigues (Rodrigues 2004: 87 e 90),<br />
considero esta ponte como romana.<br />
1º Porque <strong>as</strong> pontes em cavalete são mais típic<strong>as</strong><br />
<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> romano que <strong>do</strong> medieval.<br />
2º Porque <strong>as</strong> aduel<strong>as</strong> <strong>do</strong>s arcos são tipicamente<br />
roman<strong>as</strong>.<br />
3º Porque o topónimo calçadinha refere, precisamente<br />
o caminho que até ela conduz.<br />
O surto de urbanização, que atacou a área<br />
compreendi<strong>da</strong> entre o Almargem e a ci<strong>da</strong>de de<br />
Tavira, impede que ain<strong>da</strong> possamos localizar,<br />
no terreno, qualquer vestígio <strong>da</strong> estra<strong>da</strong>. Temos<br />
<br />
<br />
a estra<strong>da</strong> entraria no local onde hoje é Tavira e<br />
que há época não era habita<strong>do</strong>, pelo Alto de São<br />
Brás, descia ao sítio onde hoje é o Jardim <strong>da</strong><br />
Alagoa e p<strong>as</strong>sava a vau para a margem direita <strong>do</strong><br />
Séqua que seria atingi<strong>da</strong> por altur<strong>as</strong> <strong>da</strong> estação<br />
<strong>da</strong> Ro<strong>do</strong>viária. A Ponte Velha de Tavira não tem<br />
qualquer vestígio de construção romana, nem na<br />
b<strong>as</strong>e, nem nos arcos e muito menos no tabuleiro.<br />
Saben<strong>do</strong> que ela já existia ao tempo <strong>da</strong> conquista<br />
cristã <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de e examinan<strong>do</strong> bem o seu estilo,<br />
concluímos que ela é de construção islâmica,<br />
muito possivelmente almóa<strong>da</strong>.<br />
A Estra<strong>da</strong> seguia <strong>da</strong>qui pela Bela Fria até ao actual<br />
Alto <strong>do</strong> Cano, dirigia-se <strong>da</strong>í para a zona <strong>da</strong> Atalaia e<br />
seguia pela antiga estra<strong>da</strong> de Santa Luzia dirigin<strong>do</strong>-<br />
-se para Balsa. Da Atalaia saía outra via que também<br />
se dirigia a Balsa, junto desta via, no presente<br />
conheci<strong>da</strong> como caminho d<strong>as</strong> salin<strong>as</strong>, foi destruí<strong>do</strong><br />
um cemitério romano (Anica, 1993).<br />
De Balsa esta via dividia-se em <strong>do</strong>is percursos: Um<br />
dirigia-se para Norte pelo Marco e iria até Santa<br />
Catarina <strong>da</strong> Fonte <strong>do</strong> Bispo, outro dirigia-se até<br />
às proximi<strong>da</strong>des de Moncarapacho, contornan<strong>do</strong><br />
<strong>as</strong>sim o grande golfo e sapal que constituía a parte<br />
<br />
porém, bem como o <strong>da</strong> que sai de Faro para Santa<br />
Catarina <strong>da</strong> Fonte <strong>do</strong> Bispo, por Moncarapacho,<br />
será apresenta<strong>do</strong>, em pormenor, pelo Dr. Luís<br />
Fraga <strong>da</strong> Silva, também ele sócio <strong>do</strong> Campo<br />
Arqueologico de Tavira.<br />
Iniciarei, <strong>as</strong>sim, a descrição desta parte <strong>do</strong> Itinerário,<br />
a via de Ossonoba e Balsa para Pax Ivlia (Fraga,<br />
1<br />
Rodrigues, S. As vi<strong>as</strong> Roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, Faro, 2004. p. 43<br />
42 AS VIAS DO ALGARVE
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 43
2003), pela actual povoação de Santa Catarina <strong>da</strong><br />
Fonte <strong>do</strong> Bispo, onde Luís Fraga descobriu um bom<br />
troço de calça<strong>da</strong> na margem <strong>da</strong> ribeira <strong>do</strong> Lagar 2 .<br />
Daqui seguiria para Norte por Porto Carvalhoso,<br />
cujo topónimo denuncia a p<strong>as</strong>sagem <strong>da</strong> ribeira de<br />
Alportel e onde já foi recolhi<strong>do</strong> material romano.<br />
Dirigia-se depois para Bem Parece e Água de Fusos<br />
<br />
A via que conduzia a Beja seguia pelo Monte <strong>da</strong><br />
Estra<strong>da</strong>, topónimo bem esclarece<strong>do</strong>r, Merca<strong>do</strong>r e,<br />
pela Calça<strong>da</strong> <strong>do</strong>s Mouros (Maia, M.G.P. 2001) próximo<br />
<strong>da</strong> Portela e <strong>da</strong>qui por Taip<strong>as</strong>, Alcari<strong>as</strong> e Santa Justa<br />
até Giões. Cruzaria o V<strong>as</strong>cão pelo porto tradicional<br />
<strong>do</strong>mina<strong>do</strong> pelo C<strong>as</strong>telo d<strong>as</strong> Relíqui<strong>as</strong> (Catarino,<br />
1997/98) e subiria a São Bartolomeu de Via Glória.<br />
<br />
bifurcava, seguin<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s caminhos para Mértola<br />
onde entroncaria na via de Baesuris a Pax Ivlia<br />
per compendium e outra pelo Cerro <strong>da</strong> Má Noite,<br />
conheci<strong>da</strong> na região por Estradinha <strong>da</strong> Corcha, n<strong>as</strong><br />
proximi<strong>da</strong>des <strong>do</strong> C<strong>as</strong>telo <strong>do</strong> Manuel Galo (Maia, M<br />
1986), seguiria também para Mértola um pouco<br />
<br />
dirigia a Norte, por Arannis, de Água de Fusos<br />
seguiria por Cabeça de Velho, no concelho de São<br />
Brás de Alportel, C<strong>as</strong>telão, Feiteira, Valeira, Mealha<br />
e Alcari<strong>as</strong> de Pêro Guerreiro atingin<strong>do</strong> o Monte <strong>da</strong><br />
Estra<strong>da</strong>, no concelho de Alcoutim. Curiosamente,<br />
numa distância relativamente curta, existem <strong>do</strong>is<br />
topónimos iguais, Monte <strong>da</strong> Estra<strong>da</strong>. Deste monte a<br />
2<br />
Luís Fraga <strong>da</strong> Silva www.arqueotavira.com<br />
44 AS VIAS DO ALGARVE
BIBLIOGRAFIA<br />
via continuava pelo Moinho <strong>do</strong> Pereirão e prosseguia<br />
dirigin<strong>do</strong> se para a povoação de Pessegueiro, na<br />
freguesia de Martim Longo, n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des <strong>da</strong><br />
qual franqueava o V<strong>as</strong>cão, seguin<strong>do</strong> depois pelo<br />
Monte <strong>do</strong> C<strong>as</strong>telejo, São Pedro de Solis, no concelho<br />
de Mértola e prosseguin<strong>do</strong> pela Alcaria d<strong>as</strong> Bich<strong>as</strong>,<br />
Min<strong>as</strong> <strong>do</strong> Barrigão, Miguenzes, Caia<strong>da</strong>, Her<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />
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Entre São Pedro de Solis e a Her<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Espanca,<br />
zona com vários pontos alagadiços, são frequentes<br />
os troços de calça<strong>da</strong>.<br />
Uma derivação, af<strong>as</strong>tan<strong>do</strong>-se <strong>da</strong> anterior no<br />
Moinho <strong>do</strong> Pereirão, atravessava o V<strong>as</strong>cão por<br />
um porto existente junto <strong>da</strong> ponte actual, subia<br />
para Santa Cruz, no concelho de Almodôvar. Neste<br />
município, a estra<strong>da</strong> seguia pelo Monte d<strong>as</strong> Viúv<strong>as</strong>,<br />
Monte <strong>da</strong> Vinha, Semblana e Senhora <strong>da</strong> Graça de<br />
Padrões, penetran<strong>do</strong> de segui<strong>da</strong> no território de<br />
C<strong>as</strong>tro Verde, onde p<strong>as</strong>sava por Lomba<strong>do</strong>r e Santa<br />
Bárbara de Padrões a Antiga Arannis. Prosseguia<br />
depois para Norte conhecen<strong>do</strong>-a nós até à Vila de<br />
Entrad<strong>as</strong> onde entroncaria numa via que, vin<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />
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RODRIGUES, Sandra, 2004, As vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>.<br />
Faro.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 45
.VII<br />
O TERRITÓRIO DE MÉRTOLA E AS VIAS DE<br />
COMUNICAÇÃO NO PERÍODO ROMANO<br />
VIRGÍLIO LOPES<br />
Campo Arqueológico de Mértola<br />
enquadramento<br />
histórico<br />
A<br />
A história <strong>do</strong> burgo de Mértola foi, desde sempre,<br />
fortemente condiciona<strong>da</strong> por <strong>do</strong>is factores que<br />
mol<strong>da</strong>ram a sua ocupação e a sua importância<br />
ao longo <strong>do</strong> tempo. Em primeiro lugar, a sua<br />
localização estratégica: implanta<strong>do</strong> no topo<br />
de uma elevação ladea<strong>da</strong> pelo rio Guadiana,<br />
a n<strong>as</strong>cente, e pela ribeira de Oeir<strong>as</strong>, a poente,<br />
possuía excelentes condições naturais de<br />
defesa. Em segun<strong>do</strong>, o ser ponto extremo <strong>da</strong><br />
navegabili<strong>da</strong>de <strong>do</strong> rio Guadiana: a montante <strong>da</strong><br />
vila, o acidente geológico <strong>do</strong> Pulo <strong>do</strong> Lobo, com um<br />
desnível de catorze metros, impede a progressão<br />
de embarcações para norte, pelo que Mértola<br />
adquire importância fun<strong>da</strong>mental como último<br />
porto de acostagem. Esses factores tornaram-<br />
-na num importante entreposto mercantil, em<br />
permanente contacto com um v<strong>as</strong>to território<br />
interno e com o Mar Mediterrâneo. Pelo porto<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de escoavam-se, por exemplo, o ouro,<br />
a prata e o cobre extraí<strong>do</strong>s d<strong>as</strong> entranh<strong>as</strong> <strong>da</strong><br />
faixa piritosa ibérica 1 em particular os minerais<br />
provenientes d<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de S. Domingos,<br />
localizad<strong>as</strong> na margem esquer<strong>da</strong> <strong>do</strong> Guadiana,<br />
de Vip<strong>as</strong>ca (Aljustrel) ou <strong>do</strong>s “chapéus de ferro”,<br />
explora<strong>do</strong>s na zona a Oeste de Mértola, estan<strong>do</strong><br />
certamente relaciona<strong>do</strong>s com a exploração e<br />
transporte desse minério os c<strong>as</strong>tella localiza<strong>do</strong>s<br />
1<br />
OLIVEIRA, J. T. de e OLIVEIRA, V., 1996 p. 11.<br />
46 AS VIAS DO ALGARVE
nesta área 2 . E, claro está, ao porto arribavam<br />
<strong>as</strong> gentes de mil paragens e os mais diversos<br />
produtos e artefactos.<br />
A importância de Mértola é também indissociável<br />
<strong>da</strong> sua excelente localização. Ao nível regional:<br />
estava situa<strong>da</strong> no percurso <strong>da</strong> via terrestre que<br />
ligava, desde o Bronze Final, o próspero reino de<br />
Tartesso à foz <strong>do</strong> Sa<strong>do</strong> e ao estuário <strong>do</strong> Tejo, via<br />
essa por onde se encaminhava para o Mediterrâneo<br />
o estanho vin<strong>do</strong> <strong>do</strong> Norte de Portugal e <strong>da</strong> Beira<br />
Interior 3 . Ela atravessava o Alentejo entre a foz <strong>do</strong><br />
Sa<strong>do</strong> e o Guadiana, através <strong>do</strong> qual se ligava ao<br />
Sul <strong>da</strong> An<strong>da</strong>luzia.<br />
Est<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> vão <strong>da</strong>r a Mértola um importante<br />
papel nos processos históricos subsequentes,<br />
pois <strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> e o rio não transportam somente<br />
merca<strong>do</strong>ri<strong>as</strong>, m<strong>as</strong> também e, principalmente, <strong>as</strong><br />
idei<strong>as</strong> e <strong>as</strong> cultur<strong>as</strong> <strong>da</strong>queles que <strong>as</strong> percorrem,<br />
<br />
visitam. Quanto maior é o número de visitantes<br />
estrangeiros, quanto mais é facilita<strong>do</strong> o contacto<br />
com eles, maior e mais marcante será a a<strong>do</strong>pção<br />
de outr<strong>as</strong> referênci<strong>as</strong> culturais, num senti<strong>do</strong> largo,<br />
e menos conserva<strong>do</strong>ra a sua evolução. Mértola,<br />
terra de comércio, é, sem dúvi<strong>da</strong>, um local onde<br />
essa miscigenação deixou marc<strong>as</strong> relevantes.<br />
o território de Myrtilis<br />
A riqueza mineira <strong>da</strong> área envolvente de Mértola<br />
e o facto desta ter desempenha<strong>do</strong> uma função<br />
portuária importante trouxeram a esta ci<strong>da</strong>de<br />
os comerciantes e os sol<strong>da</strong><strong>do</strong>s de Roma. Foram<br />
<br />
um horizonte cronológico que vai desde os inícios<br />
<strong>do</strong> século II a.C. até ao século VIII.<br />
As primeir<strong>as</strong> prospecções arqueológic<strong>as</strong><br />
sistemátic<strong>as</strong> foram realizad<strong>as</strong> desde a décad<strong>as</strong><br />
de 70 <strong>do</strong> século XX por Manuel e Maria Maia nos<br />
concelhos de C<strong>as</strong>tro Verde, Mértola, Almodôvar<br />
e Alcoutim. Est<strong>as</strong> prospecções tiveram como<br />
<br />
estrutur<strong>as</strong> de povoamento romano e vieram a<br />
<br />
c<strong>as</strong>tella 4 Este tipo de estrutur<strong>as</strong>, marca<strong>da</strong>mente<br />
defensiv<strong>as</strong>, tem como paradigma arquitectónico<br />
o c<strong>as</strong>telo <strong>da</strong> Lousa (Mourão). A distribuição deste<br />
tipo de monumentos coincide com a faixa piritosa<br />
ibérica que se estende desde a serra <strong>da</strong> Caveira<br />
ao Guadiana e termina n<strong>as</strong> Min<strong>as</strong> de Rio Tinto e<br />
Tarsis (Huelva, Espanha). De facto, e no geral, el<strong>as</strong><br />
estão situad<strong>as</strong> ao longo deste veio mineralífero; no<br />
entanto, existe uma excepção que é o C<strong>as</strong>telo <strong>da</strong><br />
Lousa que não parece inserir-se em áre<strong>as</strong> mineir<strong>as</strong>,<br />
m<strong>as</strong> antes corresponder à defesa de uma d<strong>as</strong> rar<strong>as</strong><br />
zon<strong>as</strong> de p<strong>as</strong>sagem naquele troço <strong>do</strong> rio Guadiana.<br />
Os penh<strong>as</strong>cos xistosos <strong>do</strong> Baixo Alentejo eram<br />
ricos, não apen<strong>as</strong> em cobre, chumbo ou ferro,<br />
como se pensou até há pouco, m<strong>as</strong> também, e<br />
principalmente, em ouro e prata, extraí<strong>do</strong>s em<br />
quanti<strong>da</strong>de apreciáveis e sem grandes trabalhos<br />
de mineração nos chama<strong>do</strong>s chapéus de ferro.<br />
<br />
oxigénio <strong>do</strong> ar, sofriam o processo <strong>da</strong> oxigenação e de<br />
lexiviação provoca<strong>do</strong> pel<strong>as</strong> águ<strong>as</strong> d<strong>as</strong> chuv<strong>as</strong>. O ouro<br />
e a prata menos corruptíveis, iam-se concentran<strong>do</strong><br />
nestes chapéus de ferro de onde eram colhi<strong>do</strong>s<br />
sem grandes revovimentos de terr<strong>as</strong> 5 .<br />
A este respeito refere Juan Aurélio Pérez Maci<strong>as</strong> “a<br />
maioria <strong>do</strong>s estabelecimentos mineiros de época<br />
romana caracterizam-se pela sua dispersão”<br />
explicáveis pelo facto “<strong>do</strong>s minerais aparecerem<br />
em m<strong>as</strong>s<strong>as</strong> separad<strong>as</strong>” 6 . Na reali<strong>da</strong>de, <strong>as</strong> condições<br />
2<br />
MAIA, M., 1986, pp. 195-223, e MAIA, M. e MAIA, M. 1996, pp. 60-81.<br />
3<br />
ALARCÃO, J., 1989, p. 41.<br />
4<br />
MAIA, M., 1986, pp. 195-223.<br />
5<br />
TORRES C., 1992, p. 190.<br />
6<br />
PÉREZ MACIAS, J. A., 1986, p. 35.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 47
geológico-mineir<strong>as</strong> <strong>da</strong> faixa piritosa Ibérica dão<br />
chapéus de ferro que<br />
exigem uma exploração de tipo não-concentra<strong>do</strong>.<br />
Um modelo diferente, certamente mais rentável,<br />
deste território seria a exploração <strong>da</strong> Mina de<br />
S. Domingos, de onde se exploravam <strong>as</strong> pirites<br />
de ferro cuprífero, sulfuretos de cobre, chumbo e<br />
zinco, prata e ouro, explorad<strong>as</strong> em poços verticais<br />
e <strong>as</strong>sociad<strong>as</strong> a estrutur<strong>as</strong> habitacionais roman<strong>as</strong> e<br />
espólio com cronologia entre o século I e o IV 7 .<br />
Com o projecto augustano de reorganização<br />
administrativa <strong>da</strong> Hispânia, foi cria<strong>da</strong> por<br />
Augusto, em 16 a.C., a província <strong>da</strong> Lusitânia. Esta<br />
reestruturação abarcou <strong>as</strong>pectos tais como a<br />
fun<strong>da</strong>ção de civitates e delimitação <strong>do</strong>s territórios<br />
d<strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des 8 .<br />
Segun<strong>do</strong> um mapa d<strong>as</strong> civitates publica<strong>do</strong> pelo<br />
professor J. Alarcão 9 os territórios <strong>da</strong> civitate de<br />
seriam delimita<strong>do</strong>s a n<strong>as</strong>cente pelo rio<br />
Chança ou um pouco mais para oriente, “pelos festos<br />
<strong>do</strong>s principais acidentes de terreno que <strong>as</strong>sinalam o<br />
início <strong>do</strong> Andévalo” 10 na actual província de Huelva.<br />
Era também a oriente que oriental, que se fazia a<br />
confrontação <strong>do</strong>s territórios d<strong>as</strong> provínci<strong>as</strong> <strong>da</strong><br />
Lusitânia com os <strong>da</strong> Bética. Para os geógrafos antigos,<br />
designa<strong>da</strong>mente Plínio e Pompónio Mela, a separação<br />
<strong>da</strong> Lusitânia e <strong>da</strong> Bética era feita pelo rio An<strong>as</strong>.<br />
No entanto, a moderna investigação demonstrou de<br />
maneira inequívoca, por diferentes indícios, que uma<br />
parte <strong>do</strong>s territórios <strong>da</strong> margem esquer<strong>da</strong> <strong>do</strong> rio<br />
Guadiana pertencia, de facto à Lusitânia 11 .<br />
A Norte, os limites <strong>do</strong> territorium de <br />
confrontava com o de Pax Iulia. Seriam <strong>as</strong> ribeir<strong>as</strong><br />
de Terges e Cobres, desaguan<strong>do</strong> junt<strong>as</strong> no rio<br />
<br />
du<strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des. Na margem esquer<strong>da</strong> deste rio, os<br />
limites p<strong>as</strong>sariam pela ribeira de Lim<strong>as</strong>, hidrónimo<br />
que possivelmente deriva <strong>da</strong> palavra latina “limes”,<br />
prolongan<strong>do</strong>-se por uma linha de relevos integra<strong>do</strong>s<br />
na serra de Serpa 12 .<br />
A Sul, a ribeira <strong>do</strong> V<strong>as</strong>cão e <strong>as</strong> serrani<strong>as</strong> <strong>da</strong> Serra<br />
<br />
de <strong>do</strong> de Balsa, pois ain<strong>da</strong> hoje essa zona<br />
delimita <strong>as</strong> provínci<strong>as</strong> <strong>do</strong> Alentejo e <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>.<br />
<br />
<br />
parece ser esse o c<strong>as</strong>o <strong>do</strong>s limites territoriais de<br />
Mértola, no que concerne a fronteira a poente. Em<br />
primeiro lugar são qu<strong>as</strong>e inexistentes os acidentes<br />
geomorfológicos que delimitem uma fronteira. A<br />
fronteira, a existir, poder-se-ia ter localiza<strong>do</strong> em<br />
torno d<strong>as</strong> designad<strong>as</strong> mat<strong>as</strong> de Almodôvar, como<br />
refere o foral de 1239. A existência de topónimos<br />
como Salto e Entrad<strong>as</strong> (C<strong>as</strong>tro Verde), sugerem<br />
uma possível área de delimitação <strong>do</strong>s territórios<br />
<strong>da</strong> civita mirtilense para Oeste. No entanto,<br />
serão suposições apen<strong>as</strong>, pois é ain<strong>da</strong> duvi<strong>do</strong>sa a<br />
localização de Arannis ou Arandis 13 : 363) (que se<br />
situaria na região de Ourique, Colos, Santa Luzia<br />
ou Garvão), ci<strong>da</strong>de cujo território confrontaria<br />
com o de Este antigo território de <br />
corresponderia, grosso mo<strong>do</strong>, à área <strong>do</strong> actual<br />
concelho de Mértola.<br />
7<br />
DOMERGUE, C. 1987, p. 504.<br />
8<br />
LOPES, C., et alli, 1998, p. 135.<br />
9<br />
ALARCÃO. J., 1990, p. 367.<br />
10<br />
PÉREZ MACIAS, 1986, p.18<br />
11<br />
FABIÃO, C., 1992, p. 261.<br />
12<br />
LOPES, C., 1996, p. 67.<br />
13<br />
ALARCÃO, J., 1990, p. 363.<br />
48 AS VIAS DO ALGARVE
<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> de<br />
comunicação<br />
O rio Guadiana terá funciona<strong>do</strong>, mesmo antes e<br />
“durante a I<strong>da</strong>de <strong>do</strong> Ferro, muito provavelmente, como<br />
um caminho comercial, ligan<strong>do</strong> directamente o litoral<br />
algarvio aos distritos mineiros <strong>do</strong> Baixo Alentejo” 14 .<br />
<br />
troço navegável <strong>do</strong> Guadiana, era o centro onde<br />
<br />
mineração. Tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> embarcações <strong>da</strong> época, à vela<br />
e a remo, esperan<strong>do</strong> embora a praia-mar para o<br />
atravessamento de <strong>do</strong>is perigosos baixios existentes<br />
n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des <strong>da</strong> locali<strong>da</strong>de, abicavam no areal<br />
junto à Porta <strong>da</strong> Ribeira onde eram calafetad<strong>as</strong> a seco<br />
antes <strong>da</strong> viagem de regresso 15 . Entretanto, a partir <strong>do</strong><br />
século III d. C., com a quebra de produção d<strong>as</strong> min<strong>as</strong><br />
<br />
merca<strong>do</strong> agrícola dirigi<strong>do</strong> ao ab<strong>as</strong>tecimento d<strong>as</strong><br />
principais metrópoles <strong>do</strong> Mediterrâneo. Pax Iulia<br />
mantinha-se como a capital <strong>do</strong> v<strong>as</strong>to Conventus, e<br />
n<strong>as</strong> su<strong>as</strong> imediações desenvolvem-se na centúria<br />
seguinte luxuos<strong>as</strong> villae como Pisões ou S. Cucufate.<br />
As su<strong>as</strong> terr<strong>as</strong> férteis produziam vinho, azeite e<br />
trigo, cujos excedentes eram escoa<strong>do</strong>s por Mértola,<br />
cujo porto tinha vantagens relativamente aos <strong>da</strong><br />
costa atlântica, como Sines aos <strong>da</strong> foz <strong>do</strong> Sa<strong>do</strong>,<br />
bati<strong>do</strong>s por um mar sazonalmente muito agressivo;<br />
pelo contrário, o Guadiana permitia uma navegação<br />
qu<strong>as</strong>e permanente (excepto em altur<strong>as</strong> de chei<strong>as</strong><br />
torrenciais).<br />
A principal via de comunicação era, sem dúvi<strong>da</strong>, o<br />
rio Guadiana. Junto à sua margem encontra-se to<strong>do</strong><br />
um rico povoamento de que se destacam a villae<br />
<strong>do</strong> Álamo, onde ain<strong>da</strong> são visíveis restos de uma<br />
barragem romana, <strong>do</strong> Montinho d<strong>as</strong> Laranjeir<strong>as</strong> ou<br />
ain<strong>da</strong> o sítio de Vale de Condes para citar alguns<br />
<strong>do</strong>s mais importantes.<br />
<br />
de uma estra<strong>da</strong> paralela ao rio Guadiana. A atestar a<br />
existência <strong>do</strong> traça<strong>do</strong> terrestre, vários autores referem<br />
o Itinerário de Antonino e a <strong>do</strong> Anónimo<br />
de Ravena. Segun<strong>do</strong> est<strong>as</strong> fontes, são praticamente<br />
coincidentes os traça<strong>do</strong>s d<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> e na<br />
que percorreria o vale <strong>do</strong> Guadiana 16 .<br />
<br />
a 40 milh<strong>as</strong> de C<strong>as</strong>tro Marim” 17 e apresenta um<br />
traça<strong>do</strong> coincidente com o <strong>da</strong> actual estra<strong>da</strong><br />
nacional. Da mesma opinião partilha V. Mant<strong>as</strong> que<br />
refere “a primeira dest<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> partia de C<strong>as</strong>tro<br />
Marim (Baesuris), tocan<strong>do</strong> em Mértola (),<br />
de onde seguia directamente para a capital <strong>do</strong><br />
Conuentus Pacensis. Designa<strong>da</strong> pelo Itinerário de<br />
Antonino (431, 4-7) como per compendium, ou<br />
seja pelo caminho mais curto” 18 . O facto <strong>do</strong> autor<br />
clássico indicar o percurso em milh<strong>as</strong> e não em<br />
<br />
marítimos, leva o autor a garantir a existência<br />
dessa estra<strong>da</strong>. No entanto, são conhecid<strong>as</strong> de<br />
<br />
a serra algarvia pelos caminhos actuais. O relevo<br />
é, de facto, extremamente ondula<strong>do</strong> e acidenta<strong>do</strong>,<br />
sen<strong>do</strong> frequentes os pequenos cursos de água<br />
<br />
<strong>da</strong> construção d<strong>as</strong> modern<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong>, que teve<br />
lugar apen<strong>as</strong> nos inícios <strong>do</strong> século XX. Apesar<br />
d<strong>as</strong> referênci<strong>as</strong> <strong>do</strong> Itinerário de Antonino a esta<br />
estra<strong>da</strong> romana junto ao Guadiana, esta carece<br />
<br />
arqueológic<strong>as</strong> realizad<strong>as</strong> recentemente na<br />
margem esquer<strong>da</strong> <strong>do</strong> rio Guadiana por equip<strong>as</strong> de<br />
14<br />
TORRES, C., 1992 p. 198; ARRUDA, A. M., 1997, p. 117.<br />
15<br />
TORRES, C., 1998, pp. 7-8.<br />
16<br />
HERÁS, J. M, R., 1975, p 79.<br />
17<br />
VIANA, A., 1960, p .214.<br />
18<br />
MANTAS, V., 1997, p. 315.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 49
arqueólogos espanhóis, apontam para a existência<br />
de uma rede viária romana, que inclui restos de<br />
pontes, parecen<strong>do</strong> obedecer à mesma lógica<br />
de escoamento <strong>do</strong>s minerais e ao seu sequente<br />
<br />
paralelo ao rio m<strong>as</strong> procurava pôr em contacto <strong>as</strong><br />
zon<strong>as</strong> mineir<strong>as</strong> <strong>da</strong> serra com os embarca<strong>do</strong>iros<br />
localiza<strong>do</strong>s n<strong>as</strong> margens <strong>do</strong> rio 19 .<br />
As villae localizad<strong>as</strong> n<strong>as</strong> margens teriam entre si<br />
ligações terrestres, m<strong>as</strong>, é evidente que seria mais<br />
<br />
terrestre. Insiste-se, como nos diz Cláudio Torres, em<br />
encontrar uma calça<strong>da</strong> ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> que seria a grande<br />
<br />
serra algarvia nunca foi atravessa<strong>da</strong> por nenhuma<br />
via em época romana. Apen<strong>as</strong> caminhos de pé posto,<br />
de uso vicinal e controlad<strong>as</strong> pel<strong>as</strong> comuni<strong>da</strong>des<br />
serran<strong>as</strong> que existiriam na serra algarvia 20 . De facto,<br />
a ligação entre Baesuris e Pax Iulia parece-nos mais<br />
<br />
<strong>da</strong>qui para a capital <strong>do</strong> conventus por uma ligação<br />
<br />
de excluir a existência de uma informação erra<strong>da</strong>,<br />
no que a esta questão diz respeito, <strong>da</strong> p<strong>as</strong>sagem<br />
<strong>do</strong> Itinerário Antonino: Baesuris Pace Iulia per<br />
compendium. Se entendermos por per compendium<br />
pelo caminho mais curto, na acepção que A. Viana<br />
utilizou, este será certamente pelo rio.<br />
<br />
rápid<strong>as</strong>, mais barat<strong>as</strong> e segur<strong>as</strong> que <strong>as</strong> terrestres,<br />
foi certamente pelo rio que se processou o tráfego<br />
de merca<strong>do</strong>ri<strong>as</strong> pesad<strong>as</strong> e de matéri<strong>as</strong>-prim<strong>as</strong><br />
vind<strong>as</strong> de grandes distânci<strong>as</strong>.<br />
No que respeita às vi<strong>as</strong> de comunicação terrestres<br />
existentes, o percurso principal era o que ligava<br />
a ci<strong>da</strong>de de à capital regional, Pax Iulia<br />
(Beja). Esta estra<strong>da</strong> saía de Mértola através <strong>da</strong><br />
p<strong>as</strong>sagem que existiu até à déca<strong>da</strong> de 70 <strong>do</strong> século<br />
XX no Cerro <strong>do</strong> Fura<strong>do</strong>uro e <strong>da</strong> qual apen<strong>as</strong> existe<br />
<br />
A via ain<strong>da</strong> é reconhecível arqueologicamente na zona<br />
<br />
19<br />
GALÁN BENDALA, M., 1988, p. 40, fig. 2.<br />
20<br />
TORRES C., 1992, pp. 190-191.<br />
de calça<strong>da</strong> com lajes de xisto ou cortes longitudinais<br />
feitos na rocha b<strong>as</strong>e; segue depois em direcção às<br />
povoações de Corte Gafo de Baixo e Monte Mosteiro.<br />
Neste local atravessaria os vaus existentes na Ribeira<br />
de Terges e Cobres, seguin<strong>do</strong> depois para Salva<strong>da</strong> e,<br />
<br />
De Mértola seguia uma outra variante que p<strong>as</strong>sava<br />
na Acha<strong>da</strong> de S. Seb<strong>as</strong>tião e se juntava à estra<strong>da</strong> que<br />
ligava a Pax Iulia. Este caminho secundário<br />
acompanhava a margem <strong>do</strong> Guadiana até ao<br />
<br />
de Évora. Neste ponto ligava-se à via principal, que<br />
p<strong>as</strong>sava junto ao Rossio <strong>do</strong> Carmo, e prosseguia<br />
para o interior. Na p<strong>as</strong>sagem <strong>da</strong> ribeira de Terges e<br />
Cobres não existe qualquer vestígio de ponte, pelo<br />
que a p<strong>as</strong>sagem para a outra margem se devia fazer<br />
pelos vaus, que dependiam d<strong>as</strong> époc<strong>as</strong> <strong>do</strong> ano e <strong>da</strong><br />
quanti<strong>da</strong>de de água que a ribeira levava. Nos vaus,<br />
a p<strong>as</strong>sagem era facilita<strong>da</strong>, pois são zon<strong>as</strong> onde<br />
<strong>as</strong> águ<strong>as</strong> d<strong>as</strong> ribeir<strong>as</strong>, apesar de poderem levar<br />
<br />
a largura d<strong>as</strong> margens (estes locais de travessia<br />
ain<strong>da</strong> são usa<strong>do</strong>s nos di<strong>as</strong> de hoje). A travessia<br />
estava também facilita<strong>da</strong> pelo facto dest<strong>as</strong> zon<strong>as</strong><br />
propiciarem a acumulação de c<strong>as</strong>calheir<strong>as</strong>, crian<strong>do</strong><br />
p<strong>as</strong>sagens naturais. Vários são os locais que<br />
permitem a p<strong>as</strong>sagem <strong>da</strong> ribeira de Terges e Cobres,<br />
nomea<strong>da</strong>mente a ligação pela Amen<strong>do</strong>eira <strong>da</strong> Serra,<br />
Porto <strong>da</strong> Salva<strong>da</strong> (na margem Sul) seguin<strong>do</strong> na<br />
direcção <strong>do</strong> Monte <strong>do</strong> Pica Milho, a margem norte<br />
<strong>da</strong> ribeira são visíveis marc<strong>as</strong> <strong>do</strong>s ro<strong>da</strong><strong>do</strong>s deixad<strong>as</strong><br />
na rocha. Deve salientar-se, no entanto, que este<br />
<br />
ser enquadra<strong>do</strong> cronologicamente, pois como se<br />
referiu anteriormente, eles são utiliza<strong>do</strong>s, na sua<br />
maioria, como local de p<strong>as</strong>sagem até aos nossos<br />
di<strong>as</strong>, poden<strong>do</strong> por isso ser o vestígio de uma época<br />
posterior, o que não invali<strong>da</strong>, antes pelo contrário,<br />
a vantagem destes locais para ultrap<strong>as</strong>sagem<br />
deste obstáculo natural. Para além desta p<strong>as</strong>sagem<br />
existem mais du<strong>as</strong> de característic<strong>as</strong> semelhantes:<br />
a <strong>do</strong> Monte Mosteiro, atravessan<strong>do</strong> a ribeira no Vale<br />
de Russins, e ain<strong>da</strong> uma outra, designa<strong>da</strong> por Água<br />
Salga<strong>da</strong>. Est<strong>as</strong> p<strong>as</strong>sagens não apresentam quaisquer<br />
vestígios de rod<strong>as</strong> de carros ou carroç<strong>as</strong>.<br />
Para além desta via de maior envergadura existiam<br />
50 AS VIAS DO ALGARVE
outros <strong>do</strong>is grandes eixos viários de ligação de<br />
Mértola ao interior alentejano: um primeiro, em<br />
direcção às principais min<strong>as</strong> <strong>da</strong> faixa piritosa<br />
ibérica, nomea<strong>da</strong>mente Vip<strong>as</strong>ca (Aljustrel); e um<br />
segun<strong>do</strong> que punha em contacto a antiga <br />
com <strong>as</strong> locali<strong>da</strong>des existentes a n<strong>as</strong>cente, na<br />
margem esquer<strong>da</strong> <strong>do</strong> Guadiana.<br />
<br />
seu trecho inicial diz respeito, é indissociável <strong>da</strong><br />
exploração mineira de S. Domingos, <strong>da</strong> intensa lavra<br />
leva<strong>da</strong> a cabo no local e consequente transporte <strong>do</strong>s<br />
.<br />
N<strong>as</strong> imediações de Mértola existem vestígios <strong>do</strong><br />
antigo traça<strong>do</strong> dest<strong>as</strong> vi<strong>as</strong>. Quer a via <br />
-Pax Iulia, como a que ligava a primeira dest<strong>as</strong><br />
ao complexo mineiro <strong>da</strong> Serra de S. Domingos,<br />
possuíam uma largura que variava entre os três e<br />
os quatro metros. A via partia de Além-Rio, junto<br />
à margem esquer<strong>da</strong> <strong>do</strong> rio Guadiana e serpenteia,<br />
pelo sopé e a meia encosta, os cerros vizinhos. Por<br />
<br />
utiliza<strong>do</strong> depois frequentemente, na execução de<br />
pavimentos. Nalguns sítios subsistem os grandes<br />
taludes de pedra e terra que a sustinham e que<br />
<br />
se implantou. Estes taludes atingem mais de <strong>do</strong>is<br />
metros de altura, sen<strong>do</strong> ain<strong>da</strong> perceptíveis, junto <strong>do</strong>s<br />
mesmos, <strong>as</strong> val<strong>as</strong> que recebiam <strong>as</strong> águ<strong>as</strong> pluviais e<br />
<strong>as</strong> canalizavam, por vezes subterraneamente, para<br />
<strong>as</strong> berm<strong>as</strong> <strong>da</strong> referi<strong>da</strong> calça<strong>da</strong>.<br />
Na maior parte <strong>da</strong> extensão reconheci<strong>da</strong>, <strong>as</strong> vi<strong>as</strong> são<br />
pavimentad<strong>as</strong> com lajes de xisto e terra compacta<strong>da</strong><br />
com pequen<strong>as</strong> pedr<strong>as</strong>. Tem alguns pequenos troços<br />
e por razão <strong>da</strong> própria natureza <strong>do</strong> solo, o pavimento<br />
é a própria rocha b<strong>as</strong>e, o xisto. Em alguns pontos <strong>do</strong><br />
traça<strong>do</strong> são visíveis os sulcos longitudinais provoca<strong>do</strong>s<br />
pelos ro<strong>da</strong><strong>do</strong>s <strong>do</strong>s carros que por ela circulavam.<br />
Na direcção de Almodôvar, a via de ligação de<br />
Mértola ao interior alentejano, poderia ser feita<br />
directamente pela transposição <strong>da</strong> ribeira de Oeir<strong>as</strong>,<br />
n<strong>as</strong> imediações de Mértola, e quan<strong>do</strong> necessário,<br />
a p<strong>as</strong>sagem desta mesma ribeira poderia ser feita<br />
a norte de Mértola, no Portinho de Alcácer, local<br />
onde é visível um empedra<strong>do</strong> no leito <strong>da</strong> ribeira<br />
e uma p<strong>as</strong>sagem proporciona<strong>da</strong> pela colocação<br />
de pedr<strong>as</strong> na vertical. Transposto este maior<br />
obstáculo, a via seguia grosso mo<strong>do</strong> pelo traça<strong>do</strong><br />
<strong>da</strong> actual estra<strong>da</strong> Nacional 267, até Sra. <strong>da</strong> Graça<br />
<strong>do</strong>s Padrões e <strong>da</strong>í para Almodôvar.<br />
A via Mértola - C<strong>as</strong>tro Verde, que prosseguia para<br />
Aljustrel, poderia seguir o mesmo traça<strong>do</strong> <strong>da</strong> via de<br />
ligação até Pax Iulia, inverten<strong>do</strong> para a esquer<strong>da</strong> na<br />
zona <strong>da</strong> serra de Alcaria, prosseguin<strong>do</strong> na direcção<br />
de Entrad<strong>as</strong>, onde os caminhos se bifurcariam:<br />
um seguin<strong>do</strong> na direcção de Aljustrel e outro na<br />
direcção de C<strong>as</strong>tro Verde.<br />
A rede viária <strong>da</strong> região remonta, em grande parte, ao<br />
perío<strong>do</strong> pré-romano. A chega<strong>da</strong> d<strong>as</strong> legiões e uma<br />
nova lógica de gestão <strong>do</strong> territorial e de exploração<br />
<strong>do</strong>s naturais levou a que os traça<strong>do</strong>s e pavimento d<strong>as</strong><br />
vi<strong>as</strong> fossem remodela<strong>do</strong>s e melhora<strong>do</strong>s. Tais obr<strong>as</strong>,<br />
normalmente de grande quali<strong>da</strong>de, e a persistência<br />
de circuitos económicos e de mo<strong>do</strong>s de vi<strong>da</strong>,<br />
contribuíram para a longevi<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s caminhos,<br />
não só no perío<strong>do</strong> medieval como em époc<strong>as</strong> mais<br />
recentes. De tal mo<strong>do</strong> marcaram a paisagem que<br />
alguns deles são, ain<strong>da</strong> hoje, utiliza<strong>do</strong>s 21 .<br />
21<br />
Texto a<strong>da</strong>pta<strong>do</strong> de LOPES, V., 2003, p, 38.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 51
52 AS VIAS DO ALGARVE
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Verde, pp. 8- 28.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 53
.VIII CAMINHOS ANTIGOS, PERCURSOS MODERNOS<br />
JOSÉ D’ENCARNAÇÃO<br />
Universi<strong>da</strong>de de Coimbra<br />
Presumo<br />
Procura fazer-se um paralelo entre <strong>as</strong> vered<strong>as</strong><br />
antig<strong>as</strong> e <strong>as</strong> auto-estrad<strong>as</strong> <strong>do</strong>s nossos di<strong>as</strong>, o seu<br />
<br />
perigos e a forma de os esconjurar.<br />
Ao longo <strong>do</strong>s tempos, sempre <strong>as</strong> vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong><br />
– com seus miliários, pontes, calçad<strong>as</strong>... –<br />
interessaram os estudiosos. E disso se traça,<br />
aqui, breve panorâmica, p<strong>as</strong>sean<strong>do</strong>-nos um<br />
pouco por to<strong>do</strong> o País, m<strong>as</strong> deten<strong>do</strong>-nos mais na<br />
Geira, a Via Nova, que ligava Bracara Augusta a<br />
Asturica Augusta (Braga a Astorga), onde parece<br />
que o Romano fez ‘sementeira’ de miliários, para<br />
<br />
desses marcos com nome de impera<strong>do</strong>res e<br />
número de milh<strong>as</strong> – bem diferentes <strong>do</strong>s marcos<br />
quilométricos <strong>do</strong>s nossos di<strong>as</strong>...<br />
Curiosamente, era a Geira a Via XVII – e nós temos,<br />
hoje, a A23, o IC5, o IP3... Pouco mu<strong>do</strong>u nesse<br />
<strong>as</strong>pecto, embora noutros a transformação seja<br />
total: deixámos de saborear o petisco típico e<br />
paramos, agora, em estações de serviço, p<strong>as</strong>sad<strong>as</strong><br />
a papel químico. Diferentes seriam, em tempo de<br />
Romanos, <strong>as</strong> mutationes, estações de mu<strong>da</strong>, para<br />
fugaz troca de monta<strong>da</strong>; ou <strong>as</strong> mansiones, <strong>as</strong><br />
«mansões» ou «pousad<strong>as</strong>», lugar de poiso de um<br />
dia para o outro, com term<strong>as</strong> incorporad<strong>as</strong> para<br />
nos lavarmos <strong>da</strong> poeira<strong>da</strong> <strong>do</strong> caminho...<br />
E veneramos a nossa «calçadinha», pretexto para<br />
este encontro, numa lição de preservação d<strong>as</strong><br />
vered<strong>as</strong> que nossos antep<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>s calcorrearam... 1<br />
a consciencialização<br />
15 de Novembro de 2004. Uma povoação <strong>do</strong> Norte<br />
<strong>do</strong> País insurgiu-se e teve honr<strong>as</strong> de telejornal, porque<br />
o traça<strong>do</strong> previsto para mais uma auto-estra<strong>da</strong><br />
iria destruir um cruzeiro antigo e considerável troço<br />
<strong>do</strong> caminho de Santiago…<br />
Seguramente não haveria melhor forma de iniciar<br />
<br />
modernos”, <strong>do</strong> que este episódio, aparentemente<br />
<br />
ilusório conserva<strong>do</strong>rismo atávico, qual «velho <strong>do</strong><br />
Restelo» braman<strong>do</strong> contra a «glória de man<strong>da</strong>r»<br />
e a «vã cobiça». Para o canal televisivo, decerto,<br />
apen<strong>as</strong> mais uma acha na fogueira <strong>do</strong> nosso<br />
<br />
E até, cerimoniosamente, o Sr. Presidente <strong>da</strong> Junta<br />
de Freguesia perorou, reclaman<strong>do</strong> tradições,<br />
alvitran<strong>do</strong> alternativ<strong>as</strong>, discutin<strong>do</strong> decisões de um<br />
Poder Central e macrocéfalo, que encomen<strong>da</strong>, para<br />
o efeito, pseu<strong>do</strong>-estu<strong>do</strong>s de impacte ambiental,<br />
<br />
<br />
Não seria notícia o protesto aqui há du<strong>as</strong><br />
dezen<strong>as</strong> de anos atrás. Primeiro, porque se não<br />
‘exploravam’ ain<strong>da</strong>, então, <strong>as</strong> manifestações de<br />
descontentamento; depois, porque «Caminho de<br />
Santiago» quem é que se importava com ele Não<br />
fora <strong>as</strong>sim uma rota de monges ou de empedernid<strong>as</strong><br />
1<br />
Esta investigação foi realiza<strong>da</strong> no quadro <strong>do</strong> projecto de investigação sobre o CIL XVII (corpus <strong>do</strong>s miliários romanos), <strong>do</strong> Centro de Estu<strong>do</strong>s Arqueológicos<br />
d<strong>as</strong> Universi<strong>da</strong>des de Coimbra e <strong>do</strong> Porto.<br />
54 AS VIAS DO ALGARVE
eat<strong>as</strong> em plena escuridão medieval Finalmente,<br />
auto-estra<strong>da</strong> era, nesse tempo, um ‘el<strong>do</strong>ra<strong>do</strong>’<br />
a facilitar comércios, a encurtar distânci<strong>as</strong>, a<br />
aproximar os mun<strong>do</strong>s, a partilhar festivi<strong>da</strong>des…<br />
Os tempos amadureceram, porém. Visto <strong>do</strong> ar, antes<br />
de concluí<strong>do</strong>, o troço <strong>da</strong> A13 em construção desde<br />
Santo Estêvão (Benavente) até Vila Franca de Xira<br />
(Ponte Salgueiro Maia) era traço de união coleante,<br />
ufano já <strong>do</strong>s seus viadutos e pontes, <strong>da</strong> faixa<br />
reluzente <strong>do</strong> alcatrão acabadinho de estender…<br />
Pode vir a ser também – visto com outros olhos<br />
– a longa cicatriz para sempre r<strong>as</strong>ga<strong>da</strong> na verde<br />
v<strong>as</strong>tidão <strong>da</strong> lezíria, habitua<strong>da</strong> apen<strong>as</strong> ao voo suave<br />
d<strong>as</strong> cegonh<strong>as</strong> e d<strong>as</strong> garç<strong>as</strong>, ao p<strong>as</strong>so cadencia<strong>do</strong><br />
<strong>da</strong> boia<strong>da</strong>, ao sossega<strong>do</strong> ramerrão de agricultores<br />
e campinos…<br />
Caminhos antigos, percursos modernos – por mais<br />
que o impacte se minimize (na teoria e na prática),<br />
certo é que ele vai existir sempre: no pensamento<br />
<br />
<strong>as</strong> vered<strong>as</strong> e <strong>as</strong> vi<strong>as</strong>:<br />
<strong>do</strong> aparente improviso<br />
à organização<br />
sistemática<br />
Seduzem-me <strong>as</strong> vered<strong>as</strong> por entre os matos –<br />
porque nunca vão em linha recta. Temos a sensação<br />
de que foi alguém tol<strong>da</strong><strong>do</strong> no espírito o primeiro<br />
que af<strong>as</strong>tou os carr<strong>as</strong>cos e <strong>as</strong> urzes e os troviscos e<br />
decidiu abrir o trilho. Não foi. Usou <strong>da</strong> inteligência,<br />
a<strong>da</strong>ptou-se ao terreno – como, de resto, hoje,<br />
apesar <strong>da</strong> técnica, também <strong>as</strong> auto-estrad<strong>as</strong> se<br />
a<strong>da</strong>ptam (ao terreno e aos interesses…).<br />
Recor<strong>do</strong>-me <strong>da</strong> longa conversa que tive com João<br />
Garcia, em Novembro de 2002, meses depois de<br />
ele ter escala<strong>do</strong> o Himalaia e toca<strong>do</strong> o Pico Evereste,<br />
em expedição de que se salvou por um triz.<br />
Também ali os trilhos ziguezagueavam e af<strong>as</strong>tar-se<br />
<br />
<strong>do</strong> trilho, <strong>do</strong> caminho – desde tempos imemoriais.<br />
D<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> desde sempre se louvou o<br />
esplen<strong>do</strong>r. O rigor técnico <strong>do</strong> traça<strong>do</strong>; a sóli<strong>da</strong><br />
imponência <strong>do</strong> piso; a majestade d<strong>as</strong> pontes;<br />
a soleni<strong>da</strong>de escrita <strong>do</strong>s miliários… Legiões<br />
<br />
sábio de centuriões, esforço hercúleo, carrean<strong>do</strong><br />
lajes, estruturan<strong>do</strong> camad<strong>as</strong>… Criara-se, <strong>as</strong>sim,<br />
uma «rede viária» – «To<strong>do</strong>s os caminhos vão <strong>da</strong>r<br />
<br />
su<strong>as</strong> trop<strong>as</strong> depressa cheg<strong>as</strong>sem aonde era preciso,<br />
para arreca<strong>da</strong>r impostos ou reprimir rebeliões, nos<br />
<br />
Daí o prestígio de um <strong>do</strong>s cargos preliminares <strong>do</strong><br />
vigintivirato senatorial: os quattuorviri viarum<br />
curan<strong>da</strong>rum. Aju<strong>da</strong>vam os edis na conservação d<strong>as</strong><br />
vi<strong>as</strong> <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de e, sobretu<strong>do</strong>, d<strong>as</strong> quatro principais<br />
que ab<strong>as</strong>teciam a Urbe: a Ápia (a grande obra<br />
de Appius Claudius Caecus), a Cássia, a Cimínia<br />
e a Clódia. Sabia-se que <strong>do</strong> seu bom esta<strong>do</strong> de<br />
conservação e <strong>da</strong> segurança pessoal que ofereciam<br />
dependia a normali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> em Roma no que<br />
<br />
o Itinerário, manancial<br />
sedutor e enigmático<br />
Daí a importância <strong>do</strong> Itinerário de Antonino 2 que, se<br />
calhar, aguar<strong>da</strong> agora um estu<strong>do</strong> perspicaz encara<strong>do</strong><br />
com <strong>as</strong> perspectiv<strong>as</strong> nov<strong>as</strong> <strong>do</strong> século XXI.<br />
2<br />
Sobre este <strong>do</strong>cumento, atribuí<strong>do</strong> à época <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r Caracala (198-217), é inúmera a bibliografia, atenden<strong>do</strong> a que abarca to<strong>do</strong> o Império Romano<br />
e, portanto, em ca<strong>da</strong> zona os respectivos investiga<strong>do</strong>res procuram fazer a identificação entre os topónimos aí regista<strong>do</strong>s e os vestígios actuais, quer<br />
arqueológicos quer toponímicos. Para uma ideia geral acerca <strong>da</strong> importância deste <strong>do</strong>cumento, poderá consultar-se, por exemplo, P. ARNAUD, «L’Itinéraire<br />
d’Antonin: um témoin de la littérature itinéraire du B<strong>as</strong>-Empire», Geographia Antiqua (Florença), 2, 1993, p. 33-49.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 55
E não lhe foram insensíveis os nossos estudiosos,<br />
desde Moreira de Figueire<strong>do</strong> – no que às vi<strong>as</strong><br />
d<strong>as</strong> Beir<strong>as</strong> diz respeito – a um Mário Saa, que<br />
calcorreou o País em busca de ci<strong>da</strong>des perdid<strong>as</strong>,<br />
de vestígios ancestrais, de cois<strong>as</strong> velh<strong>as</strong> <strong>da</strong> moirama…<br />
Muito encontrou, aliás – e disso é testemunho<br />
a preciosa colecção arqueológica guar<strong>da</strong><strong>da</strong> em sua<br />
c<strong>as</strong>a, no Erve<strong>da</strong>l, hoje transforma<strong>da</strong> em museu pela<br />
<br />
de ci<strong>da</strong>des inventou também – não fôssemos nós<br />
herdeiros de um André de Resende e, sobretu<strong>do</strong>, de<br />
<br />
«cautela» na sua leitura, espírito crítico, o que se<br />
poderá ter interpreta<strong>do</strong> como «maldição», anátema<br />
<br />
nem pie<strong>da</strong>de se contrapõe, hoje, a crítica serena,<br />
<br />
que uma placa de Abiul (Leiria), de onomástica bem<br />
estranha para ser ver<strong>da</strong>deira (aí se referia um…<br />
Sapidius<br />
facto, uma placa autêntica e constituía, inclusive,<br />
3 .<br />
Têm <strong>as</strong> Grandes Vi<strong>as</strong> <strong>da</strong> Lusitânia 4 um subtítulo<br />
dever<strong>as</strong> eluci<strong>da</strong>tivo: O Itinerário de Antonino<br />
Pio. De muito tem servi<strong>do</strong> esse Itinerário, para se<br />
proceder a uma reconstituição <strong>do</strong> mapa de Portugal<br />
sob o <strong>do</strong>mínio romano. Tarefa aliciante a que não<br />
resistiu Jorge de Alarcão logo na 1ª edição <strong>do</strong> seu<br />
Portugal Romano 5 , onde o capítulo «As vi<strong>as</strong> e os<br />
<br />
«De Aquae Flaviae para ocidente havia certamente<br />
outra estra<strong>da</strong> que servia <strong>as</strong> min<strong>as</strong> de ouro <strong>do</strong><br />
Poço d<strong>as</strong> Freit<strong>as</strong> e uma ci<strong>da</strong>de que parece ter si<strong>do</strong><br />
sede de diocese no século V ou VI: Beteca, talvez<br />
correspondente a Botic<strong>as</strong>. A estra<strong>da</strong> p<strong>as</strong>saria por<br />
Vale de Anta, P<strong>as</strong>toria, Sapiãos, Botic<strong>as</strong> e Altur<strong>as</strong><br />
de Barroso. Talvez continu<strong>as</strong>se para ocidente,<br />
entroncan<strong>do</strong> na via de Bracara a Asturica, m<strong>as</strong><br />
disso não temos prov<strong>as</strong>» (p. 103).<br />
Igualmente em O Domínio Romano em Portugal 6 ,<br />
são «As estrad<strong>as</strong>» o capítulo IV (p. 87-106). Aí,<br />
<br />
<br />
<br />
vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> de Portugal. Os nossos próprios<br />
traça<strong>do</strong>s, porém, terão de ser reexamina<strong>do</strong>s e não<br />
<br />
Insistimos nesta advertência, para que não se tome<br />
como traça<strong>do</strong> indiscutível aquilo que muit<strong>as</strong> vezes<br />
é hipotético» (p. 88).<br />
M<strong>as</strong>… agora reparo que deixei para trás Cristóvão<br />
Moreira de Figueire<strong>do</strong>. Nos volumes XI (1952) e XII<br />
(1953) <strong>da</strong> revista Beira Alta, inseriu um extenso<br />
artigo intitula<strong>do</strong> «Subsídios para o estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> viação<br />
romana d<strong>as</strong> Beir<strong>as</strong>»:<br />
«Vamos a seguir indicar o traça<strong>do</strong> de vári<strong>as</strong> vi<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong>, estrad<strong>as</strong> medievais, simples caminhos<br />
antigos de transumância ou de comércio <strong>da</strong><br />
antiga Beira», escreve Moreira de Figueire<strong>do</strong>, que<br />
acrescenta:<br />
«Este trabalho modesto, de compilação por vezes<br />
de estu<strong>do</strong>s já feitos, honra muitos <strong>do</strong>s autores<br />
cita<strong>do</strong>s e só por ignorância de matéria poderá<br />
atribuir-se a quem não pertença. Contém, no<br />
entanto, b<strong>as</strong>tantes acheg<strong>as</strong> ou not<strong>as</strong> inédit<strong>as</strong><br />
noss<strong>as</strong>, designa<strong>da</strong>mente <strong>as</strong> que se referem a<br />
nomes de povoações e estações arqueológic<strong>as</strong><br />
existentes nos percursos referi<strong>do</strong>s» (p. 318).<br />
um f<strong>as</strong>cínio particular<br />
<br />
f<strong>as</strong>cínio na investigação. Não admira, pois, que uma<br />
d<strong>as</strong> primeir<strong>as</strong> dissertações de <strong>do</strong>utoramento que<br />
o Professor Jorge de Alarcão orientou, a de V<strong>as</strong>co<br />
Gil Mant<strong>as</strong>, tenha por tema precisamente a que<br />
3<br />
José d’ENCARNAÇÃO, «A colecção epigráfica de Mário Saa no Erve<strong>da</strong>l», Humanit<strong>as</strong> XLVII 1995 629-645 (sobretu<strong>do</strong> p. 635-638).<br />
4<br />
Seis volumes publica<strong>do</strong>s em Lisboa desde 1956 a 1967.<br />
5<br />
Editorial Verbo, Lisboa, Fevereiro de 1974.<br />
6<br />
Publicações Europa-América, Mem Martins, 1988.<br />
56 AS VIAS DO ALGARVE
supomos ter si<strong>do</strong> uma d<strong>as</strong> mais importantes vi<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> território hoje nacional: a via que de<br />
Olisipo leva a Bracara 7 .<br />
E também na dissertação de João Luís <strong>da</strong> Inês<br />
Vaz 8 , <strong>as</strong> vi<strong>as</strong> que de Viseu partiam ocuparam papel<br />
<br />
aí se mantiveram até hoje <strong>do</strong>s mais bonitos e bem<br />
<br />
Evidentemente, <strong>da</strong> Geira nem falo – que outros,<br />
melhor que eu, saberão <strong>da</strong> multiplici<strong>da</strong>de de estu<strong>do</strong>s,<br />
<strong>da</strong> multiplici<strong>da</strong>de de intenções, <strong>do</strong> sem-número de<br />
projectos, de tantos que <strong>as</strong> investigaram, investigam<br />
e investigarão. Não posso deixar de recor<strong>da</strong>r, to<strong>da</strong>via,<br />
a obra Milliarios <strong>do</strong> Conventus Bracaraugustanus<br />
em Portugal <strong>do</strong> sau<strong>do</strong>so Padre Martins Capella<br />
(Porto, 1895), com reedição facsimila<strong>da</strong> em<br />
1987, precisamente o ano em que se celebrou,<br />
em Tarazona, um simpósio sobre La Red Viaria<br />
en la Hispania Romana, cuj<strong>as</strong> act<strong>as</strong> a Institución<br />
«Fernan<strong>do</strong> el Católico», de Zaragoza, viria a editar<br />
em 1990, a mesma instituição que acolherá, <strong>do</strong>is<br />
anos depois, a obra de Joaquín Lostal Pros, Los<br />
Miliarios de la Provincia Tarraconense. Aliás, esse<br />
ano de 1987 parece ter si<strong>do</strong> crucial nesses estu<strong>do</strong>s,<br />
pois então se publica, sob a responsabili<strong>da</strong>de de<br />
G. Ari<strong>as</strong> Bonet, o Repertorio de Caminos de la<br />
Hispania Romana, de 1987, cuja reedição (revista)<br />
foi publica<strong>da</strong> em 2004 – uma prova mais <strong>do</strong> interesse<br />
que esta problemática vem despertan<strong>do</strong>.<br />
<br />
Composto pelo Padre José de Mattos Ferreira,<br />
clerigo <strong>do</strong> Habito de São Pedro e natural <strong>da</strong><br />
Augusta ci<strong>da</strong>de de Braga<br />
M<strong>as</strong> que não vá o Norte sem resposta, pois que<br />
Luís Marinho de Azeve<strong>do</strong>, autor de uma obra sobre<br />
a Fun<strong>da</strong>ção, Antigui<strong>da</strong>des e Grandez<strong>as</strong> <strong>da</strong> Mui<br />
Insigne Ci<strong>da</strong>de de Lisboa e Seus Varões Ilustres em<br />
Santi<strong>da</strong>de, Arm<strong>as</strong> e Letr<strong>as</strong><br />
augustíssima majestade de el-rei D. José I», em 1753<br />
(trata-se <strong>da</strong> 2ª edição de uma obra <strong>do</strong> século XVII),<br />
tem, no livro III, o capítulo XXIV: «D<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> militares<br />
que de Lisboa saíam para Méri<strong>da</strong> e Braga, segun<strong>do</strong><br />
o Itinerário <strong>do</strong> Impera<strong>do</strong>r António [sic]». E explicita,<br />
desde logo, que «o principal intento com que est<strong>as</strong><br />
<br />
pretores e lega<strong>do</strong>s pudessem como<strong>da</strong>mente<br />
conduzir os exércitos a seus alojamentos e, por<br />
<br />
estes caminhos com rodeios, para que os sol<strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />
march<strong>as</strong>sem à sua vontade e os pretores visit<strong>as</strong>sem<br />
os lugares que governavam, tocan<strong>do</strong> em to<strong>do</strong>s<br />
os principais, ain<strong>da</strong> que estivessem desvia<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />
caminho direito» (p. 92).<br />
Regressemos à Geira. Miliários no sítio, miliários<br />
desloca<strong>do</strong>s… um aqui, outro acolá, mais além um<br />
M<strong>as</strong> – voltan<strong>do</strong> um pouco atrás – também a Câmara<br />
de Terr<strong>as</strong> de Bouro não deixara de, em Abril de<br />
1982, <strong>da</strong>r à estampa o curiosíssimo Thesouro de<br />
Braga descuberto no Campo <strong>do</strong> Gerez, em que<br />
se manifestão settenta e quatro padrões que<br />
na estra<strong>da</strong> imperial <strong>da</strong> Geira, e Gerez <strong>da</strong> parte<br />
<br />
descubrirão, obr<strong>as</strong> maravilhos<strong>as</strong> <strong>do</strong>s Empera<strong>do</strong>res<br />
<br />
tirad<strong>as</strong> de notíci<strong>as</strong> e memori<strong>as</strong> cert<strong>as</strong> in<strong>da</strong>gad<strong>as</strong><br />
<br />
Figura 1<br />
Miliários na Geira<br />
7<br />
V<strong>as</strong>co Gil <strong>da</strong> Cruz Soares MANTAS, A Rede Viária Romana <strong>da</strong> Faixa Atlântica entre Lisboa e Braga. Facul<strong>da</strong>de de Letr<strong>as</strong> <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de de Coimbra,<br />
1996. 2 volumes, policopia<strong>do</strong>s.<br />
8<br />
A Civit<strong>as</strong> de Viseu – Espaço e Socie<strong>da</strong>de¸ Coimbra, 1997 (sobretu<strong>do</strong> p. 371-402).<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 57
9<br />
<br />
m miliário<br />
reaproveita<strong>do</strong>, qual alminha a abraçar vian<strong>da</strong>nte, nos<br />
parece – de braços abertos m<strong>as</strong> prega<strong>do</strong>s no madeiro<br />
<br />
<br />
Romanos Pergunta inteiramente estulta para<br />
quem, na déca<strong>da</strong> de 60 <strong>do</strong> século p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>, por<br />
exemplo, demand<strong>as</strong>se Bragança i<strong>do</strong> por Murça:<br />
não era impressionante aquele serpentear lajea<strong>do</strong><br />
pel<strong>as</strong> encost<strong>as</strong>… Questão inteiramente impensável<br />
para quem serenamente se tenha p<strong>as</strong>sea<strong>do</strong> já pela<br />
ponte de Chaves ou pela de Salamanca ou pela <strong>da</strong><br />
<br />
arcaboiço,<br />
<br />
que se preza quer ter a sua via romana. Até São<br />
Brás de Alportel, que dispõe de uma «calçadinha»<br />
de tempos modernos, fez dela o seu ex-libris de<br />
antigui<strong>da</strong>de, pois há fortes indícios de ter si<strong>do</strong><br />
implanta<strong>da</strong> sobre a antiga via (ou um diverticulum<br />
dela…) que, de Ossónoba, se embrenhava pela<br />
Serra em direcção a Vip<strong>as</strong>ca e a Pax Iulia 10 .<br />
Um f<strong>as</strong>cínio de antigui<strong>da</strong>de, portanto, de raízes –<br />
que por aqui se p<strong>as</strong>sava, por aqui se p<strong>as</strong>sou, gente,<br />
11 Havia comércio, for<strong>as</strong>teiros que<br />
paravam, alguns descansariam também e mu<strong>da</strong>riam<br />
<br />
Lembro-me <strong>da</strong> Ponderosa, ponto de paragem<br />
obrigatório na Estra<strong>da</strong> Nacional nº 1, após <strong>as</strong><br />
cansativ<strong>as</strong> curv<strong>as</strong> de Alenquer. Hoje, a auto-estra<strong>da</strong><br />
<br />
<strong>as</strong>sa<strong>da</strong> <strong>do</strong> Bigodes, à Ven<strong>da</strong> d<strong>as</strong> Raparig<strong>as</strong>. Safou-se<br />
Canal Caveira, ao que se diz – que mais forte que<br />
<strong>as</strong> press<strong>as</strong> é a delícia <strong>do</strong> seu cozi<strong>do</strong> à portuguesa<br />
e os livros de poesia popular de mestre cauteleiro,<br />
Alexandre Sobral Lourenço, que já vai no IX volume,<br />
É muito bonito ser poeta («Com 220 quadr<strong>as</strong> de<br />
40 pontos», Agosto 2002):<br />
«Para a estra<strong>da</strong> não vou<br />
De conduzir tenho me<strong>do</strong><br />
Há condutores malucos<br />
Para morrer acho ce<strong>do</strong>». (p. 199)<br />
E chegámos ao cerne <strong>da</strong> questão: a economia.<br />
Impingem-nos hoje <strong>as</strong> áre<strong>as</strong> de serviço e algum<strong>as</strong>,<br />
até, já começam a perceber que o ‘plástico’ acaba<br />
por não atrair e vão optan<strong>do</strong> por simpátic<strong>as</strong><br />
alternativ<strong>as</strong> c<strong>as</strong>eir<strong>as</strong>. A economia, motor <strong>do</strong><br />
lançamento de uma auto-estra<strong>da</strong>, <strong>da</strong> alteração<br />
<strong>do</strong> seu traça<strong>do</strong>, <strong>do</strong>s miliários ou… <strong>do</strong>s modernos<br />
painéis que nel<strong>as</strong> se quer implantar… 12<br />
Figura 2<br />
A preparação <strong>da</strong> pedra, <strong>do</strong>nde se cortaria o miliário,<br />
à beira <strong>da</strong> própria via (Geira).<br />
9<br />
Um <strong>do</strong>s últimos trabalhos sobre os miliários <strong>da</strong> Geira deve-se a António Rodríguez Colmenero, Santiago Ferrer Sierra e Rubén D. Álvarez Asorey: Miliarios<br />
e Outr<strong>as</strong> Inscricións Viári<strong>as</strong> Roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> Noroeste Hispânico (Conventos Bracarense, Lucense e Asturicense), Consello <strong>da</strong> Cultura Gallega, 2004.<br />
10<br />
João Pedro BERNARDES e Luís Filipe OLIVEIRA, A “Calçadinha” de S. Brás de Alportel e a Antiga Rede Viária <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> Central, Câmara Municipal<br />
de S. Brás de Alportel, 2002. Ver também Sandra RODRIGUES, As Vi<strong>as</strong> Roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, Faro, 2004.<br />
11<br />
Notável, pelo méto<strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong> e pelo que significa como sistemática exploração <strong>do</strong> território envolvente <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Évora, é o livro de Francisco BILOU,<br />
O Sistema Viário Antigo na Região de Évora, que teve, em 2004, du<strong>as</strong> edições, uma del<strong>as</strong> significativamente patrocina<strong>da</strong> pela Comissão de Coordenação<br />
e Desenvolvimento Regional <strong>do</strong> Alentejo.<br />
12<br />
A luta que foi para a Brisa aceder a publicitar património cultural!…<br />
58 AS VIAS DO ALGARVE
miliários, pontes,<br />
divin<strong>da</strong>des…<br />
Já se sublinhou que a forma cilíndrica e a paginação<br />
<strong>do</strong> miliário romano, deixan<strong>do</strong> na superfície perpendicular<br />
ao eixo <strong>da</strong> via <strong>as</strong> palavr<strong>as</strong> mais importantes<br />
<br />
a imediata percepção <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> informativo <strong>da</strong><br />
epígrafe. 13 É hoje genericamente aceite a ideia de<br />
Pierre Salama 14 de que, a partir <strong>do</strong> século III, os<br />
miliários com o nome <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r em <strong>da</strong>tivo e sem<br />
menção de milh<strong>as</strong> <strong>as</strong>sumem funções preferentemen-<br />
<br />
por est<strong>as</strong> paragens e noutr<strong>as</strong>, o ambiente citadino<br />
<br />
vi<strong>as</strong> deteriam, teoricamente, mais ‘especta<strong>do</strong>res’<br />
ou especta<strong>do</strong>res mais atentos <strong>do</strong> que a ci<strong>da</strong>de,<br />
que, aliás, já não <strong>as</strong>sumiria, nessa época, um papel<br />
tão aglutina<strong>do</strong>r <strong>da</strong> população como outrora. Os<br />
proprietários d<strong>as</strong> villae – “antep<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>s”, digamos<br />
<strong>as</strong>sim, “<strong>do</strong>s senhores feu<strong>da</strong>is” – certamente iriam<br />
procuran<strong>do</strong> juntar em torno de si <strong>as</strong> gentes <strong>do</strong>s<br />
arre<strong>do</strong>res, quer para o seu prestígio pessoal quer<br />
para, através dessa atitude, não desprovi<strong>da</strong> de<br />
laivos culturais, como se sabe, obterem dividen<strong>do</strong>s<br />
económicos e políticos 15 .<br />
As pontes constituem, por seu turno, de há muito<br />
a esta parte, um outro quebra-cabeç<strong>as</strong> e um outro<br />
f<strong>as</strong>cínio. Roman<strong>as</strong> Medievais sobre estrutur<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong> De montanha, como a de Alcântara (e<br />
mesmo essa que é que tem de autenticamente<br />
romano e que será <strong>do</strong> tempo <strong>do</strong>s Reis Católicos),<br />
ou de planície, como a de Méri<strong>da</strong> (que, também<br />
<br />
16<br />
Figura 3<br />
Miliário de Braga, onde se apercebe claramente que a paginação era<br />
feita colocan<strong>do</strong> <strong>as</strong> palavr<strong>as</strong>-chave no eixo perpendicular à via: o nome<br />
principal <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r (HADRIAN), o número <strong>do</strong> seu poder tribunício,<br />
a identificação <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de a partir <strong>da</strong> qual se contavam <strong>as</strong> milh<strong>as</strong>, o<br />
número de milh<strong>as</strong> (M P XIII).<br />
13<br />
José d’ENCARNAÇÃO, «Miliários <strong>da</strong> Geira: informação e propagan<strong>da</strong>», Cadernos de Arqueologia 12-13 1995-1996 39-43.<br />
14<br />
Pierre SALAMA, «La parabole des milliaires chez Saint Augustin», L’ Africa Romana 6** 1989 697-707 (sobretu<strong>do</strong> p. 703-707: «La realité des bornes<br />
milliaires en Afrique». Contra: Robert ÉTIENNE, Le Culte Impérial <strong>da</strong>ns la Péninsule Ibérique d’Auguste à Dioclétien. Paris, 1974 (reimp.), p. 502-503<br />
– que cita Pierre SALAMA, «La colonie de Rusguniae d’après les inscriptions», Revue Africaine 99 1955 5-52. Ver também Pierre SALAMA, Bornes<br />
Milliaires d’ Afrique Proconsolaire (Un Panorama du B<strong>as</strong> Empire Romain), Roma, 1987.<br />
15<br />
O édito de Galieno, de 261, que, na prática, retirava aos sena<strong>do</strong>res efectivo poder político, pois implicava, segun<strong>do</strong> Aurélio Vítor (33, 39 e seg.; 37, 6),<br />
ne imperium ad optimos nobilium transferretur – «que o poder militar não p<strong>as</strong>s<strong>as</strong>se para <strong>as</strong> mãos <strong>do</strong>s melhores <strong>do</strong>s nobres» – acabou por ter como<br />
consequência que os sena<strong>do</strong>res “volt<strong>as</strong>sem à terra” e se dedic<strong>as</strong>sem à cultura, o que lhes aumenta o poder social. De resto, é devi<strong>do</strong> a esse contributo<br />
que se <strong>as</strong>siste, no século IV – como <strong>as</strong>sinala Jean GAGÉ (Les Cl<strong>as</strong>ses Sociales <strong>da</strong>ns l’Empire Romain, Paris, 1964, p. 250 e 262) - , a uma espécie de<br />
primeiro ren<strong>as</strong>cimento clássico e pagão e se <strong>as</strong>siste ao elogio <strong>da</strong> cultura e d<strong>as</strong> virtudes polític<strong>as</strong> (cf. V. NERI, «L’elogio della cultura e l’elogio delle virtù<br />
politiche nell’epigrafia latina del IV secolo d. C.», Epigraphica XLIII 1981 175-201).<br />
16<br />
Cf., neste mesmo volume e a propósito de to<strong>da</strong> esta problemática, a intervenção de João Pedro BERNARDES, «Existem pontes roman<strong>as</strong> no <strong>Algarve</strong>».<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 59
Os miliários, evidentemente (e opto apen<strong>as</strong> por<br />
dizer ‘miliário’ – e não “marco miliário” – seguin<strong>do</strong><br />
a sugestão de Justino Mendes de Almei<strong>da</strong>, que<br />
atribui ao vocábulo miliário um valor substantivo<br />
e não adjectival 17 ), por terem letr<strong>as</strong>, por a sua<br />
mensagem carecer de decifração, arvoram-<br />
-se em grandes “senhores” no estu<strong>do</strong> d<strong>as</strong> vi<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong>, inclusive porque, geralmente de granito<br />
e amiúde reutiliza<strong>do</strong>s e retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong> seu local<br />
original, sofreram escoriações que, em regra, lhes<br />
<br />
<br />
<br />
é o próprio a digladiar-se consigo mesmo, len<strong>do</strong><br />
hoje uma coisa e propon<strong>do</strong> no ano seguinte uma<br />
<br />
Concomitantemente à decifração, a interpretação:<br />
a necessi<strong>da</strong>de de – numa visão ampla, a nível<br />
de província, <strong>da</strong> Hispânia, <strong>da</strong> parte ocidental <strong>do</strong><br />
Império… – se perceberem polític<strong>as</strong> administrativ<strong>as</strong>,<br />
gestões macro-económic<strong>as</strong>, pois a via é elo<br />
de cadeia e só <strong>as</strong>sim se pode cabalmente compreender,<br />
como se preconiza a propósito <strong>da</strong> obra de<br />
Elena Banzi, <br />
Storica (De Boccard, Paris, 1999):<br />
«A leitura crítica d<strong>as</strong> su<strong>as</strong> inscrições, se se tiver<br />
<br />
sua situação e <strong>do</strong> meio político e cultural que os<br />
produziu, fornece, amiúde, elementos essenciais<br />
para a reconstituição e destino <strong>do</strong>s itinerários ao<br />
longo <strong>do</strong>s quais foram implanta<strong>do</strong>s. Poder-se-ão<br />
determinar, desta sorte, os perío<strong>do</strong>s de utilização<br />
mais intensa, eventuais f<strong>as</strong>es de aban<strong>do</strong>no, <strong>as</strong><br />
razões que induziram <strong>as</strong> autori<strong>da</strong>des roman<strong>as</strong> a<br />
“abrir” certos itinerários e a cui<strong>da</strong>r deles com mais<br />
atenção» 18 .<br />
A descoberta d<strong>as</strong> mansiones ou d<strong>as</strong> mutationes<br />
revela-se, por sua vez, de superior interesse, de to<strong>do</strong>s<br />
os pontos de vista. Não temos a pretensão de – como<br />
Figura 4<br />
Ara aos Lares Viales, de Braga.<br />
17<br />
Justino Mendes de ALMEIDA, «Vária terminologia epigráfica e arqueológica», Estu<strong>do</strong>s Arqueológicos 1 1974 221-225.<br />
18<br />
Ver, a este propósito, José María ÁLVAREZ MARTÍNEZ, «Calzad<strong>as</strong> de Hispania: planificación e ideología imperial», in Vittorio GALLIAZZO [coord.], Via<br />
Claudia Augusta – Un’arteria alle origini dell’Europa: ipotesi, problemi, prospettive (Feltre, 24-25.09.1999), Treviso, 2002, p. 375-395.<br />
60 AS VIAS DO ALGARVE
Figura 5<br />
Capitel <strong>da</strong> ara aos Lares Viales, com vestígios <strong>da</strong> utilização <strong>do</strong> foculus,<br />
na queima d<strong>as</strong> essênci<strong>as</strong>.<br />
nos Alpes – esses locais de obrigatória p<strong>as</strong>sagem e<br />
de serena paragem serem, em simultâneo, santuário<br />
de culto a um Júpiter de epíteto local ou <strong>as</strong>socia<strong>do</strong><br />
à divin<strong>da</strong>de indígena ali venera<strong>da</strong> 19 ; m<strong>as</strong>… que são<br />
<strong>as</strong> alminh<strong>as</strong> senão a reminiscência d<strong>as</strong> ar<strong>as</strong> aos<br />
Lares Viales <br />
caminha<strong>da</strong> – e de que a ara de Bracara Augusta<br />
<br />
ain<strong>da</strong> com vestígios <strong>da</strong> acção <strong>do</strong> fogo no foculus<br />
20 Também<br />
em Freixo de Numão, num<strong>as</strong> penedi<strong>as</strong>, sugeriu-<br />
-nos Marc Mayer que pudéssemos interpretar<br />
uma epígrafe como o agradecimento de Antiro<br />
a Hércules, por a divin<strong>da</strong>de, através de oráculo,<br />
lhe haver indica<strong>do</strong> o melhor caminho a seguir em<br />
segurança («sine furtu») 21 .<br />
Caminhos antigos, percursos novos, <strong>as</strong> mesm<strong>as</strong><br />
<br />
Percursos novos no senti<strong>do</strong> de que, com alguma<br />
frequência, por sobre os antigos, sabiamente<br />
delinea<strong>do</strong>s em plena comunhão com a Natureza e<br />
não agredin<strong>do</strong>-a, novos percursos se mol<strong>da</strong>ram no<br />
decorrer <strong>do</strong>s tempos. Percursos novos num outro<br />
senti<strong>do</strong> também, pois diversa é, hoje, a perspectiva<br />
de que nos colocamos para o seu estu<strong>do</strong>: via-<br />
-caminho, via-sintoma, via-elo inseparável de to<strong>da</strong><br />
uma circunstância no espaço e no tempo.<br />
Para nós, neste dealbar <strong>do</strong> século XXI, o supremo<br />
<br />
19<br />
Recor<strong>do</strong> o que aconteceu junto ao lacus Poeninus, nos Alpes, à beira de uma via r<strong>as</strong>ga<strong>da</strong> na rocha, onde se edificou um santuário rupestre (Plan de<br />
Júpiter), abun<strong>da</strong>nte em plac<strong>as</strong> votiv<strong>as</strong> dedicad<strong>as</strong> a Poeninus, a Iuppiter Poeninus e às Dominae. Cf. Antonina Maria CAVALLARO e Patrizia FRAMARIN,<br />
«Il nuovo museo dell’Ospizio del Gran S. Bernar<strong>do</strong>. Problemi di riordino e proposta di fruizione de una raccolta antiquaria in un piccolo museo del territorio»,<br />
Epigraphica L 1988, p. 264-272.<br />
20<br />
Vide Armandino CUNHA, José d’ENCARNAÇÃO e Francisco Sande LEMOS, «Ara aos Lares Viales, de Bracara Augusta», Forum (revista <strong>do</strong> Conselho<br />
Cultural <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> Minho), 37 (Jan-Jun 2005), p. 147-155.<br />
21<br />
Vide António N. Sá COIXÃO e José d’ENCARNAÇÃO, «Epigrafia rupestre de Numão», Saxa Scripta – Act<strong>as</strong> <strong>do</strong> III Simpósio Ibero-Itálico de Epigrafia<br />
Rupestre, Viseu, 2001, p. 199-208; AE 2001, 1162; HEp 11 2005 nº 675.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 61
A “CALÇADINHA” DE SÃO BRÁS DE ALPORTEL<br />
.IX Resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s Trabalhos Arqueológicos de Valorização de 2003-2005<br />
ANGELINA PEREIRA<br />
Câmara Municipal de São Brás de Alportel<br />
resumo<br />
C<br />
Cumpri<strong>da</strong> a calen<strong>da</strong>rização <strong>do</strong> Projecto inicial<br />
foi-nos coloca<strong>da</strong> a oportuni<strong>da</strong>de de apresentar<br />
os resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s trabalhos arqueológicos<br />
de valorização e subsequente investigação<br />
desenvolvi<strong>do</strong>s na “Calçadinha” de São Brás de<br />
Alportel.<br />
<br />
a existência de um segun<strong>do</strong> troço de calça<strong>da</strong>,<br />
designa<strong>do</strong> por B, cuj<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> técnic<strong>as</strong><br />
se enquadram no que é habitual para caminhos<br />
romanos.<br />
Trazer à luz <strong>do</strong> dia parte <strong>do</strong> p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong> deste<br />
Concelho, conduzi-lo-á, certamente, a avivar a<br />
memória colectiva <strong>da</strong> população, cujo património<br />
arqueológico é hoje visto não só como uma mais<br />
valia presente, m<strong>as</strong> também como uma promessa<br />
de perspectiv<strong>as</strong> futur<strong>as</strong>.<br />
62 AS VIAS DO ALGARVE
o espaço:<br />
enquadramento geral<br />
São Brás de Alportel, situa<strong>do</strong> às port<strong>as</strong> <strong>do</strong> complexo<br />
montanhoso <strong>da</strong> Serra <strong>do</strong> Caldeirão e inseri<strong>do</strong> num<br />
espaço que se reparte, em termos geológicos, entre<br />
uma zona de xistos (Serra) e uma faixa calcária<br />
(Barrocal) constituiu, desde época antiga, uma d<strong>as</strong><br />
p<strong>as</strong>sagens privilegiad<strong>as</strong> entre o litoral e o interior.<br />
Esta duali<strong>da</strong>de paisagístico-natural ter-lhe-á proporciona<strong>do</strong><br />
ser o local ideal para o cruzamento de<br />
du<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> milenares calcetad<strong>as</strong> que se articulavam,<br />
muito provavelmente, com o antigo itinerário<br />
longitudinal que faria a ligação entre Tavira e<br />
Loulé, e com a derivação para Sul, até Faro, pela<br />
via hoje designa<strong>da</strong> por “Calçadinha”.<br />
localização geográfica<br />
A “Calçadinha” de São Brás de Alportel localiza-se<br />
no lugar de Hort<strong>as</strong> e Moinhos (São Brás de Alportel,<br />
Faro) e percorre um pequeno vale cuja altitude<br />
varia entre os 177 e os 214 metros.<br />
Trata-se de um sítio designa<strong>do</strong> por “Via”, cujo<br />
perío<strong>do</strong> cronológico de utilização se situa entre o<br />
romano-medieval e o moderno-contemporâneo.<br />
história <strong>da</strong><br />
investigação<br />
A referência mais antiga à “Calçadinha” parece ser<br />
a que se encontra na obra de Maria Luísa Estácio V.<br />
A. Santos (1971-72) que a menciona pela primeira<br />
vez numa obra de arqueologia romana <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>.<br />
Na déca<strong>da</strong> de 80 Teresa Júdice Gamito realizou<br />
a caracterização arqueológica para o Plano de<br />
Urbanização <strong>da</strong> Vila com o objectivo de aferir o seu<br />
<br />
<br />
e exemplar».<br />
A atenção pela “Calçadinha”, enquanto sítio<br />
arqueológico com interesse patrimonial a valorizar,<br />
<br />
Em Julho de 1998, a C<strong>as</strong>a <strong>da</strong> Cultura António<br />
Bentes, sob a direcção de Emanuel Andrade C.<br />
Sancho, realizou os primeiros trabalhos no troço<br />
A <strong>da</strong> “Calçadinha” com o objectivo de promover o<br />
seu aproveitamento turístico.<br />
Em 1999/2000, Susana Estrela e Pedro Barros, numa<br />
perspectiva mais ampla, iniciaram o Levantamento<br />
Arqueológico <strong>do</strong> Concelho com o objectivo de,<br />
a partir <strong>da</strong> via, caracterizarem a antiga rede de<br />
povoamento.<br />
Em 2002, João Pedro Bernardes e Luís Filipe<br />
Oliveira, publicaram um estu<strong>do</strong> onde caracterizam<br />
a “Calçadinha” no contexto <strong>da</strong> rede viária <strong>do</strong><br />
perío<strong>do</strong> romano no <strong>Algarve</strong> central e, em particular,<br />
em São Brás de Alportel.<br />
Foi neste contexto que a Autarquia são-br<strong>as</strong>ense<br />
desenvolveu os Projectos <strong>do</strong> Centro Explicativo e<br />
de Valorização <strong>da</strong> via.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 63
o projecto de<br />
valorização<br />
Objectivos<br />
No âmbito <strong>do</strong> Projecto <strong>do</strong> Centro Explicativo e<br />
de Acolhimento <strong>da</strong> “Calçadinha” de São Brás de<br />
Alportel, desenvolveu-se o Projecto de Valorização<br />
<strong>da</strong> “Calçadinha”, proceden<strong>do</strong>-se à realização de<br />
trabalhos arqueológicos, os quais visaram valorizar<br />
o antigo traça<strong>do</strong> existente <strong>da</strong> via e, neste senti<strong>do</strong>, o<br />
património histórico–arqueológico <strong>do</strong> Concelho.<br />
O percurso <strong>da</strong> “Calçadinha” desenvolve-se por uma<br />
extensão total de 1480 metros, percorren<strong>do</strong> um<br />
pequeno vale inseri<strong>do</strong> a Sul, ao qual é sobranceira<br />
uma zona mais eleva<strong>da</strong> onde está hoje implanta<strong>da</strong><br />
a Igreja Matriz. Actualmente restam conserva<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong>is troços, designa<strong>do</strong>s por A e B, separa<strong>do</strong>s por<br />
alguns metros outrora pavimenta<strong>do</strong>s, m<strong>as</strong> hoje<br />
<br />
os trabalhos<br />
arqueológicos<br />
Descrição sumária<br />
O sítio intervenciona<strong>do</strong> apresentava, antes <strong>do</strong> início<br />
<strong>do</strong>s trabalhos, um <strong>as</strong>pecto de matagal. Existia muita<br />
vegetação que nalguns locais era densa.<br />
Os trabalhos de valorização na “Calçadinha”<br />
incluíram a limpeza e remoção <strong>da</strong> vegetação e de<br />
terr<strong>as</strong> que ao longo <strong>do</strong>s tempos se acumularam<br />
sobre a via, trazen<strong>do</strong> de novo à luz <strong>do</strong> dia a calça<strong>da</strong><br />
existente. Procedeu-se também à colocação de<br />
plac<strong>as</strong> informativ<strong>as</strong> ao longo <strong>do</strong> percurso, para<br />
que o visitante possa usufruir de uma informação<br />
adequa<strong>da</strong>, a nível arqueológico, histórico, ambiental<br />
e geológico.<br />
Os trabalhos arqueológicos, vocaciona<strong>do</strong>s para<br />
uma atitude de sensibilização junto <strong>da</strong> população<br />
mais jovem deste concelho, permitiram o<br />
fomento de activi<strong>da</strong>des de cariz educacional e<br />
pe<strong>da</strong>gógico, através de program<strong>as</strong> educativos de<br />
ocupação de tempos livres, de visit<strong>as</strong> guiad<strong>as</strong>, <strong>da</strong><br />
investigação contínua, de Palestr<strong>as</strong> e Conferênci<strong>as</strong><br />
e <strong>da</strong> realização de material informativo e de<br />
divulgação. O arranjo urbanístico <strong>do</strong> acesso ao<br />
local, a colocação de sinalética direccional e<br />
<br />
contribuíram para valorizar este arqueo–sítio e<br />
incentivar à sua visita.<br />
Figura 1<br />
Aspecto <strong>da</strong> via antes <strong>do</strong> início <strong>do</strong>s trabalhos arqueológicos<br />
de valorização.<br />
Os sedimentos que soterravam a “Calçadinha”, ora<br />
deixavam entrever parte <strong>da</strong> mesma devi<strong>do</strong> à sua<br />
reduzi<strong>da</strong> espessura (0 a 10 cm), ora a tapavam por<br />
<br />
largura <strong>da</strong> via, afunilan<strong>do</strong>-a e tornan<strong>do</strong>-a numa<br />
carreteira de pé posto (vere<strong>da</strong>).<br />
Os sedimentos removi<strong>do</strong>s eram constituí<strong>do</strong>s,<br />
maioritariamente, por terra pouco compacta, de<br />
coloração c<strong>as</strong>tanha, e por pedra solta de pequena/<br />
média dimensão.<br />
O troço B apresenta uma notável extensão de cerca<br />
de 550m e uma largura que varia entre os 2,40m e<br />
os 3,50m, embora não se apresente calceta<strong>do</strong> em<br />
to<strong>da</strong> a sua extensão.<br />
64 AS VIAS DO ALGARVE
<strong>as</strong> estrutur<strong>as</strong><br />
arqueológic<strong>as</strong><br />
Descrição sumária<br />
O troço B <strong>da</strong> “Calçadinha” apresenta, <strong>as</strong>sociad<strong>as</strong> a<br />
segmentos <strong>da</strong> sua provável estrutura original, algum<strong>as</strong><br />
reconstruções que <strong>da</strong>tam de époc<strong>as</strong> posteriores.<br />
mentos<br />
que diferem entre si.<br />
Observam-se, para além <strong>do</strong>s segmentos empedra<strong>do</strong>s,<br />
segmentos em terra bati<strong>da</strong>.<br />
Os segmentos calceta<strong>do</strong>s foram dividi<strong>do</strong>s em secções<br />
ten<strong>do</strong> por b<strong>as</strong>e a técnica construtiva observa<strong>da</strong>:<br />
Secção I<br />
Aproxima-se <strong>do</strong> modelo empregue na construção de<br />
calçad<strong>as</strong> roman<strong>as</strong>, na qual se observa a existência<br />
de um lajea<strong>do</strong> de média/grande dimensão, um certo<br />
abaulamento <strong>do</strong> empedra<strong>do</strong> superior delimita<strong>do</strong><br />
por pedr<strong>as</strong> em cutelo (margines) e uma largura que<br />
ron<strong>da</strong> os 8 pés (2,50m).<br />
Figura 3<br />
Secção II<br />
Secção III<br />
Corresponde à remodelação efectua<strong>da</strong> no século XIX,<br />
em que se observa um lajea<strong>do</strong> geométrico idêntico<br />
ao <strong>do</strong> troço A, composto por pedr<strong>as</strong> de pequena/<br />
média dimensão e um eixo central delimita<strong>do</strong> por<br />
pedr<strong>as</strong> em cutelo (margines), <strong>do</strong> qual saem linh<strong>as</strong><br />
perpendiculares que formam quadrícul<strong>as</strong>, dividid<strong>as</strong><br />
obliquamente em triângulos rectângulos.<br />
Nesta remodelação ter-se-ão aplica<strong>do</strong> <strong>as</strong> recomen<strong>da</strong>ções<br />
para a reparação e/ou reconstrução de<br />
estrad<strong>as</strong> que o Bispo D. Francisco Gomes <strong>do</strong> Avelar<br />
fez publicar em Faro, em 1809.<br />
Figura 2<br />
Secção I – Modelo de construção que se aproxima <strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong><br />
em época romana.<br />
Secção II<br />
Não obedece a nenhum padrão muito claro e<br />
poderá <strong>da</strong>tar <strong>da</strong> época medieval.<br />
Figura 4<br />
Secção III – Remodelação efectua<strong>da</strong> no século XIX.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 65
segmentos em terra<br />
bati<strong>da</strong><br />
Existem ain<strong>da</strong> segmentos que não apresentam<br />
empedra<strong>do</strong> e que, grosso mo<strong>do</strong>, correspondem<br />
a zon<strong>as</strong> plan<strong>as</strong> (troços em linha recta). Aí foram<br />
apen<strong>as</strong> detecta<strong>do</strong>s vestígios <strong>da</strong> provável delimitação<br />
<strong>do</strong> traça<strong>do</strong> <strong>da</strong> estra<strong>da</strong> no terreno, ou seja, uma<br />
<br />
outros segmentos<br />
Muito provavelmente, estes segmentos corresponderão<br />
à segun<strong>da</strong> f<strong>as</strong>e <strong>da</strong> técnica utiliza<strong>da</strong> na<br />
construção <strong>da</strong> via, o rudus.<br />
Nesta antiga estra<strong>da</strong> o calcetamento terá si<strong>do</strong><br />
aplica<strong>do</strong> para vencer os obstáculos naturais, em<br />
zon<strong>as</strong> de declive acentua<strong>do</strong>, com solos de difícil<br />
trânsito e pisos irregulares que seriam facilmente<br />
altera<strong>do</strong>s pel<strong>as</strong> torrentes d<strong>as</strong> águ<strong>as</strong> pluviais ou por<br />
outros agentes erosivos.<br />
Figura 6<br />
Segmento <strong>da</strong> via que apresenta o que corresponderá à segun<strong>da</strong> f<strong>as</strong>e<br />
<strong>da</strong> técnica de construção, o rudus.<br />
Figura 5<br />
Segmento em terra bati<strong>da</strong>.<br />
Figura 7<br />
Aspecto/pormenor <strong>do</strong> troço B <strong>da</strong> “Calçadinha” de S. Brás de Alportel<br />
A maior parte dest<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> têm característic<strong>as</strong><br />
comuns, ou seja, eram construíd<strong>as</strong> segun<strong>do</strong><br />
modelos muito próprios.<br />
66 AS VIAS DO ALGARVE
<strong>as</strong> técnic<strong>as</strong><br />
de construção<br />
Para a sua construção o terreno era escava<strong>do</strong>,<br />
abrin<strong>do</strong>-se um fosso (sulcus), e depois procedia-<br />
-se ao seu enchimento, o qual era feito em três<br />
f<strong>as</strong>es. A primeira cama<strong>da</strong> ou statumen era forma<strong>da</strong><br />
por terra e pedr<strong>as</strong> de vári<strong>as</strong> dimensões bem<br />
compactad<strong>as</strong>; sobre essa colocava-se o rudus,<br />
constituí<strong>do</strong> por uma m<strong>as</strong>sa de seixos liga<strong>do</strong>s com<br />
argam<strong>as</strong>sa e bati<strong>do</strong>s com maços para obter uma<br />
<br />
superior, o pavimentum, com lajes de dimensões<br />
vári<strong>as</strong> e de superfície abaula<strong>da</strong> para favorecer o<br />
escoamento d<strong>as</strong> águ<strong>as</strong> pluviais para <strong>as</strong> berm<strong>as</strong>.<br />
a “Calçadinha” de<br />
São Brás de Alportel<br />
no contexto d<strong>as</strong> Vi<strong>as</strong><br />
Roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
Central<br />
A natureza técnica <strong>da</strong> construção, na qual são<br />
observáveis lajes de média/grande dimensão,<br />
permite-nos inseri-la no modelo romano uma vez que<br />
a via apresenta:<br />
a) um percurso a meia encosta;<br />
<br />
rochoso;<br />
c) um certo abaulamento <strong>do</strong> empedra<strong>do</strong> superior<br />
delimita<strong>do</strong> por pedr<strong>as</strong> em cutelo (margines);<br />
d) uma largura que ron<strong>da</strong> os 8 pés (2,50 m).<br />
Figura 8<br />
Elementos constituitivos de uma calça<strong>da</strong> romana.<br />
(reproduzi<strong>do</strong> de RODRIGUES, 2004:20)<br />
Na “Calçadinha” o calcetamento terá si<strong>do</strong> aplica<strong>do</strong>,<br />
para vencer os obstáculos naturais, em zon<strong>as</strong> de<br />
declive acentua<strong>do</strong> com solos de difícil trânsito e<br />
irregulares que seriam facilmente altera<strong>do</strong>s pel<strong>as</strong><br />
torrentes d<strong>as</strong> águ<strong>as</strong> pluviais ou por outros agentes<br />
erosivos. Assim, entre segmentos empedra<strong>do</strong>s<br />
deparamo-nos com outros em terra bati<strong>da</strong> que,<br />
grosso mo<strong>do</strong>, correspondem a zon<strong>as</strong> plan<strong>as</strong> e em<br />
linha recta.<br />
No âmbito d<strong>as</strong> reparações efectuad<strong>as</strong> no século<br />
<br />
de construção empregues durante os séculos<br />
seguintes são análog<strong>as</strong> às utilizad<strong>as</strong> durante a<br />
época romana.<br />
Esta hipótese, recentemente coloca<strong>da</strong>, b<strong>as</strong>eia-se<br />
também noutros <strong>as</strong>pectos.<br />
É de salientar que junto ao troço A foi encontra<strong>da</strong>,<br />
na segun<strong>da</strong> metade <strong>do</strong> século XX, uma<br />
sepultura com espólio <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> (BERNARDES e<br />
OLIVEIRA, 2002:26-27). Por outro la<strong>do</strong>, ain<strong>da</strong> n<strong>as</strong><br />
proximi<strong>da</strong>des <strong>do</strong> troço A, <br />
estrutur<strong>as</strong> arqueológic<strong>as</strong> <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> romano, cujos<br />
<br />
século IV-V d.C. (terra sigillata Hispânica, Clara D<br />
e um fragmento de ânfora), e que corresponderão,<br />
provavelmente, a uma estação viária “tipo mutatio”<br />
(estação de mu<strong>da</strong> de animais e carros para<br />
viajantes).<br />
Outros <strong>as</strong>pectos que reforçam a hipótese deste<br />
antigo caminho ter origem em época romana são<br />
os antigos <strong>do</strong>cumentos que apresentavam os<br />
principais itinerários entre <strong>as</strong> vári<strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des.<br />
Um deles, o Itinerário de Antonino, fonte clássica<br />
<strong>do</strong> século III d.C., refere a existência de algum<strong>as</strong><br />
dess<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> que atravessavam então o<br />
<strong>Algarve</strong>. A mais importante dess<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> seria a que<br />
percorria o litoral, desde Baesuris (C<strong>as</strong>tro Marim)<br />
ao Promontorium Sacrum, p<strong>as</strong>san<strong>do</strong> pel<strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 67
de Balsa (Luz de Tavira) e de Ossonoba (Faro). A<br />
esta estra<strong>da</strong>, ligavam-se outr<strong>as</strong> secundári<strong>as</strong>, uma<br />
del<strong>as</strong>, provavelmente a “Calçadinha”, atravessava<br />
o território onde hoje se localiza o Concelho de<br />
São Brás de Alportel e prosseguia em direcção<br />
às grandes ci<strong>da</strong>des roman<strong>as</strong>: Pax Iulia (Beja) e<br />
Olisipo (Lisboa).<br />
Por último, salientamos os resulta<strong>do</strong>s recentemente<br />
apresenta<strong>do</strong>s na obra de Sandra Rodrigues (2004)<br />
intitula<strong>da</strong> “As Vi<strong>as</strong> Roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>”, onde a<br />
autora refere que parece “plausível a ideia de se<br />
tratar de uma via terrena, pelo menos até ao sítio<br />
de Hort<strong>as</strong> e Moinhos, onde existem <strong>do</strong>is troços<br />
de calça<strong>da</strong> cuj<strong>as</strong> característic<strong>as</strong> nos impelem à<br />
atribuição de uma cronologia romana, sobretu<strong>do</strong><br />
num deles (RODRIGUES, 2004:68).<br />
<br />
se encontrarem, ain<strong>da</strong> hoje, bem visíveis ao<br />
longo <strong>do</strong> troço B, não podemos esquecer que<br />
o conhecimento d<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> se<br />
encontra limita<strong>do</strong> devi<strong>do</strong>, em parte, às afectações<br />
e reutilizações a que est<strong>as</strong> estrad<strong>as</strong> estiveram<br />
sujeit<strong>as</strong> ao longo <strong>do</strong>s séculos.<br />
considerações finais<br />
Consideran<strong>do</strong> <strong>as</strong> característic<strong>as</strong> técnic<strong>as</strong> que a<br />
“Calçadinha” evidencia e os antigos <strong>do</strong>cumentos<br />
que apresentam os principais itinerários entre <strong>as</strong><br />
vári<strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des, colocamos a hipótese deste antigo<br />
caminho fazer, originalmente, parte <strong>do</strong> Itinerário<br />
XXI de Antonino, uma d<strong>as</strong> mais importantes vi<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> Sul <strong>da</strong> antiga província <strong>da</strong> Lusitânia.<br />
Assim, a “Calçadinha” seria uma via terrena<br />
(caminho de abertura fácil e que contemplaria<br />
grande parte <strong>do</strong> seu traça<strong>do</strong> em terra bati<strong>da</strong>),<br />
constituin<strong>do</strong>, provavelmente, uma ligação<br />
secundária entre a principal ci<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> e<br />
sede de ciuit<strong>as</strong> – Ossonoba (Faro) – e a capital<br />
conventual – Pax Iulia (Beja).<br />
Na falta de troços empedra<strong>do</strong>s, o seu provável<br />
trajecto pôde ser segui<strong>do</strong> a partir de uma análise<br />
toponímica e <strong>da</strong> localização de sítios arqueológicos<br />
conheci<strong>do</strong>s.<br />
Assim, a referi<strong>da</strong> via saía <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Ossonoba<br />
(Faro) pela estra<strong>da</strong> <strong>da</strong> Penha, p<strong>as</strong>sava pela<br />
Conceição, por Milreu (Estói) e pelos Macha<strong>do</strong>s<br />
até ao sítio de Hort<strong>as</strong> e Moinhos, onde podemos<br />
encontrar os <strong>do</strong>is troços calceta<strong>do</strong>s.<br />
A “Calçadinha” começou a ser gradualmente<br />
“aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong>” a partir de 1860, <strong>da</strong>ta em que foi<br />
construí<strong>da</strong> a estra<strong>da</strong> moderna, sen<strong>do</strong> apen<strong>as</strong><br />
utiliza<strong>da</strong> como caminho rural, por p<strong>as</strong>tores e alguns<br />
habitantes de sítios circun<strong>da</strong>ntes.<br />
To<strong>do</strong>s os factores menciona<strong>do</strong>s, apesar de tod<strong>as</strong><br />
<strong>as</strong> dúvid<strong>as</strong> que sempre enformam uma pesquisa<br />
desta natureza – a atribuição de uma cronologia<br />
mais antiga para esta via, nomea<strong>da</strong>mente romana<br />
– são o resulta<strong>do</strong> <strong>da</strong> investigação que, por agora,<br />
nos foi possível apresentar.<br />
68 AS VIAS DO ALGARVE
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<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 69
.X<br />
OS CAMINHOS, AS VERE<strong>DAS</strong> E O POVOAMENTO ANTIGO.<br />
Do Romano ao Islâmico. Os <strong>da</strong><strong>do</strong>s revela<strong>do</strong>s pela arqueologia<br />
no concelho de Alcoutim.<br />
FERNANDO DIAS | MANUELA TEIXEIRA<br />
Divisão de Acção Social Cultura e Desporto | Município de Alcoutim<br />
resumo<br />
C<br />
Com o presente póster pretende-se apresentar o<br />
panorama d<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> de comunicação terrestres no<br />
concelho de Alcoutim, <strong>da</strong> época romana ao perío<strong>do</strong><br />
islâmico, com b<strong>as</strong>e nos <strong>da</strong><strong>do</strong>s arqueológicos.<br />
Situa<strong>do</strong> no nordeste algarvio, no extremo <strong>da</strong> serra<br />
<strong>do</strong> Caldeirão, o território de Alcoutim caracteriza-<br />
-se por um relevo acidenta<strong>do</strong> e marca<strong>do</strong> pelos<br />
inúmeros vales serpentiformes d<strong>as</strong> ribeir<strong>as</strong> e<br />
barrancos que desaguam no rio Guadiana a este.<br />
Os solos são constituí<strong>do</strong>s especialmente por<br />
xistos, grauvaques e uma cama<strong>da</strong> de terra arável<br />
pouco espessa, responsável pela fraca capaci<strong>da</strong>de<br />
agrícola <strong>da</strong> região. A localização deste território,<br />
no limite sul <strong>da</strong> faixa piritosa ibérica, explica a<br />
existência de inúmeros “chapéus de ferro” ricos<br />
em cobre e outros minerais. Est<strong>as</strong> ocorrênci<strong>as</strong> são<br />
especialmente notóri<strong>as</strong> a nordeste de Martinlongo,<br />
a este de Vaqueiros, nos vales d<strong>as</strong> ribeir<strong>as</strong> de<br />
Foupana e Odeleite, e a norte de Alcoutim, numa<br />
faixa junto ao rio.<br />
Para o estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> rede viária antiga no concelho<br />
de Alcoutim temos que seguir uma meto<strong>do</strong>logia<br />
<br />
<br />
por b<strong>as</strong>e a toponímia e o povoamento antigo.<br />
O rio Guadiana era a grande aveni<strong>da</strong> de acesso<br />
ao interior, como lhe chamou Cláudio Torres, e<br />
desempenhou um importante papel estrutura<strong>do</strong>r<br />
no desenvolvimento <strong>da</strong> rede de caminhos antigos.<br />
Os recursos mineralógicos, a p<strong>as</strong>torícia e a caça<br />
representaram o principal atractivo que levou ao<br />
estabelecimento de comuni<strong>da</strong>des neste território<br />
a partir <strong>do</strong>s perío<strong>do</strong>s neolítico e calcolítico. Esta<br />
dinâmica de povoamento teve continui<strong>da</strong>de n<strong>as</strong><br />
i<strong>da</strong>des <strong>do</strong> bronze e <strong>do</strong> ferro, como testemunham <strong>as</strong><br />
vári<strong>as</strong> necrópoles de cist<strong>as</strong> encontrad<strong>as</strong>.<br />
Do perío<strong>do</strong> romano imperial conhecemos vári<strong>as</strong><br />
estações de habitat em que a faixa junto ao rio<br />
Guadiana, pel<strong>as</strong> facili<strong>da</strong>des de comunicação que<br />
70 AS VIAS DO ALGARVE
permitiam o comércio com o exterior, foi mais<br />
densamente ocupa<strong>da</strong>. Destes sítios partiriam alguns<br />
trilhos que se embrenhavam no interior serrano<br />
com o principal objectivo de exploração <strong>do</strong>s ditos<br />
“chapéus de ferro” e por onde se faria o transporte<br />
<br />
que a civilização romana tenha aproveita<strong>do</strong> muitos<br />
caminhos anteriores, à semelhança <strong>do</strong> resto <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong> segun<strong>do</strong> V<strong>as</strong>co Gil Mant<strong>as</strong>. Para este<br />
perío<strong>do</strong> sublinhamos <strong>as</strong> referênci<strong>as</strong> de Antonino a<br />
uma estra<strong>da</strong> per compendium que ligaria Baesuris<br />
a p<strong>as</strong>san<strong>do</strong> pelo vale <strong>do</strong> Guadiana. Esta<br />
estra<strong>da</strong> que parece pouco lógico ter existi<strong>do</strong>, pelo<br />
facto <strong>do</strong> rio Guadiana ser facilmente navegável até<br />
Mértola, é c<strong>as</strong>o <strong>as</strong>sente para alguns especialist<strong>as</strong>.<br />
É provável que, vin<strong>da</strong> de Azinhal por Porto Largo,<br />
p<strong>as</strong>s<strong>as</strong>se por Corte d<strong>as</strong> Don<strong>as</strong>, Álamo, Montinho<br />
d<strong>as</strong> Laranjeir<strong>as</strong>, Lourinhã, Necrópole <strong>do</strong> Calvário<br />
e se af<strong>as</strong>t<strong>as</strong>se <strong>do</strong> rio por S. Martinho, Cerca<strong>do</strong><br />
<strong>da</strong> Ferrugem e seguisse em direcção à Ribeira<br />
<strong>do</strong> V<strong>as</strong>cão onde existe um antigo caminho <strong>do</strong><br />
la<strong>do</strong> de Mértola próximo d<strong>as</strong> ruín<strong>as</strong> <strong>do</strong> Moinho <strong>da</strong><br />
Calça<strong>da</strong>. Segun<strong>do</strong> Abel Viana uma outra via romana<br />
atravessaria a serra vin<strong>da</strong> de Balsa por Cachopo<br />
e Martinlongo, onde se bifurcaria para Alcoutim e<br />
para Mértola.<br />
reduzid<strong>as</strong> e às várze<strong>as</strong> <strong>do</strong> rio Guadiana, com maior<br />
potencial agrícola e facili<strong>da</strong>de de escoamento <strong>do</strong>s<br />
produtos.<br />
Salienta-se ain<strong>da</strong> o facto <strong>do</strong>s inúmeros caminhos<br />
<br />
registo de topónimos viários como calça<strong>da</strong>, portela,<br />
etc, que ligariam to<strong>da</strong> a rede de povoamento,<br />
denunciarem uma continui<strong>da</strong>de após a reconquista<br />
cristã. To<strong>do</strong>s estes caminhos e vered<strong>as</strong>, que<br />
serviram este território serrano até ao século XIX<br />
/XX, devem ter si<strong>do</strong> viae terrenae muito sinuos<strong>as</strong><br />
e estreit<strong>as</strong>.<br />
Esta dinâmica de ocupação / exploração mineira<br />
parece ter sofri<strong>do</strong> uma certa estagnação, ou mesmo<br />
<br />
visigótico/bizantino e emiral, segun<strong>do</strong> a análise<br />
<strong>do</strong>s <strong>da</strong><strong>do</strong>s arqueológicos conheci<strong>do</strong>s.<br />
Para o perío<strong>do</strong> islâmico pleno a arqueologia revela-<br />
<br />
local, testemunha<strong>do</strong> pela grande densi<strong>da</strong>de de<br />
habitats e crescimento <strong>da</strong> sua maioria. Associa<strong>da</strong><br />
a uma contínua exploração mineira parecem estar<br />
<strong>as</strong> explorações agrári<strong>as</strong> e pecuári<strong>as</strong> indicad<strong>as</strong> pelo<br />
surgimento de algum<strong>as</strong> alcari<strong>as</strong>, como Alcaria<br />
Chã, Vila Longa, Alcari<strong>as</strong> de Marim, Alcari<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
Laborato, Alcaria Cova e Barranco <strong>do</strong> Tecedeiro<br />
(CATARINO, 1997/98), cuj<strong>as</strong> capaci<strong>da</strong>des agrári<strong>as</strong><br />
<strong>do</strong>s terrenos devem ter orienta<strong>do</strong> a escolha <strong>da</strong> sua<br />
implantação. As explorações agrári<strong>as</strong> e pecuári<strong>as</strong><br />
roman<strong>as</strong> parecem ter-se limita<strong>do</strong> a áre<strong>as</strong> muito<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 71
72 AS VIAS DO ALGARVE
LEGENDA DO MAPA<br />
1 Monta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Pereirão – referência a um forno de<br />
telh<strong>as</strong> n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des e a antigo caminho de pé posto<br />
que seguia na direcção de Santa Cruz (Alentejo).<br />
2 Pereirão – referência a sepultur<strong>as</strong> de incineração e<br />
inumação, destruíd<strong>as</strong>, a 2,5 Km a NNW <strong>da</strong> povoação com<br />
o topónimo Monte <strong>da</strong> Estra<strong>da</strong>.<br />
3 Alcaria de Vila Longa – grande povoação com<br />
arruamentos e caminho antigo que atravessa a ribeira<br />
<strong>do</strong> V<strong>as</strong>cão.<br />
4 Curralinhos – referência a antigo caminho que segue,<br />
atravessan<strong>do</strong> a ribeira <strong>do</strong> V<strong>as</strong>cão, em direcção a S. Pedro<br />
de Solis.<br />
5 Mestr<strong>as</strong> – <strong>as</strong>socia<strong>da</strong> à exploração agrária e à pecuária.<br />
6 Alcari<strong>as</strong> de Diogo Di<strong>as</strong> – existem escóri<strong>as</strong> de fundição,<br />
provavelmente <strong>as</strong>sociad<strong>as</strong> à exploração mineira.<br />
7 Alcariais de Monte Argil – referência a escóri<strong>as</strong> de<br />
fundição e proximi<strong>da</strong>de de min<strong>as</strong> a sul na freguesia de<br />
Cachopo (Tavira).<br />
8 Cerro <strong>do</strong> Lírio, Laborato a C<strong>as</strong>telhanos – antigo<br />
<br />
com partes em calça<strong>da</strong>.<br />
9 Martinlongo – existem restos de escóri<strong>as</strong> e estaria<br />
<strong>as</strong>socia<strong>da</strong> à exploração mineira <strong>do</strong> Serro <strong>da</strong> Mina e à<br />
exploração agrícola <strong>do</strong> planalto envolvente.<br />
10 Alcari<strong>as</strong> <strong>do</strong> Laborato – antigos caminhos entre muros<br />
e escóri<strong>as</strong> de fundição, próximo de antig<strong>as</strong> min<strong>as</strong>.<br />
11 Serro <strong>do</strong> Lírio – existem escóri<strong>as</strong> de fundição,<br />
referência a forno de fundição e situa-se próximo de<br />
caminho e min<strong>as</strong> antig<strong>as</strong>.<br />
12 Serro <strong>da</strong> Mina – mina com exploração no perío<strong>do</strong> romano,<br />
onde foi encontra<strong>do</strong> um denário de prata de Antonino Pio.<br />
13 Lutão – caminho, entre vala<strong>do</strong>s, com calça<strong>da</strong> antiga<br />
n<strong>as</strong> imediações <strong>do</strong> povoa<strong>do</strong> islâmico.<br />
14 Cerca d<strong>as</strong> Oliveir<strong>as</strong> <strong>do</strong> Lutão – existe antigo<br />
caminho com calça<strong>da</strong>, <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> à exploração mineira.<br />
15 Alcaria Chã – grande povoação com caminhos<br />
antigos, seguin<strong>do</strong> um para o Mingor<strong>do</strong> onde existiu uma<br />
antiga mina junto à ribeira <strong>do</strong> V<strong>as</strong>cão.<br />
16 Alcaria Chã – antigo caminho, entre vala<strong>do</strong>s, sobre<br />
<br />
a área <strong>do</strong> antigo povoa<strong>do</strong>.<br />
17 Vaqueiros – encontra<strong>do</strong> um denário republicano e<br />
moed<strong>as</strong> de Cláudio e provável <strong>as</strong>sociação às explorações<br />
mineir<strong>as</strong> d<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des.<br />
18 Alcari<strong>as</strong> de Madeiros – existem blocos de escóri<strong>as</strong> de<br />
fundição, provavelmente <strong>as</strong>socia<strong>do</strong>s à exploração mineira.<br />
19 Ferrari<strong>as</strong> – antig<strong>as</strong> min<strong>as</strong> com vestígios de exploração<br />
desde os perío<strong>do</strong>s romano e islâmico até ao séc. XIX.<br />
20 C<strong>as</strong>telo d<strong>as</strong> Relíqui<strong>as</strong> – hisn e povoa<strong>do</strong> presumivelmente<br />
liga<strong>do</strong> ao controle <strong>do</strong> território, com provável<br />
caminho em direcção a S. Bartolomeu <strong>da</strong> Via Glória<br />
(Mértola).<br />
21 Curralão – existem escóri<strong>as</strong> de fundição e está<br />
<strong>as</strong>socia<strong>do</strong> à exploração d<strong>as</strong> antig<strong>as</strong> min<strong>as</strong> <strong>da</strong> Couraça<br />
n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des.<br />
22 Mesquita – junto de antigo caminho, provavelmente,<br />
<strong>as</strong>socia<strong>da</strong> a explorações mineir<strong>as</strong> e agrári<strong>as</strong>.<br />
23 Alcari<strong>as</strong> de Alcaria Grande – existem escóri<strong>as</strong> de<br />
fundição, provavelmente <strong>as</strong>sociad<strong>as</strong> à exploração mineira.<br />
24 Clarines – povoa<strong>do</strong> com capela de origem visigótica<br />
<strong>as</strong>socia<strong>do</strong> à exploração agrícola e pecuária.<br />
25 Alcariais d<strong>as</strong> Velh<strong>as</strong> – liga<strong>da</strong> à exploração agrícola e<br />
pecuária, <strong>as</strong>socia<strong>da</strong> a antigos fornos e telheiros.<br />
26 Alcari<strong>as</strong> de Marim – referência a escóri<strong>as</strong> de fundição<br />
e proximi<strong>da</strong>de de antig<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de cobre.<br />
27 Rocha <strong>do</strong> Touro – referência a sepultur<strong>as</strong> de<br />
incineração e inumação, destruíd<strong>as</strong>, <strong>as</strong>socia<strong>da</strong> ao Povoa<strong>do</strong><br />
de S. Bento Velho.<br />
28 S. Bento Velho – existência de antigo caminho<br />
talha<strong>do</strong> na rocha e <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> às explorações mineir<strong>as</strong><br />
n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des.<br />
29 Alcariais de Zambujal – próximo de caminhos e<br />
min<strong>as</strong> antig<strong>as</strong>.<br />
30 Cerca<strong>do</strong> d<strong>as</strong> Oliveir<strong>as</strong> <strong>do</strong> Tesouro – <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> a<br />
antigo forno com caminho de calça<strong>da</strong> em pedra miú<strong>da</strong>.<br />
31 Alcaria Cova – povoação liga<strong>da</strong> à exploração agrícola<br />
e pecuária.<br />
32 C<strong>as</strong>telo de Alcaria Cova <br />
liga<strong>da</strong> à exploração mineira.<br />
33 Soudes – tesouro monetário com denários<br />
republicanos <strong>do</strong> século III e II a. C., caminhos velhos,<br />
escóri<strong>as</strong> de fundição e min<strong>as</strong> antig<strong>as</strong> n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des.<br />
34 Pedrinh<strong>as</strong> de S. Brás – provável igreja paleocristã,<br />
referência a fornos de fundição e explorações mineir<strong>as</strong><br />
n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des.<br />
35 Vicentes – escóri<strong>as</strong> de fundição e lugar de p<strong>as</strong>sagem<br />
de antigo caminho proveniente <strong>da</strong> Alcaria d<strong>as</strong> Peg<strong>as</strong> em<br />
direcção a Clarines.<br />
36 Alcari<strong>as</strong> de Fonte Zambujo – liga<strong>da</strong> à exploração<br />
agrícola e pecuária.<br />
37 Santa Marta – provavelmente <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> à mina <strong>do</strong><br />
Pego <strong>da</strong> Quebra<strong>da</strong>.<br />
38 Cerca<strong>do</strong> <strong>da</strong> Ferrugem – <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> à exploração de<br />
antig<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de cobre no Barranco d<strong>as</strong> Quebrad<strong>as</strong>.<br />
39 Serro d<strong>as</strong> C<strong>as</strong>inh<strong>as</strong> – existem escóri<strong>as</strong> de fundição e<br />
antigo forno, situa-se próximo de caminho e min<strong>as</strong> antig<strong>as</strong>.<br />
40 Desgraci<strong>as</strong> – encontra<strong>do</strong> busto romano em bronze,<br />
referência a restos de antigo caminho com calça<strong>da</strong> que<br />
vinha de Alcaria d<strong>as</strong> Peg<strong>as</strong> seguin<strong>do</strong> por Vicentes em<br />
direcção a Clarines.<br />
41 Alcaria d<strong>as</strong> Peg<strong>as</strong> – grande povoa<strong>do</strong> de exploração<br />
agrícola e pecuária.<br />
42 Alcariais <strong>do</strong> Barranco <strong>do</strong> Tecedeiro – ocupa extensa<br />
área, liga<strong>da</strong> à exploração agrícola e pecuária.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 73
BIBLIOGRAFIA<br />
43 Cerca d<strong>as</strong> Oliveir<strong>as</strong> de S. Martinho Velho – provável<br />
igreja paleocristã <strong>as</strong>socia<strong>da</strong> à p<strong>as</strong>sagem <strong>da</strong> via per<br />
compendium de Baesuris a antigo caminho entre<br />
muros, escóri<strong>as</strong> de fundição e situa-se n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des<br />
d<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de Cortes Pereir<strong>as</strong>.<br />
44 Cerca d<strong>as</strong> Oliveir<strong>as</strong> <strong>do</strong> Cerro <strong>do</strong> Lobo – <strong>as</strong>socia<strong>do</strong><br />
à exploração mineira, com escóri<strong>as</strong> de fundição, onde<br />
existe um antigo caminho.<br />
45 Enxoval – <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> a antig<strong>as</strong> explorações mineir<strong>as</strong> e<br />
existem microtopónimos indica<strong>do</strong>res de caminhos antigos<br />
(portela, porto, etc.).<br />
46 Montinho de Corte <strong>da</strong> Se<strong>da</strong> – grande povoa<strong>do</strong><br />
<strong>as</strong>socia<strong>do</strong> a antig<strong>as</strong> explorações mineir<strong>as</strong> n<strong>as</strong><br />
proximi<strong>da</strong>des.<br />
47 Sepultur<strong>as</strong> <strong>do</strong> Calvário – próximo <strong>do</strong> caminho velho<br />
<strong>da</strong> Lourinhã, actualmente intransitável, que ligaria os sítios<br />
romanos <strong>da</strong> Lourinhã e <strong>do</strong> Enxoval.<br />
48 Lourinhã – provável villa <strong>as</strong>socia<strong>da</strong> à exploração<br />
mineira, situa<strong>da</strong> na várzea <strong>do</strong> rio Guadiana.<br />
49 Cerro <strong>da</strong> Horta <strong>do</strong> Brejo – existem escóri<strong>as</strong> de<br />
fundição e está <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> à exploração <strong>da</strong> Mina <strong>do</strong> Brejo.<br />
50 Lourinhã II – existem escóri<strong>as</strong> de fundição e está<br />
<strong>as</strong>socia<strong>da</strong> às antig<strong>as</strong> min<strong>as</strong> existentes n<strong>as</strong> proximi<strong>da</strong>des.<br />
51 C<strong>as</strong>telo Velho de Alcoutim – hisn e povoa<strong>do</strong> liga<strong>do</strong><br />
ao controle <strong>do</strong> território, <strong>do</strong> rio Guadiana e à exploração<br />
mineira.<br />
52 C<strong>as</strong>a Velha <strong>do</strong> Marmeleiro – povoa<strong>do</strong> <strong>as</strong>socia<strong>do</strong> à<br />
exploração d<strong>as</strong> antig<strong>as</strong> min<strong>as</strong> de cobre <strong>da</strong> C<strong>as</strong>a Velha.<br />
53 Vale de Condes – provável existência de igreja<br />
Paleocristã, situa<strong>do</strong> na várzea <strong>do</strong> rio Guadiana e possível<br />
p<strong>as</strong>sagem de antigo caminho proveniente <strong>do</strong> Álamo em<br />
direcção a Alcoutim.<br />
54 Pontal – antigo caminho com partes em calça<strong>da</strong><br />
e muro de suporte, construí<strong>do</strong> a meia encosta. Seria a<br />
continuação <strong>do</strong> que vinha <strong>do</strong> Álamo.<br />
55 Montinho d<strong>as</strong> Laranjeir<strong>as</strong> – importante villa romana<br />
com provável porto e igreja Paleocristã.<br />
56 Álamo<br />
rochoso, com referência a calça<strong>da</strong> em direcção à Villa <strong>do</strong><br />
Montinho d<strong>as</strong> Laranjeir<strong>as</strong>.<br />
57 Álamo – villa com barragem, onde se encontrou a<br />
estátua de Apolo, e onde p<strong>as</strong>sava uma antiga estra<strong>da</strong> que<br />
vinha de C<strong>as</strong>tro Marim e seguia para Alcoutim.<br />
58 Corte d<strong>as</strong> Don<strong>as</strong> – antigo caminho em direcção ao<br />
Fa<strong>da</strong>goso, entre vala<strong>do</strong>s, com partes em calça<strong>da</strong> e outr<strong>as</strong><br />
<br />
59 Fa<strong>da</strong>goso – situa-se junto de antigo caminho calceta<strong>do</strong><br />
que seguia para Corte d<strong>as</strong> Don<strong>as</strong>.<br />
CATARINO, Helena, 1997/98, “O <strong>Algarve</strong> Oriental durante a<br />
<br />
in ,<br />
N.º 6, 3 Volumes, Arquivo Histórico Municipal de Loulé, Loulé.<br />
MANTAS, V<strong>as</strong>co Gil, 1997, “Os caminhos <strong>da</strong> serra e <strong>do</strong> mar”<br />
in Noventa séculos entre a Serra e o Mar, I.P.P.A.R., Lisboa,<br />
pp. 311-325.<br />
RODRIGUES, Sandra, 2004, As vi<strong>as</strong> roman<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>,<br />
C.E.P. <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong> / C.C.D.R. <strong>Algarve</strong>, Faro.<br />
SANTOS, Maria Luisa Estácio <strong>da</strong> Veiga Afonso <strong>do</strong>s, 1972,<br />
Arqueologia Romana <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, Vol. II, Associação <strong>do</strong>s<br />
Arqueólogos Portugueses, Lisboa, pp. 367-396.<br />
TORRES, Cláudio, 1992, “Povoamento antigo no Baixo Alentejo.<br />
Arqueologia<br />
Medieval, N.º 1, Campo Arqueológico de Mértola, pp. 189-<br />
202.<br />
VIANA, Abel, 1960, “Not<strong>as</strong> históric<strong>as</strong>, arqueológic<strong>as</strong> e<br />
Arquivo<br />
de Beja, Vol. XVII, pp. 214-218.<br />
74 AS VIAS DO ALGARVE
.XI<br />
LIGAÇÃO DE S. BRÁS DE ALPORTEL POR ESTÓI E<br />
CONCEIÇÃO À ETAR NASCENTE FARO<br />
Trabalhos arqueológicos no âmbito <strong>do</strong> Sistema Multimunicipal de Saneamento <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
Multimunicipal de Saneamento <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong><br />
BRUNO SILVA | SUSANA BORGES | JOSÉ ANTÓNIO PEREIRA<br />
Novarqueologia, L<strong>da</strong>. 1<br />
resumo<br />
E<br />
Este artigo apresenta os trabalhos desenvolvi<strong>do</strong>s<br />
no âmbito <strong>do</strong> acompanhamento arqueológico de<br />
uma empreita<strong>da</strong> de construção de um sistema de<br />
saneamento nos concelhos de S. Brás de Alportel e<br />
Faro, e d<strong>as</strong> medid<strong>as</strong> de minimização preconizad<strong>as</strong><br />
<br />
e salvaguar<strong>da</strong> de vi<strong>as</strong> antig<strong>as</strong>.<br />
Desde Outubro de 2004 que a NOVARQUEOLOGIA,<br />
LDA é responsável, pelo acompanhamento<br />
arqueológico de um conjunto de empreitad<strong>as</strong> de<br />
construção ou reabilitação de infra-estrutur<strong>as</strong> de<br />
ab<strong>as</strong>tecimento de água e saneamento promovid<strong>as</strong><br />
pela empresa Águ<strong>as</strong> <strong>do</strong> <strong>Algarve</strong>, S. A.<br />
Ten<strong>do</strong> em conta a natureza d<strong>as</strong> empreitad<strong>as</strong>,<br />
destacan<strong>do</strong>-se a abertura de extens<strong>as</strong> val<strong>as</strong> para<br />
a implantação de condut<strong>as</strong> que unem <strong>as</strong> vári<strong>as</strong><br />
infra-estrutur<strong>as</strong> de ab<strong>as</strong>tecimento e saneamento,<br />
o Programa de Trabalhos privilegia de forma<br />
<br />
arqueologia preventiva:<br />
- o estu<strong>do</strong> de tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> informações disponíveis<br />
acerca d<strong>as</strong> empreitad<strong>as</strong> de forma a estabelecer<br />
áre<strong>as</strong> e tipos de afectação;<br />
- o levantamento exaustivo de to<strong>do</strong>s os <strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />
relativos aos bens patrimoniais d<strong>as</strong> áre<strong>as</strong> a serem<br />
afectad<strong>as</strong>;<br />
- a prospecção sistemática e/ou dirigi<strong>da</strong> em<br />
<br />
<br />
arqueológica <strong>do</strong> local.<br />
- intervenções de emergência ou diagnóstico<br />
como forma de mitigação de impactes negativos<br />
sobre eventuais elementos de valor patrimonial<br />
<br />
No âmbito <strong>do</strong> projecto “Ligação de São Brás De<br />
Alportel Por Estói e Conceição à ETAR N<strong>as</strong>cente de<br />
Faro” este tipo de actuação revelou-se fun<strong>da</strong>mental<br />
<br />
de calça<strong>da</strong> (Fonte <strong>do</strong> Touro) e no senti<strong>do</strong> de<br />
acautelar o impacto negativo <strong>da</strong> empreita<strong>da</strong> sobre<br />
eventuais vestígios <strong>da</strong> “Calçadinha de S. Brás” ou<br />
<br />
1<br />
Rua. Luís De Camões, 63. 2380-085 Alcanena.<br />
E-mail: Geral@novarqueologia.pt<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 75
a criação de um novo sistema de condução e<br />
tratamento de águ<strong>as</strong> residuais produzid<strong>as</strong> por<br />
povoações <strong>do</strong>s concelhos de São Brás de Alportel<br />
e Faro.<br />
A implantação d<strong>as</strong> condut<strong>as</strong> decorre essencial-<br />
<br />
a Norte, Este e a Oeste.<br />
calça<strong>da</strong> <strong>da</strong> fonte<br />
<strong>do</strong> touro<br />
Aquan<strong>do</strong> d<strong>as</strong> acções de prospecção sistemática<br />
prévi<strong>as</strong> à execução <strong>da</strong> obra que decorreram entre<br />
<br />
uma calça<strong>da</strong> no lugar de Fonte <strong>do</strong> Touro, n<strong>as</strong><br />
proximi<strong>da</strong>des <strong>da</strong> ribeira <strong>da</strong> Gaifona.<br />
Localiza<strong>da</strong> numa área de declive relativamente<br />
acentua<strong>do</strong> e franquea<strong>do</strong> por intensa vegetação,<br />
é composta por pedr<strong>as</strong> de calcário de superfícies<br />
polid<strong>as</strong> de diferentes tamanhos e dispost<strong>as</strong> de<br />
forma irregular.<br />
Apresenta cerca de 1,35m de largura média no<br />
troço mais largo e cerca de 30m de extensão<br />
preserva<strong>da</strong>, apresentan<strong>do</strong>-se mutila<strong>da</strong> em vári<strong>as</strong><br />
zon<strong>as</strong> inclusive na área mais próxima <strong>da</strong> ribeira,<br />
local de implantação <strong>da</strong> conduta de saneamento. O<br />
seu traça<strong>do</strong> é algo <strong>as</strong>simétrico apresentan<strong>do</strong> ligeira<br />
<br />
<br />
regulares e nalguns c<strong>as</strong>os encaixa<strong>da</strong> entre grandes<br />
<br />
um <strong>as</strong>pecto tosco.<br />
Para além de espólio cerâmico de cronologia<br />
<br />
arre<strong>do</strong>res <strong>da</strong> cita<strong>da</strong> calça<strong>da</strong>, no decurso destes<br />
trabalhos não se conseguiram reunir elementos<br />
que atestem a sua cronologia. Conseguiu-se<br />
apen<strong>as</strong> recolher um pequeno cravo possivelmente<br />
Figura 1<br />
Localização <strong>da</strong> calça<strong>da</strong> <strong>da</strong> Fonte <strong>do</strong> Touro e son<strong>da</strong>gem de diagnóstico na “Calçadinha de São Brás de Alportel”.<br />
76 AS VIAS DO ALGARVE
Figura 2<br />
Planta parcial <strong>da</strong> calça<strong>da</strong> <strong>da</strong> Fonte <strong>do</strong> Touro<br />
pertencente a ferradura de animal. Ten<strong>do</strong> em conta <strong>as</strong> característic<strong>as</strong> <strong>da</strong> calça<strong>da</strong> parece tratar-se de<br />
uma via de carácter local, de importância secundária cria<strong>da</strong> de forma espontânea e sem grande critério<br />
construtivo, provavelmente na I<strong>da</strong>de Moderna ou Contemporânea, para <strong>as</strong>segurar a circulação entre a<br />
povoação mais próxima e a ribeira.<br />
De realçar que não muito distante <strong>do</strong> local pervive o topónimo Calça<strong>da</strong>, topónimo que de alguma forma<br />
pode estar relaciona<strong>do</strong> com a existência desta via.<br />
Apesar de não se prever qualquer afectação por parte <strong>da</strong> empreita<strong>da</strong>, o sítio foi devi<strong>da</strong>mente sinaliza<strong>do</strong> e<br />
<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 77
Figura 3<br />
Trabalhos de registo na calça<strong>da</strong> <strong>da</strong> Fonte <strong>do</strong> Touro.<br />
trabalhos na<br />
calçadinha de s. brás<br />
Posteriormente, no decurso <strong>do</strong> acompanhamento<br />
<br />
traça<strong>do</strong> <strong>da</strong> conduta <strong>do</strong> Interceptor B poderia<br />
colidir com o novo troço <strong>da</strong> “calçadinha romana,”<br />
recentemente descoberto (Abril 2005) no âmbito <strong>do</strong>s<br />
trabalhos de valorização <strong>da</strong> mesma pela arqueóloga<br />
<strong>da</strong> Câmara Municipal de S. Brás de Alportel.<br />
Perante esta possibili<strong>da</strong>de, realizou-se uma reunião<br />
de campo que contou com representantes <strong>do</strong><br />
Instituto Português de Arqueologia, d<strong>as</strong> Águ<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
<strong>Algarve</strong>, Novarqueologia, Planege (Fiscalização)<br />
e com o empreiteiro (Hidralgar) <strong>da</strong> qual resultou<br />
uma solução alternativa à p<strong>as</strong>sagem <strong>da</strong> conduta,<br />
que previa a implantação desta numa antiga<br />
exploração de pedra que terá no p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong> leva<strong>do</strong><br />
à amputação total <strong>do</strong>s vestígios <strong>da</strong> calça<strong>da</strong> nesse<br />
local. Com esta nova alteração, o impacte nos<br />
vestígios arqueológicos seria nulo, <strong>da</strong><strong>do</strong> que a<br />
largura <strong>da</strong> vala não excedia os 90 cm. Mesmo <strong>as</strong>sim<br />
foi preconiza<strong>do</strong>, como medi<strong>da</strong> de minimização, a<br />
realização de uma son<strong>da</strong>gem de diagnóstico de 1m x<br />
1,20m. Constituiu objectivo principal <strong>da</strong> intervenção<br />
avaliar a existência de vestígios arqueológicos no<br />
subsolo que fossem afecta<strong>do</strong>s pelo novo traça<strong>do</strong><br />
<strong>da</strong> conduta e em particular a existência de um troço<br />
de calça<strong>da</strong> ou outros vestígios, paralelamente ao<br />
<br />
Contu<strong>do</strong>, <strong>da</strong> intervenção arqueológica resultou a<br />
<br />
cronologi<strong>as</strong> coetâne<strong>as</strong> à utilização <strong>da</strong> “calçadinha”,<br />
de acor<strong>do</strong> com os <strong>da</strong><strong>do</strong>s históricos e arqueológicos.<br />
De igual forma não foram recolhi<strong>do</strong>s artefactos ou<br />
outros elementos relaciona<strong>do</strong>s com a exploração<br />
<strong>da</strong> pedreira, que pudessem conter interesse para<br />
a arqueologia industrial. Como medi<strong>da</strong> mitiga<strong>do</strong>ra<br />
manteve-se o acompanhamento presencial <strong>do</strong>s<br />
trabalhos de abertura de vala e consequente<br />
movimentação de máquin<strong>as</strong> no senti<strong>do</strong> de <strong>as</strong>segurar<br />
a não obliteração acidental de qualquer parcela <strong>da</strong><br />
“calçadinha”.<br />
Figura 4<br />
Cravo () de ferradura em ferro proveniente <strong>da</strong> calça<strong>da</strong> <strong>da</strong> Fonte <strong>do</strong> Touro.<br />
78 AS VIAS DO ALGARVE
esulta<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s<br />
<br />
Touro) certamente contribuíra para o enriquecimento<br />
<strong>do</strong> acervo patrimonial <strong>do</strong> Concelho de São Brás<br />
de Alportel, a acrescentar à já famosa “Calçadinha<br />
de São Brás de São Brás Alportel”. De igual forma<br />
é um elemento novo que permite testemunhar a<br />
importância d<strong>as</strong> redes de mobili<strong>da</strong>de a nível local,<br />
em particular se atendermos ao facto de que a<br />
própria histórica “Calçadinha” ter si<strong>do</strong>, até há bem<br />
pouco tempo usa<strong>da</strong> como meio de comunicação.<br />
No que se refere à alternativa preconiza<strong>da</strong> para a<br />
implantação <strong>da</strong> conduta no troço B <strong>da</strong> “Calçadinha<br />
de São Brás de Alportel” impede qualquer tipo<br />
de afectação negativa sobre aquele elemento de<br />
valor patrimonial arqueológico. A son<strong>da</strong>gem de<br />
diagnóstico permitiu reconhecer a viabili<strong>da</strong>de <strong>do</strong><br />
traça<strong>do</strong> alternativo, sen<strong>do</strong> a afectação em termos<br />
arqueológicos nula. A intercepção <strong>da</strong> conduta na<br />
área <strong>da</strong> “Calçadinha” pela pedreira desactiva<strong>da</strong><br />
conferirá ain<strong>da</strong> um maior grau de segurança para<br />
os visitantes, uma vez que o fosso a céu aberto será<br />
aterra<strong>do</strong> para ocultar a conduta. Não obstante,<br />
to<strong>do</strong>s os trabalhos de implantação de conduta<br />
no local serão devi<strong>da</strong>mente acompanha<strong>do</strong>s pela<br />
equipa de arqueologia.<br />
Figura 5<br />
Trabalhos de registo na son<strong>da</strong>gem efectua<strong>da</strong> na “Calçadinha de São<br />
Brás de Alportel”.<br />
Figura 6<br />
Implantação e plano inicial <strong>da</strong> son<strong>da</strong>gem na “Calçadinha de São Brás<br />
de Alportel”.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 79
.XII<br />
VIAS URBANAS DE SILVES: MUTAÇÕES E PERVIVÊNCIAS<br />
MARIA JOSÉ GONÇALVES<br />
Arqueóloga, Gabinete de Arqueologia <strong>da</strong> Câmara Municipal de Silves<br />
resumo<br />
N<br />
Neste pequeno estu<strong>do</strong> apresentam-se alguns <strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />
resultantes <strong>da</strong> investigação arqueológica e <strong>da</strong><br />
análise d<strong>as</strong> fontes históric<strong>as</strong>, que conjugad<strong>as</strong>, nos<br />
permitiram reconstituições <strong>do</strong> traça<strong>do</strong> viário urbano<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Silves, nos perío<strong>do</strong>s de <strong>do</strong>minação<br />
islâmica e durante o século XV, observan<strong>do</strong>-se<br />
mutações e pervivênci<strong>as</strong>.<br />
Figura 1<br />
Indicação <strong>do</strong> possível cardus e decumanus, segun<strong>do</strong> R.V.Gomes.<br />
80 AS VIAS DO ALGARVE
introdução<br />
Ain<strong>da</strong> que alguns autores admitam para a ci<strong>da</strong>de de<br />
Silves uma possível fun<strong>da</strong>ção Romana 1 , a ver<strong>da</strong>de é<br />
que até à presente <strong>da</strong>ta, não obstante a enorme área<br />
escava<strong>da</strong>, ou arqueológicamente acompanha<strong>da</strong>, no<br />
<br />
Centro Histórico (Programa Polis) 2 , ain<strong>da</strong> em curso, e<br />
muitos outros trabalhos antes realiza<strong>do</strong>s, os vestígios<br />
romanos são residuais e descontextualiza<strong>do</strong>s e a<br />
ocupação mais antiga remonta ao perío<strong>do</strong> islâmico,<br />
consistin<strong>do</strong>, na maior parte <strong>do</strong>s c<strong>as</strong>os, em estrutur<strong>as</strong><br />
habitacionais e negativ<strong>as</strong> (silos e foss<strong>as</strong>), est<strong>as</strong><br />
últim<strong>as</strong> escavad<strong>as</strong> no substracto geológico (Vieira e<br />
Chanoca, 2006 a; 2006 b).<br />
Também no decurso de obr<strong>as</strong> de construção civil,<br />
tiveram lugar em zon<strong>as</strong> mais baix<strong>as</strong> <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de,<br />
trabalhos arqueológicos em áre<strong>as</strong> de dimensão<br />
<strong>as</strong>sinalável e não se colocaram a descoberto níveis<br />
de ocupação romana. As ocupações mais antig<strong>as</strong><br />
remontavam ao século XI em <strong>do</strong>is <strong>do</strong>s c<strong>as</strong>os –<br />
Biblioteca (Gonçalves e Santos, 2005:198), Teatro<br />
M<strong>as</strong>carenh<strong>as</strong> Gregório (Ramos,2004:4) e aos séculos<br />
XII-XIII no Empreendimento <strong>do</strong> C<strong>as</strong>telo (Duarte e<br />
Costa, 2006).<br />
To<strong>da</strong>via, a Arqueóloga R. V. Gomes, exumou tramo<br />
de muralha que <strong>as</strong>sentava sobre nível arqueológico<br />
que atribuiu ao perío<strong>do</strong> tar<strong>do</strong>-romano, um pouco a<br />
n<strong>as</strong>cente <strong>da</strong> Porta <strong>da</strong> Almedina (Gomes e Gomes,<br />
1992:288 e Gomes, 2002 b:332), e defende fun<strong>da</strong>ção<br />
romana para a ci<strong>da</strong>de de Silves (Gomes,2002a:93),<br />
ven<strong>do</strong> n<strong>as</strong> actuais ru<strong>as</strong> que cruzam junto à Sé, o<br />
car<strong>do</strong> maximus e o decumanos, que marcavam a<br />
organização urbana d<strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des roman<strong>as</strong> <br />
<br />
vi<strong>as</strong> e na actual organização urbana <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de esses<br />
traços de ortogonali<strong>da</strong>de, antes vislumbramos um<br />
urbanismo com origem n<strong>as</strong> ci<strong>da</strong>des islâmic<strong>as</strong>,<br />
em que o planeamento é mínimo e se centra n<strong>as</strong><br />
<br />
a Mesquita Aljama e os Merca<strong>do</strong>s, e a situação<br />
estratégica e o relevo actuam como principais<br />
elementos condiciona<strong>do</strong>res <strong>da</strong> sua implantação.<br />
Assim, estamos perante um crescimento orgânico<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, altamente dependente <strong>do</strong> aumento<br />
<strong>da</strong> população, ain<strong>da</strong> que algum<strong>as</strong> regr<strong>as</strong> de<br />
planeamento se encontrem subjacentes 3 .<br />
perío<strong>do</strong> de<br />
permanência islâmica<br />
Ain<strong>da</strong> que algum<strong>as</strong> frentes de trabalho arqueológico<br />
se encontrem em curso, e pouca informação tenha<br />
si<strong>do</strong> divulga<strong>da</strong> sobre os acha<strong>do</strong>s, temos conhecimento<br />
de que se não colocaram a descoberto<br />
quaisquer vestígios <strong>da</strong> rede viária urbana relativa<br />
ao perío<strong>do</strong> de <strong>do</strong>minação islâmica 4 . Pelo contrário,<br />
<br />
lógic<strong>as</strong> efectuad<strong>as</strong> sob os actuais arruamentos,<br />
estrutur<strong>as</strong> habitacionais islâmic<strong>as</strong>, revelan<strong>do</strong> que a<br />
actual rede viária nem sempre coincide exactamente<br />
com os arruamentos <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de islâmica. Porém,<br />
em du<strong>as</strong> intervenções ocorrid<strong>as</strong> em zon<strong>as</strong> que<br />
corresponderiam ao arrabalde Este <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, há<br />
vestígios de vi<strong>as</strong> urban<strong>as</strong>.<br />
Na intervenção arqueológica <strong>da</strong> “Biblioteca”, em que<br />
os elementos arquitectónicos de maior relevância se<br />
materializam em <strong>do</strong>is tramos de muralha liga<strong>do</strong>s por<br />
uma torre de ângulo, foram coloca<strong>do</strong>s a descoberto<br />
1<br />
Ver a propósito, artigo de Jorge de Alarcão (2005:294 a 297), sobre a localização <strong>do</strong> oppidum Cilibis.<br />
2<br />
Foram escavad<strong>as</strong> v<strong>as</strong>t<strong>as</strong> áre<strong>as</strong> e realizad<strong>as</strong> mais de 150 son<strong>da</strong>gens arqueológic<strong>as</strong> na ci<strong>da</strong>de de Silves.<br />
3<br />
Ver a propósito: Ahmed Tahiri (2006), n<strong>as</strong> fontes jurídic<strong>as</strong>: Trata<strong>do</strong>s <strong>da</strong> Hisba e Direito ao Merca<strong>do</strong>, Regulamento <strong>da</strong> Defesa, Regime<br />
Imobiliário e Regulamentação Tributária, Regime de Arren<strong>da</strong>mento de Vivend<strong>as</strong> e Terrenos, Trata<strong>do</strong>s de Construção, etc. E, ain<strong>da</strong>, Alfonso<br />
Gonzalez Carmona (2005) La Medina en formación. Los <strong>da</strong>tos de los textos jurídicos – Comunicação apresenta<strong>da</strong> no 3º Congreso La<br />
Medina en Formación: La Ciu<strong>da</strong>d en el Occidente Islámico Medieval. Nov<strong>as</strong> aportaciones de la arqueologia e relectura de fuentes, Silves,<br />
7 a 10 de Setembro de 2005.<br />
4<br />
As son<strong>da</strong>gens realizad<strong>as</strong> nalgum<strong>as</strong> ru<strong>as</strong>, nomea<strong>da</strong>mente na Rua <strong>da</strong> Arrochela, Rua Nova <strong>do</strong> Carmo e Rua <strong>do</strong> Pelourinho, revelaram a<br />
existência de foss<strong>as</strong>, que habitualmente se localizam sob os arruamentos, levan<strong>do</strong> a inferir tratar-se de ru<strong>as</strong> que à época já existiam,<br />
com um traça<strong>do</strong> semelhante.<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 81
Figura 2<br />
Arruamento em seixo rola<strong>do</strong> <strong>da</strong> escavação arqueológica <strong>da</strong> “Biblioteca”<br />
Figura 3<br />
Arruamento em terra bati<strong>da</strong> <strong>da</strong> escavação arqueológica<br />
“Empreendimento <strong>do</strong> C<strong>as</strong>telo”<br />
três níveis de arruamento sobrepostos, construí<strong>do</strong>s<br />
em seixo rola<strong>do</strong> de pequena a média dimensão,<br />
compacta<strong>do</strong>s com terra de matriz arenosa e muito<br />
material arqueológico. Este arruamento, corre<br />
no senti<strong>do</strong> Este-Oeste, e <strong>as</strong>socia-se a estrutur<strong>as</strong><br />
habitacionais, dispost<strong>as</strong> a Norte <strong>do</strong> mesmo, sen<strong>do</strong><br />
que, na zona em que toca a torre, o seu material<br />
construtivo compõe-se de pequen<strong>as</strong> lajes de arenito<br />
vermelho. Na área escava<strong>da</strong>, esta via mede cerca<br />
de 4m de largura por 20m de comprimento e, o<br />
sector que encosta à torre, 2m de largura por 8m<br />
de comprimento. Terá si<strong>do</strong> construí<strong>da</strong> no perío<strong>do</strong><br />
<br />
2005:188 e Gonçalves e Pires, 2006) <br />
Também na intervenção arqueológica leva<strong>da</strong> a cabo<br />
em área limítrofe Este <strong>da</strong> actual ci<strong>da</strong>de, espaço<br />
que parece coincidir com zona limite de um <strong>do</strong>s<br />
arrabaldes <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de islâmica, foram resgatad<strong>as</strong> <strong>do</strong><br />
terreno, uma imensidão de estrutur<strong>as</strong> arqueológic<strong>as</strong>,<br />
<br />
XII-XIII, <strong>as</strong>sociad<strong>as</strong> a arruamentos, evidencian<strong>do</strong><br />
algum planeamento urbanístico.<br />
A via principal, de orientação Nordeste-Su<strong>do</strong>este,<br />
media 4m de largura máxima e detinha cerca de<br />
40m de comprimento na área escava<strong>da</strong>, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong><br />
construí<strong>da</strong> em terra bati<strong>da</strong> que embalava alguns<br />
calhaus rola<strong>do</strong>s de pequena dimensão, sen<strong>do</strong><br />
provável que se dirigisse a uma d<strong>as</strong> port<strong>as</strong> <strong>da</strong><br />
muralha <strong>do</strong> Arrabalde Este <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de. Para além<br />
deste, corria outro arruamento paralelo, <strong>do</strong> la<strong>do</strong><br />
Oeste, com uma largura aproxima<strong>da</strong> de cerca de<br />
2m e mais de 10m de comprimento, igualmente<br />
construí<strong>do</strong> em terra bati<strong>da</strong>. Um outro arruamento<br />
corria no senti<strong>do</strong> perpendicular à via principal, de<br />
orientação tendencialmente Este-Oeste, m<strong>as</strong> não se<br />
articulava com a anterior. Este último oferecia uma<br />
técnica construtiva em tu<strong>do</strong> semelhante à descrita<br />
para o arruamento <strong>do</strong> sítio <strong>da</strong> “Biblioteca”, ou seja,<br />
o recurso ao seixo rola<strong>do</strong> compacta<strong>do</strong> com terra e<br />
material cerâmico. Media cerca de 2m de largura,<br />
sen<strong>do</strong> ladea<strong>do</strong> por <strong>do</strong>is muros que o encerrava e,<br />
muito provavelmente, conduziria a espaço agrícola<br />
junto à margem direita <strong>do</strong> Rio Arade 5 <br />
O conhecimento inequívoco <strong>da</strong> localização d<strong>as</strong> três<br />
port<strong>as</strong> que permitiam o acesso ao interior <strong>da</strong> Medina,<br />
permitem-nos inferir sobre a existência de três ru<strong>as</strong><br />
<br />
perto <strong>da</strong> Mesquita Aljama e <strong>do</strong> acesso ao interior<br />
<strong>da</strong> alcáçova. Assim, a porta em cotovelo aberta no<br />
sector Sul <strong>da</strong> muralha <strong>da</strong> Almedina, permitiria o<br />
acesso à zona central <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de através <strong>da</strong> actual<br />
Rua <strong>da</strong> Sé; a porta aberta no sector Oeste <strong>da</strong><br />
muralha facilitaria, de igual mo<strong>do</strong>, o acesso à zona<br />
nobre <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, através <strong>da</strong> actual Rua <strong>da</strong> Porta <strong>da</strong><br />
Azóia e; a porta aberta no sector Este <strong>da</strong> muralha,<br />
através <strong>da</strong> actual Rua <strong>do</strong> C<strong>as</strong>telo, conduziria à zona<br />
privilegia<strong>da</strong> de encontro d<strong>as</strong> populações <strong>da</strong> Xilb<br />
islâmica <br />
5<br />
Agradecemos à Dra. Paula Abranches, Arqueóloga administra<strong>do</strong>ra <strong>da</strong> Empresa Archeoestu<strong>do</strong>s e ao Dr. José Costa, Arqueólogo responsável<br />
pela escavação, tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> informações e elementos cedi<strong>do</strong>s.<br />
82 AS VIAS DO ALGARVE
Figura 4<br />
Edifícios e elementos viários <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Silves no perío<strong>do</strong> de <strong>do</strong>minação islâmica<br />
século xv<br />
É neste perío<strong>do</strong> que <strong>as</strong> fontes nos oferecem maior<br />
quanti<strong>da</strong>de de informação quanto às vi<strong>as</strong> urban<strong>as</strong> <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong>de de Silves. O Livro <strong>do</strong> Almoxarifa<strong>do</strong> de Silves,<br />
produzi<strong>do</strong> em 1474, ao descrever a proprie<strong>da</strong>de régia<br />
e <strong>as</strong> rend<strong>as</strong> que deviam ao monarca aqueles que a<br />
traziam afora<strong>da</strong>, vai percorren<strong>do</strong> <strong>as</strong> ru<strong>as</strong> <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de,<br />
de um mo<strong>do</strong> que nos permite alguma reconstituição,<br />
não só d<strong>as</strong> vi<strong>as</strong> urban<strong>as</strong>, como d<strong>as</strong> que ligavam a<br />
ci<strong>da</strong>de às proprie<strong>da</strong>des e locali<strong>da</strong>des vizinh<strong>as</strong>.<br />
Assim, no interior <strong>da</strong> Almedina, é-nos possível<br />
Rua direita (actual Rua <strong>da</strong> Sé), que<br />
<strong>da</strong> Porta <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong>de se dirigia para Norte, p<strong>as</strong>san<strong>do</strong><br />
frente à Sé, prolongan<strong>do</strong>-se até cerca <strong>do</strong>s muros <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong>de (fol.1 a 4). Também conhecemos a rua que,<br />
<strong>da</strong> Porta <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong>de viran<strong>do</strong> para a direita, conduzia<br />
à Judiaria (actual Rua <strong>da</strong> Porta de Loulé) (fol. 8 e 9).<br />
Ain<strong>da</strong>, a rua que, <strong>da</strong> Porta <strong>da</strong> Almedina viran<strong>do</strong> à<br />
esquer<strong>da</strong>, p<strong>as</strong>sava junto aos chãaos que em outro<br />
tempo foram banhos (actual Rua <strong>da</strong> Cadeia) (fol.<br />
9v.). Também a Rua Pública que encimava a C<strong>as</strong>a <strong>da</strong><br />
Aduana (actual Travessa <strong>da</strong> Cató) (fol.10) e, ain<strong>da</strong>,<br />
a Rua pública travessa, que separava pardieiros,<br />
de c<strong>as</strong>a que noutro tempo havia si<strong>do</strong> celeiro (actual<br />
Rua <strong>da</strong> Misericórdia) (fol. 10). No cimo <strong>da</strong> Rua direita,<br />
de fronte à C<strong>as</strong>a d<strong>as</strong> Fang<strong>as</strong> e <strong>do</strong>s Açougues,<br />
conhecemos uma outra Rua pública, que se dirigia<br />
para a Porta <strong>da</strong> Azóia (actuais Largo Correia Lobo<br />
e Rua <strong>da</strong> Porta <strong>da</strong> Azóia) (fol.4v. e 5), por detrás <strong>da</strong><br />
qual se situava uma Azinhaga sem saí<strong>da</strong> (actual Rua<br />
<strong>do</strong> Saco) (fol.4v.).<br />
A maior dúvi<strong>da</strong> reside na localização <strong>da</strong> Rua <strong>da</strong><br />
Çapataria Velha (fol. 10 e 11), a única à qual é<br />
atribuí<strong>do</strong> nome próprio. É menciona<strong>da</strong> após referência<br />
à actual Rua <strong>da</strong> Cató, razão que nos sugere situar-se<br />
na sua proximi<strong>da</strong>de. Na mesma se localizam, além<br />
de c<strong>as</strong><strong>as</strong> térre<strong>as</strong> <strong>do</strong> rei, o Forno Grande, o Forno<br />
<strong>do</strong> Corteçinho e o Forno <strong>da</strong> Rua. Maria de Fátima<br />
Botão, julga tratar-se <strong>da</strong> actual Rua Nova <strong>da</strong> Boavista<br />
(Botão,1992: 27 e 98), que ligava directamente à<br />
<strong>ACTAS</strong> <strong>DAS</strong> I JORNA<strong>DAS</strong> 83
Fig. 5<br />
Edifícios e elementos viários <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Silves no século XV<br />
buraca. Por seu turno, Garcia Domingues (Leal, 1984:<br />
83), advoga tratar-se <strong>da</strong> actual Rua <strong>da</strong> Arrochela,<br />
o que nos parece mais plausível, por questões de<br />
proximi<strong>da</strong>de aos espaços que antecedem a menção.<br />
M<strong>as</strong>, também n<strong>as</strong> zon<strong>as</strong> designad<strong>as</strong> no Livro <strong>do</strong><br />
Almoxarifa<strong>do</strong> de Silves, como Mouraria e Arrabalde o<br />
rei possuía bens afora<strong>do</strong>s, que confrontavam com ru<strong>as</strong><br />
públic<strong>as</strong>, muito embora, neste c<strong>as</strong>o, seja mais difícil<br />
localizá-l<strong>as</strong>, <strong>da</strong><strong>do</strong> que os bens afora<strong>do</strong>s, são qu<strong>as</strong>e<br />
sempre espaços devolutos, ou parcel<strong>as</strong> de terreno de<br />
vocação agrícola, tornan<strong>do</strong>-se impossível seguir <strong>as</strong><br />
<br />
referid<strong>as</strong>. Ain<strong>da</strong> <strong>as</strong>sim, reconhecemos na actual Rua<br />
<strong>do</strong> Moinho <strong>da</strong> Porta, a Rua pública que conduzia ao<br />
Moinho <strong>da</strong> Porta (fol. 12), bem como a Porta <strong>do</strong><br />
Cerco <strong>da</strong> Mouraria (fol.12v.), à qual se seguiria uma<br />
rua, talvez actual Rua Eli<strong>as</strong> Garcia.<br />
Para além dest<strong>as</strong> ru<strong>as</strong>, são referid<strong>as</strong> mais du<strong>as</strong> ru<strong>as</strong><br />
públic<strong>as</strong>, que não foi possível situar, bem como diversos<br />
caminhos, nomea<strong>da</strong>mente, o Caminho para a Ponte<br />
(fol.15), (talvez actual Rua Policarpo Di<strong>as</strong>) o Caminho<br />
para Fonte <strong>da</strong> Mesquita (fol.15), certamente a actual<br />
Rua <strong>da</strong> Mesquita, sen<strong>do</strong> que amb<strong>as</strong> entestavam com a<br />
Cerca <strong>da</strong> Mouraria e encerravam um ferragial e, ain<strong>da</strong>,<br />
o Caminho para Portugal (fol.15v.), que acreditamos<br />
tratar-se <strong>da</strong> actual Rua Cruz de Portugal, <strong>da</strong><strong>do</strong> que<br />
esta encerrava a Norte a Horta <strong>do</strong> Pão, que a Sul<br />
era delimita<strong>da</strong> pelo Açude <strong>do</strong>s Moinhos <strong>da</strong> Porta e<br />
<strong>da</strong> Torre, imóveis cuja localização é hoje reconheci<strong>da</strong><br />
junto à margem direita <strong>do</strong> Arade. Encontramos ain<strong>da</strong><br />
referência ao Caminho que ia para o Enxerim<br />
(fol.16v.) e que partiria <strong>da</strong> Torre Cruza<strong>da</strong> <strong>do</strong> C<strong>as</strong>telo,<br />
tratan<strong>do</strong>-se, muito provavelmente, <strong>da</strong> actual Rua <strong>do</strong><br />
Cemitério <br />
Para além dest<strong>as</strong> vi<strong>as</strong>, o valioso <strong>do</strong>cumento refere<br />
diversos caminhos que ligavam a ci<strong>da</strong>de de Silves a<br />
locali<strong>da</strong>des vizinh<strong>as</strong>, sem que, contu<strong>do</strong>, se consiga<br />
reconstituir o seu traça<strong>do</strong>. São menciona<strong>do</strong>s<br />
os caminhos que levavam a Lagoa, Bemposta,<br />
Estombar, Lagos, S. Miguel, Porches e Alagoa,<br />
locais cujos solos detém grande vocação agrícola e<br />
onde, privilegia<strong>da</strong>mente, se situava grande parte <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong>de régia.<br />
84 AS VIAS DO ALGARVE
considerações finais<br />
A falta de ortogonali<strong>da</strong>de <strong>do</strong> traça<strong>do</strong> viário actual<br />
recusa a ideia de uma fun<strong>da</strong>ção romana <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de<br />
de Silves, muito embora tenhamos que admitir, que a<br />
<br />
por completo eventuais marc<strong>as</strong> de um traça<strong>do</strong><br />
hipodâmico.<br />
Apesar de serem marcantes os traços de uma<br />
estruturação urbana islâmica, alguns <strong>do</strong>s vestígios<br />
arqueológicos coloca<strong>do</strong>s a descoberto, no âmbito de<br />
trabalhos arqueológicos recentes, dão a conhecer a<br />
ocupação de algum<strong>as</strong> d<strong>as</strong> actuais ru<strong>as</strong> por estrutur<strong>as</strong><br />
habitacionais islâmic<strong>as</strong>, necrópole islâmica, etc.,<br />
levan<strong>do</strong> a concluir sobre um traça<strong>do</strong> viário islâmico<br />
algo diverso <strong>do</strong> actual. Tal evidência encontra<br />
<br />
<br />
durante o século XIV, que levará ao aban<strong>do</strong>no e<br />
degra<strong>da</strong>ção de habitações, poden<strong>do</strong> a consequente<br />
<br />
espaços, que ao serem reocupa<strong>do</strong>s séculos depois,<br />
merecerão uma diferente organização espacial,<br />
nomea<strong>da</strong>mente no concernente aos arruamentos.<br />
Tal situação de declínio é visível na descrição <strong>da</strong><br />
proprie<strong>da</strong>de régia, que o Livro <strong>do</strong> Almoxarifa<strong>do</strong><br />
de Silves (século XV) encerra, não obstante se<br />
<br />
ain<strong>da</strong> hoje existentes, mostran<strong>do</strong> a longa pervivência<br />
dest<strong>as</strong> vi<strong>as</strong>.<br />
A análise <strong>do</strong>s <strong>da</strong><strong>do</strong>s disponíveis relativos a vi<strong>as</strong><br />
urban<strong>as</strong> no perío<strong>do</strong> islâmico cinge-se aos<br />
arruamentos <strong>do</strong> arrabalde, recentemente coloca<strong>do</strong>s<br />
a descoberto no âmbito de trabalhos arqueológicos.<br />
Apesar de se tratar de uma amostra reduzi<strong>da</strong>, vemos<br />
alguma uniformi<strong>da</strong>de no que concerne à largura<br />
<strong>do</strong>s caminhos principais e secundários (4m e 2m,<br />
respectivamente) e, também, no que concerne às<br />
técnic<strong>as</strong> construtiv<strong>as</strong> - terra bati<strong>da</strong> ou seixo rola<strong>do</strong><br />
compacta<strong>do</strong> com terra.<br />
A continuação <strong>do</strong>s trabalhos arqueológicos e a<br />
análise sistemática <strong>do</strong>s <strong>da</strong><strong>do</strong>s recolhi<strong>do</strong>s permitirão,<br />
no futuro, ilações mais consistentes acerca <strong>da</strong><br />
evolução <strong>da</strong> rede viária urbana de Silves.<br />
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