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oralidade e escrita: refletindo a prática pedagógica ... - Celsul.org.br

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Anais do 6º Encontro <strong>Celsul</strong> - Círculo de Estudos Lingüísticos do SulORALIDADE E ESCRITA: REFLETINDO A PRÁTICA PEDAGÓGICA DOCENTEClésia da Silva Mendes ZAPELINI (PG-UNISUL) *ABSTRACT: The article presents results of an applied field research to students of a first series of theFundamental Teaching, with the objective of describing, by observation, the pedagogic practices of ateacher's of 1st series Portuguese Language, from the ,proposition of the activities to the correctionevents.KEYWORDS: acquisition; speech and writing; pedagogic practice.1 Introdução: Este artigo irá descrever, mediante observação, as práticas pedagógicas de LínguaPortuguesa de um docente de 1ª série do Ensino Fundamental, desde a proposição das atividades até oseventos de correção. Vamos relevar as dificuldades que o professor encontra de corrigir ou não a <strong>escrita</strong>da criança, como e quando realiza-la sem causar danos ou constrangimento para as mesmas. Aobservação ocorre na Escola de Ensino Fundamental Professora Naíde Guedert Teixeira, no Municípiode Gravatal, Santa Catarina.Sabemos que vários pesquisadores têm buscado aprofundar as questões voltadas àaquisição da linguagem <strong>escrita</strong>, mas, neste artigo, pretendo priorizar os estudos de Luria (1998), EmiliaFerreiro e Ana Teberosky (1985) e Lemle (1994).Com intuito de aproximar as teorias da prática pedagógica docente, realizarei uma análisede dados com base na observação realizada no contexto de sala de aula.2 Fundamentação teórica: O processo de aquisição da linguagem <strong>escrita</strong> inicia muito antes da criançafreqüentar a 1ª série do ensino fundamental, interagindo com as diversas manifestações <strong>escrita</strong>s no seudia-a-dia - <strong>escrita</strong> de bilhetes, receitas, utilização de manuais. Luria (1988) destaca que o primeiroestágio do desenvolvimento da <strong>escrita</strong> não ocorre no momento em que a criança começa a escrever seusprimeiros exercícios na escola, a origem deste processo está na pré-história do desenvolvimento dasformas superiores do comportamento infantil.Dentro do vasto programa de pesquisa do grupo de Vygotsky, Luria desenvolveu o estudoexperimental so<strong>br</strong>e o desenvolvimento da <strong>escrita</strong>. Solicitava às crianças que não sabiam ler e nemescrever que memorizassem uma série de sentenças faladas por ele, depois, pedia-lhes que asescrevessem. A partir desta observação, Luria delineou um percurso para a pré-história da <strong>escrita</strong>.Inicialmente, a criança construía apenas rabiscos mecânicos.[...] Apreendiam a forma externa da <strong>escrita</strong> e viam como os adultos a executavam; erammesmo capazes de imitar os adultos, mas eram completamente incapazes de apreender osatributos psicológicos específicos que qualquer ato deve ter, caso venha ser usado comoinstrumento a serviço de algum fim (LURIA, 1988:149).O ato de escrever para a criança não era um meio para representar algum significado, masuma <strong>br</strong>incadeira, um ato em si mesmo.É comum observarmos crianças, na faixa etária de dois e três anos, rabiscando semsignificado funcional, apenas por mero prazer, embora temos crianças que utilizam os rabiscos comoauxiliar da memória, escrevem por meio de sinais topográficos. “[...] Punham um risco em um canto dopapel e outro em um segundo canto e, ao agir assim, começavam as sentenças ditadas com as suasanotações, [...]” (LURIA, 1988:157).As marcas topográficas se caracterizam por apresentar uma <strong>escrita</strong> que reflita as diferençasnas sentenças faladas, isto é, frases curtas são registradas por marcas pequenas e frases longas pormarcas grandes. Depois a criança passa a diferenciar (as frases) pelo conteúdo do que é dito, e preocupaseem distinguir quantidade, tamanho, forma e outras características concretas.Segundo Luria (1988), o pequeno sinal feito pela criança em um papel é o primeirorudimento do que mais tarde se transformará na <strong>escrita</strong>. A criança <strong>org</strong>aniza o seu pensamento, mas aindanão possui um conteúdo próprio, embora não determine, mas indica algum significado.* Especialista em Fundamentos Epistemológicos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental pelaUniversidade do Sul de Santa Catarina. Aluna do curso de mestrado em Ciências da Linguagem daUniversidade do Sul de Santa Catarina, clesiamcl@ac.unisul.<strong>br</strong>.


Neste ponto do seu desenvolvimento, a criança já desco<strong>br</strong>iu a necessidade de trabalharcom marcas diferentes em sua <strong>escrita</strong>, desco<strong>br</strong>iu a sua natureza instrumental, e assim começa a utilizardesenhos, que Luria denominou de representações pictográficas.Os desenhos não são utilizados como forma de expressão individual, mas sim como signosmediadores que representam conteúdos determinados.[...] a criança,inicialmente, chega à idéia de usar o desenho (no qual antes já era bastanteboa) como meio de recordar e, pela primeira vez, o desenho começa a convergir para umaatividade intelectual complexa. O desenho transforma -se, passando de simplesrepresentação para um meio, e o intelecto adquire um instrumento novo e poderoso naforma da primeira <strong>escrita</strong> diferenciada (LURIA, 1988:166).O próximo passo é a assimilação dos mecanismos da <strong>escrita</strong> simbólica, culturalmentedisponível. Esse percurso não é um processo individual, independente do contexto, mas resultado dasinterações com os usos da língua <strong>escrita</strong>. É no contato com <strong>escrita</strong> dos adultos e pelos processos demediações que ocorre a aquisição da linguagem <strong>escrita</strong> na criança. Dependendo do contexto em que acriança está inserida, poderá não passar por nenhum destes processos elaborados por Luria, pelo fato denão aceitar desenhos para representar a <strong>escrita</strong>. Utilizará, por exemplo, “A” para carrinho, “A” para casa,“A” para cachorro. Enfim, o percurso sofrerá variações de acordo com suas experiências.As pesquisadoras Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (1985) também elaboraram umaexplicação so<strong>br</strong>e os processos que levam as crianças a aprenderem a ler e a escrever, propuseram umtipo de aproximação ao problema da aprendizagem do sistema de <strong>escrita</strong>, introduzindo as idéias doepistemólogo e psicólogo Jean Piaget, mencionando o essencial da sua teoria e do seu método científico.A metodologia utilizada pelas pesquisadoras foi à entrevista clínica, realizando estudoslongitudinais e transversais com crianças de diversos meios socioculturais. Nas tarefas de <strong>escrita</strong>solicitavam às crianças que escrevessem um conjunto de palavras cujo significado fosse conhecido, comgradação segundo o número de sílabas. Após a <strong>escrita</strong>, era solicitado que a criança procedesse à leiturado que acabara de escrever, apontando os registros.Nas atividades de leitura solicitavam que as crianças escolhessem entre uma coleção decartões com letras, palavras, desenhos, esquemas e pseudoletras quais lhes pareciam adequadas para ler.“O objetivo era identificar a existência de critérios formais relativos às características que a <strong>escrita</strong> devater para ser reconhecida como tal (AZENHA, 1996:27)”.No início foram acompanhadas trinta crianças de classe social baixa, cursando a primeirasérie do Ensino Fundamental, o acompanhamento ocorreu no início, no meio e no fim do ano letivo.Em um estudo transversal, outras 78 crianças entre quatro a seis anos foram entrevistadas,crianças oriundas de classes sociais baixa s e média. O objetivo era de verificar a partir de que momentoa <strong>escrita</strong> tornava-se objeto de conhecimento.Segundo, Landsmann (1998:175):Os resultados de todas as situações experimentais demonstraram a existênciade um interesse muito precoce pela <strong>escrita</strong>, ao mesmo tempo que indicavamque algumas das idéias infantis não coincidiam com as convenções da <strong>escrita</strong>alfabética.As conclusões obtidas por Ferreiro e Teberosky indicam que as crianças constroemhipóteses so<strong>br</strong>e a linguagem <strong>escrita</strong>, que se sucedem em uma progressão regular, constituindo de níveisou fases da aquisição. Nessa progressão, é possível distinguir três períodos em que as crianças tentamresolver os problemas específicos:‣ Distinção entre a representação icônica e não-icônica;‣ Construção de diferenciações entre o que se escreve, com critérios centrados tanto naquantidade quanto no tipo de marca empregada;‣ Incorporação de recursos de fonetização à <strong>escrita</strong>.O primeiro período está caracterizado pela busca de parâmetros distintivos entre as marcasgráficas icônicas e as não icônicas. Nesse período as letras se constituem em objetos substitutivos ecomeça a busca das condições de interpretabilidade desses objetos. Ou seja, a criança menos de quatroou cinco anos ao classificar os cartões em que aparecem letras soltas, letras deformadas, palavras, váriasletras juntas que não forma m palavras, não conseguem separar o icônico do não icônico. “A criança,geralmente não denomina “desenho” ao icônico, mas o chama daquilo que lhe parece que estádesenhado[...] (LANDSMANN, 1998:176)”. Por exemplo, se mostrarmos um cartão com a imagem deuma casa, logo ela vai dizer que não dá para ler, pois é uma casa. Olhando o objeto a criança rejeita


enquanto <strong>escrita</strong>. O não icônico, a criança estabelece diversas denominações, pois serve para ler.Portanto, nesta etapa é comum aparecer na <strong>escrita</strong> muitas letras, letras repetidas, imitação da <strong>escrita</strong>manuscrita, etc.A criança percebe que com o mesmo tipo de linhas, pode desenhar e escrever, mas adiferença está na <strong>org</strong>anização das linhas. Quando desenha as linhas seguem os contornos dos objetos, ena <strong>escrita</strong> as linhas não seguem os contornos dos objetos. Quando escreve está fora do campo icônico, asformas das letras nada tem a ver com a forma do objeto ao qual as letras se referem.Graças a essa distinção, as crianças reconhecem, com muita rapidez, duas dasprincipais características básicas de qualquer sistema de <strong>escrita</strong> – a saber: oconjunto de formas é arbitrário (pois as letras não reproduzem a forma dosobjetos) e elas são <strong>org</strong>anizadas de maneira linear (ao contrário do desenho).Na verdade, linearidade e arbitrariedade de formas são as duas característicasque aparecem muito cedo nas produções <strong>escrita</strong>s das crianças pequenas(FERREIRO, 1995:25).As formas convencionais costumam aparecer cedo nas produções das crianças. No entanto,os esforços não estão para invenção de outras letras, mas na maneira como os elementos são<strong>org</strong>anizados.Quando a criança começa a diminuir o número de caracteres que escreve para construir<strong>escrita</strong>s que se diferenciam umas das outras, indica que a criança ingressou em um outro momento daaquisição da <strong>escrita</strong>, ou seja, estabelece as diferenciações quantitativas e qualitativas entre as <strong>escrita</strong>sproduzidas.Este período é caracterizado pela construção dos modos de diferenciação entre as formas<strong>escrita</strong>s, trabalhando so<strong>br</strong>e o eixo qualitativo e quantitativo. O eixo qualitativo refere-se à necessidade devariação interna entre as letras empregadas para escrever algo, ou seja, a <strong>escrita</strong> não pode ter sempre asmesmas letras. No que se refere ao eixo quantitativo à criança não analisa o padrão sonoro das palavras,mas está trabalhando com o símbolo lingüístico na sua totalidade (significado e som juntos, com uma sóidentidade).Ferreiro (1995:28) menciona que:Enquanto procuram o significado e/ou o referente do nome que queremescrever, as crianças tentam, às vezes, testar a seguinte hipótese: talvez asvariações no número de letras estejam ligadas a variações nos aspectosquantificáveis dos objetos implicados (mais letras se objeto for grande,menos letras se for pequeno; mais letras para um grupo de objetos , menosletras para um objeto só; mais letras para uma pessoa mais velha, menosletras para uma criança).É importante compreender que as restrições de quantidade e variedade estabelecidas pelascrianças, é a forma que as mesmas utilizam para obter uma <strong>escrita</strong> legível. A criança está trabalhandocom a sintaxe do sistema, definindo quais as combinações são permitidas e quais não são.O terceiro período é caracterizado pela fonetização da <strong>escrita</strong>, que começa na hipótesesilábica e procede até a hipótese alfabética.Na hipótese silábica primeiramente as correspondências são apenas quantitativas(quantidade de silabas com quantidade de letras), depois passarão a ser qualitativas (quantidade desílabas, mas só com certas letras).Há uma correlação entre partes da fala e partes do escrito. A palavra é decomposta emsílabas para atribuir significados as letras.É nesta correspondência fala e <strong>escrita</strong> que encontramos a maior transformação qualitativana <strong>escrita</strong> infantil, onde a incorporação da pauta sonora se dá, mesmo que de maneira imprecisa.Neste mesmo período, e não por acaso, as letras começam a adquirir valor sonoroconvencional, uma vez que agora a criança está atenta às características sonoras daspalavras. É freqüente, então, que as crianças criem maior estabilidade na <strong>escrita</strong>, já que àspartes sonoras semelhantes devem corresponder <strong>escrita</strong>s semelhantes (AZENHA,1996:35).Na hipótese silábico-alfabética, a criança entra num processo de transição, hora escreve naconcepção silábica hora numa hipótese alfabética. Quando a criança a<strong>br</strong>e mão da <strong>escrita</strong> silábica, pela


descoberta de que a sílaba não é composta de apenas uma letra, ocorre o ingresso no período final daevolução, a hipótese alfabética.Na hipótese alfabética, a criança já entendeu a natureza intrínseca do sistema alfabético,mas ainda não lida com todos os traços ortográficos. “Entenderam, apenas, que a similaridade de somimplica uma similaridade de letras, bem como que uma diferença no som implica letras diferentes(FERREIRO, 1995:32)”. Portanto, a criança escreve de acordo com os princípios do sistema alfabético,assim não pode lidar com todas as particularidades gráficas, pois a massa de traços ortográficos respeitaoutras regras ligadas a outros princípios.Nem todas as crianças necessariamente passarão por todos os estágios, pode ocorrer umaseqüência de só dois níveis, do pré-silábico ao silábico-alfabético, ou do pré-silábico ao alfabético, porexemplo. O que determinará a passagem da criança pelos estágios será a sua capacidade de aquisição, aquantidade de linguagem a que estará exposta e a qualidade da interação adulto-criança.A lingüista Miriam Lemle (1994), no seu Livro “Guia teórico do alfabetizador”, mencionaas capacidades necessárias para que uma pessoa possa aprender a ler e a escrever, os saberes que elaprecisa atingir e algumas percepções que deve realizar conscientemente. Assim, reflete so<strong>br</strong>e as relaçõesentre sons e letras.De acordo com a autora, a primeira coisa que a criança precisa saber é o que representamaqueles risquinhos pretos em uma página <strong>br</strong>anca. O segundo problema, de acordo com Lemle (1994), éentender que cada um daqueles risquinhos vale como símbolo de um som da fala. Assim, precisadiscriminar as formas das letras para referir-se ao seu valor sonoro.A conscientização da percepção auditiva é a terceiro problema que a criança deve estaratenta. Se as letras simbolizam sons da fala, é preciso saber ouvir diferenças entre esses sons, para quepossa escolher a letra certa para simbolizar cada som.É claro que só será capaz de escrever aquele que tiver a capacidade de perceber asunidades sucessivas de sons de fala utilizadas para enunciar as palavras e de distingui-lasconscientemente umas das outras. Note que a análise a ser feita pela pessoa é bem sutil: eladeve ter consciência dos pedacinhos que compõem a corrente da fala e perceber asdiferenças de som pertinentes à diferença de letras (LEMLE, 1994: 9).O quarto problema para o alfabetizando é captar o conceito de palavra e perceber osespaços entre as mesmas na construção da <strong>escrita</strong>.A palavra é o cerne da relação simbólica contida numa mensagem lingüística, ou seja, arelação entre conceitos e seqüências de sons da fala. Temos, portanto, “[...] uma relação entre a forma daunidade palavra e seu sentido ou conceito correspondente, e uma relação entre a seqüência de sons dafala que compõem a palavra e a seqüência de letras que transcrevem a palavra” (LEMLE, 1994:11).A unidade de sentença é outra estrutura importante na <strong>escrita</strong>, considerado pela autoracomo o quinto problema. A criança precisa perceber que a sentença é representada começando por letramaiúscula e terminando por ponto. E também que a ordem das letras é da esquerda para a direita nalinha, e que a ordem das linhas é de cima para baixo na página.Segundo Lemle (1994:15), “depois de todo esse trabalho, temos um freguês pronto edesejoso de aprender a ler e a escrever”.No processo de alfabetização, uma das capacidades fundamentais é compreender a relaçãoexistente entre as letras e os sons da fala. O famoso estalo acontece quando a criança capta a idéia de quecada letra é símbolo de um som e cada som é simbolizado por uma letra.O casamento entre sons e letras nem sempre é monogâmico, cada letra representando umsom e vice-versa. Temos pouco caso na língua portuguesa desta correspondência biunívoca entre sons dafala e letras do alfabeto. “[...]Chama -se correspondência biunívoca aquela em que um elemento de umconjunto corresponde a apenas um elemento de outro conjunto, ou seja, é de um para um acorrespondência entre os elementos, em ambas as direções (LEMLE,1994:17)”.O segundo tipo de relação entre sons da fala e as letras do alfabeto é a poligamia . As letrasse casam com sons diferentes, um exemplo desta relação são as palavras <strong>escrita</strong>s com a letra “L”, lata emala, o “L” é pronunciado com o som de uma consoante lateral. Mas o “L” pode ser encontrado nofinal de sílabas, como em jornal, mal, bols a, calça. Neste momento, o professor precisa ter muita clarezae atenção, pois as crianças acabaram de entender que as letras simbolizam os sons, e acreditam que cadaletra tem seu som.O terceiro tipo de relação é o mais difícil para criança, pois são as relações deconcorrências, em que duas letras estão aptas a realizar o mesmo som, no mesmo lugar. É o caso da letra“s” e “z” entre duas vogais. Exemplo: mesa, reza, azar, casar. O mesmo caso ocorre com as letras c, ç ess, ch e x, g e j. Segundo Lemle (1994:23), “esse caso é o mais difícil para a aprendizagem da língua


<strong>escrita</strong>. Aqui, não há qualquer principio fônico que possa guiar quem escreve na opção entre as letrasconcorrentes”.Lemle (1994) propõe para a alfabetização uma gradação de facilidade na aprendizagem dasletras. Primeiro, a teoria da relação monogâmica ou biunívoca entre letras e sons, que o caso das letras p,b, t, d, f, v e a. Depois, mostra as palavras que apresentam a poligamia, ou seja, uma letra representandodiferentes sons, segundo a posição (exemplos com a letra “s”: sala, casa, duas resto). E um somrepresentado por diferentes letras, segundo a posição (exemplos com o som “k”: casa, esquina, come,pequeno, bicudo).A terceira etapa diz respeito à ortografia correta, as partes arbitrárias do sistema. Quandomais de uma letra pode, na mesma posição, representar o mesmo som, é o caso de “exame” que poderiaser escrito com “s” ou com “z”.A última etapa seria um pouco de morfologia identificar os sufixos e os prefixos.Com esta ordem lógica, que vai do mais motivado foneticamente para o mesmo motivado(foneticamente), a autora Lemle supõe que o aprendiz constrói o seu conhecimento do sistema de <strong>escrita</strong>.Os estudos apresentados são resultados de pesquisadores que buscaram compreender osprocessos de aquisição da linguagem <strong>escrita</strong>. Outros pesquisadores, como Smolka (1993), Kato (1992;2002), realizaram também suas pesquisas.Além de conhecer os processos de aquisição da <strong>escrita</strong>, o professor precisa saber orientaros alunos nas situações de aprendizagem, compreendendo a importância das manifestações orais e<strong>escrita</strong>s neste processo de transição, para que se construa uma relação dialógica da fala para a <strong>escrita</strong>.“[...] trata-se de estudar globalmente o fenômeno da comunicação humana, recolocando a fala na suainteração com o mundo escrito (AUROUX, 1998:73).Portanto, a orientação das atividades de sala de aula possibilitará à criança um encontrocom novos conceitos, auxiliando-a a <strong>org</strong>anizar as elaborações iniciais e a confrontá-las com outraspossibilidades de elaboração.A orientação mais freqüente na prática do professor diz respeito à construção de <strong>escrita</strong>elaborada pela criança, mas, neste processo, o professor realiza vários questionamentos, principalmente:Como analisar? Como avaliar? Como corrigir? Entre a tarefa da escola de ensinar a forma convencionalda <strong>escrita</strong>, e o processo de construção do conhecimento e a utilização da <strong>escrita</strong> pela criança, qual oposicionamento do professor?É comum o professor analisar a <strong>escrita</strong> da criança e efetuar correções no próprio texto doaluno, sem voltar pelo menos a falar do erro. Correções voltadas para as questões ortográficas,desconsiderando a fala que está presente na <strong>escrita</strong>.“A fala (enquanto manifestação da prática oral) é adquirida naturalmente em contextosinformais do dia-a-dia e nas relações sociais e dialógicas que se instauram desde o momento em que amãe dá seu primeiro sorriso ao bebê” ( MARCUSCHI,2001:18 ). Como a <strong>escrita</strong> não consegue dar contade representar com exatidão a fala, ela termina sendo uma convenção, mesmo que falem de mododiferente, todos os usuários de uma mesma língua devem escrever do mesmo modo, quem não segue asregras da <strong>escrita</strong>, comete erro.Na escola, os erros ocupam grande parte do tempo do professor. Segundo Possenti (2004)existem dois tipos de erros ortográficos: os que decorrem da falta de correspondência entre sons e letras,e os que decorrem da pronuncia variável em regiões ou grupos sociais diferentes. Os dois tipos podemser exemplificados na grafia da palavra “resolveu”: a dificuldade de escolher entre “s” ou “z” nasegunda sílaba decorre da falta de correspondência entre sons e letras no sistema ortográfico, “s” ou “z”são duas grafias possíveis para o mesmo som; outra dificuldade é de escolher entre o “l” e o “u” no finalda sílaba, que tem haver com as variações geográficas. Portanto, é comum na aquisição da <strong>escrita</strong> trocasde “l” por “u” ou “s’ por “z”, pois o aluno espera que haja uma correspondência entre som e letra.Os erros de <strong>escrita</strong> característicos dos alfabetizandos que ainda se encontra na fasemonogâmica da teoria do vínculo entre sons e letras consistem, principalmente, natranscrição de todos os sons pelas suas letras correspondentes em seu valor fonético maistípico. Por exemplo: a palavra pato é <strong>escrita</strong> patu, porque o aluno escreve como pronuncia,e em sua mente a transcrição do som [u] só pode ser feita pela letra u. Pela mesma lógica,ele escreve devi em vez de deve, treis em vez de três, tonbo em vez de tombo, derão emvez de deram. A lógica desses erros é sempre a mesma: falta a aprendizagem das restriçõesque a posição na palavra impõe a distribuição das letras e dos sons [...] (LEMLE, 1994:30).De acordo com a regra padrão, estes erros citados por Lemle são considerados inadequadosno ensino da escola. No entanto, a correção pode ser feita pela simples apresentação da forma correta,sem causar constrangimento para criança e estimulando a mesma para novas possibilidades de <strong>escrita</strong>.


Nas metodologias tradicionais , penaliza -se constantemente o erro, supondo que só seaprende através da reprodução correta. Enfatizam-se as cópias e as atividades de decodificação dassílabas através das atividades das cartilhas. Geralmente, a conseqüência destas metodologias é a inibiçãoda criança, frente às atividades de leitura e <strong>escrita</strong>.O professor na sua prática pedagógica deve ter bem clara a metodologia que irá adotar, eacreditar que a saída é proporcionar um repertório variado de atividades significativas, que venha aoencontro dos anseios e necessidades da criança. Porque alfabetizar é:[...] propiciar condições para que o indivíduo - criança ou adulto - tenha acesso ao mundoescrito, tornando-se capaz não só de ler e escrever, enquanto habilidade de decodificação ecodificação do sistema de <strong>escrita</strong>, mas, e so<strong>br</strong>etudo, de fazer uso real e adequado da <strong>escrita</strong>com todas as funções que ela tem em nossa sociedade e também como instrumento na lutapela conquista da cidadania plena. (SOARES, 1985:13).3 Metodologia e análise dos dados: Para descrever as práticas pedagógicas do docente, realizeiobservação em uma sala de aula composta por dez alunos de 1ª série do Ensino Fundamental, da Escolade Ensino Fundamental Professora Naíde Guedert Teixeira, da rede pública do Município de Gravatal,Santa Catarina.A observação constou de 16 horas/aula, perfazendo um total de quatro dias. Neste período,procurei observar a prática do professor nas proposições das atividades e nos eventos de correção.Nesta comunicação, citarei algumas observações, mas detalharei especificamente estaanálise a um texto proposto pelo professor e construído pelos alunos, sendo que será analisado um únicotexto.No primeiro dia de observação, a professora, ao chegar na sala, cumprimentou os alunos,recolheu suas tarefas, e entregou uma paródia cujo titulo era ‘A Bichada’. A professora fez a leitura, emseguida, foi em cada carteira, onde cada criança fez a leitura. A parte que cada aluno lia era bem restrita,quem conseguia ler melhor ficava com uma parte maior, quem tinha dificuldade de decodificação oprofessor lia na frente e a criança repetia.Na mesma folha do texto tinham duas atividades, uma era para fazer a cópia do texto eoutra era para transcrever algumas palavras, passando da letra de forma para a cursiva.Percebi, nesta atividade e na maioria que estão <strong>escrita</strong>s no caderno, que as crianças nãoescreviam para registrar uma idéia, nem documentar um fato, nem por necessidade ou prazer decomunicar com alguém. Na maioria das vezes, copiavam palavras soltas, provavelmente com algumsignificado para elas, mas sem articulação e sem sentido, com objetivo de a criança apenas aprender a lere a escrever. A intenção do professor era mostrar a semelhança gráfico-sonora entre as palavras.Portanto, as atividades não vinham de encontro com as necessidades das crianças, sãoatividades que levam a criança aprender a ler e a escrever, mas não fazer uso real e adequado da <strong>escrita</strong>com todas suas funções, como menciona Soares (1985), afirmando que alfabetizar, é propiciar condiçõespara que a criança tenha acesso ao mundo escrito, fazendo o uso real e adequado em todas as suasfunções que ela tem em nossa sociedade e também na luta pela cidadania.Na parte da leitura, o que observei foi que o processo realizou-se ao contrário, pois quemdeveria ter mais atenção na hora da leitura eram as crianças que tinham ainda alguma “dificuldade”.Mas, nesta situação, o que as crianças estavam lendo? Estavam compreendendo? Para quê? Para quem?São questionamentos que nos afloram quando percebemos atividades realizadas soltas semnenhum contexto, realizadas apenas para cumprir o espaço da leitura na escola. O professor nãopossibilita espaço para a criança ser o leitor, espera que a mesma se torne leitora como resultado do seuensino. Portanto, a própria prática é a negação da leitura.No segundo dia em que estava observando, a professora pediu para as crianças quetirassem o caderno de fazer historinhas, referindo-se ao caderno de construção de texto. Entregou umafolha contendo uma gravura da história infantil “Os três porquinhos”, depois perguntou se todosconheciam aquela história, todos responderam em coro que a conheciam. Então, explicou que cadacriança iria escrever a história, mas poderia escrever diferente da história do livro.Cada aluno elaborou seu texto, alguns solicitavam o auxilio do professor, outros não. Cadaaluno que terminava ia entregando, enquanto o professor ia pegando e guardando os cadernos.Depois de dois dias, o professor entregou novamente os cadernos, não mencionou nada arespeito do texto e solicitou que fosse elaborado outro texto.Nesse momento detive-me a observar as correções que o professor realizou.Apresento um texto elaborado por uma das crianças, com as correções do professor:


Correções realizadas no texto acima:FelisTreisPoquinhoEngraçadoTreisDerepemteDiseVoVoceisTreisVoceisCoreuAtrazDeEscrita da criançaCorreção do professorFeliztrêis (corrigiu apenas o cento circunflexo)PorquinhosEngraçadoTrêsDerepenteDisseVouVocêsTrêsVocêsCorreuAtrásEmO texto que a criança produziu mostra que a aquisição já passou dos estágios dedesenvolvimento pesquisados por Luria, a mesma estaria passando pela hipótese alfabética dos estudosde Ferreiro e Teberosky, onde incorpora a expressão sonora as grafias.O modelo de texto que a criança possui é do texto oral, escreve de acordo com os sons dafala, porque a fala é uma atividade muito mais central do que a <strong>escrita</strong>, apesar de que na práticapedagógica o professor não privilegia de fato a <strong>oralidade</strong> no ato da <strong>escrita</strong>, desconsidera a construçãosocial e a interação com o meio que a mesma se encontra inserida.Os erros destacados pelo professor, de acordo com Lemle (1994), são erros de quem seencontra na fase mo nogâmica, consistem na transcrição de todos os sons pelas suas letrascorrespondentes em seu valor fonético mais típico.O professor não privilegiou a construção <strong>escrita</strong> da criança, mesmo a criança elaborandoum texto diferente do clássico da literatura infantil, criando uma nova história. Desta forma, nãoorientou adequadamente a criança neste momento de elaboração, desconsiderou suas manifestaçõesorais neste processo de transição para a <strong>escrita</strong>, obteve o olhar apenas para as questões de ortografia.A correção poderia ser feita pela simples apresentação da forma correta, onde a criança queiria observar outra possibilidade de <strong>escrita</strong>, sem constrangimento e estimulando para novas construções.Ao corrigir apenas algumas palavras, o professor revelou sua insegurança do ato dacorreção, pois não corrigiu as palavras: ‘riu’, ‘derepente’, ‘vej’ e ‘um’ (que era ‘uma’, na segunda linhado texto) etc.Diante do que acima está exposto, questiono: para quem serviu esta correção? Para os pais?Para a direção de escola? Para as crianças? Para quem?


4 Palavras finais : A dificuldade na prática do professor está inserida no ato da correção, ainda não estáclaro para o professor se deve ou não corrigir certas palavras, como e quando corrigi-las. Assim, seso<strong>br</strong>evaloriza a ortografia, fazendo as correções e a subvaloriza a <strong>escrita</strong> fonológica no texto.As correções ortográficas estão ligadas à transcrição dos sons pelas letras, onde a criançaescreve da mesma forma que fala. Portanto, o professor precisa orientar a criança nesta atividade de<strong>escrita</strong> possibilitando um encontro com os novos conceitos.Compreender as teorias referentes à aquisição da linguagem <strong>escrita</strong> é a base para o docenteproceder na sua prática pedagógica, desde o planejamento, execução até a correção das atividadespropostas. Agindo assim, de maneira coerente, poderá conduzir a criança no seu processo de construçãoda <strong>escrita</strong>.RESUMO: O artigo apresenta resultados de uma pesquisa de campo aplicada a alunos de uma primeirasérie do Ensino Fundamental, com o objetivo de descrever, mediante observação, as práticaspedagógicas de Língua Portuguesa de um docente de 1ª série, desde a proposição das atividades até oseventos de correção.PALAVRAS-CHAVE: aquisição; fala e <strong>escrita</strong>; prática pedagógica.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASAUROUX, Sylvain. A filosofia da linguagem. Campinas: Editora da UNICAMP, 1998. 499p.AZENHA, Maria da Graça. Imagens e letras: Ferreira e Luria duas teorias psicogenéticas. São Paulo:Ática,1996. 196p.FERREIRO Apud GOODMANN. Como as crianças constroem a leitura e a <strong>escrita</strong>: perspectivapiagetianas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.LANDSMANN, Liliana Tolchinsky. Aprendizagem da Linguagem Escrita: Processos evolutivos eimplicações didáticas. São Paulo:Ática, 1998.LEMLE, Miriam. Guia teórico do alfabetizador. São Paulo: Ática,1994. 72p.MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a <strong>escrita</strong>: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez,2001 2.ed.133p.POSSENTI, Sírio. Porque (não) ensinar gramática na escola. Campinas: Mercado de letras, 1994. 95p.SOARES, Magda B. As muitas facetas da alfabetização Caderno de Pesquisa. São Paulo: FundaçãoCarlos Chagas, nº 52, Fev, 1985.VIGOTSKYII, L.S. LURIA, A.R. et al. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone,1988. 2.ed. 228p.

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