A Qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Vida na Doença do Refluxo Gastroesofágico:Comparação Entre os Grupos Não-erosivo e Erosivo126 38<strong>31</strong>(2):37-42toms and therapeutic results in four presentations of gastroesophagealrefl ux disease. Results: Patients with gastroesophagealrefl ux disease in the statistical tests with the analysisof the questionnaires don’t show statistical differences insymptoms and therapeutic results in four presentations ofgastroesophageal refl ux disease. Conclusions: The qualityof life was similar in patients with and without esophageallesions, regardless of its nature: erosive disease without hiatalhernia, erosive disease with hiatal hernia, non-erosive diseasewith hiatal hernia and non-erosive disease without hiatalhernia, harming the quality of life. The surgical treatment maybenefi t that important portion of the population and may alsobe indicated in non-erosive cases, given the excellent resultof surgical treatment of gastroesophageal refl ux disease withlow morbidity and mortality, with vi<strong>de</strong>osurgery promoting theantirefl ux barrier repair placed at the gastroesophageal junctionand so improving the quality of life. These results couldgui<strong>de</strong> future consensus on the indication for surgery in thesepatients.Keywords: Quality of Life, Gastroesophageal Refl ux, Questionnaire,Esophagus.IntroduçãoA Doença do Refl uxo Gastroesofágico (DRGE) é uma dasafecções mais frequentes na prática médica. 1 A enfermida<strong>de</strong>agrupa, sob a mesma <strong>de</strong>nominação, apresentações clínicastão distintas quanto a pirose ocasional, a tosse crônica e aasma refratária, além dos sintomas típicos como a pirose, aregurgitação, a dor epigástrica e a dor retroesternal. 2,3 Noplano diagnóstico, existem condições endoscópicas muitovariadas, como, <strong>de</strong> um lado, a ausência <strong>de</strong> lesão e <strong>de</strong> outroa presença <strong>de</strong> lesões erosivas e complicações importantes,como o sangramento, a estenose e o esôfago <strong>de</strong> Barrett,além do aumento da incidência do a<strong>de</strong>nocarcinoma najunção esôfago-gástrica. 4-7Na realida<strong>de</strong>, a correlação entre os sintomas e a presençae grau <strong>de</strong> esofagite é muito pobre. 8 A elevada prevalência,a varieda<strong>de</strong> nas formas <strong>de</strong> apresentação clínica e o impactoeconômico, consequências do prejuízo na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vidae <strong>de</strong> gastos com investigação clínico-laboratorial, têm estimuladoa realização <strong>de</strong> reuniões internacionais <strong>de</strong> consenso.A maior parte dos indivíduos com sintomas típicos <strong>de</strong> pirose,epigastralgia e regurgitação não apresentam lesões esofágicasdistais e po<strong>de</strong>m ser diagnosticados com teste terapêutico.9 A doença sem lesão erosiva não confi rmada porpHmetria esofágica ambulatorial <strong>de</strong> 24 horas é tratada cominibidores <strong>de</strong> bomba <strong>de</strong> prótons e procinéticos associadosa medidas comportamentais. 8A etiologia é múltipla, mas po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>fi nida como resultante<strong>de</strong> um distúrbio da motilida<strong>de</strong> esofágica e <strong>de</strong>corrente<strong>de</strong> um <strong>de</strong>feito na barreira anti-refl uxo situada na junçãoesofagogástrica. 11 Hoje, sabe-se que a principal causa daocorrência do refl uxo é o fenômeno <strong>de</strong>nominado “relaxamentotransitório do esfíncter”, fenômeno fi siológico que, apartir <strong>de</strong> certa duração, intensida<strong>de</strong> e frequência, passa aser patológico. É consi<strong>de</strong>rado o principal fenômeno motorassociado à DRGE. 12 A avaliação da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida foiacrescentada nos ensaios clínicos randomizados como aterceira dimensão a ser avaliada, além da efi cácia (modificação da doença pelo efeito da droga) e da segurança(reação adversa a drogas). 13 Do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> doença, aqualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida po<strong>de</strong> ser avaliada por questionários comoo SF-36 14 e QS-DRGE Brasil. 15Os tratamentos clínicos ou cirúrgicos passam a fazer partedo arsenal terapêutico oferecido ao paciente como opção<strong>de</strong> tratamento. A tolerância ao tratamento clínico prolongadocom uso <strong>de</strong> medicamentos e muitas vezes <strong>de</strong> formavitalícia, acrescidos <strong>de</strong> modifi cações e restrições comportamentais,custos socioeconômicos, e a difi culda<strong>de</strong> naa<strong>de</strong>rência ao uso crônico <strong>de</strong>sses medicamentos, norteiam opaciente na <strong>de</strong>cisão da modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tratamento que <strong>de</strong>veser compartilhada com o médico assistente. 16A sintomatologia com prejuízo na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida nosindivíduos que não apresentam lesões é muito semelhantenos que apresentam as lesões erosivas no esôfagodistal, inclusive com maior grau <strong>de</strong> prejuízo na qualida<strong>de</strong><strong>de</strong> vida. 17,18 Mesmo a pHmetria esofágica, que em princípioseria um exame <strong>de</strong> diagnóstico <strong>de</strong>fi nitivo, não o é, poismuitos pacientes com lesões erosivas no esôfago distal,assim como outros portadores <strong>de</strong> hérnia hiatal sem lesõeserosivas, apresentam uma pHmetria esofágica normal,mesmo sendo muito sintomáticos. 19,20 A maior parte dosindivíduos com sintomas típicos <strong>de</strong> pirose, epigastralgia eregurgitação não apresenta lesões esofágicas distais, e elespo<strong>de</strong>m ser diagnosticados com teste terapêutico. 2,3,9Não foram encontradas, nas bases <strong>de</strong> dados consultadas,publicações que revelem o tratamento cirúrgico para adoença do refl uxo gastroesofágico não erosivo, quando nãohaja hérnia hiatal ou pHmetria esofágica positiva, emborasabendo que o mecanismo da doença é o mesmo. 8 Noscasos <strong>de</strong> doença erosiva 17% a 29% apresentam pHmetriaesofágica ambulatorial <strong>de</strong> 24 horas normal 21 e os pacientespo<strong>de</strong>m ser submetidos a tratamento cirúrgico in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<strong>de</strong> ter realizado pHmetria esofágica. 2,3 Consi<strong>de</strong>rando-seque mais da meta<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses indivíduos apresenta adoença do refl uxo gastroesofágico não erosivo, 22,23 e atualmentesó recebem o tratamento clínico e comportamental,GED gastroenterol. endosc. dig. 2012: <strong>31</strong>(2):37-42
P. R. MACIEL, S. S. S. V. MACIEL, C. A. PERES, L. R. RAMOSmuitos passam a ter prejuízo importante na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>vida, haja vista não po<strong>de</strong>rem arcar com o tratamento clínicoque é contínuo e na gran<strong>de</strong> maioria das vezes para todaa vida, 6,22,24 e sendo os sintomas semelhantes e <strong>de</strong> mesmaintensida<strong>de</strong>, o tratamento clínico ou cirúrgico po<strong>de</strong>ria seroferecido a esses indivíduos. Comparou-se a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>vida dos indivíduos com doença do refl uxo gastroesofágiconão-erosivo com os portadores <strong>de</strong> doença do refl uxo gastroesofágicoerosivo nas quatro apresentações da doença:erosiva sem hérnia hiatal, erosiva com hérnia hiatal, nãoerosivacom hérnia hiatal e não-erosiva sem hérnia hiatalpara avaliar a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida nos quatro tipos <strong>de</strong> apresentaçãoda doença.MétodosO presente estudo foi realizado <strong>de</strong> forma prospectiva,incluindo os pacientes que apresentavam a doença dorefl uxo gastroesofágico no período compreendido entremarço <strong>de</strong> 2007 a julho <strong>de</strong> 2009, atendidos em uma clínicaespecializada em gastroenterologia no agreste <strong>de</strong> Pernambuco.Ao longo do estudo foram selecionados 400 pacientesentre 850 atendidos no período, portadores <strong>de</strong> DRGE, <strong>de</strong>ambos os sexos, que se dispuseram a respon<strong>de</strong>r ao questionário<strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida SF-36 14 e o questionário dossintomas da doença do refl uxo gastroesofágico QS-DRGEBrasil, 15 após concordância com o termo <strong>de</strong> consentimentoinformado. São resi<strong>de</strong>ntes no agreste <strong>de</strong> Pernambuco,<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma população estimada em 1.271.570habitantes (IBGE), maiores <strong>de</strong> 13 anos e não portadores<strong>de</strong> outras doenças pépticas, tais como: gastrite, duo<strong>de</strong>nite,úlcera péptica duo<strong>de</strong>nal ou gástrica, infestação porCândida albicans no esôfago e infecção por Helicobacterpylori no estômago, e que respon<strong>de</strong>ram com supressão ouredução signifi cativa dos sintomas após um mês <strong>de</strong> tratamentocom inibidor <strong>de</strong> bomba <strong>de</strong> prótons e procinéticosem dose plena pela manhã e à noite.ResultadosA amostra selecionada nesse estudo foi composta por 400indivíduos, sendo 292 (73,0%) do gênero feminino e 108(27,0%) do gênero masculino, não havendo limitação aoestudo com relação aos pacientes portadores <strong>de</strong> comorbida<strong>de</strong>stais como: doenças cardíacas, pulmonares, osteoarticulares,hematológicas, imunológicas e metabólicas entreoutras.A média <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> das mulheres foi <strong>de</strong> 38,7 anos, variando <strong>de</strong>14 a 82 anos, com <strong>de</strong>svio-padrão <strong>de</strong> 14,4 anos, e nos homens39,2 anos, variando <strong>de</strong> 15 a 75 anos, com <strong>de</strong>svio-padrão <strong>de</strong>14,1 anos.No questionário SF-36 14 , ambos os grupos apresentaramescores médios estatisticamente iguais dos domíniosCapacida<strong>de</strong> funcional, Limitação por aspectos físicos,Dor, Vitalida<strong>de</strong>, Limitação por aspectos emocionais. Apenaspara os domínios <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> mental, Estado geral <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> eAspecto social, os indivíduos com hérnia hiatal apresentaramescores médios menores que os indivíduos sem hérnia hiatal,sem signifi cação estatística relacionada à doença erosiva enão-erosiva - Tabela 1.127 39<strong>31</strong>(2):37-42Tabela 1: Resultados das comparações dos indivíduos, segundo tipo <strong>de</strong> refluxo e presença <strong>de</strong> hérnia hiatal para cadaum dos domínios do SF-36.Domínio do SF-36 Tipo <strong>de</strong> refluxo Presença <strong>de</strong> hérnia hiatalCapacida<strong>de</strong> funcional erosivo = não-erosivo (p=0,963) com hérnia = sem hérnia (p=0,415)Aspectos físicos* erosivo = não-erosivo (p=0,699) com hérnia = sem hérnia (p=0,695)Dor erosivo = não-erosivo (p=0,172) com hérnia = sem hérnia (p=0,087)Estado geral<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>erosivo = não-erosivo (p=0,698)com hérnia < sem hérnia (p=0,024)Vitalida<strong>de</strong> erosivo = não-erosivo (p=0,655) com hérnia = sem hérnia (p=0,100)Aspectos sociais erosivo = não-erosivo (p=0,093) com hérnia < sem hérnia (p=0,029)Aspectos emocionais** erosivo = não-erosivo (p=0,285) com hérnia = sem hérnia (p=0,603)Saú<strong>de</strong> mental erosivo = não-erosivo (p=0,111) com hérnia < sem hérnia (p=0,015)*limitação por aspectos físicos **limitação por aspectos emocionaisGED gastroenterol. endosc. dig. 2012: <strong>31</strong>(2):37-42