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36 Revista Brasileira de Literatura Compara<strong>da</strong>, n.11, 2007 Weltliteratur, um conceito transcultural 37O conceito de Weltliteratur, cristalizado pelo velhoGoethe, não se limita, como o termo faz supor pela desarticulação<strong>da</strong> palavra – literatura do mundo –, em proporum tema que se restringe ao campo <strong>da</strong> literatura. A discussãodesse conceito por Goethe, na última etapa de suavi<strong>da</strong>, pressupõe, isso sim, uma idéia que se aproxima doconceito de universali<strong>da</strong>de: o advento de uma literaturaque deveria conduzir a um novo ethos universal, algo quese aproximaria de uma totali<strong>da</strong>de de caráter moral.Para que se possa rastrear o surgimento dessa idéia noprocesso conceitual do velho Goethe, cabe, aqui, não sófazer um levantamento <strong>da</strong> gênese e <strong>da</strong> ocorrência <strong>da</strong> palavra,como também perscrutar as diversas conotações queo termo abrange, bem como relacioná-lo a conceitos quenos são contemporâneos.A primeira manifestação de Goethe, na qual é mencionadoo termo Weltliteratur, é de 1827, <strong>da</strong>ta em que Goetheproclama, em uma conversa com Eckermann, ter chegadoa época de uma literatura universal. A partir de então, oconceito aparece, de forma recorrente, em conversas, cartas,resenhas e ensaios <strong>da</strong> última fase do grande clássicoalemão, apontando para a relevância que tal idéia adquireno pensamento do velho Goethe.Gênese <strong>da</strong> palavraDurante muito tempo, Goethe constou como o criadordo termo. Como informa Birus (2004) ao citar Hans-J. Weitz em um ensaio publicado na <strong>revista</strong> Arcádia de 1987,sob o título de “Weltliteratur zuerst bei Wieland” [“Literaturauniversal primeiro em Wieland”], a palavra apareceprimeiro em Wieland, como bem indica o próprio títulodo estudo. O termo teria sido utilizado por Wieland emsua nova versão <strong>da</strong> tradução <strong>da</strong>s cartas de Horácio.Wieland, nesse caso, emprega o termo para referir-se àformação cultural ao tempo de Horácio, um requinte própriodo gosto <strong>da</strong> capital, algo característico <strong>da</strong> urbani<strong>da</strong>de,prenhe de conhecimento do mundo e refletido na literaturaque lhe é equivalente: uma literatura desse grand monde.Portanto, em Wieland, entende-se por mundo – Welt – asmarcas culturais <strong>da</strong> grande polis, e, dentro desse contexto,manifesta-se a literatura do homme du monde do Weltmann.Em contraposição a esse conceito em Wieland, espacialmentedeterminado, Weltliteratur, em Goethe, é um conceitoque abrange to<strong>da</strong> a humani<strong>da</strong>de, algo que vai além<strong>da</strong>s fronteiras nacionais. Não há nenhuma bibliografia subsidiáriaque aponte o conhecimento, por parte de Goethe,do termo empregado por Wieland. Em todo caso, por causado cunho próprio <strong>da</strong>do por Goethe à acepção <strong>da</strong> palavra,pode-se afirmar que Goethe é o criador do conceito.De acordo com o senso comumA primeira tendência que se tem ao empregar o conceitoé no sentido extensivo, na acepção de “literaturageral”. Sob esse aspecto, o termo é empregado indistintamenteem todo o mundo. Esse seria o caso de qualquerpublicação no gênero dos dicionários sobre a literatura domundo. Essas publicações, de abrangência genérica, procuramnomear e caracterizar as várias literaturas do mundoem uma enumeração quantitativa. Nesse mesmo sentido,por exemplo, temos, em bibliografia de língua portuguesa,os vários livros escritos por Otto Maria Carpeaux sobre ahistória <strong>da</strong> literatura universal.A essa expansão quantitativa do termo, pode-se contraporuma acepção qualitativa, na esteira <strong>da</strong>s idéias própriasdo Iluminismo. Numa época em que se preconiza arazão como o bem supremo do indivíduo, a poesia, no sentidode literatura, deve colaborar para enriquecer o conhecimento.Assim, a literatura deveria ser, antes de tudo,Bildungspoesie, uma poesia de formação. Sob essa acepçãoa Weltliteratur adquire o predicado de obra clássica, obrade valor universal que deve transmitir valores universaiscomo o bom, o belo e o ver<strong>da</strong>deiro.Um livro como o de Harold Bloom (1995), O cânoneocidental, pressupõe o conceito Weltliteratur – mesmo não