Biossegurança eBIOSSEGURANÇAVacinas da DengueCritérios de Biossegurança na análise de um candidato VacinalBenedito Antônio Lopes da FonsecaDepartamento de Clínica Médica da Faculdade deMedicina de Ribeirão Preto - Universidade de SãoPaulo. Médico formado pela Faculdade de Medicinada Universidade de São Paulo e Mestrado eDoutorado pela Yale University (USA).dengue, hoje a mais importantedoença viraltransmitida por artropódos,resulta da infecçãopor um dos sorotipos dovírus do dengue. Esses vírus, denominadosdengue tipos 1, 2, 3 e 4, sãotransmitidos a um hospedeiro susceptívelatravés da picada da fêmeado mosquito Aedes aegypti previamenteinfectada. O quadro clínicodessa doença varia desde apresentaçõesassintomáticas até quadros gravescaracterizados por hemorragia echoque circulatório e associados aalta letalidade, denominados febrehemorrágica do dengue (FHD) e síndromedo choque do dengue (SCD).Essas formas da doença estão, namaior parte das vezes, relacionadascom a infecção secundária causadapor um sorotipo do vírus da denguediferente daquele que causou a infecçãoprimária. FHD e SCD são prevalentesem mais de 100 países e sãouma ameaça à saúde de mais de 2,5bilhões de pessoas, habitantes dasregiões tropicais e subtropicais doglobo terrestre. A incidência anual dadengue é estimada em torno de dezenasde milhões, com um númeroaproximado de 500.000 hospitalizaçõesde casos de FHD/SCD. Em média,o índice de mortalidade dessescasos é de 5%, com, aproximadamente,24.000 óbitos por ano. No Brasil,somente neste ano, já foram notificados213.932 casos de dengue, sendoque, até a 18 a semana epidemiológica,50 casos foram caracterizadoscomo FHD/SCD e resultaram em 8óbitos.A Organização Mundial da Saúde(OMS) considera o controle e a prevençãoda dengue uma das suas prioridadese, para atingir esse objetivo,adotou, em 1995, um programa estratégicomundial. Atualmente, o controledessa doença baseia-se primariamenteno controle do vetor, já quenão existe ainda uma vacina licenciadapara uso humano, apesar de intensapesquisa nesse campo nos últimos30 anos.Vacinas para a dengueAs primeiras tentativas de produçãode vacinas para os vírus da dengueiniciaram-se alguns anos apósesses vírus terem sido isolados. Inicialmente,candidatos vacinais foramatenuados pela passagem seriada emcérebros de camundongos e se mostraramprotetores contra os seus protótiposselvagens. Entretanto, proteçãoapenas contra um tipo de sorotiponão é suficiente devido à hipótesede que a infecção sequencial por umsorotipo diferente leve a uma doençamais grave. Desse modo, a vacinapara o dengue deve ser tetravalente,isto é, proteger contra os 4 sorotipos.Assim, pesquisadores começaram atentar produzir vacinas atenuadas parao dengue, em particular grupos devárias instituições americanas e daMahidol University, na Tailândia. Ascepas 45AZ5 PDK-27 (dengue-1),DEN-2 PR-159-S1 (dengue-2),CH53489 clone 24/28 (dengue-3) e341750 Carib (dengue-4) foram desenvolvidaspelos grupos americanosenquanto que as cepas DEN-1 PDK-13, DEN-2 PDK-53, DEN-3 PGMK-30/F2 e DEN-4 PDK-48 foram desenvol-28 <strong>Biotecnologia</strong> Ciência & Desenvolvimento
vidas na Tailândia, sob supervisão daOMS. Vários ensaios clínicos foramfeitos com esses candidatos vacinais,quando foram conseguidos algunsresultados que garantiam a possibilidadedessas vacinas serem usadas,desde que os problemas de potênciae imunogenicidade fossem resolvidos.Em 1993, foi firmado um acordocomercial entre a Mahidol Universitye a Pasteur Merieux Serums andVaccines Company para optimizar aprodução dessas vacinas para o dengue.No início deste ano, foi apresentado,no First Annual Conference onVaccine Research em Washington,D.C., o resultado dos testes em voluntárioshumanoscom esta vacina. Aconclusão do trabalhofoi que, apesarda maioria dos individuostestados teremapresentadosoroconversão, interaçõesentre os sorotiposvirais resultandoem viremiaseletiva pelo dengue-3,podem afetara infectividade eimunogenicidadeda vacina tetravalente.A produção devacinas de vírus inativadostem sidopouco explorada na produção devacinas para o dengue devido à característicade não apresentar grandeimunogenicidade. Recentemente, Putnake colaboradores tem investidonesse método de produção de candidatosvacinais através da passagemdesses vírus em células Vero (rim demacaco verde africano) e FRhL-2(pulmão fetal de macaco Rhesus)seguido por inativação em formalinaa 0.05% e formalina seguida de radiação(7 mRads de fonte de cobalto).Entretanto, somente proteção parcialfoi obtida com esta técnica o que acoloca em segundo plano em relaçãoàs demais, principalmente pelo fatode ser muito caro produzir esse tipode vacina e pela pouca imunogenicidade.Outra estratégia usada na produçãode candidatos vacinais refere-seà purificação de proteínas nativasdos vírus da dengue por cromatografialíquida (HPLC). Os resultados aítambém foram desapontadores e, associadaao custo de produção, essa estratégiatem sido abandonada.Nos últimos anos, algum progressono desenvolvimento de vacinas temsido alcançado por meio do uso datecnologia do DNA recombinante. Asestratégias usadas foram as de produçãode peptídeos sintéticos, vacinas desubunidades, vacinas de vírus recombinantes,vacinas derivadas de clonesinfecciosos de cDNA derivados de candidatosvacinais e vacinas de DNA.Deposita-se muita esperança nos doisúltimos métodos. Um clone infecciosode cDNA preparado a partir do candidatovacinal DEN-2, PDK-53 está sendousado para construir vírus quiméricospor meio da inserção dos genes dacápside viral, da pré-membrana e doenvelope dos vírus dengue-1, 3, e 4 naestrutura genômica do DEN-2 PDK-53.Essas vacinas vêm sendo desenvolvidascom sucesso por um grupo doNational Intitutes of Heallth (NIH) etêm-se mostrado imunogênicas nomodelo animal. Além disso, clone infecciosode cDNA do vírus da febreamarela pode ser usado para os mesmosfins. As vacinas de DNA podemrepresentar uma solução, pois elas podemser usadas para imunização contraum sorotipo específico de dengue, semo inconveniente de induzir a respostaimune exacerbada responsável pelasinfecções graves do dengue. Kochel ecolaboradores produziram um candidatovacinal para o dengue-2 e demonstrarama presença de anticorposneutralizantes para esse vírus em camundongos.Outros candidatos vacinaispreparados por engenharia genéticasão as vacinas de subunidadese vírus recombinantes que expressemproteínas dos vírus da dengue. Aprodução de vacinas de subunidadesem baculovírus tem tido resultadosconflitantes pois alguns grupos têmencontrado proteção total em camundongos,enquanto outros encontramapenas proteção parcial. Com vírusrecombinantes, principalmente como vírus da vaccínia, esses resultadosnão têm sido diferentes, apesar dessesvírus recombinantes possuírem areputação de induzirem melhor respostaimune do que os outros vetoresrecombinantes, tais comobactérias, por exemplo, aSalmonella typhimurium.Biossegurança e vacinasDesde que a vacinapara a dengue seja a únicachance de realmente controlaressa doença, intensaspesquisas nessa áreapoderão resultar na produçãode candidatos vacinais.As normas para liberaçãode uma vacina devecobrir todas as fases deprodução de uma vacina,isto é, a fase de desenvolvimento,de ensaios clínicos,registro nos orgãos competentese vigilância pós-liberação. Antes dafase de investigação clínica, deve-seinvestir na segurança do laboratórioem que a pesquisa está sendo desenvolvidaa fim de se proteger as pessoasque estão envolvidas na pesquisae que o meio ambiente não sejaafetado pelos produtos secundáriosresultantes dessa pesquisa. Para tanto,as condições de segurança doslaboratórios devem ser otimizadas,em especial com a manipulação dosvírus e o descarte do material. A infraestruturade biotério é de extremaimportância, pois se a pesquisa forrealizada em áreas endêmicas para adengue, existe a possibilidade decontaminação dos animais usados empesquisa por mosquitos infectadosou da contaminação de mosquitospelo candidato vacinal. Além disso, énecessário certificar-se de que os materiaisusados na produção das vaci-<strong>Biotecnologia</strong> Ciência & Desenvolvimento 29