PORTO sempre050. símboloMuitos livros, muitos títulos e muitos registosA actual Biblioteca Pública <strong>Municipal</strong> <strong>do</strong> <strong>Porto</strong> foi fundada em 1833 porD. Pedro IV que a baptizou como Real Biblioteca Pública <strong>do</strong> <strong>Porto</strong>Paula Bonifácio Marquescolabora com a BibliotecaPública <strong>Municipal</strong> <strong>do</strong> <strong>Porto</strong>(BPMP) desde 1991 e jáconhece bem os “cantos à casa”.Licenciada em História, pósgraduadaem CiênciasDocumentais, esta Bibliotecáriatem a seu cargo uma equipa deatendimento da Sala de LeituraPresencial e de Referência.Nesta sala, “somosresponsáveis pelo DepósitoLegal que a BPMP usufruidesde a sua fundação que,por uma questão depreservação <strong>do</strong> património,apenas está disponível paraleitura presencial”,esclareceu.“Por aqui, por dia, passam cercade 400 leitores e movimentam-semais de 800 títulos, é um serviçoútil para estudantes,investiga<strong>do</strong>res ou apenascuriosos”, afirmou a Bibliotecáriaque conhece alguns leitores pelonome.Paula Bonifácio Marques explicou,ainda, os procedimentos de registoAlexandre Herculano foi oprimeiro Bibliotecário da RealBiblioteca <strong>do</strong> <strong>Porto</strong> e também oresponsável por grande parte <strong>do</strong>actual património deManuscritos de Santa Cruz deCoimbra, onde se inclui a cópiacoeva <strong>do</strong> “Roteiro da PrimeiraViagem de Vasco da Gama àÍndia” recentemente empresta<strong>do</strong>ao Museu Histórico Alemão, emBerlim, para integrar a exposição“Novos Mun<strong>do</strong>s - Portugal e aÉpoca <strong>do</strong>s Descobrimentos -Séculos XV a XVII”, que seráorganizada para assinalar apassagem da presidência daUnião Europeia da Alemanhapara Portugal.<strong>do</strong>s livros e consequente organização <strong>do</strong>s catálogos,que “começaram na fundação com livros manuscritos,passan<strong>do</strong> depois para as fichas bibliográficas, atéchegarem ao actual catálogo, cria<strong>do</strong> a partir de1990, que já é digital e integra a Porbase, isto é,a Base Nacional de Da<strong>do</strong>s Bibliográficos.”
. portuenses ilustresMiguel Veigapor José da Cruz SantosPORTO sempre051Miguel Luís Kolbach da Veiga nasceuno <strong>Porto</strong> em 1936, filho de mãefrancesa e pai beirão. Licenciou-seem Direito, na Universidade deCoimbra, em 1959. Foi um <strong>do</strong>sfunda<strong>do</strong>res <strong>do</strong> PPD e Deputa<strong>do</strong> pelo<strong>Porto</strong> à Assembleia Constituinte.Membro eleito pela Assembleia daRepública para o Conselho Superiorda Magistratura. Membro daChancelaria das Ordens HonoríficasCivis Portuguesas. Membro <strong>do</strong>s júris<strong>do</strong> “Prémio Pessoa”. Agracia<strong>do</strong> coma “Ordem da Liberdade” e com aMedalha de Ouro da Cidade <strong>do</strong> <strong>Porto</strong>.Tem títulos publica<strong>do</strong>s sobre temasde Direito e cidadania, apresentoue prefaciou livros e catálogos e éactor empenha<strong>do</strong> em todas ascausas culturais e, em particular,nas que envolvem a cidade <strong>do</strong> <strong>Porto</strong>.No dia 1 de Junho de 2007, MiguelVeiga foi homenagea<strong>do</strong> na FundaçãoDr. António Cupertino de Miranda.Dessa homenagem transcrevemosparte <strong>do</strong> texto li<strong>do</strong> por Vasco GraçaMoura:“Nos i<strong>do</strong>s de 1960, o Miguel Veigaera um jovem e fogoso advoga<strong>do</strong>,com alta qualificação académica,fortíssima preparação técnica e umacombatividade fora <strong>do</strong> vulgar. Era,como então escrevi, um jovem leãoda advocacia, que começava porcausar alguma irritação pelo ar deimpertinência nonchalante emimada que costumava afivelar,pelo quase gaguejar com que partiapara as grandes tiradasprovocatórias, pelas piadassangrentas, pelas inflexões da vozhabituada a tirar grandes efeitosna barra <strong>do</strong> tribunal, pelo olharclaro e sem rodeios, pela expressãodecidida.O Miguel já então mostrava umtalento peculiar para a retóricaforense, essa difícil arte de persuadiros tribunais na defesa de uma causa:tanto sabia ser incisivo e irónico,como manifestava um killer instinctque se exprimia por uma utilizaçãocerteira e vigorosa da língua, pelasimagens e metáforas maissugestivas, pela prosa de ritmoimplacável no desenvolvimentológico das ideias e <strong>do</strong>s pontos devista, com a citação oportuna <strong>do</strong>stratadistas e <strong>do</strong>s grandes autores,com a exploração pertinente dajurisprudência e da <strong>do</strong>utrina. Nabarra e no papel sela<strong>do</strong>, porqueentão escrevíamos em papelsela<strong>do</strong>…, o Miguel, com a suatemível inteligência e o potencialacutilante da sua artilhariaargumentativa, depressa se tornouum caso singular no panoramaforense desta cidade.E também já nessa altura as suasligações à produção cultural setornavam evidentes: aparecia muitofrequentemente nas exposições, noscolóquios, nos espectáculos, nassessões de autógrafos, nas livrarias,nas múltiplas formas de amizade econvívio com escritores e artistasque caracterizavam o <strong>Porto</strong> daquelaépoca; viajava; estava a par dasúltimas novidades surgidas no Paíse no estrangeiro; e iniciava umaversátil colecção de pintura,mostran<strong>do</strong> um “faro” quase infalívelnas suas aquisições, o que não oimpedia de ajudar muitos artistasem dificuldades, sobretu<strong>do</strong> os maisnovos.A tu<strong>do</strong> isto agregava-se umadimensão, também profundamentevivida, da sua naturalidadeportuense. Aquilo a que ele umavez chamou, numa bela imagem,“o sotaque <strong>do</strong> ser”. Beirão, pelalinha paterna, e parisiense, pelalinha materna, o Miguel é uma figuraque só se compreende pela suaradicação inabalável no <strong>Porto</strong>. Num<strong>Porto</strong> de cultura e tradição cívicaliberal. Num <strong>Porto</strong> de aberturapermanente ao mun<strong>do</strong> semdescaracterização própria. Aindependência, o desassombro, afranqueza, a atitude directa, avivência das qualidades, <strong>do</strong>sdefeitos, das tradições e <strong>do</strong>sproblemas de uma burguesia típicada cidade, a ligação intelectual eafectiva ao rio e ao mar, às gentes,ao casario e à paisagem, aosgranitos encardi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> velho burgoe às volumetrias mais íntimas epenetradas pela maresia da Foz <strong>do</strong>Douro, a deambulação anímica pelosroteiros históricos e sentimentais<strong>do</strong> <strong>Porto</strong>, a matriz e o senti<strong>do</strong> deuma cidadania que entãoesbracejava pela expressão plena,a intervenção republicanaintransigente e coerente, tu<strong>do</strong> issoera assumi<strong>do</strong> pelo Miguel como umhomem na sua humanidade, podemesmo dizer-se que "de nascença",para se tornar entretanto umaopção constante de vidae de postura deste vultoportuense que se tornouentretanto uma grandefigura nacional.Ora o que, nessaépoca, era umareivindicaçãodas liberdadesrepublicanasque durantedécadas nãotínhamos conheci<strong>do</strong>em Portugal, veio atornar-se, em 1974, umaverdadeira possibilidadede contribuir para a construção de uma democraciarepresentativa de modelo europeu ocidental. É aí quesurge a nossa ligação ao PSD, ao tempo denomina<strong>do</strong>Parti<strong>do</strong> Popular Democrático.À trajectória <strong>do</strong> Miguel, que é bem conhecida, agregouseentretanto uma nova dimensão. Como quem nãoquer a coisa, ele tornou-se naturalmente um escritor.Nos textos que tem vin<strong>do</strong> a produzir ao sabor dasmais variadas circunstâncias e solicitações surpreendese,ao mesmo tempo, a alegria da escrita como princípiode prazer, a versatilidade temática <strong>do</strong> pensamento edas abordagens, a sugestividade incomparável de umaforma literária pessoal e intransmissível. Há umaveemência especial que ele põe na construção dassuas análises e na defesa das suas ideias, de par comuma elegância de formulação e um senti<strong>do</strong> damaterialidade sensorial da palavra que remontam aosseus tempos de jovem advoga<strong>do</strong>, mas que se refinaramna vivacidade de uma voz estimulante e bem timbrada,em que vida, conhecimento, experiência, reflexão,humor e capacidade fulgurante de síntese aforísticase aliam estreitamente.Mas eu deixei para o fim a nota que considero principal,embora, aqui e ali, ela já tivesse si<strong>do</strong> aflorada emfiligrana. Refiro-me à amizade.A amizade, tal como o Miguel a cultiva, é uma ética,uma estética e uma poética, um mo<strong>do</strong> de ser e umaarte, uma maneira especialíssima e generosa de estarno mun<strong>do</strong>, uma regra convivial e uma firme linha derumo. Mas é também uma coisa muito “à <strong>Porto</strong>”,muito pão, pão, queijo, queijo, muito tripeiramenteobjectiva nas suas apreciações e inabalavelmentesolidária nas suas atitudes. De si mesmo, o Miguelcostuma dizer que não é “espelho de virtudes”. Mas,pelo menos neste ponto, a maneira como sabe emostra ser amigo <strong>do</strong> seu amigo encarrega-se dedesmenti-lo”.