_INTR_EST_LITERÃRIOS
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Introdução aos<br />
Estudos<br />
Literários<br />
Um texto marcante e extremamente citado no universo letrado seria “A<br />
morte do autor”, de Roland Barthes e que foi escrito em 1968. Nele, Barthes traça<br />
um possível caminho de escrita, lugar no qual o corpo que escreve se perde,<br />
perde sua identidade, pois a escrita é esse oblíquo para onde foge esse sujeito,<br />
no sentido da dissimulação e fi ngimento de que falou Fernando Pessoa.<br />
À medida que os fatos são contados, a voz perde sua essa origem de<br />
corpo, e “o autor entra na sua própria morte, a escrita começa”. Dessa forma,<br />
Barthes vai delineando um mapa de como se observar o ‘autor’ no passar dos anos. Em<br />
algumas sociedades, tínhamos a fi gura de um mediador que contava as histórias, que fazia<br />
a vez do contador, mas nunca a idéia do gênio. Para Barthes, o autor é uma personagem<br />
moderna, descoberta com o fi m da Idade Média, que trouxe à tona o ‘prestígio pessoal<br />
do indivíduo’ ou da ‘pessoa humana’. Assim, é, pois, no positivismo (resumo e desfecho<br />
da ideologia capitalista) que ocorre de se conceder maior importância à pessoa do autor.<br />
Este começa a reinar nos manuais de história literária, nas biografi as de escritores, nas<br />
entrevistas. Barthes coloca ainda que a imagem que podemos encontrar na cultura corrente<br />
é tiranicamente centrada na fi gura do autor, da sua pessoa, dos seus gostos, paixões.<br />
Todavia, ele contrapõe as afi rmações acima dizendo que quem performa é a linguagem<br />
e não o autor. ‘É a linguagem quem fala e não o autor, e escrever é, através de uma<br />
impessoalidade prévia, atingir aquele ponto e que só a linguagem atua, performa’. O que ele<br />
pretende refl etir é a morte de um tipo de Autor-Deus, que contém toda a verdade e explicação<br />
do texto. Roland Barthes não compactua com esse Autor-Deus, pois acredita que o escritor<br />
moderno nasce ao mesmo tempo em que seu texto. Ele acredita que o verdadeiro lugar da<br />
escrita é a leitura e que para o leitor nascer, morre o Autor.<br />
Outras visões irão se seguir ao texto de Barthes, concordando com a morte do Autor, mas<br />
nunca com a do autor. O autor sobrevive às tempestades teóricas enquanto mais um sujeito<br />
que é prenhe de subjetividade e são as lacunas de sua vida que transbordam em seu texto.<br />
Não se pretende com isso, dizer que toda leitura de um texto deve levar em consideração os<br />
fatores biográfi cos do autor para ser compreendido em sua completude. Esses fatores - sobre a<br />
vida de quem escreve - servem enquanto um suplemento para uma determinada interpretação<br />
de texto que por acaso vá em busca desses acontecimentos que, mesmo quando não forem<br />
‘aproveitados‘ no momento da leitura, não podem, contudo, ser ignorados.<br />
Para conhecermos um pouco mais o assunto e como ele tem repercutido, vamos ver<br />
o texto que se segue com alguns apontamentos sobre as principais teorias desenvolvidas<br />
sobre a questão do autor:<br />
Foucault (1992), em seu texto “O que é um autor?”, comenta que, historicamente,<br />
os textos passaram a ter autores na medida em que os discursos se tornaram<br />
transgressores com origens passíveis de punições, pois, na Antiguidade, as narrativas,<br />
contos, tragédias, comédias e epopéias - textos que hoje chamaríamos literatura - eram<br />
colocados em circulação e valorizados sem que se pusesse em questão a autoria - o<br />
anonimato não constituía nenhum problema, a sua própria antigüidade era uma garantia<br />
sufi ciente de autenticidade. Os textos científi cos, ao contrário, deveriam ser avalizados<br />
pelo nome de um autor, como os tratados de medicina, por exemplo.<br />
Nos séculos XVII e XVIII, os mesmos textos científi cos passaram a ter validade<br />
em função de sua ligação a um conjunto sistemático de “verdades” demonstráveis.<br />
No fi nal do século XVIII e no correr do século XIX, com a instituição do sistema de<br />
propriedade, possuidor de regras estritas sobre direitos do autor e relações autor/<br />
editor, é que o gesto carregado de riscos da autoria, enquanto transgressão, segundo<br />
Foucault, passou a se constituir um bem, preso àquele sistema.<br />
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