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GESTA MARIAL DE UM VARÃO CATÓLICO<br />
tendia que confiar em Deus é uma<br />
atitude boa. Lembrava-me até de<br />
um canto entoado pelo coro da<br />
paróquia em que me fiz Congregado<br />
Mariano, cuja letra em latim era:<br />
Beatus homo qui confidet in te —<br />
“Bem-aventurado o homem que<br />
confia em Vós, Senhor”. Eu gostava<br />
de ouvir aquilo, era uma canção que<br />
me dizia alguma coisa, porém não<br />
aprofundava seu significado.<br />
Agora, naquela amargura, ao ler<br />
as palavras “voz de Cristo, voz misteriosa<br />
da graça”, tive uma sensação<br />
curiosa, como se uma atmosfera<br />
dulcíssima e cheia de afeto penetrasse<br />
em mim, afastasse todos os<br />
espantalhos e receios, e me dissesse:<br />
“Repita, meu filho: voz de Cristo,<br />
voz misteriosa da graça, vós murmurais<br />
em minha alma palavras de<br />
doçura e de paz”.<br />
Eu sentia algo que fazia desaparecer<br />
todas as minhas angústias e<br />
me dava uma certeza de que, realmente,<br />
aqueles fantasmas de perspectivas<br />
e de preocupações futuras<br />
sumiriam. E de que Nosso Senhor e<br />
Nossa Senhora resolveriam bem os<br />
problemas que tanto me amarguravam.<br />
Continuei a ler o livro, e a cada<br />
nova frase, a mesma sensação de<br />
tranqüilidade se produzia em mim.<br />
Eu tinha a impressão de estar entrando<br />
num bosque encantado onde<br />
davam flores maravilhosas, onde passarinhos<br />
cantavam do modo mais<br />
sonoro e agradável possível, etc.<br />
E onde fica a razão?<br />
Contudo, habituado sempre a raciocinar<br />
muito, e não conhecendo a<br />
doutrina católica a respeito da confiança,<br />
eu tinha duas objeções contra<br />
esses sentimentos.<br />
Em primeiro lugar, não se me<br />
apresentava nenhuma razão plausível<br />
para confiar em que Nossa Senhora<br />
me ajudaria naquela emergência,<br />
pois não via no meu horizonte<br />
nada que me prometesse uma<br />
solução. E o homem tem de ser concreto,<br />
não pode viver de impressões<br />
interiores. Para confiar, ser-me-iam<br />
necessários motivos pão-pão, queijo-queijo,<br />
filhos da razão. Ora, onde<br />
estava a razão dentro dessa história?<br />
Depois, havia o fato de que em<br />
certas horas do dia eu lia aquelas<br />
frases, e era para mim como se estivesse<br />
mascando serragem de madeira.<br />
Não me diziam nada. Em outras<br />
horas, pelo contrário, era como<br />
se penetrasse um pedaço do Céu<br />
dentro de meu espírito. Logo, objeção:<br />
“Que propósito tem isto?<br />
Eu não entregarei minha alma<br />
a essas sensações interiores<br />
sem antes ter uma explicação<br />
de como se fundamentam<br />
na boa e ortodoxa<br />
doutrina da Santa<br />
Igreja Católica Apostólica<br />
Romana.”<br />
Mas, não havia remédio,<br />
era uma experiência<br />
curiosa: eu abria o<br />
livro e penetrava em mim<br />
essa doçura. Nesse momento,<br />
as objeções desapareciam,<br />
tornando evidente<br />
ser aquilo uma ação da graça,<br />
um favor de Deus e de Nossa Senhora.<br />
Porém, quando fechava o livro,<br />
aquela suavidade se eclipsava,<br />
e para mim já não era tão patente<br />
tratar-se de um movimento da graça.<br />
Então, eu precisava de provas.<br />
A solução exata,<br />
no momento exato<br />
Estas apareceram, de modo bem<br />
inesperado.<br />
Vinha eu passar os fins de semana<br />
em São Paulo para estar com<br />
meus pais, e no domingo à noite ou<br />
segunda-feira de manhã retornava<br />
ao Rio de Janeiro.<br />
Certa noite, numa dessas minhas<br />
passagens por São Paulo, encontrava-me<br />
no prédio da Congregação<br />
Mariana de Santa Cecília, quando<br />
um congregado amigou meu,<br />
pessoa muito viva e inteligente,<br />
aproximou-se de mim e, num<br />
tom de voz baixo, quase sussurrado,<br />
me disse:<br />
— <strong>Plinio</strong>, você gostaria que<br />
eu lhe pusesse na pista de um emprego<br />
muito bom? Quando você<br />
deixar de ser deputado, você fica<br />
com esse trabalho...<br />
Eu caí das nuvens! “Esse homem<br />
não sabe nada a respeito de minha<br />
vida, não conhece os apuros e os<br />
problemas em que ando, como pode<br />
ele vir me oferecer algo tão capaz<br />
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