Sentença OMR e RCR - Versão Wellington Magalhães

45. Assim, a adequação do tipo penal às práticas delitivas do denunciado
revela-se suficientemente demonstrada, sobretudo, diante da incoerência entre
as datas de lavratura da Escritura de Compra e Venda “26/03/2006” e a data da
Procuração “17/11/2006”.
46. Com efeito, extrai-se a manifesta impossibilidade de a data da Procuração
ser posterior à data de transação de lavratura da referida Escritura, fatos estes
devidamente delineados no laudo (evento 71 – fl. 27), registro este também
objeto de certidão imobiliária a posteriori. Assim, as alegações defensivas não
merecem acolhida.
47. Dito isso, por decorrência lógica, não há como aquiescer a tese da
ausência de dolo, porquanto o tipo penal em comento exige elemento subjetivo
específico, consistente na finalidade de prejudicar direito, criar obrigação ou
alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. E não há como afastar a
relevância do fato de se lavrar um documento público em serventia destinada a
assegurar a fé pública e as formalidades próprias dos negócios jurídicos.
48. Ademais isso, no caso discutido nestes autos, observa-se que o ato
consciente do réu de lavrar escritura pública com a omissão da procuração e
consequente expedição da primeira certidão imobiliária teve o condão de
prejudicar o negócio jurídico celebrado, ou, no mínimo, de praticar ato jurídico
público em total desrespeito aos princípios da segurança jurídica; e
incompatível com o dever funcional decorrente da Lei nº 8.935/94, v. g., artigos
30, V c/c art. 31, V, do mesmo diploma legal.
49. Quanto à ausência de demonstração de lesão a bem jurídico, em que pese
não esteja explícito na inicial acusatória o efetivo prejuízo, não se exige para a
configuração de tal delito a ocorrência de dano, bastando a potencialidade de
um evento danoso. Especialmente em se tratando de ato praticado por titular
de serventia extrajudicial de onde se espera todo rigor, legalidade e
legitimidade de seus atos registrais e notariais.
50. A esse respeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ
sustenta que uma vez caracterizada a falsidade, é desnecessária a
demonstração de efetivo prejuízo, vejamos:
PENAL. PROCESSUAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE
RECURSO. FALSIDADE IDEOLÓGICA. AÇÃO PENAL.
TRANCAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. JUSTA CAUSA. DENÚNCIA
AMPARADA EM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL
PARA FINS PENAIS E DIVERSOS DEPOIMENTOS. DOLO
ESPECÍFICO DESCRITO NA DENÚNCIA. OCULTAÇÃO DA
PROPRIEDADE DE EMPRESA ENVOLVIDA EM
PROCEDIMENTO FISCAL. ATIPICIDADE DA CONDUTA.
AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. IRRELEVÂNCIA. 1. Ressalvada
pessoal compreensão diversa, uniformizou o Superior Tribunal de
Justiça ser inadequado o writ quando utilizado em substituição a
recursos especial e ordinário, ou de revisão criminal, admitindose,
de ofício, a concessão da ordem ante a constatação de
ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia. 2. A extinção
da ação penal, por falta de justa causa ou por inépcia, situa-se
no campo da excepcionalidade, pois somente é cabível o