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Pág. 4 | DISTRIBUIÇÃO GRATUITA! O Jornal Comunitário da Zona Norte de Maringá! | Ano 01 | Edição <strong>002</strong> | Maringá, fevereiro de <strong>2018</strong><br />
População de rua em<br />
Maringá: invisíveis<br />
ou indesejados?<br />
A realidade na cidade que ocupa os mais positivos<br />
rankings nacionais para se viver.<br />
(Profª. Dra. Ana Lúcia Rodrigues - Professora da UEM e<br />
Coordenadora do Observatório das Metrópoles - Núcleo Maringá)<br />
“Pior que morar na rua, só a morte.”<br />
Ouvi esta frase de um senhor que<br />
viveu muitos anos em situação de rua.<br />
Hoje ele atua no movimento nacional<br />
de moradores de rua que luta pelos direitos<br />
à moradia, à saúde, ao trabalho etc.<br />
Um desfecho singular que pode ser considerado<br />
exceção no mundo da rua, pois<br />
é muito difícil superar tal situação,<br />
principalmente numa cidade como Maringá,<br />
onde essas pessoas são completamente<br />
desconsideradas como seres<br />
humanos, a despeito de os maringaenses<br />
serem extremamente caridosos.<br />
Mas o que prevalece em nossa cidade<br />
é a negação desse problema e a<br />
invisibilização dessas pessoas. Um<br />
prefeito chegou a dizer certa vez que<br />
em Maringá não existia favela nem<br />
morador de rua.<br />
Afinal, na imagem de Maringá<br />
não tem espaço para estas pessoas,<br />
pois o que vale é a cidade ter sido planejada<br />
desde sua origem para os negócios<br />
e, com isso, elementos “indesejados”<br />
como os moradores de rua<br />
são invisibilizados.<br />
Uma pesquisa que vem sendo realizada<br />
pelo Observatório das Metrópoles<br />
da UEM (2015, 2016 e<br />
2017) constatou que já são quase<br />
300 pessoas vivendo nas ruas da cidade,<br />
dormindo nas praças, sob as marquizes<br />
das lojas, nas igrejas e, principalmente,<br />
concentradas nas imediações<br />
do Albergue e do Centro Pop.<br />
Quando perguntamos aos entrevistados:<br />
“O que você acha que as<br />
pessoas da sociedade pensam sobre<br />
as pessoas em situação de rua?”, ouvimos<br />
respostas muito negativas como:<br />
“pra eles nós é lixo”;<br />
“acham que são vagabundos”;<br />
“a maioria<br />
das pessoas ignora”;<br />
“agem com desprezo”;<br />
“não tratam<br />
como ser humano”.<br />
Mas ouvimos também<br />
impressões carregadas<br />
de solidariedade:<br />
“uns ajudam,<br />
uns escutam a<br />
gente”; “alguns são bonzinhos,<br />
outros fingem que nem vê, mas<br />
não maltratam”; “algumas ajudam,<br />
algumas têm preconceito”;<br />
“eles têm medo da gente,<br />
mas a gente é gente igual eles”;<br />
“que são excluídos da sociedade e<br />
que não têm vez”.<br />
Nessa pesquisa foi identificado<br />
que, entre os fatores que mais levam<br />
as pessoas a viverem nas ruas, o mais<br />
citado foi a dependência química; em<br />
segundo lugar os desentendimentos e<br />
rompimentos com a família<br />
e, a terceira maior causa<br />
é o desemprego.<br />
Todavia, em 2017 observamos<br />
que o uso de<br />
substâncias psicoativas<br />
caiu como causa da situação<br />
de rua e o desemprego<br />
aumentou, em relação<br />
aos anos anteriores.<br />
Os resultados apontam<br />
a urgente necessidade<br />
de que o tema esteja no planejamento<br />
da cidade e na agenda pública<br />
e, por isso, um dos objetivos deste<br />
trabalho busca dar visibilidade a esta<br />
população que possui as seguintes<br />
características: a maioria dos moradores<br />
de rua é homem (cerca de<br />
90%); a maior faixa de idade é entre<br />
35 e 40 anos; mais de 65% são<br />
de cor preta ou parda; mais de<br />
90% têm baixa escolaridade; a<br />
fonte de renda da maioria é pedir<br />
dinheiro e/ou cuidar de carros.<br />
Destacamos que as duas informações<br />
mais importantes<br />
mostram que mais de 90% dos<br />
entrevistados deseja sair da situação<br />
de rua e para isso necessitam<br />
de “Emprego”; “Moradia”<br />
e “Família”.<br />
Os resultados de nossa pesquisa,<br />
que investiga as características e as<br />
condições de vida dessa população,<br />
são divulgados para a sociedade e entregue<br />
ao poder público para subsidiar<br />
as ações em favor destas pessoas,<br />
contribuindo para reduzir a precariedade<br />
em que vivem. Esse fenômeno<br />
é crescente em todo o país e<br />
também em Maringá.<br />
Mas, na cidade que alimenta - local<br />
e nacionalmente - uma imagem<br />
sui generis, na qual não existiriam os<br />
mesmos problemas sociais de outros<br />
centros urbanos brasileiros; uma cidade<br />
que ocupa os mais positivos<br />
rankings nacionais, a condição de invisibilidade<br />
da população em situação<br />
de rua é sempre muito presente.<br />
Afinal, essas pessoas colocam em xeque<br />
e contradizem a imagem de cidade<br />
que se busca vender.<br />
No entanto, é importante frisar<br />
que o objetivo da pesquisa é muito<br />
maior do que evidenciar esse contraponto<br />
entre cidade imagem em confronto<br />
com a cidade real.<br />
O projeto é um instrumento de<br />
participação dos cidadãos na construção<br />
de uma sociedade mais igualitária<br />
e, por isso, desde a coleta de<br />
dados até a fase final de apresentação<br />
da pesquisa em Audiência Pública<br />
envolve todos os atores do poder<br />
público e da sociedade, interessados<br />
na problemática dessa população.<br />
A 4ª edição da pesquisa ocorrerá<br />
no 2º. Semestre de <strong>2018</strong> e convidamos<br />
a todos os interessados em conhecer<br />
essa questão social tão grave<br />
que se juntem a nós.■<br />
Contatos:<br />
(44) 3011-4287<br />
observatorio@uem.br<br />
observatoriodasmetropolesmaringa.com<br />
Claudio A.L., cadeirante que vivia em<br />
situação de rua. Morreu queimado em<br />
julho de 2017.