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Linguística românica<br />
as línguas vivas, onde a evolução da língua pode ser objeto de observação e<br />
não de conjecturas. Na prática, o trabalho dos neogramáticos se caracterizou<br />
por <strong>um</strong>a exigência de extremo rigor, e pela crença de que as “leis” da evolução<br />
fonética agem de maneira absolutamente regular, aparecendo exceções apenas<br />
quando sua ação é contrariada pela força psicológica da analogia. Exemplos<br />
simples de como a analogia atua no funcionamento das línguas podem ser<br />
encontrados na fala das crianças, em “erros” como eu fazi ou eu trazi por eu<br />
fiz e eu trouxe: segundo Ferdinand de Saussure, que expõe em seu Curso de<br />
linguística geral o conceito de analogia dos neogramáticos, operaria aí <strong>um</strong>a<br />
espécie de regra de três: se viver, correr etc. fazem o perfeito em -i, pode-se<br />
esperar que fazer e trazer também o façam. Um exemplo muito simples de como<br />
a analogia afeta a evolução das línguas é dado pelo verbo português render e<br />
seus correspondentes românicos fr. rendre, it. rendere etc.: essas formas não<br />
poderiam provir do verbo que significa “render” em latim clássico, ou seja,<br />
reddere, pois nenh<strong>um</strong>a lei fonética conhecida justifica que apareça do nada <strong>um</strong><br />
-n- fechando a primeira sílaba; as formas românicas derivam verossimilmente<br />
de *rendere, construído por analogia com o verbo que significava “tomar”,<br />
isto é, prendere (clássico prehendere).<br />
Pela rigidez que atribuíram à evolução fonética, os neogramáticos atraíram<br />
as críticas de autores que, ou por razões teóricas (como o linguista alemão Hugo<br />
Schuchardt [1842-1927]) ou por estarem em contato direto com a realidade multiforme<br />
dos dialetos, como o dialetólogo italiano Graziadio Isaia Ascoli (1829-<br />
1907), não estavam dispostos a aceitar a tese de que as leis fonéticas operam de<br />
maneira cega. Tiveram, contudo, <strong>um</strong>a influência determinante, para a Linguística<br />
e para a Romanística. Ferdinand de Saussure, em quem se cost<strong>um</strong>a reconhecer<br />
o fundador da Linguística moderna, era neogramático de formação, tendo estudado<br />
com Brugmann na Universidade de Leipzig; como se sabe, Saussure teve<br />
entre seus alunos alguns linguistas de grande porte, como Charles Bally, Albert<br />
Sechehaye (1870-1946) e Antoine Meillet (1886-1946), e seu ensinamento deu<br />
origem à Linguística estrutural; também teve formação neogramática o mais<br />
importante romanista depois de Diez, William Meyer-Lübke (1861-1936), cujas<br />
obras Gramática das línguas românicas e Dicionário etimológico românico (este<br />
geralmente conhecido pela sigla REW, formada pelas três primeiras letras do título<br />
original) são ainda hoje fundamentais. Os trabalhos dos neogramáticos em geral,<br />
e de Meyer-Lübke em particular, refinaram o método de Diez, isto é, o método<br />
histórico-comparativo, que é fundamental nos estudos de Linguística Histórica<br />
em geral, e nos estudos românicos em particular.