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Leonardo Sant’Anna<br />
MÚSICA E<br />
SEGURANÇA<br />
Precisamos de LENNYS<br />
Divulgação<br />
O<br />
que uma coisa tem a ver com a outra? Música<br />
e segurança, aparentemente, não se conectam.<br />
Aparentemente. Por que tratar disso se violinistas<br />
não são policiais? Desde quando arranjo<br />
musical se mistura com operação policial? Aparentemente<br />
tocar o bumbo não se confunde com prender bandidos. Mas<br />
será que realmente não há nada em comum entre música e<br />
segurança?<br />
Nos últimos trinta e dois anos, eu tenho lidado com os dois<br />
temas muito intensamente. Quando gravei para o Discovery<br />
Channel em 2013, fizeram a pergunta de sempre: “Sair de DJ<br />
a consultor internacional de segurança foi muito complicado?”.<br />
Fui econômico: “O que vem fácil, vai fácil!”. Em pouco<br />
mais de cinco anos já comandava operações de alto risco no<br />
BOPE, o Batalhão de Operações Policiais Especiais. Depois de<br />
duas décadas, me dividia entre o trabalho local e o compartilhamento<br />
de políticas públicas, táticas e estratégias pelas<br />
Américas, Ásia e Europa.<br />
Nesse mesmo período, os anos nos trouxeram perdas insubstituíveis<br />
nos dois campos. E você sente isso nos seus<br />
ouvidos e em seu cotidiano, nas 24 horas do seu dia. 24 horas<br />
mesmo. É muito estranho saber que não temos mais o<br />
nosso Renato Russo, Michael Jackson, Naná Vasconcelos,<br />
Amy Winehouse, Leonard Bernstein. Na mesma proporção,<br />
quem imaginaria não poder estar tranquilo na porta da própria<br />
casa, em não mais poder apreciar o pôr do sol tranquilamente<br />
nas praias do Rio de Janeiro - nosso maior cartão<br />
postal. Que haveria atentados na Time Square ou que nos<br />
chocaríamos com múltiplas notícias de violência nas escolas<br />
de nossos filhos? O que está faltando? Onde erramos?<br />
A verdade é que deixamos de aplicar na segurança o que<br />
não pode deixar de existir na música: HARMONIA. Também<br />
conhecida como ausência de conflito, como concórdia e<br />
como equilíbrio, essa palavra abraça tanto o artístico como<br />
o social. Tudo que é harmônico se reconhece como justo e<br />
perfeito. Se reconhece como equilibrado. Esse descompasso<br />
em qualquer momento da música ou da segurança significa<br />
um problema.<br />
Agora já fica mais fácil perceber que existem coincidências.<br />
Música e segurança estão em quase tudo. Acompanham<br />
homens e mulheres desde sempre. Os dois são bons para o<br />
corpo e para a alma. A primeira, do grego musikē, que significa<br />
a arte das musas, organiza som e silêncio tão bem e nos<br />
alcança de forma tão profunda, que há tempos é utilizada<br />
inclusive como terapia. Ela influencia diretamente sensações<br />
e sentimentos de forma imperceptível. Quer ver? Tente<br />
assistir a um filme sem trilha sonora. O resultado não será<br />
o mesmo. Outra coisa: me diga que você nunca esteve estressado<br />
e falou em algum momento para si mesmo: “Deixa<br />
eu escutar uma boa música para ver se melhoro?”.<br />
A segunda é muito parecida. Precisa ter os mesmos requisitos<br />
e promove os mesmos resultados. Brevemente diferente,<br />
organiza o certo e o errado. Percebemos que sua ausência<br />
nos incomoda profundamente e, no filme de nossas vidas,<br />
quando a segurança não é sentida, altera cada passo que<br />
damos e decisão que tomamos. Perceba que, do local selecionado<br />
para adquirir a casa dos seus sonhos, à escola em<br />
que seus filhos estudam, esse quesito é um dos primeiros<br />
a ser considerado. Nessa escolha, certamente, uma de suas<br />
perguntas será “como é a segurança por aqui?”.<br />
Como a música, a segurança precisa ser revestida de conceitos,<br />
parâmetros e produzir resultados. Sem isso, existir som<br />
não é o mesmo que ter música, como existir instituições de<br />
proteção não significa, por si só, ter segurança. É impossível<br />
dizer que se ouça uma sinfonia sem que haja um maestro,<br />
melodia, bons instrumentos, ensaio e até um local adequado<br />
para difusão do som. Quando desejamos nos distanciar de<br />
perigos e riscos mas escolhemos economizar em um bom<br />
gestor, quando não nos importamos em modernizar as leis,<br />
quando descuidamos de boas ferramentas de trabalho para<br />
quem está nos defendendo, e quando deixamos de lado treinamento<br />
e bom ambiente laboral, não se pode esperar grandes<br />
feitos. Seguindo dessa maneira apostamos em ter como<br />
resposta algo bem diferente do previsto para quem busca<br />
essa tal de segurança.<br />
Pegando uma carona na música clássica, quem sabe um dia<br />
a segurança se valha do exemplo que nos deu Lenny, como<br />
era conhecido o Maestro Leonardo Bernstein. Em 1986, ele<br />
teve a felicidade de ser chamado para tornar histórica a queda<br />
do muro de Berlim e a união das Alemanhas. Juntou o que<br />
havia de melhor na música: a Filarmônica de Nova York, a Orquestra<br />
de Paris, a do Kirov de Leningrado, e a Orquestra Sinfônica<br />
de Londres. Foi inesquecível. Mas só deu certo porque,<br />
no momento da execução daquele ato musical, todos sabem<br />
que não se pode futucar. Não há espaço para palpite.<br />
Devemos nos esforçar para que um dia tenhamos o mesmo<br />
na segurança. Daí será possível comemorar a união de nossos<br />
músicos da proteção pública. Só assim voltaremos a ter a sensação<br />
de estarmos plenamente seguros e protegidos. E que<br />
sejamos maduros o suficiente para não permitir a aparição de<br />
futucadores e palpiteiros. Precisamos urgentemente dos maestros<br />
que nos devolvam essa tão desejada harmonia.<br />
Definitivamente música e segurança têm pontos em comum.<br />
Mas carecemos de Lennys.<br />
Nosso país permitiu a construção de diversos muros de Berlim.<br />
Precisamos derrubar o que nos impede de termos mais<br />
segurança. Garanto que o som da queda dessas barreiras<br />
será a melhor música que ouviremos.<br />
EVOKEMAR2018<br />
EVOKEMAR2018