Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Após quase 50 anos sucessivos de sistemática<br />
organização e da passagem de inúmeros<br />
especialistas, cruciais à organização do<br />
Acervo do Museu da Música, a Coleção<br />
Dom Oscar de Oliveira, bem como outras<br />
seções integradas a posteriori, chegaram<br />
ao século XXI sob devido tratamento arquivístico-musical,<br />
contando com a publicação<br />
de 10 livros, 09 álbuns musicais, a abertura<br />
e expansão de módulos expositivos destinados<br />
mediação das fontes documentais,<br />
onde o visitante pode ter impressões sonoras<br />
e visuais adjacentes ao conteúdo musical<br />
que ora se apresentaria apenas manuscrito<br />
ou impresso no documento.<br />
Quando um lote de manuscritos chega ao<br />
Museu da Música, vem ainda envolvido pelo<br />
trato de seu arconte primário, conduzido<br />
pela essência arquivística do mesmo. Na<br />
apreensão desse sentido também se<br />
estende o ato educativo: discutimos, para<br />
além do valor estético destas fontes musicais,<br />
seu teor educativo na atualidade.<br />
O conceito de exposição adotado pelo<br />
Museu da Música possibilita atualmente<br />
que os visitantes percorram quatro salas,<br />
sendo apresentados, na primeira, a antigos<br />
livros que serviram à organização musical<br />
do calendário litúrgico. Trata-se de livros<br />
vindos de Portugal a partir de 1745 que,<br />
datados entre o século XVI e o século XX,<br />
contêm a mais elaborada prática de notação<br />
musical do Canto Gregoriano.<br />
O canto Gregoriano é o canto próprio da<br />
Igreja Católica, composto sobre textos<br />
bíblicos, orações e salmos. Originalmente,<br />
tem a função de aumentar o decoro das<br />
ações litúrgicas convocando a atenção dos<br />
fiéis aos textos sagrados. É um gênero de<br />
música vocal monofônica, monódica, tem<br />
ritmo livre e não medido, seguindo o ritual<br />
litúrgico católico romano. Um dos aspectos<br />
que tornam tão singular o vislumbrar dos<br />
livros de canto, missais e graduais está no<br />
fato de serem muitos deles manuscritos,<br />
apresentando neumas correntes desde a<br />
idade média.<br />
Desde 1711, a edificação que viria ser a Sé<br />
marianense, recebeu o título de Matriz<br />
37<br />
c o n s a g r a d a a N o s s a S e n h o r a d a<br />
Conceição. Em 1745, com a criação da<br />
Diocese de Mariana, a matriz foi elevada a<br />
Catedral tendo como orago Nossa Senhora<br />
da Assunção. Não é possível um entendimento<br />
claro sobre o patrimônio históricomusical<br />
brasileiro, sem abordarmos nossa<br />
história eclesiástica já contada a partir de<br />
pesquisas realizadas e textos já escritos.<br />
Dom Frei Manoel da Cruz, o primeiro bispo<br />
de Mariana, ainda no ano de sua chegada,<br />
passou à constituição do cabido: quatro<br />
dignidades (arcediago, arcipreste, chantre e<br />
tesoureiro mor); dez cônegos; doze capelães;<br />
um mestre de cerimônias do bispo; um<br />
mestre de cerimônias do cabido; quatro<br />
moços de coro, um sacristão, dois mestres<br />
de capela, um organista, dois sacristãos e<br />
um porteiro de massa. A esse Cabido, o<br />
agrupamento de cônegos e outros sacerdotes,<br />
instituído para assegurar o serviço<br />
religioso e colaborar no governo da diocese,<br />
serviram os livros que ora estão em exposição.<br />
O canto gregoriano, no contexto teórico<br />
musical, é também usado para a análise da<br />
condução e abertura das vozes, o exercício<br />
do contraponto e o desenvolvimento da<br />
polifonia que, na música chamada ocidental,<br />
após uma extensa transformação,<br />
acarreta práticas específicas de afinação e<br />
harmonização, cuja normatização ainda<br />
vigora até o presente. Dada sua conformação<br />
litúrgica, tais livros serviram de fonte<br />
primária aos compositores que de alguma<br />
maneira se vincularam ao contexto eclesiástico<br />
catedralício de Mariana e seu<br />
entorno, para criar e adaptar as belíssimas<br />
obras polifônicas da música colonial.<br />
Na segunda sala, onde é possível ver de<br />
perto e ouvir a música grafada nos manuscritos<br />
dos séculos XVIII e XIX, hoje soam<br />
como inéditos. Vê-se o texto musical gregoriano,<br />
seus neumas e melismas, vigentes na<br />
Europa no século XVIII, lado a lado a exemplos<br />
de seu respectivo uso na polifonia<br />
transcrita pelos músicos mineiros.