Museu da Existência - Criação da Amarelo Silvestre

JÁ PODE SER MENINO
Aliança do pai do menino
Valor do objecto: A memória de um dia em que o bebé
que vinha a caminho, mesmo se fosse menino, já não ia
à guerra em adulto.
Proprietário: Museu da Existência (colecção própria).
Origem: Canas de Senhorim.
Método e data de recolha: Aquisição Museu da Existência
(por mim próprio, de meu nome Melo), a 18 de
Dezembro de 2015.
O relato é do Senhor Américo: “A 25 de Abril
de 1974, eu, estudante de medicina, estava a
fazer uma história clínica nos velhos Hospitais
da Universidade de Coimbra. A determinada
altura, diz-me uma amiga: ‘parece que houve
uma revolução em Lisboa’. Eu perguntei: Uma
revolução de esquerda ou de direita?” Mas ainda
não havia resposta. “Eu disse à minha amiga: a
história clínica acabou aqui, eu vou tentar saber
o que se passa. Com a excitação, desapartei os
botões da bata, atirei-a e a aliança que estava no
bolso... nunca mais a vi (mais tarde, a minha sogra
teve a gentileza de me oferecer outra). Quando
cheguei a casa...”- a esposa do Senhor Américo, a
Dona Graça, continuou o relato: “Ele pegou-me
ao colo - eu estava com um barrigão de grávida
– e ele andava comigo à roda e dizia: ‘já pode
ser menino, já pode ser menino’”. Ele para ela:
“Já pode ser menino porque a revolução vai
acabar com a guerra”. Disse-me a Dona Graça:
“Até esse dia, ele queria uma menina. Só então
percebi porquê.”
O Senhor Américo e a Dona Graça são pais
de três meninos. Durante a Guerra Colonial
morreram mais de oito mil militares das Forças
Armadas portuguesas.