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Direito Minerário cap.32

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DIREITO DA

MINERAÇÃO

questões minerárias,

ambientais

e tributárias

Marcelo Azevedo

Paulo Honório de

Castro Júnior

Tiago de Mattos

William Freire

[Coords.]

editora


Copyright © 2017, D'Plácido Editora.

Copyright © 2017, Os autores.

Editor Chefe

Plácido Arraes

Produtor Editorial

Tales Leon de Marco

Capa, projeto gráfico

Letícia Robini de Souza

Diagramação

Bárbara Rodrigues da Silva

Christiane Morais de Oliveira

Editora D’Plácido

Av. Brasil, 1843, Savassi

Belo Horizonte – MG

Tel.: 31 3261 2801

CEP 30140-007

WWW.EDITORADPLACIDO.COM.BR

Todos os direitos reservados.

Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida,

por quaisquer meios, sem a autorização

prévia do Grupo D’Plácido.

Catalogação na Publicação (CIP)

Ficha catalográfica

Direito da mineração: questões minerárias, ambientais e tributárias. FREIRE,

William; AZEVEDO, Marcelo; HONÓRIO, Paulo; MATTOS, Tiago de [Orgs.] -- Belo

Horizonte: Editora D’Plácido, 2017.

Bibliografia.

ISBN: 978-85-8425-XXX-X

1. Direito Ambiental. I. Título. II. Autores

CDU 349 CDD 341.347


ITR SOBRE ÁREAS DE MINERAÇÃO

32

1. Introdução

Luiza Viglioni Nogues 1

Paulo Honório de Castro Júnior 2

O Brasil possui um dos maiores patrimônios minerais do

mundo e é um importante produtor e exportador de minérios de

qualidade, sendo esta a razão pela qual a mineração é considerada

uma das grandes forças da economia brasileira.

De tempos em tempos o setor passa por ciclos de prosperidade

nos negócios, mas se pode afirmar que a Indústria da Mineração

sempre foi uma das responsáveis pelo saldo positivo da balança

comercial brasileira – vale lembrar que os minerais representam

importante commodity na pauta de produtos de exportação.

Não obstante o grande destaque na economia do nosso país,

o setor minerário ainda encontra grandes obstáculos ao seu desenvolvimento,

entre os quais se encontra a questão da carga tributária

vinculada ao seu exercício.

E no que se refere à carga tributária aplicada à mineração, além

da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais

(CFEM), tema bastante questionável e frequentemente discutido

1

Graduada em Direito pela Fundação Mineira de Educação e Cultura (FUMEC).

Graduanda em Ciências Contábeis Fundação Mineira de Educação e Cultura

(FUMEC). Analista Sênior de Tributos de empresa de mineração. Advogada.

2

Presidente do Instituto Mineiro de Direito Tributário – IMDT. Pós-Graduado

pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Coordenador e professor

em cursos de pós-graduação e extensão em Direito Tributário. Advogado.

809


por estudiosos da área, muitos outros tributos oneram o setor de

produção mineral, sendo necessária uma ampliação das discussões

acerca do tema.

Pretende-se, neste trabalho, analisar e refletir sobre a incidência

de um tributo em especial, o Imposto Territorial Rural, às propriedades

rurais onde haja atividade de mineração, possibilitando a discussão

em torno da cobrança deste tributo, tema que demonstra relevância

prática e, em que pese já apresente decisões favoráveis aos contribuintes

conforme veremos, ainda encontra lacunas doutrinárias.

2. O ambiente histórico no contexto do

surgimento do Imposto Territorial Rural

A competência tributária do ITR, prevista na Constituição de

1946, foi outorgada à União Federal por meio da promulgação da

Emenda Constitucional nº 10/64, a qual foi editada com o objetivo

de conferir à União um importante e eficaz instrumento de política

fiscal para a Reforma Agrária 3 .

Neste sentido, e no mesmo ano, foi editado o Estatuto da

Terra, Lei n.º 4.504/64, o qual tratou dos direitos e obrigações

concernentes aos imóveis rurais, para os fins de execução da reforma

agrária e política agrícola nacional. Dentre outras disposições, foi

apresentado o conceito do imóvel rural, bem como foi instituído o

imposto territorial rural.

Como conceito, o Estatuto trouxe em seu art. 4º, I, que imóvel

rural é “prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização

que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer

através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada”.

Já em relação ao imposto, o ITR, o Estatuto o instituiu de forma

progressiva, cujo fato gerador recaía somente sobre áreas passíveis

de aproveitamento rural, assim entendida a exploração da atividade

agrícola, pecuária e florestal 4 .

3

BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11ª Ed. Atualizada por

Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro, Forense, 2010. p. 232.

4

Art. 50. Para cálculo do imposto, aplicar-se-á sobre o valor da terra nua, constante

da declaração para cadastro, e não impugnado pelo órgão competente,

ou resultante de avaliação, a alíquota correspondente ao número de módulos

fiscais do imóvel, de acordo com a tabela adiante: (Redação dada pela Lei nº

6.746, de 1979) (...)

810


A incidência do ITR apenas sobre áreas destinadas à atividade

rural estava de acordo com os objetivos da tributação da terra previstos

no próprio Estatuto (art. 47), de atuar como instrumento de

auxílio de política agrária. Dentre os objetivos listados no dispositivo,

ressalta-se o estímulo ao uso racional e sustentável da terra e dos

recursos naturais renováveis, financiamento dos projetos de reforma

agrária e aperfeiçoamento dos sistemas de controle da arrecadação

de impostos.

Assim, como o propósito era estruturar a atividade rural por

meio do ITR, não foram incluídas as áreas de mineração como áreas

tributáveis e aproveitáveis, conforme dispôs o art. 8º, do Decreto- Lei

n.º 57/66, o qual, dentre outras providências, alterou dispositivos

sobre lançamento e cobrança do imposto:

“Art 8º Para fins de cadastramento e do lançamento do ITR, a

área destinada a exploração mineral, em um imóvel rural, será

considerada como inaproveitável, desde que seja comprovado

que a mencionada destinação impede a exploração da mesma

em atividades agrícolas, pecuária ou agro-industrial e que sejam

satisfeitas as exigências estabelecidas na regulamentação dêste

Decreto-Lei. ” (Grifou-se).

Importante destacar, para este estudo, que o Decreto- Lei n.º

57/66 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988 como Lei

Complementar, conforme definido pelo Supremo Tribunal Federal

no Recurso Extraordinário nº 140.773/SP, Relator Ministro Sydney

Sanches, DJ 04.06.1999:

“Antes mesmo que o C.T.N. entrasse em vigor, o que ocorreu a

1º de janeiro de 1967 (art. 218), seu art. 32 foi alterado pelo

art. 15 do Decreto-Lei nº 57, de 18.11.1966 [...].

Esse Decreto-Lei nº 57/66 também foi recebido, não só como lei

formal, atendido, assim, também nesse caso, o princípio da legalidade,

mas como de natureza complementar (...)”. (Grifou-se).

§ 4º Para os efeitos desta Lei; constitui área aproveitável do imóvel rural a que

for passível de exploração agrícola, pecuária ou florestal. Não se considera

aproveitável: (Redação dada pela Lei nº 6.746, de 1979)

a) a área ocupada por benfeitoria; (Redação dada pela Lei nº 6.746, de 1979)

b) a área ocupada por floresta ou mata de efetiva preservação permanente, ou

reflorestada com essências nativas; (Redação dada pela Lei nº 6.746, de 1979)

c) a área comprovadamente imprestável para qualquer exploração agrícola,

pecuária ou florestal. (Incluído pela Lei nº 6.746, de 1979).

811


Diante do exposto, fica claro que os objetivos considerados na

Emenda Constitucional 10/64, na Lei n.º 4.504/64 e no Decreto-

Lei n.º 57/66, de nítido cunho extrafiscal, sustentaram a real intenção

do legislador à época do surgimento do ITR, o que permanece

compatível com a Constituição de 1988.

A CF/88 prevê a política agrária nacional, em seus arts. 184 a

191, com o objetivo principal de assegurar que se cumpra a função

social da propriedade rural. E para a consecução deste objetivo,

também foram previstos três principais instrumentos, quais sejam,

planejamento e execução de política agrícola, tributação diferenciada

das áreas rurais pelo ITR e a desapropriação dos imóveis improdutivos

para fins de reforma agrária.

Desse modo, o ITR também foi previsto na CF/88 como

instrumento para a concretização da política agrária nacional e, seu

principal papel foi demonstrado a partir da instituição de alíquotas

progressivas do imposto, que desestimulam a manutenção de propriedades

improdutivas, bem como a partir da imunidade das pequenas

glebas rurais exploradas por seus proprietários.

Contextualizado o ambiente de surgimento do imposto, faz-se

necessária a análise do ITR no cenário atual, nos termos da nossa

Constituição e leis vigentes.

3. O Imposto Territorial Rural na

legislação vigente

O ITR está previsto no artigo 153 da CF/88 e possui como

objetivo principal o desestímulo ao uso improdutivo da propriedade

rural, o que demonstra novamente seu caráter extrafiscal:

“Art. 153. Compete à União instituir imposto sobre: (...)

VI – propriedade territorial rural; (...)

§ 4º O imposto previsto no inciso VI do caput:

I - será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular

a manutenção de propriedades improdutivas;

II - não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei,

quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel;

III – será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem,

na forma da lei, desde que não implique redução do imposto

ou qualquer outra forma de renúncia fiscal. ” (Grifou-se).

812


Também está previsto no Código Tributário Nacional, o qual

estabeleceu como hipótese de incidência do imposto a propriedade,

o domínio útil ou a posse do imóvel localizado na zona rural (art.

29), tendo como base de cálculo o valor fundiário do imóvel.

A Lei n.º 9.393/96, foi a responsável por regular a atual forma

de incidência do ITR, e o fez estabelecendo que o imposto é calculado

mediante a multiplicação do Valor da Terra Nua Tributável

(“VTNt”) por uma alíquota, definida progressivamente, de 0,03%

a 20%, pela conjugação das grandezas Grau de Utilização e Área

Total do imóvel em hectares (art. 11), conforme tabela prevista no

Anexo da Lei n.º 9.393/1996:

O Grau de Utilização do imóvel equivale à relação percentual

entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável, conforme

dispõe art. 10, § 1º, VI, da Lei n.º 9.393/1996:

A área efetivamente utilizada foi definida pelo art. 10, § 1º, V,

como a porção do imóvel que, no ano anterior ao fato gerador,

tenha sido objeto de exploração extrativa; plantada com produtos

vegetais; servido de pastagem, nativa ou plantada; servido para exploração

de atividades granjeira e aquícola; e objeto de implantação

de projeto técnico.

A área aproveitável, por sua vez, foi definida pelo caput do inciso

IV, do § 1º, do art. 10, como apenas a que for passível de exploração

agrícola, pecuária, granjeira, aquícola ou florestal, cuidando as alíneas

do referido inciso de especificar as áreas não aproveitáveis, quais sejam,

aquelas ocupadas por benfeitorias úteis e necessárias e aquelas

não tributáveis, definidas no inciso II, do mesmo artigo e parágrafo.

Os fatores demonstrados acima irão determinar a alíquota do

ITR. Já em relação à base de cálculo do imposto é o Valor da Terra

Nua Tributável, ou VTNt, obtido por meio da multiplicação do VTN

813


pelo quociente entre a área tributável e a área total do imóvel, conforme

dispõe o inciso III, do § 1º, do art. 10, da Lei n.º 9.393/1996:

O VTN corresponde ao valor do imóvel, excluído do valor

das construções, instalações, benfeitorias, culturas permanentes e

temporárias, pastagens cultivadas e melhoradas e florestas plantadas

(inciso I, do § 1º, do art. 10).

A área tributável se refere a área total do imóvel, excluídas as áreas

comprovadamente imprestáveis para produção rural; de preservação

permanente e de reserva legal; de interesse ecológico; sob regime de

servidão ambiental; cobertas por florestas nativas; e alagadas para fins

de constituição de reservatório de usinas hidrelétricas, nos termos

do inciso II, do § 1º, do art. 10, da Lei em comento.

Ressalte-se, de todo o exposto, que as áreas definidas pela Lei nº

9.393/96 como não tributáveis são exatamente aquelas não passíveis

de exploração agrícola, pecuária, granjeira, aquícola ou florestal, ou

seja, áreas não aproveitáveis, conforme a definição.

Assim, por exemplo, considerando as áreas de preservação permanente

e de reserva legal, ao mesmo tempo em que são excluídas

do cálculo do Grau de Utilização do imóvel, causando a diminuição

da alíquota do ITR, já que são inaproveitáveis, também são excluídas

da base de cálculo do imposto, vez que são áreas qualificadas como

não tributáveis.

Para regulamentar a Lei n.º 9.393/96, foi editado o Decreto

n.º 4.382/02, cujo art. 18, III c/c art. 27 restringiu o conceito de

atividade extrativa 5 , considerando como efetivamente utilizada apenas

a área que desenvolva atividade extrativa vegetal:

“Art. 18. Área efetivamente utilizada pela atividade rural é a

porção da área aproveitável do imóvel rural que, no ano anterior

ao de ocorrência do fato gerador do ITR, tenha (Lei nº 9.393,

de 1996, art. 10, § 1, inciso V, e § 6):

III - sido objeto de exploração extrativa, observados, quando

aplicáveis, os índices de rendimento por produto a que se refere o

art. 27 e a legislação ambiental.

(...)

Art. 27. Área objeto de exploração extrativa é aquela

servida para a atividade de extração e coleta de produtos

5

A atividade extrativa foi mencionada neste mesmo tópico, quando foi definida

a “área efetivamente utilizada”.

814


vegetais nativos, não plantados, inclusive a exploração madeireira

de florestas nativas, observados a legislação ambiental e os índices

de rendimento por produto estabelecidos em ato da Secretaria da

Receita Federal, ouvido o Conselho Nacional de Política Agrícola

(Lei nº 9.393, de 1996, art. 10, § 1, inciso V, alínea “c”, e §

3) ”. (Grifou-se).

Nessa esteira, o art. 26, da Instrução Normativa SRF n.º 256/02,

considerou como atividade extrativa válida, para cálculo do ITR,

somente aquela voltada ao extrativismo vegetal. Ademais, o seu art.

30, II, expressamente qualificou as áreas ocupadas com jazidas ou

minas, exploradas ou não, como áreas não utilizadas:

“Art. 30. A área não utilizada pela atividade rural corresponde

ao somatório das parcelas da área aproveitável do imóvel que, no

ano anterior ao de ocorrência do fato gerador do ITR, não tenham

sido objeto de qualquer exploração ou tenham sido utilizadas

para fins diversos da atividade rural, tais como:

II - áreas ocupadas por jazidas ou minas, exploradas ou não”.

Além disso, tanto o Decreto n.º 4.382/2002, em seu art. 15 6 ,

como a Instrução Normativa SRF n.º 256/2002, art. 14, parágrafo

único 7 , condicionaram a validade das áreas imprestáveis para a atividade

rural à obtenção de declaração, do órgão competente, de que

estas áreas sejam de interesse ecológico, o que conforme veremos

adiante não se aplica às áreas de mineração.

6

Art. 15. São áreas de interesse ecológico aquelas assim declaradas mediante ato

do órgão competente, federal ou estadual, que (Lei nº 9.393, de 1996, art. 10,

§ 1º, inciso II, alíneas “b” e “c”):

I - se destinem à proteção dos ecossistemas e ampliem as restrições de uso

previstas nos incisos I e II do caput do art. 10; ou

II - sejam comprovadamente imprestáveis para a atividade rural.

7

Art. 14. São áreas de interesse ecológico aquelas assim declaradas mediante ato

do órgão competente, federal ou estadual, que:

I - se destinem à proteção dos ecossistemas e ampliem as restrições de uso

previstas para as áreas de preservação permanente e de reserva legal; ou

II - sejam comprovadamente imprestáveis para a atividade rural.

Parágrafo único. Para fins do disposto no inciso II, as áreas comprovadamente

imprestáveis para a atividade rural são, exclusivamente, as áreas do imóvel rural

declaradas de interesse ecológico mediante ato específico do órgão competente,

federal ou estadual.

815


Isto é, a regulamentação dada à Lei nº 9.393/1996, no que se

refere à apuração do Grau de Utilização do imóvel, impede que

as áreas de mineração sejam consideradas efetivamente utilizadas,

portanto, produtivas.

Essa também é a conclusão de Marciano Seabra de Godoi e

Fabiana Leão de Melo 8 , em seu artigo sobre o tema:

“Portanto, a regulamentação da Lei n.º 9.393 ocorreu no

seguinte sentido: o conceito de área aproveitável do inciso

IV, do art. 10 da lei, que corresponde a “área passível de exploração

agrícola, pecuária, granjeira, aquícola ou florestal”,

abrange as áreas destinadas à atividade mineral. Por outro

lado, o conceito do inciso V, c, do mesmo dispositivo, de “área

efetivamente utilizada na exploração extrativa”, não abrange

a atividade de mineração, mas apenas a extração vegetal. ”

Como consequência, a Administração Tributária adotou posicionamento

restritivo, considerando as áreas voltadas à atividade de

pesquisa e lavra mineral como improdutivas, sujeitas às alíquotas mais

gravosas do ITR, e também as considerando como áreas tributáveis,

as quais compõem a base de cálculo do imposto.

4. O tratamento restritivo dado pela Administração

Tributária face à incidência do ITR sobre áreas

destinadas à atividade de mineração

Acompanhando o posicionamento histórico da Receita Federal

quanto à incidência do ITR sobre as áreas de mineração, observamos

que há, reiteradas vezes, uma equiparação de tais áreas aos latifúndios

improdutivos. Isto é, além de serem consideradas equivocadamente

como aproveitáveis, também são consideradas como não utilizadas

ou improdutivas.

Esse entendimento foi oficializado pela Receita Federal do

Brasil por meio da Decisão nº 195, de 18 de agosto de 1998:

“ASSUNTO: Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural

– ITR

8

GODOI, Marciano Seabra de e MELO, Fabiana Leão de. O ITR e as Áreas

Destinadas à Atividade de Mineração, in Direito Empresarial Atual, Vol. 2. Belo

Horizonte: Del Rey, 2013, págs. 262.

816


EMENTA: As áreas destinadas à exploração mineral (minas,

lavras, jazidas, lagoas de rejeitos, oficinas, etc) são consideradas

pela legislação do ITR como componentes da Área Tributável e

da Área Aproveitável do imóvel, mas não como componentes de

sua Área de Utilização Limitada”. (Grifou-se).

Desse modo, são impostas restrições no sentido de impossibilitar

que as áreas de mineração sejam excluídas na apuração das

alíquotas e base de cálculo do imposto e, como consequência, os

contribuintes do ITR que se dedicam às atividades de mineração

sofrem a incidência desse tributo de forma tão gravosa quanto as

propriedades ociosas.

Ocorre que ao impor às mineradoras um tratamento fiscal

similar àquele conferido aos contribuintes que mantém latifúndios

improdutivos, o fisco viola a sistemática progressiva de incidência

do ITR, subvertendo o valor que orienta a sua incidência

(função social da propriedade); não se atenta ao que dispõe o

art. 8º do Decreto- Lei n.º 57/66, que foi recepcionado pela

CF/88 como Lei Complementar; além de afrontar a isonomia,

tratando como equivalentes contribuintes que não se encontram

na mesma situação.

Neste sentido, corrobora Misabel Derzi 9 , em sua atualização à

obra de Aliomar Baleeiro:

“Inconstitucional será a norma legal que, concedendo estímulos

a certos proprietários de terra, deles exclua outros em igualdade

de condições que, assim, pertencem à mesma categoria

essencial. As atividades identicamente situadas têm de merecer,

sem exceções, o mesmo tratamento no imposto, nos incentivos,

nos prêmios, nas isenções ou na progressividade sancionante.

Qualquer critério de exclusão do tratamento igual para pessoas

iguais jamais poderá ser arbitrário, mas dele dever-se-á poder

aferir a razoabilidade”.

Portanto, resta ao contribuinte, mais uma vez, a função de

demonstrar que o entendimento da Administração Tributária está

claramente equivocado. Os estudos jurisprudenciais sobre o tema

demonstram que bons frutos já foram colhidos em prol do contribuinte,

motivo pelo qual também passamos a analisá-los adiante.

9

Op. Cit., pág. 234.

817


5. Dos argumentos que comprovam a ilegalidade

do tratamento da Administração Tributária

e as principais decisões favoráveis aos

contribuintes

Diante de todo o exposto, os contribuintes têm utilizado a

tese que argumenta, basicamente, o reconhecimento da ilegalidade

do tratamento dado pela Receita Federal às áreas rurais destinadas

à mineração, com pedidos de exclusão de tais áreas na apuração de

alíquota e base de cálculo do ITR, pelos principais motivos a seguir:

1. afronta a sistemática progressiva de incidência do ITR,

no contexto do seu objetivo extrafiscal (arts. 153, § 4º, I

e art. 186, da CR/88 c/c art. 9º, da Lei n.º 8.629/1993);

2. violação à aplicação do art.8º, do Decreto- Lei n.º 57/66;

3. violação ao princípio constitucional da isonomia tributária

(art. 150, II, da CR/88), ao conferir às mineradoras, que

utilizam em alto grau os imóveis rurais, o mesmo tratamento

fiscal atribuído a latifúndios improdutivos, que não

cumprem a função social da propriedade.

Importante observar que as razões acima conversam entre si e

devem ser interpretadas em conjunto. Em relação à primeira, conforme

já visto, a função extrafiscal do ITR e a desapropriação para reforma

agrária são instrumentos constitucionalmente previstos para a concretização

da política agrária nacional (arts. 184 a 191, da Constituição), cujo

objetivo é assegurar o cumprimento da função social da propriedade

rural, mediante o desestímulo à manutenção de latifúndios improdutivos.

Ao estudarmos as formas de definição de alíquotas, de modo

progressivo e a depender do grau de utilização do imóvel em relação

a sua área total, e base de cálculo do imposto, da qual são excluídas as

áreas não passíveis de aproveitamento, resta claro que o ITR possui

o propósito de onerar mais os imóveis improdutivos.

Dessa forma, tenta-se demonstrar que o ITR, na sua condição

extrafiscal de auxílio da política de reforma agrária, não tem como

objetivo a incidência sobre áreas que não podem ser destinadas à

exploração rural. O imposto, tampouco, destina-se a induzir um

comportamento sobre a atividade de mineração, tal como expressamente

previsto no Decreto-Lei n.º 57/66.

818


As áreas destinadas à atividade de mineração, incluindo suas diversas

instalações e benfeitorias, cumprem, absolutamente, sua função

social, não havendo motivos razoáveis para que o ITR incida sobre elas

de forma tão gravosa como acontece com os latifúndios improdutivos.

Adentrando ao segundo argumento dos contribuintes, cumpre

ressaltar, inicialmente, que ainda como reforço à ideia trazida pelo

Decreto-Lei n.º 57/66, vale recordar a Lei n.º 8.629/93, que dispõe

sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à

reforma agrária, trazendo em seu art. 10, o seguinte:

“Art. 10. Para efeito do que dispõe esta lei, consideram-se não

aproveitáveis:

I - as áreas ocupadas por construções e instalações, excetuadas

aquelas destinadas a fins produtivos, como estufas, viveiros, sementeiros,

tanques de reprodução e criação de peixes e outros

semelhantes;

II - as áreas comprovadamente imprestáveis para qualquer tipo

de exploração agrícola, pecuária, florestal ou extrativa vegetal;

III - as áreas sob efetiva exploração mineral;

IV - as áreas de efetiva preservação permanente e demais áreas

protegidas por legislação relativa à conservação dos recursos naturais

e à preservação do meio ambiente. ” (Grifou-se).

Percebe-se assim, que os dois instrumentos (Decreto-Lei n.º

57/66 e Lei n.º 8.629/93) visam ao cumprimento do mesmo objetivo

constitucional.

Assim como no cálculo do ITR, demonstrado em tópico específico,

a fórmula adotada pela Lei n.º 8.629/93 para aferir o Grau

de Utilização do imóvel é o quociente entre a área efetivamente

utilizada e área aproveitável, da qual, contudo, são excluídas as

áreas destinadas a projetos de mineração, por força do dispositivo

acima transcrito.

Neste ponto, conclui-se que o disposto na Lei nº 8.629/93

reforça, por analogia, a interpretação sistemática que deve ser realizada

do art. 8º, do Decreto-Lei n.º 57/66 com o art. 10, da Lei

n.º 9.393/96.

Em tempo, no que tange à violação ao art. 8º, do Decreto-Lei

n.º 57/1966, tem-se que a administração tributária parece esquecer

que a norma foi recepcionada pela CF/88 com força de Lei

Complementar.

819


Na lição de Marciano Seabra de Godoi e Fabiana Leão de

Melo 10 :

“Nesses termos, possuindo o Decreto-lei n.º 57/1996 status

de lei complementar e como não houve alteração por legislação

da mesma natureza quanto à questão da exclusão das áreas de

mineração da base de cálculo do ITR, é de se concluir que a

referida norma encontra-se em vigor e não poderia ser alterada

pela Lei n.º 9.393. ”

Assim, conforme dispôs o Decreto-Lei, sendo legalmente qualificadas

como inaproveitáveis, as áreas rurais destinadas à pesquisa e lavra

mineral, inclusive a extensão das benfeitorias e instalações vinculadas

a essas atividades, devem ser excluídas no cálculo do Grau de Utilização

do imóvel, de forma a reduzir as alíquotas do ITR, bem como

deduzidas da área tributável, reduzindo também a base de cálculo do

imposto, uma vez que, conforme já visto neste estudo, nos termos

da Lei n.º 9.393/96, há uma correlação entre a imprestabilidade e

a inaproveitabilidade, a ponto de todas as áreas qualificadas como

imprestáveis também serem caracterizadas como inaproveitáveis para a

atividade rural, o que se verifica no art. 10, § 1º, IV, b c/c II, c.

Além disso, o próprio art. 8º, do Decreto-Lei n.º 57/66 sugere

que as áreas de mineração são também imprestáveis para qualquer

atividade rural, ocasionando a redução da base tributável, quando se

refere à área que “impede a exploração da mesma em atividades agrícolas,

pecuária ou agro-industrial”.

Ainda quanto à imprestabilidade das áreas de mineração para

qualquer atividade rural, ressalta-se a condição para a exclusão

destas da área tributável à prévia declaração de interesse ecológico,

mencionado na alínea c, do II, § 1º, art. 10, da Lei n.º 9.393/96.

Mas, ao exigir esta declaração também para as áreas de mineração,

novamente não está sendo considerada a existência do art. 8º, do

Decreto-Lei n.º 57/66, que deve ser interpretado conjuntamente

com a Lei nº 9.393/96, sobretudo por se tratar de norma mais específica,

como visto.

A interpretação sistemática de tais normas, leva ao entendimento

de que a Lei n.º 9.393/96 exige que as áreas imprestáveis para

10

Op. Cit., págs. 265.

820


a atividade rural sejam declaradas de interesse ecológico, exceto as

áreas de mineração, que possuem tratamento específico no art. art. 8º,

do Decreto-Lei n.º 57/66, cuja hierarquia é de Lei Complementar.

Novamente, vale ressaltar a lição de Marciano Seabra de Godoi

e Fabiana Leão de Melo 11 sobre o tema:

“Conforme explicitado, o Poder Executivo considera as áreas

destinadas à mineração não enquadráveis como atividade rural,

mas veda sua exclusão da base de cálculo do ITR, por considerar

imprescindível a prévia declaração do interesse ecológico da área.

A interpretação literal e isolada da alínea c, do inciso II, do artigo

10 da Lei n.º 9.393/1996 realmente conduz a esse entendimento

quanto à base de cálculo: [...].

Entretanto, essa interpretação desconsidera o Decreto-Lei n.º

57/1966, que contém disposição específica reconhecendo a imprestabilidade

das áreas de mineração à atividade rural e a consequente

exclusão da apuração do ITR: [...].

Diante disso, cabe concluir que a legalidade do artigo 10, II, c

da Lei n.º 9.393 depende necessariamente de sua interpretação

no sentido de que a previsão de exigência de prévia declaração de

interesse ecológico pelo órgão competente não se aplica às áreas

de mineração. Somente essa interpretação compatibiliza o dispositivo

com o disposto no art. 8.º do Decreto-Lei nº 57/1966”.

(Grifou-se).

Observa-se, contudo, que o próprio 8º, do Decreto-Lei n.º

57/66 exige uma comprovação de que a “destinação impede a exploração

da mesma em atividades agrícolas, pecuária ou agro-industrial e que sejam

satisfeitas as exigências estabelecidas na regulamentação deste Decreto-Lei”.

A partir do estudo do exercício da atividade mineral, seja essa

feita de forma subterrânea ou a céu aberto, na qual o solo/subsolo

é constantemente revolvido para a extração do mineral (desmonte

com acionamento de explosivos, por exemplo), onde há utilização

de diversos equipamentos e pessoas, bem como construções de

barragens de rejeitos, percebe-se que tal atividade é notoriamente

incompatível com a exploração agrícola, pecuária ou agro-industrial.

É da essência das atividades de pesquisa e lavra mineral impedir

que a área destinada a esse fim não seja passível de aproveitamento

para qualquer outra atividade econômica, sobretudo atividades rurais,

11

Op. Cit., págs. 263/265.

821


até mesmo em razão da legislação pátria que trata a atividade minerária

como atividade estratégica, de utilidade pública e de exercício

obrigatório nas áreas qualificáveis para tanto.

Nesse sentido, a outorga de um Direito Minerário pelo Departamento

Nacional de Produção Mineral – DNPM não garante

apenas o direito de se realizar a pesquisa (Alvará de Pesquisa) ou a

lavra (Portaria de Lavra). Por força dos arts. 29, I e II, 47, I e XIV

e 49, do Código de Mineração (Decreto-Lei nº 227/1967) 12 , e por

ser a mineração uma atividade de interesse nacional (art. 176, da

CR/88), o minerador, ao receber os títulos de pesquisa e lavra, tem

o dever de exercer a atividade, sob pena de aplicação das sanções

previstas no Código de Mineração.

Desse modo, tal comprovação deverá ser realizada apenas no

bojo de eventual procedimento de fiscalização tributária, assim como

já ocorre, por exemplo, em relação à fiscalização sobre os hectares

declarados pelos contribuintes a título de reserva legal e área de

preservação permanente, valor do imóvel, áreas de pastagem, etc.,

12

“Art. 29 O titular da autorização de pesquisa é obrigado, sob pena de sanções:

I - A iniciar os trabalhos de pesquisa:

a) dentro de 60 (sessenta) dias da publicação do Alvará de Pesquisa no Diário

Oficial da União, se o titular for o proprietário do sol ou tiver ajustado com

este o valor e a forma de pagamento das indenizações a que se refere o Artigo

27 deste Código; ou,

b) dentro de 60 (sessenta) dias do ingresso judicial na área de pesquisa, quando

a avaliação da indenização pela ocupação e danos causados processar-se em

juízo.

II - A não interromper os trabalhos, sem justificativa, depois de iniciados, por

mais de 3, (três) meses consecutivos, ou por 120 dias acumulados e não consecutivos.

Parágrafo único. O início ou reinício, bem como as interrupções de trabalho,

deverão ser prontamente comunicados ao D. N. P. M., bem como a ocorrência

de outra substância mineral útl, não constante do Alvará de Autorização”.

“Art. 47. Ficará obrigado o titular da concessão, além das condições gerais que

constam deste Código, ainda, às seguintes, sob pena de sanções previstas no

Capítulo V:

I - iniciar os trabalhos previstos no plano de lavra, dentro do prazo de 6 (seis)

meses, contados da data da publicação do Decreto de Concessão no Diário

Oficial da União, salvo motivo de força maior, a juízo do D.N.P.M.; [...].

XIV - Não suspender os trabalhos de lavra, sem prévia comunicação ao

D.N.P.M.”.

“Art. 49. Os trabalhos de lavra, uma vez iniciados, não poderão ser interrompidos

por mais de 6 (seis) meses consecutivos, salvo motivo comprovado de

força maior”. (Grifou-se).

822


cuja comprovação deve ser apresentada apenas quando notificados

para tanto, sob pena de arbitramento do imposto (art. 14, da Lei nº

9.393/1966).

Por fim, em relação ao terceiro argumento utilizado pelo

contribuinte, não é difícil perceber que a atitude da Administração

Tributária vai contra o princípio constitucional da isonomia (art. 150,

II, da CR/88), porque dá às mineradoras contribuintes do ITR, que

utilizam em alto grau os imóveis rurais, o mesmo tratamento fiscal

atribuído a latifúndios improdutivos, que não cumprem a função

social da propriedade.

Em outras palavras, trata-se como equivalentes contribuintes

que não se encontram na mesma situação. No que tange ao argumento,

confira-se a lição 13 de Marciano Seabra de Godoi e Fabiana

Leão de Melo:

“De fato, não vislumbramos qualquer justificativa para que uma

área de extração mineral possa ser onerada com uma alíquota de

até 20%, enquanto a mesma área, se utilizada para a exploração

de qualquer atividade rural, se sujeite a uma carga fiscal correspondente

a 0,45%. (...).

Como a premissa fundamental para a progressividade do ITR é

o desestímulo ao uso improdutivo da terra, carece de coerência e

viola a isonomia diferenciar, para fins de tributação, duas atividades

igualmente produtivas, de tal maneira que uma se sujeite

à alíquota de 20% e outra à de 0,45%, ou equiparar duas

atividades totalmente distintas no cumprimento da função social

da propriedade, como áreas utilizadas à atividade mineral e os

grandes latifúndios passíveis de reforma agrária”. (Grifou-se).

Ou seja, o tratamento dado pela Administração Tributária

em relação ao ITR incidente sobre áreas destinadas à atividade de

mineração, não merece prosperar em nenhum de seus argumentos.

Neste sentido, ao avaliarmos as jurisprudências sobre o tema, é

possível verificar importantes decisões que corroboram com os conceitos

e ideias abordados neste estudo. Vejamos, por exemplo, decisões

do Eg. TRF da 1ª Região que acolhem a tese dos contribuintes:

“Dispõe o art. 8º, do Decreto nº 57/66 que para fins de cadastramento

e do lançamento do ITR, a área destinada a exploração

13

Op. Cit. Pág. 273.

823


mineral, em um imóvel rural, será considerada como inaproveitável,

desde que seja comprovado que a mencionada destinação impede

a exploração da mesma em atividades agrícolas, pecuária ou

agro-industrial e que sejam satisfeitas as exigências estabelecidas

na regulamentação deste Decreto-Lei.

(...)

4. O Decreto de Lavra, por sua vez, encontra-se devidamente

encartado às fls. 53/54, razão pela qual, de fato, os imóveis em

tela são insuscetíveis de incidência do ITR, enquanto estiverem,

em sua completude, sendo utilizados para produção mineral.

(...)”. (AC 0022324-29.1999.4.01.3500 / GO, Rel. JUIZ

FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, 5ª TURMA

SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.324 de 23/10/2013). (Grifou-se).

“(...) ITR. ISENÇÃO. ÁREA DE PRODUÇÃO MINE-

RAL. DECRETO 57/66 REGULAMENTADO PELO

DECRETO 59.900/66. ISENÇÃO. AÇÃO DECLARA-

TÓRIA. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA.

EFEITOS PROSPECTIVOS. CABIMENTO. (...)

1. Dispõe o art. 8º, do Decreto nº 57/66 que para fins de cadastramento

e do lançamento do ITR, a área destinada a exploração

mineral, em um imóvel rural, será considerada como inaproveitável,

desde que seja comprovado que a mencionada destinação impede

a exploração da mesma em atividades agrícolas, pecuária ou

agro-industrial e que sejam satisfeitas as exigências estabelecidas

na regulamentação deste Decreto-Lei.

2. O regulamento, no caso, ficou por conta do Decreto 59.900/66,

que dispôs que para efeito do disposto no art. 8º do Decreto-lei

nº 57, de 18 de novembro de 1966, o contribuinte deverá apresentar

planta com a localização das áreas de exploração mineral

e o respectivo registro no Departamento Nacional de Produção

Mineral do Ministério de Minas e Energia, o decreto de lavra, e

a justificativa quando a lavra não for de superfície, de que a mencionada

destinação impede a exploração com finalidade agrícola,

pecuária, ou agro-industrial.

3. Da perícia realizada nestes autos, restou indene de dúvidas

que existe concessão mineral sobre o imóvel sendo que o mesmo

está sendo usado em sua totalidade para este fim. Concluiu o

perito, ademais, que a área onde está sendo executado o trabalho

de lavra, ou seja, a totalidade do imóvel, é imprestável para atividades

agrícolas ou pecuárias.

4. O Decreto de Lavra, por sua vez, encontra-se devidamente

encartado às fls. 53/54, razão pela qual, de fato, os imóveis em

tela são insuscetíveis de incidência do ITR, enquanto estiverem,

em sua completude, sendo utilizados para produção mineral.

824


(...)”. (AC 0022324-29.1999.4.01.3500 / GO, Rel. JUIZ

FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, 5ª TURMA

SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.324 de 23/10/2013). (Grifou-se).

O mesmo entendimento também foi exarado na sentença

proferida pelo Ilmo. Juiz Federal Osmane Antônio dos Santos, da

Subseção Judiciária de Uberaba/MG, ao julgar a Ação Ordinária

nº 1999.38.02.002713-3, declarando a não incidência do ITR

sobre as áreas objeto de Portaria de Lavra, Alvará de Pesquisa e

Servidão Mineral:

“Nos termos do art. 10, II, “c”, da Lei nº 9.393/96, conclui-se

que o ITR incide, inicialmente, sobre a área total do imóvel, com

exceção das áreas comprovadamente imprestáveis para qualquer

exploração agrícola, pecuária, granjeira, aquícola ou florestal.

Por sua vez, o art. 8º, do Decreto-Lei nº 57/66, preconiza

que, ‘para fins de cadastramento e do lançamento do ITR, a

área destinada a exploração mineral, em um imóvel rural, será

considerada como inaproveitável [...]’.

Vê-se que o legislador, quando entendeu necessário, fez as ressalvas

correspondentes, quanto à não incidência do ITR, do que é possível

concluir, mesmo que implicitamente, mas de forma inequívoca,

evidente isenção dessa exigência do ITR. É que, se o quisesse, o

legislador consignaria em referido artigo, que as áreas de extração

mineral sofreriam a incidência do imposto em discussão.

De mais a mais, o art. 10, III, da Lei nº 8.629/1993, dispõe

que as áreas sob efetiva exploração mineral, são consideradas não

aproveitáveis”. (Grifou-se).

Destaca-se também a sentença proferida, em 2014, pelo Dr.

Francisco Neves da Cunha, na Ação nº 0028513-41.2013.4.01.3400,

da 22ª Vara Federal da JFDF:

“Óbvia interpretação teleológica dos diplomas acima citados leva

a uma só conclusão: que o ITR surgiu para impedir que o campo

seja um enorme vazio sócio-econômico enquanto alhures abundam

o desemprego, a migração e a fome.

Entendo que as atividades da Autora, embora a princípio não

alimentem o negócio rural, tampouco tornam ociosas terras que poderiam

ser produtivas. As áreas sob exploração minerária atendem

sua função função social e econômica e se situam além dos limites

postos pelas normas que regulam e informam o recolhimento

do ITR. Elas não se destinam à produção rural mas tampouco

825


frustram os ideais da reforma agrária, pois não estão sob o uso

improdutivo que atrairia a ação do Estado para disciplinar sua

racionalização por meio do ITR.

Não é outra direção que parte do ordenamento já sinaliza, como

o decreto lei 57/1996, que inclusive permite considerar inaproveitáveis

as áreas em que a empresa se instala (...)

A Autora trouxe farta e ampla documentação para comprovar que

suas atividades são produtivas. O relatório de lavra do exercício

de 2012 (Ano-base 2011), por exemplo, juntado aos presentes

autos às folhas 2975-2551, mostra o volume da extração e indica

uma situação muito distante do que poderia se chamar de ociosidade.

À folha 3108 temos um mapa da propriedade da Autora:

uma grande parte da área é ocupada por rejeito da mineração,

outra grande parte é a área da escavação, e ainda há pontos dos

quais é retirado solo para construção do maciço da barragem, bem

como para a atividade industrial da empresa. Todo esse espaço é

imprestável para a atividade agrária. Às folhas 3125-3127 há

fotografias panorâmicas que ilustram o uso do solo que, revolvido

e explorado, tornou-se incapaz de sustentar a agricultura. ”

Finalmente, o atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais

– CARF e o antigo Conselho de Contribuintes/MF decidiram

em várias oportunidades de forma favorável à tese aqui arguida, ainda

que não tenham se manifestado expressamente sobre o art. 8º, do

Decreto-Lei nº 57/1966.

Em 21.10.2010, por exemplo, foi publicado o Acórdão nº

2201-00.876, do CARF, que acolhe a premissa de que as áreas de

mineração são imprestáveis, devendo ser excluídas na apuração da

base de cálculo do ITR:

“4. ÁREA IMPRESTÁVEL

A Jurisprudência desse Conselho, tem o entendimento de que a

área utilizada em mineração de superfície produtiva que inviabiliza

a utilização para qualquer finalidade agrícola, pecuária,

aquícola, granjeira e florestal, deve ser considerada imprestável,

sendo passível de exclusão da base de cálculo do ITR”. Pág. 10.

(CARF – 2ª Câmara / 1ª Turma Ordinária – Acórdão

2201-00.876 – Relatora Rayana Alves de Oliveira França

– Publicado em 21.10.2010). (Grifou-se).

Já em outras oportunidades, o Conselheiro Zenaldo Loibman

foi o Relator de Recursos sobre o tema no antigo Conselho de

Contribuintes/MF, tendo proferido votos substanciais acolhendo

826


também a premissa de as áreas de mineração são inaproveitáveis,

devendo ser excluídas do Grau de Utilização, na determinação da

alíquota do ITR:

“A exploração mineral de superfície é evidentemente atividade

produtiva, de incontestável interesse econômico, que, entretanto,

inviabiliza a utilização dessas terras para qualquer finalidade

agrícola, pecuária, aquícola, granjeira ou florestal. É cediço que

a área utilizada em mineração de superfície, de importância

econômica incontestável, pode e deve ser considerada inaproveitável

no que tange às atividades rurais, e por isso deve

ser excluída do cálculo do grau de utilização da propriedade

rural, e, portanto, tal área não sofre a incidência do ITR”. Fl.

188. (CC/MF – 3ª Câmara / 3º CC – Acórdão 303-

34.669 – Relator Zenaldo Loibman – Publicado em

11.09.2007). (Grifou-se).

Desse modo, percebe-se que os argumentos analisados neste

estudo têm sido corroborados pelos órgãos julgadores e representam

importantes precedentes em prol dos contribuintes que enfrentam

problemas relacionados à incidência do ITR sobre áreas em que

desenvolvem a atividade minerária.

6. Da alteração da Lei n.º 9.393/96, trazida

pela Lei n.º 11.727/08, para excluir da

área tributável as áreas alagadas para

constituição de reservatório de usinas

hidrelétricas

Importante, por fim, observamos no contexto deste estudo,

que a Lei n.º 9.393/96 não previu, inicialmente, a exclusão das

áreas alagadas para fins de constituição de reservatório de usinas

hidrelétricas das áreas tributáveis.

Tal previsão foi disposta no art. 40 da Lei n.º 11.727/08, o

qual alterou o art. 10, II, da Lei n.º 9.393/96, sendo este um caso de

sucesso dos contribuintes em face do tratamento dado às estas áreas

pela Administração Tributária, no que se refere à incidência do ITR.

A discussão ganhou tamanha importância que foi objeto

de súmula, aprovada pela segunda turma da CSRF, em sessão de

08/12/2009:

827


“Súmula CARF nº 45: O Imposto sobre a Propriedade Territorial

Rural não incide sobre áreas alagadas para fins de constituição

de reservatório de usinas hidroelétricas. ”

Analisando um dos principais acórdãos paradigmas, percebe-se

que um forte argumento utilizado pelo contribuinte, companhia

energética, para defender seu direito é o fato de se prestar um serviço

público, em que a posse do imóvel pertence à União.

Contudo, há que se ressaltar alguns trechos do acórdão, em que

é dada interessante interpretação em favor do contribuinte:

“Apenas para já traçar os pressupostos da conclusão do voto, já

trago à colação a previsão do artigo 20 da Constituição Federal,

incisos III a VI e § 1 0, bem como art. 176, nos seguintes termos:

Art. 20: São bens da União:

III — os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de

seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites

com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele

provenham, bem como os terrenos marginais e as praias pluviais.

IV— as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros

países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras,

excluídas, destas, as áreas referidas no art. 26, liç

V — os recursos naturais da plataforma continental e da zona

econômica exclusiva;

VI— o mar territorial;

VII — os terrenos de marinha e seus acrescidos

VIII — os potenciais de energia hidráulica

...

§ 1° É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito

Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da

administração direta da União, participação no resultado

da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos

para fins de geração de energia elétrica e de outros

recursos minerais no respectivo território, plataforma continental,

mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação

financeira por essa exploração.

Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais

e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade

distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento,

e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade

do produto da lavra.

(...)

Poderia perdurar a dúvida sobre a incidência do ITR sobre as

terras submersas e sobre a área situada ao seu redor, em vista da

828


“propriedade” dessas terras pertencerem à Recorrente. Todavia,

há que ser considerado que tal propriedade ocorre como condição

para a prestação do serviço público sob o regime de concessão, de

tal modo que a “propriedade” que detém a Recorrente não possui

o contorno que se atribui à propriedade pura e simples do direito

privado, pois em vista do regime de concessão a que está submetida

não lhe é dado o direito de alienar ou ceder o imóvel, e, as águas

que sobre as terras pertencem, como visto, ao patrimônio da União.

(...)

Portanto, consoante o meu entendimento, nesse caso, a propriedade,

como título constante do registro imobiliário e como registro

contábil da Recorrente não permite a incidência do ITR pelo

contexto em que se insere tal instituto, posto que esta propriedade

é limitada à formalidade, não se caracterizando como propriedade

quando da análise dos elementos de tal instituto nos termos da

lei e doutrina civil aplicada ao caso, além da questão da posse, já

demonstrado, a meu ver, que cabe indiscutivelmente à União, o

que, acarreta a imunidade..

(...)

Para corroborar tal fundamento de voto, registro a lembrança do

previsto no parágrafo primeiro do artigo 20 da CF: § 1 0 É assegurada,

nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal

e aos Municípios, bem como a órgãos da administração

direta da União, participação no resultado da exploração

de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins

de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais

no respectivo território, plataforma continental, mar

territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação

financeira por essa exploração. O propósito de tal previsão

constitucional foi o de criar uma exação (sem entrar na

natureza jurídica dela —se tributária ou não) para compensar

a pessoa jurídica de direito público interno pela

exploração pela pessoa de direito privado, de seus bens

constantes do rol do art. 20. Assim, se por um lado, impossível

a cobrança do ITR, por outro lado, a Recorrente

deve pagar a CFEM pela exploração de bens da União,

visto que a característica dessa exação é a sua natureza

compensatória. ” (CARF – 1ª Câmara / 3º CC – Acórdão

301-33.691 – Relator Susy Gomes Hoffmann – Data da

Sessão 28.02.2007). (Grifou-se).

Conforme visto, a questão gira em torno, principalmente, da

função social apresentada pelo imóvel, não merecendo prosperar

qualquer argumento que, de maneira superficial, julgue a terra improdutiva

para fins de tributação.

829


Trazendo para o contexto das áreas de mineração, tem-se que a

análise sobre a incidência do imposto deve ser mais profunda, além

de considerar as características peculiares da atividade, o que, infelizmente,

ainda não vem sendo feito pela Administração Tributária.

7. Conclusão

A partir das considerações trazidas neste estudo, e observando

a interpretação sistemática que deve ser realizada do art. 8º, do

Decreto-Lei n.º 57/66 com o art. 10, da Lei n.º 9.393/96, pode-se

concluir que, via de regra, as áreas destinadas à atividade de mineração

devem ser qualificadas como inaproveitáveis, de forma a reduzir as

alíquotas de incidência do ITR, e consideradas como imprestáveis

à atividade rural, devendo também ser excluídas da apuração da

base de cálculo do imposto. Tudo, por força de expressa previsão do

Decreto-Lei n.º 57/66, recepcionado pela CF/88 com o status de

Lei Complementar.

A não incidência do imposto sobre tais áreas está de acordo

com o próprio papel do ITR, que conforme demonstrado, surgiu

no contexto de busca por instrumentos de auxílio à política agrária,

de forma a estimular o desenvolvimento à atividade rural, não sendo

a atividade de mineração incluída em tal campo.

Além disso, a interpretação sistemática das normas, também

nos leva ao entendimento de que a Lei n.º 9.393/96 exige que as

áreas imprestáveis para a atividade rural sejam declaradas de interesse

ecológico, exceto as áreas de mineração, que possuem tratamento

específico no art. art. 8º, do Decreto-Lei n.º 57/66.

A pretensão da Administração Tributária, que insiste em considerar

que a legislação foi alterada de modo a incluir as áreas destinadas

à atividade de mineração no campo de incidência do ITR,

não merece prosperar. Para tanto, a sistemática do tributo deveria

ter sido alterada mediante Lei Complementar, respeitando ainda sua

progressividade no intuito de desestimular o uso improdutivo da

terra, o que configura, dentre outros motivos, o caráter extrafiscal

do imposto.Conforme destacado neste estudo, as áreas destinadas à

atividade de mineração, incluindo suas diversas instalações e benfeitorias,

cumprem sua função social, não havendo motivos razoáveis para

que o ITR incida sobre elas de forma tão gravosa como acontece

com os latifúndios improdutivos.

830


A atividade de mineração foi estimulada pelo legislador, sendo

explorada no interesse nacional, e considerando a previsão de tributação

das áreas destinadas à esta atividade, não se poderia aceitar

o comparativo indevido que vem sendo feito, principalmente em

respeito à extrafiscalidade e ao princípio da isonomia.

Neste sentido, a jurisprudência também vem reforçando seus

argumentos, com decisões que garantem os direitos do contribuinte.

Contudo ainda não há reconhecimento unânime sobre o correto

tratamento do ITR sobre as áreas de exploração mineral, motivo

pelo qual se fazem necessários estudos sobre o tema que fortaleçam

os argumentos trazidos pelos contribuintes.

Bibliografia

.BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11ª Ed. Atualizada por

Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro, Forense, 2010.

. GODOI, Marciano Seabra de e MELO, Fabiana Leão de. O ITR e as

Áreas Destinadas à Atividade de Mineração, in Direito Empresarial Atual,

Vol. 2. Belo Horizonte: Del Rey, 2013.

831


editora

Este livro foi impresso em papel Off-Set 75g,

com tipografia Bembo Std 12/14.

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