41ª Edição_Revista ATRAÇÃO
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Por Dra. Telma Mª S Machado
Nas asas do
pensamento
Aracaju
SERGIPE
BRASIL
Delegada da ABRAME (Associação brasileira dos Magistrados Espíritas) em Sergipe, Graduada em Ciências Biológicas e em
Direito, Pós-Graduada em Direito Processual Público, Juiza Federal da Seção Judiciária de Sergipe, Mestre em Filosofia,
O filósofo e matemático francês Descartes (1596-1650), ao pronunciar
a frase “Cogito, ergo sum” (“penso, logo existo”) provavelmente
não tinha a exata noção da importância e simbologia de que
ela se revestiria Professor
na construção do pensamento racional. A investigação,
a análise e a metodologia defendidas na sua famosa obra “O Discurso
sobre o Método”, publicada em 1637, em Leiden (França), tornaram-se
importantes Gonçalo
ferrramentas, inclusive, para o avanço da ciência.
Para além do aspecto meramente biológico, através do pensamento
é possível
Ferreira
visitar regiões materialmente
Melo
insondáveis, que sobrelevam
a perspectiva existencial, nem sempre decodificadas de modo a proporcionar
as múltiplas conquistas necessárias à autopacificação.
A racionalidade, portanto, longe de afastar as emoções inerentes
à condição humana, é valiosa ferramenta para a rejeição das mais variadas
espécies de fanatismo. Por sua vez, a emoção colore os sentidos
para que as deduções oriundas do pensamento racional possibilitem a
real assimilação da beleza, da justiça, do amor...
O pensamento, sem dúvida, é a grande fonte onde deságuam
as nossas dúvidas, as nossas certezas (ainda que momentâneas), inquietações,
angústias, ansiedades e esperança. Com impressionante
rapidez, ele pode nos levar a estados existenciais conflitantes. Não por
acaso, o Mestre inesquecível, ciente do que é capaz de fazer o poder
do pensamento, alertou-nos a não pecar “por pensamentos, palavras
e ações”.
Nas asas do pensamento voam as nossas vibrações e sintonias, daí
porque as ondas que ele cria têm gênese em nossa própria essência, às
vezes ainda encoberta.
A liberdade de pensar, aliás, é algo que, não raras vezes, tem sido
a grande força e consolação da humanidade de todas as épocas, basta
volvermos o olhar para o passado e lembrarmos os povos submetidos
pelas guerras que a história noticia.
Giuseppe Fortunino Francesco Verdi (1813-1901), grande compositor
de óperas da Itália, na época em que aquela Nação se via oprimida
pela Áustria, compôs Nabuco, com libreto de Temístocles Solera, ópera
que teve retumbante sucesso em 1842, e cujo enredo se referia à conquista
de Judá pelo rei Nabucodonosor e à escravidão do povo hebreu
na Babilônia. Um dos segredos de tamanho êxito deveu-se ao coro dos
escravos hebreus em que sobressaía a frase “Va pensiero sull’ali dorate”
(“Vai pensamento, em asas douradas”) e no qual está representada a
desolação do povo judeu com a subjugação a que foi submetido. Os
italianos, dominados pela Áustria, identificaram-se com a tristeza ali
representada. O trecho a seguir, retirado de um artigo (“Verdi: como
vencer a censura”) publicado por Carlos Heitor Coni na Folha de São
24 Atração_maio de 2021
Paulo, em 09/11/2007, resume bem a passagem:
[...] a Itália vivia o seu próprio cativeiro, dominada pela Áustria.
Verdi compreendeu a intenção de Solera: transpor o drama dos hebreus
dominados junto aos rios da Babilônia para a sua própria pátria espezinhada
pelo grande império dos Habsburgos. Não conseguiu dormir
naquela noite. Os versos estavam em sua cabeça: “Va pensiero”. Até hoje,
esse coro de escravos serve de hino para todos os oprimidos em qualquer
parte do mundo.
Dias depois, a ópera estava pronta e encenada. O povo não apenas
gostou da ópera, mas da mensagem que ela trazia. O nome de Verdi
virou anagrama: “Vittorio Emanuelle, Re d’Italia”. Verdi passou a ser a
senha de liberdade. Mais uma vez, um artista demonstrou que a censura
não atrapalha a inteligência - quando há inteligência. 1
A Doutrina Espírita apresenta vasto estudo sobre o quanto o pensamento
modela o ser.
Evidentemente, quanto mais se é atrasado moralmente, maior
será o manuseio do pensamento para construir cenas de rancor, de vingança
e de cureldade, assim como o bem que habita uma mente mais
evoluída espiritualmente arquitetará paisagens de paz, de bem estar e
de harmonia. Tais disposições mentais redundam em ideoplastias que
se propagam em nossa essência psicológica e transcendental, eis que o
poder dos pensamentos, hoje não mais se duvida, afeta o ser espiritual
e, consequentemente, o ser corpóreo, pelo arrastamento de correntes
vibratórias.
A harmonia do corpo e da mente, portanto, está em direta e indissociável
relação com os pensamentos que abrigamos, daí a necessidade
de vigiá-los e educá-los, através do permanente cultivo de sentimentos
relacionados à bondade, à ética, ao perdão etc.
Jesus ofertou a receita ideal para a harmonia individual e coletiva
ao exortar o homen a se livrar dos malefícios de ações, palavras e pensamentos
destrutivos, sombrios, desarmonizadores, que transportam,
em asas opacas, sofrimento e infelicidade.
As asas douradas, portanto, são construídas pela força de vontade,
pela determinação de iluminar as sombras do inconsciente, a fim de
que essa claridade leve ao caminho da sublimação. Somos todos passarinhos
e:
Sendo pássaros,
Não podemos rastejar.
Respeitemos nossas asas.
As estrelas são a meta,
As sombras até as ocultam,
Mas não as removem de lá.
1 http://academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?from_info_
index=51&infoid=6403&sid=579, acesso em 15 de março de 2009.